segunda-feira, 28 de agosto de 2017
Omeleteira para além de omeletes. Ou cataplana de pimenta cambuci, abobrinhas salteadas.
Eu chamo por brincadeira de cataplana de abobrinha, cataplana de berinjela, de vagem, de quiabo, de jiló, o que quer que seja que eu faça dentro da omeleteira de tampa. Cataplana, na verdade, é uma panela portuguesa, do Algarve, de fundo côncavo e não reto como a omeleteira. Em comum, as duas têm apenas a união da parte de cima com a de baixo por uma dobradiça. Na cataplana são preparados pratos de peixe e/08 frutos do mar, quase como nossas moquecas.
Mas basta chamar de legumes salteados. Eu uso esta técnica quando estou com pressa e estou fazendo dez coisas ao mesmo tempo. Basta colocar um pouco de azeite na frigideira, os legumes por cima e fechar. De vez em quando vá mexendo na frigideira chacoalhando pra lá e pra cá, virando de ponta cabeça. Enquanto os legumes cozinham no próprio vapor, vão também dourando no azeite. No preparo da abobrinha da foto, quando já estava dourada juntei gotas de shoyu. Junto, uns pedaços de pimenta cambuci.
Para as pimentas cambuci, a mesma coisa. Azeite, legumes e sal - durante ou no final. Só que juntei uns pedaços de cebola e deixei as pimentas maduras inteiras - cada um que a prepare no próprio prato, tirando cabinho e sementes (eu como com sementes, só tiro o cabinho). Lembrando que é uma técnica pra quando a gente não tem tempo, então, quando mais íntegro estiver o legume, mais tempo sobra para quem está cozinhando. Em poucos minutos a pimenta já está dourada e macia. Pra servir, juntei umas folhas de cipó de alho, mas bem poderiam ser umas folhas de manjericão. Com arroz, feijão, uma carne, um ovo frito... E nhac!
terça-feira, 15 de agosto de 2017
Pancnacity de 12 de agosto de 2017
Resultado do forrageio |
Seguem aqui algumas fotos:
Cerejeira rosa claro |
Todo mundo cheirando |
As primeiras jacas |
Pão bicolor |
Pão de abóbora e de jenipapo verde - que dá azul |
Bolinho de feijão fradinho fermentado - o azul é o jenipapo verde - veja posts atrás |
Farofa de içá, salada de mamão verde, bolinho de feijão fradinho, canjiquinha com coração de bananeira, feijão guandu, berinjela com taioba, cará moela com flores de capuchinha |
Sobremesa: manjar azul de coco e araruta com vinagre de umbu (o azul é dado pelo jenipapo verde) |
A turma! |
quarta-feira, 9 de agosto de 2017
Pão azul de jenipapo com flores de lavanda
Antes de fazer esta receita, você precisa saber o que é o leite azul e o jeito de fazer está explicado aqui neste post sobre jenipapo verde. E se você ainda não tem um fermento natural pra chamar de seu, eu ensino a fazer do zero aqui. Só lembrando que a quantidade de jenipapo usada é muito pequena e por isto o sabor natural do pão não é alterado. É só mesmo a cor. Qual a vantagem? Nenhuma. É pura diversão.
Corte antes de levar ao forno. Se quiser, use um estencil e polvilhe farinha |
Pão azul de jenipapo
200 g de levain reformado e borbulhante
300 ml de água + 50 ml de leite azul bem forte (dependendo da farinha usada, pode precisar de mais água - eu uso a Paullinia orgânica, que pede mais água que isto
½ colher (sopa) ou 10 g de sal
500 g de farinha branca
4 flores de lavanda fresca debulhada
Dilua o levain com a água com o leite. Junte a farinha de trigo de uma só vez e vá acrescentando mais água se for preciso para fazer uma massa homogênea e um pouco pegajosa. No final, junte as flores de lavanda.
Passe para uma
vasilha limpa untada com óleo, feche e espere de 15 a 30 minutos.
Faça dobras na
massa, espichando e dobrando para cima como se fosse um embrulho. Espere meia hora.
Repita as dobras.
Cubra e espere de 15 a 30 min.
Repita as dobras.
Cubra e espere de 15 a 30 min. Modele e coloque numa cestinha com pano
enfarinhado. Cubra com plástico e espere crescer por cerca de 2 horas ou até
que ao enfiar o dedo a massa retorne rapidamente à posição inicial.
