quarta-feira, 28 de julho de 2010

Convite: Tinha uma Horta Aqui




Caro leitor, vou deixá-lo livre de mim por uns dias, pois estou preparando duas aulas para o evento do Caderno Paladar, do Estadão. E não sou, definitivamente, do tipo tranquilo. No sábado tenho a aula com a Ana Soares e Mara Salles, na qual vamos falar da galinha - e mostrar muita coisa legal. E comer, comer.... Não sei se ainda há ingressos, mas para minha palestra na sexta-feira com certeza há. Ficarei feliz se encontrar ao menos um leitor por lá. Você vai poder ver, cheirar e apalpar a maioria das coisas da qual vou falar. Aqui, como está no programa:
TINHA UMA HORTA AQUI - Do jacatupé ao jiquiri, com Neide Rigo Nutricionista e incansável pesquisadora de ingredientes desconhecidos ou quase esquecidos, Neide Rigo fala nesta aula justamente dessas culturas que foram negligenciadas ao longo do tempo e praticamente sumiram. Nunca ouviu falar em jacatupé? Neide explica que é uma leguminosa que não produz feijões comestíveis, mas tubérculos doces e ricos em amido e proteínas. E jiquiri? Ah, esse é uma ervinha para lá de espinhenta. E tem ainda ocará-moela (também conhecido como cará-do-ar), o mangarito (cujo sabor lembra uma mistura de tubérculo de taioba e inhame), a araruta (um rizoma que dá origem a uma fécula delicada, usada para fazer brevidade) e o almeirão-roxo para nos lembrar de como é grande a biodiversidade alimentar brasileira.
PALESTRAS 16h - R$ 30 Indicado para todos os grupos
Volto aqui na segunda se sobreviver!

terça-feira, 27 de julho de 2010

Manteiga caseira e bolo com soro de manteiga



Foto: Júlia Bulhões
Na semana passada estive em Fartura com minha amiga Inês, mais pelo galinheiro, porém o curral está na mesa à toda hora. O leite chega espumoso e cheiroso; meu pai chega a caneca com um pouco de mel junto à teta da vaca para em seguida beber de golada. Prefiro-o quente fervendo, com café colhido, torrado e moído na hora por ali mesmo. O pão acabou de sair do forno e, por cima, a manteiga que acabei de bater com a nata que vai se acumulando numa vasilha guardada no freezer. Já falei a respeito e mostrei o passo-a-passo do feitio manteiga aqui.
Quando o creme chega a meio quilo, um quilo, é só descongelar e bater. Já usei processador e liquidificador e os dois dão certo, mas descobri que gosto mesmo é de usar o batedor de arame ou fuet. Sinto algum prazer em ver os glóbulos de gordura se separando lentamente do soro para se aglomerar em bloco único. Sinto também que tenho domínio da situação. Parece mágico ver a transformação de uma emulsão de gordura-em-soro no inverso soro-em-gordura, já que a rede de gordura formada abriga aqui e ali gotículas de soro (até 20% da gordura é de soro).
Depois de apertar bem o bloco de gordura na própria tigela e ir escorrendo o soro (pode lavar a gordura com água gelada - isto contribui para que a manteiga tenha um tempo de vida maior), gosto de colocar a manteiga sobre uma peneira fina e ir jogando pra cima e recolhendo, formando uma bola, tudo muito devagar para que só o soro passe pelos furos. Por isto a marca de peneira na manteiga da foto. Juntei um pouco de sal antes de passar para a peneira.

O perfume e o sabor da manteiga caseira são intensos, lembram queijos maduros e tem um pouco de acidez - tudo graças aos ácidos graxos que a compõe, especialmente ácido butírico.
Quanto ao soro da manteiga ou buttermilk, todo mundo deve saber, não é pra jogar fora. Tem muitos componentes do leite, menos a gordura e ainda é ácido, de modo que pode ser usado no lugar do iogurte, como para fazer bolos, por exemplo. E foi o que fiz e de maneira bem rápida, com umas fatias das bananas que estavam na fruteira, que era pra dar tempo de entrar na mesa do lanche da tarde.


