Yes, nós temos nosso confit. A primeira coisa que pensei quando conheci o confit de canard foi na carne de lata que minha avó trazia do Paraná. Conforme ela ia desfazendo as malas, ficávamos, meus irmãos e eu, especulando sobre o que poderia aparecer a qualquer momento naquela profusão de roupas cheirando a fumaça do fogão de lenha, a café, a sabão de pedra, ao sítio todo. Aos poucos, as iguarias iam sendo desembrulhadas de trapos de algodão cru defumados. A lata com carne de porco na gordura branca era uma atração. Na hora do almoço uns nacos de lombo iam para a panela em fogo branco até a gordura derreter e a carne ficar bem quente, suculenta, brilhante. Durava dias a farra. No ano passado no Revelando São Paulo, um expositor vendia a carne de lata num recipiente de plástico, destes de Catupiry. Fiquei feliz pela produção, mas, por saudade da lata e da vó Zefa, deu uma tristeza. Sorte é que ainda posso comer uma versão parecida na Ilha do Marajó, na casa da minha amiga, Dona Jerônima. Sorte de vocês também que podem passar uns tempos lá comendo delícias, já que o lugar é um hotel fazenda, com búfalos, guarás, manguezais, praia particular, peixe fresco, turu e tudo o que têm de melhor em Soure.
Confit, carne de lata e frito do vaqueiro são do tempo em que não havia geladeira. E mesmo com o surgimento dela, o preparo sobreviveu não pela intenção mas pelo resultado - carne macia, suculenta, perfumada com a gordura e às vezes com a fumaça da lenha. Mudam as carnes, mas os motivos e o modo de preparo- cozinhar lentamente a carne na própria gordura - são os mesmos. Só é pena que muitos de nós temos mais oportunidades de comer no Brasil um confit francês que uma autêntica carne de lata colonial ou um frito de vaqueiro marajoara. Mas, vá lá, uma vez colônia, pra sempre colonizado.
Na Ilha do Marajó o frito é tradicionalmente servido no café da manhã. Conta Dona Jerônima que era comida dos vaqueiros que andavam pelos campos levando apenas algumas provisões. Antes da partida, as mulheres preparavam o prato com a carne fresca do búfalo. Tiravam-lhe a fraldinha e, sem lavar, enxugavam o sangue com um pano limpo, picavam e cozinhavam, no calor fraco da lenha, por longas horas, usando como tempero apenas o sal. Ela fica pronta quando a água seca e só resta na panela o óleo que se solta da carne e serve agora para dourá-la. Os vaqueiros levavam a preparação em lata, mergulhada na própria gordura endurecida depois de fria – ela envolve todos os pedaços, protegendo-os da oxidação e do apodrecimento. Na hora de comer, bastava aquecer e juntar um bocado de farinha para tornar o prato algo substancioso.
Frito do vaqueiro marajoara
Ingredientes
3 kg de fraldinha de búfalo em temperatura ambiente
1 colher (sopa) rasa de sal ou a gosto
Modo de fazer
Com um pano bem limpo, enxugue a carne sem lavar. E sem tirar a gordura aparente, corte-a em cubos. Coloque a carne numa panela grande de ferro e polvilhe o sal. Mexa, tampe a panela e leve ao fogo bem baixo. Sem acrescentar água ou gordura, vá cozinhando a carne no próprio vapor, mexendo de vez em quando, até que toda a umidade seque e a carne comece a dourar na própria gordura. Em fogão de lenha, com a chama bem fraca, isso deve levar de 5 a 6 horas. Em fogão doméstico, de 2 a 3 horas. De qualquer forma, estará pronta quando os cubos estiverem macios, dourados, mas não ressequidos. Passe para um recipiente de vidro, cerâmica ou guarde na própria panela. Tampe bem e conserve por até 5 dias. Vá retirando pequenas porções e aquecendo na medida em que for necessário. Aqueça em frigideira tampada, em fogo baixo, para não ressecar. Sirva com farinha de mandioca amarela torrada levemente e ainda quente.
Ingredientes
3 kg de fraldinha de búfalo em temperatura ambiente
1 colher (sopa) rasa de sal ou a gosto
Modo de fazer
Com um pano bem limpo, enxugue a carne sem lavar. E sem tirar a gordura aparente, corte-a em cubos. Coloque a carne numa panela grande de ferro e polvilhe o sal. Mexa, tampe a panela e leve ao fogo bem baixo. Sem acrescentar água ou gordura, vá cozinhando a carne no próprio vapor, mexendo de vez em quando, até que toda a umidade seque e a carne comece a dourar na própria gordura. Em fogão de lenha, com a chama bem fraca, isso deve levar de 5 a 6 horas. Em fogão doméstico, de 2 a 3 horas. De qualquer forma, estará pronta quando os cubos estiverem macios, dourados, mas não ressequidos. Passe para um recipiente de vidro, cerâmica ou guarde na própria panela. Tampe bem e conserve por até 5 dias. Vá retirando pequenas porções e aquecendo na medida em que for necessário. Aqueça em frigideira tampada, em fogo baixo, para não ressecar. Sirva com farinha de mandioca amarela torrada levemente e ainda quente.
Rendimento
: 10 porçõesPara conhecer a Fazenda São Jerônimo, clique aqui.