Preaqueça o forno a
250 ºC (e, dentro dele, uma panela de ferro / barro e sua tampa)
Coloque a massa na
panela (só enfarinhada), tampe e deixe assar por 20 minutos.
Destampe, abaixe a
temperatura para 230ºC e deixe assar mais 20 ou 30 minutos.
Desenforme, deixe esfriar totalmente numa grade e fatie só depois de frio.
Nhac! |
Bolinhas de kefir com jenipapo verde
Improvise um jeito de deixar escorrendo |
A receita do queijinho azul de kefir é igualzinha à que já publiquei no post sobre o jenipapo verde.
A diferença é que neste coloquei um pouco de grãos de endro e flores de lavanda na massa. E fiz bolinhas. Ficou bem bom pra comer com o pão azul ou torradas.
Repito aqui a receita. Mas também tem esta da amiga Veronika que pode ser adaptada.
Bolinhas de kefir com jenipapo verde
2 xícaras de kefir de leite pronto
1/2 xícara de leite azul
Sal a gosto
uma pitada de grãos de endro e outra de flores de lavanda
Sal
Misture o kefir com o leite azul, tempere com sal e deixe escorrer num pano de um dia para outro. Tem que ficar bem sequinho. Desembale, faça bolinhas e regue com azeite. Espalhe por cima pétalas de flores de cerejeira e de lavanda. Pra comer com torradas!
segunda-feira, 7 de agosto de 2017
Molho fermentado de pimenta
O vinagre de kombucha é pra dar um começo na fermentação. Vinagre pasteurizado não serve, não. Não tendo kombucha, faça com água mesmo. Ou caldo de cana. |
Tire as pontinhas da pimenta e lave bem |
Desde que nosso pé de pimenta dedo-de-moça em Piracaia desembestou a dar pimentas, também desembestei a fazer este molho fermentado. Não peguei receita de lugar nenhum. Simplesmente supus que batendo a pimenta, juntando sal e um pouco de kombucha ou vinagre de kombucha, ele ia fermentar e me dar um molho gostoso e vermelhinho. Não é difícil de imaginar, diga-se. Não fiz com água ainda, mas vai fermentar também, talvez com um pouco de retardo, mas vai. Com caldo de cana também deve ficar bom. Vale tentar.
Bem, o jeito que fiz já tinha explicado lá no Instagram. Fermentadas: pimentas dedo dedo de moça verde ou vermelha ( fiz com as duas, orgânicas do sítio) 4% de sal e kombucha suficiente pra bater no liquidificador. Despeje num vidro, coloque uma bexiga ou luva de silicone na boca do vidro e deixe em temperatura ambiente pra fermentar. A bexiga / luva vai encher. Solte o gás, cubra de novo. Solte a o gás sempre que encher. Quando não houver mais gás, 3, 4 dias, tampe e guarde na geladeira pra sempre.
E aqui, de outro jeito, mas igual: O molho de pimenta fiz assim: peguei um tanto de pimenta dedo-de-moça que colhi no sítio, lavei bem, tirei o cabinho e bati no liquidificador com um pouco de kombucha pronto. Juntei sal - 1 colher (chá) para cada xícara da mistura. Coloquei num vidro, deixando 1/3 do volume livre, tampei bem e deixei fermentar durante 3 dias - abrindo o pote de tempos em tempos pra soltar o excesso de gás. Quando acabou a fermentação, fechei o vidro e guardei na geladeira. Se preferir, se ficar com medo de o vidro estourar - se você não for tirando a pressão, pode acontecer - é melhor acoplar à boca do vidro uma bexiga de aniversário ou uma luva de silicone. Faça um furo com uma agulha e o gás carbônico vai sair por aí sem deixar entrar oxigênio. Ou faça como mostrei aqui.
quinta-feira, 3 de agosto de 2017
Expedição Porcini . Matéria de hoje no Paladar
Recentemente fui a Urupema acompanhar uma coleta de cogumelo. O assunto virou matéria do Paladar e está hoje no jornal impresso, no site do caderno e também aqui.