Bolo com soro de manteiga: misturei numa tigela 4 ovos, 2 xícaras de açúcar, 3 xícaras de farinha de trigo, 1/2 xícara de manteiga amolecida, 1 xícara de soro de manteiga e 1 colher (sopa) de fermento em pó. Mexi com colher de pau até ficar uma massa lisa. Juntei casquinhas raladas de limão rosa e umas 4 bananas nanincas maduras e firmes, em rodelas. Mexi devagar e despejei a massa numa forma redonda untada com manteiga e enfarinhada. Assei e nhac.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Resposta à charada: medula de pato


Cérebro e medulas espinhais das aves: praticamente a mesma constituição. Aqui, miolo de galinha

Pescoço de frango para todo o gosto no Mercado da Lapa. De pato, nunca vi
Pensei que a charada seria fácil, já que passei a semana falando do pato. Por isto mesmo, alguns leitores, como a Heliane, a Márcia, a Kelly e a Alessandra citaram partes dele - traqueia e tripa. Outras sugestões foram raiz forte, raiz de coentro, bardana, broto de samambaia, aspargos, bambu e até turu. Acertaram mesmo a Ceiça e a Margarida que responderam: medula do pato. De qualquer forma, obrigada a todos que devam palpites.
De fato, a medula espinhal não aparece nas partes miúdas do pato que mostrei aqui. É que para conseguir tirar assim, feito uma minhoquinha, o pesçoço tem que estar cozido. Cozinhei para fazer o caldo da canja. A carne, tirei para fazer o recheio do ravioli. E as vértebras, já molinhas, cheias de caldo entranhado, chupei e mastiguei. Não sem antes quebrá-las para tirar a medula, feito que não se consegue facilmente com pato ou frango de granja. Na ave caipira, tanto o cérebro quanto a medula são mais firmes e se mantêm íntegros, fácil de separar. Não fiz nenhuma receita específica para ele, mas ideias não faltam. Nem a você, imagino. Basta um monte deles para se viajar.
Na minha casa, aos domingos, o frango para a macarronada sempre foi inteiro pra panela, cabeça, pés, pesçoço, costelas, tudo. Particularmente sempre gostei da cabeça, disputando a preferência com meu pai, e tudo ali me interessava, da medula do pescoço ao cérebro, crista e até os olhinhos. Diferentes texturas, sabores e surpresas. Dizem que o pescoço é a parte que mais tem carne - a gente come, chupa, come e ainda tem o que tirar. E assim eu era sempre a última a sair da mesa quando por acaso havia na panela cabeças de dois frangos ou por engano o frango vinha com duas cabeças. Afinal, a preferência era do meu pai.
Mas um dia minha mãe confiou no meu juízo de criança e achou que já era hora de eu ir às compras. Cheguei à avícola com dinheiro contadinho para comprar 250 gramas de alguma parte mais nobre do frango - talvez peito, que não via a menor graça. Como nunca imaginei que as peças poderiam ter preços diferentes, olhando o balcão percebi que com o mesmo dinheiro compraria dois quilos de cabeça com pescoço. Pensei: será que minha mãe, tão econômica, é burra? Não deu outra, cheia de autoridade levei pra casa dois quilos de cabeça e toda feliz porque ainda tinha troco e não teria que ficar disputando com meu pai o único cérebro branquinho e cremoso. Tinha uns nove anos e o saco cheio era enorme e desajeitado para mim, sem sacola. Mas tinha certeza que minha mãe ia ficar orgulhosa de detectar ali meu faro para a economia doméstica - embora o motivo intrínseco da minha audácia era mesmo que eu poderia comer sem disputas mais que uma cabeça e nem precisaria esperar o domingo. Quando voltei com sorriso inverso pra trocar, tive que ouvir da vendedora: ô, minha filha, eu sabia que você ia voltar.
E assim parece que devia ser, uma miudeza ali e acolá; uma moelinha pra um; o coração para outro; a cabeça pro pai; o rabicó pra mãe; os pés sempre meus. Já o fígado, é roubado da panela antes de o frango ficar pronto. Todos disputam sobre um naco de pão, como aperitivo.
Voltando à parte medular: só pra quem não se lembra das lições de anatomia, a medula espinhal faz parte do sistema nervoso central junto com o encéfalo e se aloja no canal vertebral. Por isto, ambos, miolo e medula espinhal, têm a mesma constituição: fibras nervosas com tudo a que têm direito - dentritos, axônios, bainhas de mielina. As duas partes apresentam também a mesma coloração esbranquiçada, consistência macia, amanteigada, e sabor do melhor dos patês.
Nunca vi composição nutricional específica para o sistema nervoso central de aves, mas deve ser parecida com a dos mamíferos - é rico em proteínas - menos que a carne; tem muito colesterol e gorduras - mais monoinsaturadas, o que é bom; bastante fósforo e vitamina E e quantidades absurdas de vitamina B12, além dos teores razoáveis das outras vitaminas do complexo B como niacina e B6. Portanto, nada de desperdiçar a medula - é quase como pílulas de vitamina B12.
Boa notícia
A aula que daremos (Ana Soares, Mara Salles e eu) no Laboratório Paladar deste ano terá como tema a Cozinha sem Vergonha: galinha de cabo a rabo e está com ingressos quase esgotados. Se quiser ir, corra enquanto é tempo. E tem outras atrações imperdíveis. Veja toda a programação AQUI.
Na sexta-feira também darei uma palestra: Tinha uma horta aqui: do jacatupé ao jiquiri. R$ 30,00 - também no Hyatt.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

O que é, o que é?