Boletus
edulis, um brinde aos pés
dos pinheiros
Já
era tarde de uma noite gelada de outono quando chegamos, um casal de amigos eu,
à Pousada Rio dos Touros, em Urupema, considerada a cidade mais fria do Brasil,
na Serra Catarinense. A claridade da lua
crescente ainda era fraca, nos impedindo de ver a paisagem da chegada. Mas enquanto
havia luz no caminho não era difícil constatar a fragmentação das florestas de
araucária, árvore símbolo da região Sul, grande parte dela substituída pela
monocultura de Pinus spp. Contraditoriamente, afinal sabemos das campanhas para erradicação
da espécie exótica, invasiva e agressiva, estávamos ali pelo brinde que que o Pinus nos dá. Os cogumelos silvestres
porcini , os mais apreciados na França e na Itália, são como uma compensação
que cresce aos pés destas espécies que já fizeram grandes estragos ambientais
especialmente no Sul.
Os
proprietários da pousada, Fernando Raddatz e Rose Kéia Mozzaquatro nos
esperavam com gentilezas, todos nós ansiosos pelo brilho do amanhã quando
sairíamos para coletar cogumelos silvestres.
No dia seguinte bem cedo fomos acordados por curucacas, aves enormes que
fazem seus ninhos no alto das araucárias que rodeiam o local. A vegetação
rasteira estava coberta pelo sereno gelado e no terreno separado por muro baixo
de pedra dava pra ver uma gralha azul pousando sobre uma goiabeira serrana ou
feijoa, comum por ali. Num outro canto, dezenas de jacus ciscando não longe de
um comedor adornado com pássaros de todas as cores que iam e vinham sem parar
bicar maçãs pingo-de-mel – a iguaria não é uma variedade mas uma situação que
só acontece nos frutos colhidos depois de uma geada, uma verdadeira iguaria
local. Sanhaçu-papa-laranja, saíra-preciosa, saíra-viúva, tio-tio, canários e
tantos outros se exibem por ali.
Na
mesa do café, chimias de frutas locais feitas pela Rose nos esperavam junto com
pão caseiro, além de nata, queijo e
salame da vizinhança. Ao redor do fogão
de lenha secavam fatias de cogumelos e, sobre a brasa, pinhões lustrosos do
quintal pra sapecar.
Logo
chegaram de São Paulo o Chef Cesar Costa, seu sócio Luiz Guilherme Simões e o cozinheiro Eduardo Amorim, todos do
restaurante Corrutela que está pra abrir em Pinheiros. E conversa não poderia ser outra senão
cogumelos enquanto limpávamos os porcini e outros coletados no dia anterior
pelo Fernando. Logo depois, saímos para colher ervas espontâneas para o almoço
feito por Cesar e Eduardo com todos ajudando. Teve polenta de milho crioulo,
cogumelos na manteiga e ervas espontâneas do quintal. Enquanto seu restaurante não abre, Cesar
investe em visitar produtores e foi assim que chegou à região. Ele trabalhou na Inglaterra na Forager, empresa de Miles Irving, autor
do livro The Forager handbook, a
guide to the edible plants of Britain. Sua função era sair para coletar ervas
espontâneas e cogumelos silvestres que depois de limpos e embalados são
vendidos para restaurantes. Então, de coletar cogumelos e plantas silvestres
ele entende e ali em Urupema já era sua segunda vez.
À
tarde, o grande momento, nos juntamos à Joziéli Andrade Wrubleschi, jornalista e assessora de imprensa da
prefeitura de Urupema, para coletar
cogumelos na propriedade da família perto da cidade. Aquela cena europeia que temos no imaginário
de sair com cestinhas de palha para colher cogumelos e deixar espalhar os
esporos aconteceu exatamente assim, com a diferença que as cestas não foram
suficientes e apelamos para sacolas e bacias de plástico que tínhamos nos
porta-malas, tamanha a quantidade, apesar do fim de safra e da pequena
plantação de pinheiros.
E
pensar que até pouco tempo atrás Joziéli se encantava com os grandes cogumelos que
publicava no facebook pra fazer graça –
diz que tropeçava neles quando ia colher gravetos no mato pra acender fogo. Nem
imaginava que andava sobre terreno minado de preciosidades, pois só ficou
sabendo recentemente que eram de comer quando estiveram na cidade a Chef do
restaurante Arturito, Paola Carosella que já utiliza os porcini catarinense em
seu restaurante, e o Chef César Costa, que pretende usar. Foram ciceroneados
por Daniela Carneiro Maximo de Oliveira, veterinária e articuladora comunitária
na região de Lages.