Juro que é de comer. Quer arriscar a me dizer o que é?
Resposta na segunda-feira. Bom fim de semana!

Pato em miúdos 4: Ravioli de pato com molho de tangerina

Continuação do post sobre pato

Como já disse, separei todos os restinhos de carne dos pedaços de pato que cozinhei para fazer o caldo - carne do pescoço, a grudada à costela, do meio da asa etc. Tudo somou 130 gramas, o bastante para fazer recheio de ravioli, por exemplo. Lá vai a receita, então, que fui fazendo a olho, mas registro enquanto é tempo.

A massa fiz igual a destes agnolotti



O recheio
foi fácil: juntei os 130 g de carne de pato com meia cebola dourada num pouco de banha de galinha, 3 colheres (sopa) de salsa picada, 1 pimenta dedo-de-moça sem sementes, uma pitada de sal e outra de pimenta-do-reino. Juntei ainda umas 3 colheres (sopa) de pão ralado grosso. Piquei tudo muito finamente, juntanto e rejuntando até formar uma mistura homogênea.

Recheei a massa, cozinhei (veja lá a receita dos agnolotti) e servi com molho que improvisei com a geleia de tangerina da minha mãe.

Molho de tangerina: numa frigideira coloque 25 g de manteiga e doure aí meia cebola em fatias finas. Junte 2 colheres (sopa) de geleia de tangerina e um pouco de água. Deixe cozinhar um pouco até derreter toda a geleia. Junte sal e pimenta-do-reino a gosto, desligue o fogo e coloque mais 25 g de manteiga gelada, em quadradinhos, chacoalhando a frigideira até formar um molho denso. Sirva bem quente sobre a massa.
Rende: 3 porções

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Pato em miúdos 3: pato caipira ao vinho

Continuação da postagem do pato
Pato caipira ao vinho
Separe coxas e sobrecoxas, coxinhas da asa, meios das asas e o peito cortado em pedaços. Tempere com tempero pilado: 1 colher (chá) de sal, 2 dentes de alho, 1 colher (chá) de pimenta-do-reino moída na hora e 1 colher (sopa) de vinagre. Passe os pedaços de pato neste tempero e deixe pegar gosto por cerca de 5 horas. Na hora de preparar, junte um pouco de óleo na panela, coloque os pedaços de pato e deixe dourar. Junte 1 colher (chá) de colorau, água quente suficiente para cobrir a carne e mais 2 xícaras de vinho tinto. Abaixe o fogo e deixe cozinhar lentamente por cerca de 3 horas ou até a carne estar bem macia e o caldo bem reduzido. Junte 1 cebola cebola picada, meio pimentão verde em tiras, 1 pimenta dedo-de-moça sem sementes e em tirinhas, 1 tomate descascado e fatiado e 1 alho-poró em fatias. Deixe cozinhar por cerca de 15 minutos ou até que o pimentão esteja macio. No final, confira o sal e a pimenta e corrija, se necessário. Junte bastante cheiro-verde antes de servir - com polenta. Rende de 4 a 6 porções e o desejo de comer mais no dia seguinte.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Pato em miúdos 2: canja de pato caipira


Para o caldo: pés, pontas de asa, pescoço, costela. Mais louro, alho, pimenta-do-reino, piment, salsinha. Imbatível!



Miúdos do pato: moela, fígado, pulmões, testículos, traqueia e coração são aferventados no caldo, picados e voltam pra panela com arroz

Continuação da postagem do pato


Somando todos os miúdos do pato caipira de Fartura, moela, rim, baço, coração, fígado, traqueia, esôfago, testítulo e pulmões, pesei 100 gramas de cores e texturas variadas que ainda contrastaram com o arroz cateto cremoso.
Para o caldo de pato: use ossos da costela, pesçoso, pontas das asas e pés. Coloque na panela com 4 folhas de louro, 1 pimenta dedo-de-moça inteira, 2 dente de alho com casca socado, 1/2 colher (chá) de pimenta preta, alguns galhos de salsinha, 1 galho de alfavaca ou manjericão. Coloque junto também a moela e deixe cozinhar em fogo baixo até o pescoço e a moela ficarem bem macios - cerca de 3 horas, escumando de vez em quando e juntando água quente sempre que reduzir muito. Passe por peneira e reserve separadamente o caldo e os pedaços (você pode tirar todas as carnes entranhadas no pescoço e costelas, lembrando que a moela vai ser picada para a canja).

Para a canja
: volte o caldo ao fogo. Cozinhe nele os miúdos restantes por uns 3 minutos e tire-os da panela. Deixe o coração um pouco mais. Se precisar, junte mais água pra ficar com mais ou menos 1,5 litro de líquido. Junte meia xícara de arroz cateto e deixe cozinhar. Enquanto isso, pique todos os miúdos, incluindo a moela que foi cozida no caldo, e devolva-os à panela quando o arroz estiver bem macio. Deixe ferver, desligue o fogo e junte bastante salsinha picada. Espalhe por cima pimenta-do-reino moída grossa. Rende quatro porções e muitos suspiros de satisfação.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Pato em miúdos: come-se

Neste fim de semana resolvi descongelar o pato caipira que minha mãe mandou por minha irmã quando ela esteve lá. Estava com dó de usar. Mas a situação pedia. Quando descongelei foi como se me transportasse para o sítio, à beira do fogão de lenha e as panelas de ferro da minha mãe. Difícil pensar que um bicho morto pode ser cheiroso mas este pato era. Um cheiro bom de palha queimada, usada para sapecar. A pele era firme, aderida, defumada apenas ligeiramente, só por aquele tempo necessário para tirar penugens. O resumo de toda a pastagem dos patos soltos no sítio estava na carne escura, firme, sequinha - nada de água minando do músculo. Dona Olga só não mandou as tripas e a cabeça (segundo ela, não é boa nem bonita como a de frango). De resto, a miudeza toda veio. Dos pequenos testículos amarelinhos ao esôfago, estrelado ao avesso.
Os miúdos viraram canja com o caldo feito de costelas, pescoço, pés, pontas das asas e outros ossos. Ainda salvei carnes, desfiadas dos pedaços do caldo, para o ravioli que estou fazendo agora. E pele do pescoço cortada em tirinhas, que vou usar não sei onde. Pedaço maiores foram para a panela com vinho e outros temperos. Gordura não sobrou nenhuma. O pato era magrinho. As receitas, nos proximos capítulos. Outros aproveitamentos para o pato de supermercado, incluindo o preparo da gordura, está no post Lá vem o pato.

Não é usual consumir os pés, mas são gostosos, ainda que mais magros. Foram para o caldo


O esôfago, então, ninguém nunca vê, mas é gostoso de morder e tem este formato lindo

Coxas e sobrecoxas, coxinhas e meio das asas, além do peito em pedaços, foram pra panela com vinho, cebolas, alho-poró, salsinha. Servidos com polenta mole

Miúdos foram para a canja feita com o caldo das partes menos carnosas, como pesçoso, pés, pontas de asas e pedaços da costela
Patos caipiras de Fartura - é pra lá que vou! Volto na quinta! (mas tentarei postar o resto do pato)

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Resposta à charada de sexta-feira: feijoada de rolo


Nada de chocolate, nada de licuri, nada de doce. De qualquer forma, obrigada a todos que arriscaram um palpite (eu também chutaria licuri ou coquinho de gueroba). Tudo começou com aquela imagem mostrada no post da charada.
Havia sobrado colágeno de pé de galinha das minhas experiências e decidi usá-lo para cozinhar um feijão de corda que trouxe de Lisboa, parecido com o nosso, porém menor e mais escuro. Deixei na geladeira numa vasilha quadrada. Na hora de requentá-lo, ele saiu em bloco com a superfície dura, brilhante, como uma gelatina. Com o adicional da pectina do feijão, que deu reforçou a consistência de corte.
Não pensei duas vezes - se ficou bonito assim, quadrado, imagine em rolo como salame. Procurei pela casa toda algo cilíndrico que permitisse isto, até que me lembrei da reforma. Pedi para o Samuel o favor de serrar uns pedaços de cano de PVC ainda não usados. Saí de novo à procura de algo que vedasse uma das saídas, até que encontrei umas rolhas. Fiz feijões bem temperados com colágeno (testei o preto e o azuki) e botei nos canos. Perfeito!
Levei para reunião das galinhas, da aula que vou dar junto com a Mara Salles e Ana Soares, no evento do Paladar. E como olhar de chefe é olhar além, Mara e Ana logo se empenharam em arrumar acompanhamentos. Uma trouxe uma rendinha crocante de couve, a outra arrumou por cima do vinagrete que levei uma fatia de laranja e organizaram, assim, uma feijoadinha. De rolo, foi o nome proposto pela Andreza, que trabalha com a Ana. Rolo de formato, rolo de enrolar, de embromar. Feijoada, coisa nenhuma - um rolo.
Agora o desafio era melhorar a receita e arranjar um recipiente mais apropriado que não fossem tubos e conexões Tigre, de plástico reciclado. No sábado, saindo do cinema, passei numa loja de cozinha e o Marcos achou por acaso o instrumento ideal - um daqueles trambolhos de fazer biscoitinhos, em alumínio. Foi só desmontar e aproveitar o cilindro e seu êmbolo. Comprei ainda um refrigerante de garrafa comprida só pra aproveitar a embalagem e mostrar que dá para improvisar. Dei fatias com vinagrete aos pedreiros para experimentarem. Perguntei se sabiam o que era e disseram que nem imaginavam, mas era um troço bom pra caramba pra comer com cerveja.
Talvez até a aula eu já tenha mudado um pouco a receita, mas tenho certeza que você saberá temperar o feijão à sua moda. O importante é que se use o colágeno de 1 quilo de pé para cada xícara de feijão cru (200 g). O uso dos pedacinhos do pé desossado é opcional, mas garante variação de textura. E o bacon traz a proximidade do sabor com a feijoada verdadeira. De resto, muita pimenta, alho, louro e a lembrança de que não se trata de uma conserva, um embutido. Portanto, assim como o feijão, deve ser feito e consumido em pouco tempo e conservado na geladeira, para comer frio - no calor o colágeno pode derreter e impedir o corte.