Daniela já trabalha há algum tempo com estes cogumelos
junto à família Bunn. Larissa Bunn Gugelmin incrementou a semeadura de esporos
de porcini nas terras da família, em Otacílio Costa, não muito distante dali,
quando descobriu ao acaso que os gordos cogumelos que despontavam por baixo das
agulhas dos pinheiros eram os mesmos que aprendeu a reconhecer e coletar na
região da Catalunha, na Espanha. A feliz
descoberta foi referendada pelo professor Admir Gianchini, do departamento de
microbiologia da Universidade Federal de Santa Catarina, e em 2008 virou
negócio. Larissa passou a vender boletus frescos e secos para restaurantes como
Mani,Tuju, Arturito - o tema já foi matéria
neste Paladar há dois anos.
Logo
se espalhou a notícia de que os mesmos cogumelos de Otacílio Costa estava
presente em todos os pinheirais da redondeza. No Rio Grande do Sul também tem.
Aliás, até na Serra da Mantiqueira, perto de São Paulo, podemos encontrar. Porém,
por reunir situações climáticas mais favoráveis, a Serra Catarinense, com dias
ensolarados e noites frias, produz mais, muito mais. E, segundo o pesquisador especialista
em cogumelos Marcelo Sulzbacher, da Universidade de Santa Maria, no Rio Grande
do Sul, tanto os cogumelos de Urupema quanto os gaúchos são diferentes dos
europeus e ainda diferentes entre si. Os nossos têm sabor e perfume menos
acentuados que os europeus, sem perder, no entanto, o fascinação, pois
continuam deliciosos.
Por
tudo isto, Joziéli está eufórica, tanto
quanto nós. Apesar de conviver com os cogumelos há muito tempo, também é debutante na coleta
do porcino nacional. São doze alqueires
onde o pai cultiva pinheiros há uns 16
anos. Ele resolver trocar os pastos por Pinus
elliottii quando houve um incentivo do governo estadual para o plantio da
espécie para suprir a demanda das serrarias que se instalaram ali nos anos
1970, e da indústria de celulose que chegou depois. O que no começo parecia um bom negócio,
afinal era cultura que exigia pouco trabalho e teria rendimento certo, hoje
ocupa a terra e não dá nada em troca. É que o preço da madeira caiu tanto para
os pequenos produtores, que não compensa pagar mão de obra para derrubar. Nem
pra lenha serve por ter tem muita resina – que pode ser uma futura fonte de
renda. Sem contar que as folhas em
formato de agulhas, ou acículas, são lenhosas e resistentes à
decomposição, cobrem a terra formando
uma camada grossa que tapa a passagem de luz e impede o desenvolvimento de
qualquer outra espécie verde. Ainda bem que cogumelo dá aos montes, e não só
porcini, pois há outros comestíveis. Por
enquanto, fiquemos com os porcini. Em breve ouviremos falar mais dos cogumelos
nativos e dos exóticos que se deram bem por aqui, como a trufa que já foi
identificada no Rio Grande do Sul.
O
almoço havia se estendido e já era meio da tarde quando começamos a percorrer o
bosque iluminado por raios de sol que encontravam falhas nas copas altas dos
pinheiros. De fato, o terreno onde antes
era pasto é um tanto íngreme para culturas tradicionais, mas uma floresta densa
cairia bem ali. As acículas forram o chão como um tapete escorregadio e os
tombos até que foram divertidos. Agora, a alegria maior era mesmo enxergar uma protuberância levantando as
folhas secas. Basta afastar com as mãos que você descobre um gordo cogumelo
ainda claro e tenro se anunciando. Alguns
já eram grandes, com chapéus marrons e resquícios de folhas-agulhas grudadas na
superfície. Em outros percebiam-se mordidas de lebres. E vários resistiam
firmes, prontos para o jantar. Como estávamos coletando ali pela primeira vez,
de muitos só encontramos os esqueletos. Uma semana antes e a colheita teria sido muito
maior. Ainda assim, saímos carregados.
Nossa euforia só foi apagada com com o por do sol e a repentina
escuridão no interior do bosque. Lá fora ainda havia luz, suficiente para apreciar
a vista no despraiado do Rio Caronas de águas límpidas e geladas no fundo do
vale. De volta à pousada, era hora de
lidar com os cogumelos enquanto vamos sabendo do histórico que antecedeu este
momento.