Feijões mais macios como o azuki podem ser cozidos diretamente no caldo do pé de galinha. Mas os grãos podem grudar no fundo, então o melhor é adicioná-lo no final, junto com o tempero, e esperar reduzir
Alho, cebola, alguma erva (aqui orégano fresco, mas pode ser cebolinha), pimenta fresca e páprica defumada são boas opções
Depois de ter fervido o feijão com os temperos e com o caldo de colágeno, desliga o fogo e acrescenta os pedacinhos de pé de galinha - que pode ter sido cozido com temperos ou não
Agora é só encher os cilindros. Aqui, a primeira experiência com canos de PVC, mas não recomendo por serem feitos de plástico reciclado, não indicado para comidas
Melhor usar um cilindro de biscoitos, por exemplo

Ou uma embagem cilíndrica de alimentos cortada. Compre o refrigerante, jogue o líquido fora (ou beba, vá lá!) e corte as duas extremidades. Lave bem e improvise uma tampa para uma das aberturas, já que o cilindro deve ficar na geladeira na vertical
Na hora de desenformar basta empurrar a tampa como um êmbolo
E servir com vinagrete
Ou quem sabe sobre um crocante de couves e uma fatia de laranja, como sugeriram Ana Soares e Mara Salles. Com uma caipirinha ou cerveja gelada, nhac! Mas não deixe te enrolarem, espere pela feijoada de verdade. Esta é só de rolo.
Feijoada de rolo
Para os pés de galinha
1 kg de pés de galinha ou 750 g de munhecas, sem as canelas
1 litro de água
Sal, urucum, grãos de pimenta, salsinha, folhas de louro e pimenta a gosto, para temperar
Para o feijão
1 xícara ou 200 g de feijão preto deixado de molho um dia antes
1 litro de água
3 folhas de louro
1 dentes de alho socado
50 g de bacon picado
2 xícaras de colágeno (ou todo o caldo dos pés de galinha desengordurado)
2 colheres (sopa) de gordura de galinha (que vai vir do caldo dos pés)
3 dentes de alho finamente picado
1/2 cebola pequena finamente picada
1 pimenta dedo-de-moça sem sementes picada
1 pimenta malagueta sem sementes picada
1 pitada de páprica picante defumada (opcional)
1 pitada de pimenta do reino triturada grosso
3 colheres (sopa) de cebolinha verde picada fino
Sal a gosto
140 g de pés de galinha picados (ou as almofadinhas de todos os pés de galinha que foram cozidos)
Para os pés: coloque todos os ingredientes numa panela de pressão, abaixe o fogo quando a válvula começar a chiar e deixe cozinhar por uma hora. Peneire sobre uma tigela, reserve o caldo e os pés. Espere esfriar. Deixe o caldo na geladeira até gelatinizar para ficar mais fácil tirar a gordura. Tire a gordura da superfície com uma colher e reserve gordura e caldo. (deve render mais ou menos 2 xícaras, mas se render menos não tem problema; se render mais, é só levar ao fogo para reduzir). Tire pedacinhos do pé do frango cozido e pique bem. Separe cerca de 140 gramas. Veja mais sobre o colágeno dos pés aqui.
Para o feijão: escorra a água de remolho do feijão, cubra com um litro de água e leve ao fogo, com as folhas de louro, o alho e o bacon. Deixe cozinhar em fogo baixo, juntando mais água se for necessário, até que o feijão esteja macio, sem se desmanchar e com quase nenhum caldo. Fique por perto para não deixar queimar. Se quiser, pode usar a panela de pressão, mas corre o risco de os feijões se romperem e a intenção é que fiquem macios e inteiros. Sem pressão, isto é mais fácil. Numa outra panela, coloque a banha da galinha e junte o alho e a cebola. Deixe dourar e adicione as pimentas e a cebolinha. Em seguida, despeje aí o feijão e junte o colágeno. Tempere com sal a gosto. Deixe cozinhar até o caldo ficar bem reduzido como uma mistura cremosa, mas ainda com os feijões íntegros. Desligue o fogo. Junte, então, os pedacinhos de pé, misture e prove o sal - corrija, se necessário. Coloque nos cilindros, empurre bem para que não fique com bolhas e deixe na geladeira até gelatinizar.
Desenforme empurrando a mistura por um dos lados, corte em fatias e sirva com azeite; páprica polvilhada; vinagrete; cilindros de arroz (como para oniguiri); couve; colocado no centro de uma sopa quente de macarrão, milho ou fubá ou até no meio do pão para enrolar a criançada que não gosta de feijão (neste caso, pode diminuir a pimenta).

domingo, 18 de julho de 2010

Come-se 4 anos: Hoje no Suplemento Feminino do Estadão


Há quatro anos, 17 de julho de 2006, criei o Come-se e postei timidamente o primeiro post acompanhado desta foto de amendoim feita no scanner, pois sequer tinha máquina fotográfica: "Gosto de comer e de cozinhar, mais ainda de saber o que estou comendo, de onde vem, como é cultivado, como é feito. E, sempre que possível, eu mesma faço, eu mesma planto. De turu do Marajó ao huitlacoche mexicano, tudo aqui é possível, não interessa se tem ou não no supermercado. Basta que eu tenha comido, desejado, rejeitado. Pelo menos divido com alguns leitores minguados interessados. Só não esperem regularidade nos posts, já que sou adepta do viverlentamente.". Acho que pelo menos a intenção do blog não se corroeu com o tempo.
Mas fui perder a vergonha mesmo já quase um ano depois, quando comecei a publicar diariamente a respeito de coisas que faziam parte do meu dia-a-dia. Imaginava que não teria regularidade, pois me faltaria assunto ou disciplina para tanto. Diferente do que pensei, descobri que assuntos brotam como estes amendoins esquecidos. Se acumulam até. E que afinal havia descoberto a melhor forma de me disciplinar, registrando meus aprendizados quase em tempo real. Isto, para mim mesma. Mas o melhor é que poderia ainda dividi-los com quem tivesse o mesmo interesse, trocar ideias. Eu não mostro o que sei, mas quase sempre o que acabei de descobrir, ver, comer, colher, cozinhar. E os leitores, que hoje não tem nada de minguados, estão convidados a participar comigo destas descobertas. É só isso.
Como muitos já sabem, não sou ligada em datas, por isto esqueço aniversários dos amigos e até o meu mesmo (às vezes digo que tenho 49 anos porque não me lembro se já fiz ou ainda vou fazer aniversário e prefiro subir pra mais para que ninguém pense "nossa, parece mais"). E por isto também só descobri que o blog estava completando quatro anos porque daria uma entrevista pra CBN e sabia que a reporter iria me perguntar.
Juro que não tenho assessoria de imprensa, nem divulgo o blog em redes sociais. Foi coincidência mesmo a entrevista da CBN ter saído na data de aniversário. E mais coincidência ainda a comemoração continuar neste fim de semana no Suplemento Feminino do Estadão, que traz hoje uma ótima matéria da Vera Fiori sobre blogueiros, com entrevista feita já há algum tempo. Novamente o Come-se está lá - e também o Cuecas na Cozinha, de Alessander Guerra, e Chocolatria, de Simone Izumi.
Não, não vou ficar fazendo considerações a respeito destes anos de Come-se, nem dizer sobre a alegria que tenho em dividir o que sei e o quanto já aprendi com os leitores; nem mencionar o tanto de presentes que já ganhei e, o melhor, o tanto de amigos que conquistei. Amigos de infância como a Veronika, a Mariângela, o Rui, a Chus, a Fernanda, o Luiz, a Marisa e tantos outros. Agora só quero agradecer a companhia e brindar: tim tim com todos.