Maçã pingo-de-mel |
Depois
do primeiro encontro com os Chefs de São Paulo, Paola e Cesar, que foram
conhecer possíveis produtores na região, Joziéli, Daniela, Fernando e Rose se
animaram em criar uma associação na região serrana de Santa Catarina para lidar
com os cogumelos e produtos locais como a maçã pingo-de-mel, o kiwi, a gila, o
marmelo etc. Daniela diz que a associação quer estimular o consumo do porcini
na serra e a melhoria de renda das famílias, cadastrar donos de plantações de pinheiros,
fazer parcerias com a indústria papeleira que retém a maior parte da área
plantada, organizar o comércio de cogumelos de forma participativa, limpa, justa e sustentável, aproximar
produtor e consumidor, e se unir com as universidades para prover treinamentos
e dar assistência técnica quanto ao manejo, processamento, conservação e
transporte. Isto é o que já começaram a
fazer para que tudo esteja pronto até o próximo outono. E o turismo gastronômico seria uma feliz
consequência na época da safra para se coletar e consumir localmente o produto
fresco.
Paola
Carosella prefere usar em seu restaurante o cogumelo seco, pois o fresco
atualmente tem custado muito caro e diz ter vergonha de repassar o valor para
seu cliente. Sugere, então, que a nova associação
invista em cogumelos secos, em pó, em conservas ou temperando azeite. Os
frescos, podemos comer lá.
A
ideia de comercializar o produto seco é reforçada por Daniela que tem larga
experiência no produto. Ela diz que o porcino
fresco é perecível e tem muita perda no transporte. Algumas limitações impostas
por consumidores, como preferir os de pequeno tamanho, e a brevidade da safra, também
dificultam o comércio in natura. E ela fala com conhecimento de causa. Não só
porque trabalhou nos últimos anos com estes cogumelos na empresa da família
Bunn, mas também porque conhece a difícil realidade dos agricultores. O pai foi
prefeito de Lages no auge do incentivo governamental para o plantio de Pinus spp, na década de 1970 e ela pode vivenciar esta
mudança de cultura. Sementes e mudas de Pinus elliottii e outras espécies para
estes plantios chegaram ao Sul e Sudeste há cerca de 50 anos vindas dos Estados
Unidos e Canadá, certamente já micorrizadas com Boletus e outros. Micorriza
é uma relação simbiótica entre plantas e fungos em que as hifas do fungo se
incorporam à raiz absorvendo nutriente da planta ao mesmo tempo que torna
micronutrientes e água mais biodisponíveis para a planta. Ambos se beneficiam.
Em
suas andanças, Daniela diz que tem colhido vários relatos sobre a existência
desses cogumelos com antigos moradores da região da serra e agora o que mais
quer é trabalhar em grupo na nova associação respeitando a história das pessoas
e melhorando a qualidade de vida delas, sempre seguindo os princípios da
agroecologia para que a atividade seja socialmente justa, ambientalmente
correta e economicamente viável .
O
bom é que esta associação já começa seguindo estes princípios e ainda se
cercando de segurança - todo cuidado
quando se trata de identificação de cogumelo é pouco. O micólogo Marcelo Sulzbacher é parceiro do
grupo e está empenhado na assessoria. Ele alerta para que os novatos não se
aventurem a coletar porcini sem ter certeza. Diz que há outras espécies do
gênero Boletus venenosos como o Boletus satanas, ainda não identificado
por aqui. Como podem acorrer no mesmo habitat é bom tomar cuidado, lembrando
que mesmo o porcini que não era tão farto anos atrás hoje ocorre até nas beiras
das estradas. Então, novas espécies parecidas podem surgir com o envelhecimento
das plantações. Outro cogumelo venenoso
que cresce no mesmo ambiente é o Amanita
muscaria, aquele vermelho com pintas brancas comuns nos desenhos de florestas
encantadas. Daniela conta que o gado adora porcino mas afasta os amanitas.