A matéria no Suplemen to Feminino: Sabores, causos e temperos virtuais.
A entrevista na CBN, com Maíra Menezes: Nutricionista dá dicas de receitas e escreve sobre legumes, verduras e frutas típicos do país que estão quase desaparecendo

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Come-se por quatro anos. Amanhã na rádio CBN

Amanhã o Come-se faz quatro anos e coincidentemente fui convidada pela Maíra Menezes para dar uma entrevista no quadro Blogueiros, do programa Revista CBN. Entre gaguejos e tropeços estarei lá no 92,5 FM (CBN - Rio), amanhã às 13h30.
Nota pós-post: eu mesma não ouvi (tenho este problema, não gosto da minha voz e recrimino minhas gaguejadas, mas estou aprendendo a dar a cara a tapa. Então, pra quem quiser ouvir, clique aqui!)

O que é, o que é?

Na segunda, a receita. Já sabe o que é?

Dilenia 5: Bolo de coalhada de dilênia


Para a coalhada: 120 g de dilênia e 1 xícara de leite, mais açúcar e gelo. Liquidificar, peneirar e nglupt!
Antes, veja explicações sobre a dilênia e, se quiser, veja também outras receitas com dilênia publicadas nos posts anteriores: curry de camarão , curry de jaca verde com dilênia e lentilhas rosas com dilênia.

Pensei no umbu quando decidi bater leite com pedaços das sépalas de dilênia ainda cru. Principalmente por causa da acidez. Na hora o leite coalhou. Adocei, juntei gelo e tomei com folhinhas de hortelã. Poderia ter batido junto algum tempero como água de flor de laranjeira ou cardamomos, mas não precisou. Só não pode demorar muito para tomar, porque o soro começa a se separar e o líquido começa a oxidar. É bater e tomar. Ou usar para o bolo.
O que sobrou, decidi usar pra fazer um bolo branco simples, como faria se estivesse lidando com iogurte. Não usei batedeira nem liquidificador. Só juntei tudo na tigela e misturei com batedor de arame. Mas, claro, se quiser ainda mais fofinho, use manteiga em vez de óleo, batidas antes com as gemas e açúcar. No final, as claras em neve. Só fiz pra ver no que dava. E deu no que deu, só ligeiramente ácido, como se fosse o de iogurte. Servi com uma calda feita com o suco da dilênia e açúcar engrossado no fogo.


Bolo de coalhada de dilênia
4 ovos
1,5 xícara de açúcar
1 xícara de coalhada de dilênia (veja acima)
2 xícaras de farinha de trigo
1 colher (sopa) de raspinhas de limão rosa
1 colher (sopa) de fermento químico
1 pitada de sal
Coloque todos os ingredientes numa tigela. Misture bem até homogeneizar. Despeje a massa em forma grande, com buraco no meio, untada com manteiga e enfarinhada, e leve ao forno médio, pré-aquecido. Deixe assar por cerca de 40 minutos ou até ficar dourado.
Rende uns 20 pedaços

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Receitas de piquenique


Receitas do último piqueninique estão no Piperca
Nosso piquenique é assim: tem bolo de milho verde do Paulo, torta de ovos e palmitos da Chus, bolo de abóbora da Fabiana, tortinhas da Veronika, salada de triguilho da Neide e assim vamos formando um arsenal de receitas que podem ser úteis para nós mesmos quando estamos sem ideia e inventamos de reverenciar os amigos. Ou para leitores piquiniqueiros como nós, já que criamos o blog Piquenique Perto de Casa (nosso desejo é este - que as pessoas se animem a ocupar com os amigos os espaços públicos perto de suas casas), aberto a espiadelas, que agrupa cenas, receitas, experiências e reflexões sobre nossos encontros.
O Piperca, apelido do blog, é tocado sem compromissos pela jornalista Veronika Paulics, do blog Ando a Pé, pela Fabiana Jardim, do blog Noturnos Imperfeitos e recém-aprovada professora na faculdade de educação da USP, e por mim. Sem compromissos, da mesma forma como ocorre nossos piqueniques, programados para ser uma vez por mês, de preferência no primeiro domingo, mas que pode mudar, de acordo com o tempo, a temperatura ou o humor do grupo, para o terceiro domingo ou ainda acontecer instantaneamente numa ligeira estiada durante um período chuvoso como agora (algo do tipo: meninas, apareceu o sol, peguem as crianças, uma panela de pipoca, um pão, um vinho e a toalha xadrez e vamos pra praça).
Só por uma questão prática, as receitas têm ficado por minha conta, mas cada uma de nós escreve só o que quer e quando quer. A maioria das receitas do último piquenique já está lá. E tem ainda um texto lindo da Fabiana.
www.piqueniquepertodecasa.blogspot.com.
Como tudo começou está aqui no Come-se (se um dia perder o sono e não tiver absolutamente mais nada pra fazer, pode ir à caixa de busca ali em cima e digitar piquenique), mas tem links lá no início do Piperca também. Seja bem-vindo!