Fernando, que é biólogo e também guia turístico, está
empolgado com os cogumelos da região e já faz planos. Sua pousada é quase um santuário de aves e recebe entre
abril e junho muitos observadores de pássaros. É que apesar dos pinheiros
exóticos ainda há por ali, em sua propriedade e vizinhança, muita araucária e a safra do pinhão, durante
estes meses, atrai milhares de papagaio-charão e papagaio-de-peito-roxo que vêm
do Rio Grande do Sul para o banquete. Esta
migração, junto com as aves endêmicas do planalto das araucárias e dos campos
sulinos, faz de Urupema o melhor destino para observação de pássaros do
país. A ideia é juntar a época do pinhão
e dos pássaros com a safra dos cogumelos porcini. Os pássaros, só para serem
observados, claro. Na mesa, pinhões e
cogumelos. Sem esquecer que em Urupema tem frio, geada, tem neve e fogão de
lenha. Vinho da serra? Tem também.
E,
finalmente, chegou a hora de todos rodearem o fogão de lenha de Fernando e da
Rose, em cuja chapa repousavam algumas fatias de cogumelos para secar. Joziéli
resolveu adaptar uma receita local, acreditando que assim será mais fácil
convencer seus vizinhos da cidade a
experimentar a iguaria. Preparou um completo Entrevero, prato feito no disco de
arado com carnes frescas e variadas, secas e defumadas, linguiças, bacon,
legumes e a variação que quiser - geralmente usa-se o que tem por perto e cada
família tem suas preferências. O que não
pode faltar no Entrevero é o ingrediente emblemático, o pinhão cozido.
Tudo chapeado para comer com polenta, pão ou macarrão - o yakisoba da
serra catarinense, brinca a cozinheira de plantão! Joziéli inventou
de colocar porcini, chapéu e pés cortados em cubos, dourados antes em manteiga. O sabor lembrou
carne de porco, que poderia estar presente, mas não havia. Assim, acabava de nascer ali na nossa frente
o “Entrevero Porcino” que acompanhamos de polenta e vinho da serra. Foi o nome que
me ocorreu agora, já que era o porcino substituindo o porco. Que fique sendo o
prato típico de Urupema! Ou pelo menos
o prato de batismo da associação que está nascendo na região. Outono, volte logo! Enquanto isto,
temos um ano pra fazer nossas reservas.
ENTREVERO PORCINO – Receita de Joziéli
Andrade Wrubleschi
1
kg de cogumelos porcini picados em pedaços grandes
200
g de manteiga sem sal
3
dentes de alho picado finamente
3
cebolas grandes picada grosseiramente
250
g de bacon picado
500
g de lingüiça calabresa fatiada
2
cenouras fatiadas
1
pimentão vermelho cortado em quadrados
1
pimentão verde cortado em quadrados
1
pimentão amarelo cortado em quadrados
1
kg de pinhões cozidos e descascados
1
xícara de salsa ou ervas de sua preferência picadas grosseiramente
Coloque
os cogumelos e a manteiga num disco de arado (compra-se geralmente em lojas de
produtos agropecuários) ou wok sobre uma
chama bem forte, de preferência de fogão de lenha. Mexa até ficar macio e
começar a dourar. Reserve. No mesmo recipiente, ainda com um pouco da manteiga,
junte o alho e um quarto da cebola picada. Refogue rapidamente e junte o bacon
e a lingüiça. Quando o bacon começar a dourar, junte o restante da cebola, a
cenoura e os pimentões e vá mexendo até os legumes amaciarem. Junte os pinhões
cozidos e espere que fiquem bem quentes. Por fim, junte os porcini reservados e
a salsa picada. Polvilhe um pouco de sal se for preciso, misture e sirva com um
ou mais desses acompanhamentos: polenta, farofa, arroz, pão ou macarrão ao alho e óleo.
Rende: 8 porções
PORCINO, UM COGUMELO GORDO COMO UM
PORQUINHO
Em
italiano diz-se porcino. No plural, é porcini. Recebem este nome na Itália os
cogumelos da espécie Boletus edulis,
como os que encontrados aqui nas plantações de Pinus spp. Também são comuns nos bosques de castanheiras (Castanea sativa Mill.) do sul do
Brasil.
São cogumelos simbióticos que
dependem totalmente da parceria com as raízes destas árvores, assim como elas
se aproveitam da companhia para melhorar a absorção de água e nutrientes da
terra. O aspecto gorducho e maciço foi a motivação para o termo
porcino – relativo a porcos. São de fácil identificação, mas ainda assim
é recomendável aprender com quem tem experiência e nunca se aventurar a coletar
e consumir espécies sem um prévio conhecimento, reforça o especialista em
cogumelos Marcelo Sulzbacher. E diz que a carne branca, não mudando de cor
quando o porcino for cortado ao meio, é
uma das características desta espécie. Não a única.