Dilênia 4. Lentilha rosa com dilênia e especiarias


Antes, veja explicações sobre a dilênia e, se quiser, veja também outras receitas com dilênia publicadas nos posts anteriores: curry de camarão e curry de jaca verde com dilênia.
A receita na qual me baseei levava pedacinhos de dilênia, mas minhas sépalas restantes estavam fibrosas demais para isto, por isto usei só o suco e foi o bastante para tornar o prato perfumado e azedinho. Se não encontrar lentilhas rosas, use lentilhas comuns - lembrando que aquelas são peladas. E se ainda quiser tornar suas lentilhas comuns em lentilhas coloridas e peladas, coloque-as no processador e bata até que as casquinhas se soltem, abane e use os grãos, que cozinharão mais rapidamente. Você verá que as ordinárias lentilhas marrons são amarelinhas por dentro.
Lentilha rosa com dilênia e especiarias
150 g de lentilha rosa (3/4 de xícara aproximadamente)
2 xícaras de água
2 xícaras de suco de dilênia (dilênia cozida, batida no liquidificador com água e coada - deve ficar com consistência de um mingau ralo)
1 colher (sopa) de açúcar
Sal a gosto
2 colheres (chá) de cúrcuma (açafrão-da-terra)
2 colheres (sopa) de óleo
2 colheres (sopa) de grãos de mostarda escura
1 cebola pequena picada
1 pimenta dedo-de-moça verde picada
Folha de coentro a gosto
Lave a lentilha, escorra e coloque numa panela com a água, o suco de dilênia, o açúcar, o sal e a cúrcuma. Deixe cozinhar em fogo baixo por cerca de 20 minutos ou até os grãos ficarem bem macios. À parte, aqueça o óleo com a mostarda e espere os grãos começarem a pipocar. Junte, então, a cebola e a pimenta. Deixe refogar até que fiquem macias. Junte a lentilha cozida e deixe ferver por dois minutos para que os sabores se misturem. Se precisar, junte um pouco mais de água pra corrigir a consistência, que deve ser pastosa. Prove e corrija o sal, se necessário. Espalhe folhas de coentro por cima, sirva com arroz quentinho num dia frio e chuvoso como é agora em São Paulo. Nhac!
Rende: 4 porções

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Dilênia 3: Curry de jaca verde com dilênia

Esta receita fará mais sentido se você vir os posts anteriores:
Curry de Jaca verde com dilênia
2 colheres (chá) de manteiga
2 colheres (chá) de sementes de mostarda
2 galhos de folhas de curry (neem doce) - opcional
1 cebola branca picada em quadrados
½ pimentão verde picado
2 pimentas dedo-de-moça sem sementes, cortadas em quadradinhos
350 g de cubos de jaca verde cozida - cerca de 2,5 xícaras (veja aqui como preparar)
2 colheres (chá) de pó de curry
1 colher (chá) de cúrcuma em pó (açafrão-da-terra)
1 colher (chá) de sal ou a gosto
1 colher (chá) de açúcar
1 xícara de suco de dilênia (cozida, batida no liquidificador e peneirada)
1 colher (chá) de grãos de coentro tostados e triturados na hora
1 colher (chá) de cuminho tostado e triturado na hora
Leite de coco a gosto, opcional
Salsinha ou folhas de coentro a gosto
Numa panela, aqueça a manteiga e coloque a mostarda e as folhas de curry. Quando os grãos começarem a pipocar, junte a cebola, o pimentão e as pimentas. Deixe amolecer. Junte, então, a jaca e refogue por 1 minuto. Acrescente os outros ingredientes, menos a salsinha, e mexa delicadamente. Tampe a panela e cozinhe por 10 minutos. Se precisar, junte mais água quente ou suco de dilênia. Ou leite de coco, caso decida usar (aconselho!). Prove o sal e corrija, se necessário.
Rende: 6 porções
Nota: esta receita também ficará boa se acrescentar cubinhos de carne de porco ou de frango temperadas com sal e pimenta e previamente dourados em alguma gordura.
Comi com arroz integral. A uma parte juntei leite de coco - aconselho! Marcos sugeriu uns cubinhos de carne de porco ou frango e eu tenho certeza de que ficará ainda melhor.
Assim como a dilênia, jaca verde não se acha nas feiras e supermercados, portanto fique de olho nas jaqueiras, como esta da minha rua que está carregada de jaquinhas imaturas.