O
píleo ou chapéu tem formato convexo que passa a ser mais plano com a maturação.
É muito carnoso e compacto nos exemplares jovens, com um ou dois dias. Passa a
esponjoso com a maturidade, em torno do quinto dia a uma semana. O estipe ou pé
é robusto e compacto, cilíndrico e geralmente inchado na região da base.
A cor do píleo varia do amendoado ao marrom mais ou menos escuro, com bordas
mais esbranquiçadas. Com cerca de cinco dias a parte de baixo do píleo
começa a ficar esverdeada mas ainda assim, se o cogumelo está íntegro, é
comestível e neste estágio se presta bem para a secagem e elaboração de
farinha.
NA COZINHA
Os
porcini são apreciados crus, fatiados em salada com limão, azeite, sal e
pimenta, acompanhada de queijo. O chapéu carnudo é excelente na chapa com
manteiga, azeite ou a mistura dos dois, só para amaciar, o que acontece em
poucos minutos. Na brasa também vai bem. Coloque dentro de uma peneira de
metal e aproxime da brasa. Quando estiver macio, junte um pouco de
manteiga, como fez o Chef Cesar Costa depois da coleta. É usado ainda em
risotos e recheios de pasteis e tortas. Pode ser conservado em azeite ou
vinagre e ainda ser fatiado e seco para hidratar na hora de usar. Ou
transformar em pó para usar como condimento. Secos podem durar até 2
anos, sendo que, segundo Daniela, as safras mais velhas ficam ainda
melhores no sabor e na aparência. Basta
hidratar por cerca de meia hora em água morna e ainda usar a água para cozinhar
arroz, sopas etc., ensina Cesar.
DEZ REGRAS DE
OURO ENTRE OS AMANTES DE COGUMELOS
Baseadas
nas conversas com os entrevistados, os Chefs Paola Carosella e César Costa, a articuladora
Daniela Carneiro Máximo de Oliveira, o micologista Marcelo Sulzbacher, o
biólogo e guia Fernando Raddatz e a jornalista Joziéli Wrubleschi, recém
produtora de porcini.
1.
Nunca sair coletando cogumelos por aí
sem ter a certeza da identificação que deve ser feita e supervisionada por
especialistas no assunto. Aprenda antes com quem sabe, faça cursos, workshops ou saia com guias locais.
2. Não
coletar cogumelos em terras alheias sem autorização do proprietário. Isto é
roubo.
3. Não
coletar cogumelos em áreas urbanas. Os cogumelos têm a capacidade
absorver metais pesados, prejudiciais à saúde.
4. Usar
sempre uma cesta ao coletar, pois assim estará espalhando os esporos enquanto caminha.
Use cestas separadas caso resolva levar espécies tóxicas ou duvidosas. Nunca
misture-as com espécies comestíveis. E
leve sempre um canivete, assim poderá limpar a base dos pés já no local.
5. Evitar
a ganância e ao encontrar um bosque público com muitos cogumelos, nunca colete
tudo. Lembre-se que outras pessoas poderão chegar depois de você. Assim como os animais, que se alimentam deles
e também ajudam a espalhar os esporos. Colha apenas o que pretende
comer.
6. Se
estiver pensando em montar um negócio de coleta de cogumelos, colete apenas os
que crescem em sua propriedade ou fazer parcerias transparentes com outros
proprietários e coletores.
7. Formar
clubes de coleta com regras definidas para que haja distribuição justa para a
os coletores. O excedente pode ser seco com uso de desidratador,
forno a lenha, lareira. Assim, terá cogumelos para o ano todo.
8. Ao
comprar, escolher associações que respeitem a população local e que
pratiquem comércio justo e o respeito aos princípio agroecológicos.
9. Contentar-se
em consumir cogumelos frescos no outono e de preferência nos locai endêmicos.
Há grandes perdas no transporte que poderiam ser aproveitadas para fazer outros
tipos de produtos como cogumelo seco, em pó, azeites aromatizados etc.
10. Nunca,
jamais, trocar uma floresta nativa de araucária por uma monocultura exótica de Pinus
– aproveite o que já tem.
Venenoso! |
Amanita muscaria
É
um bom indicador da presença de porcini. Vermelho vivo ponteado de branco
destaca-se entre os tons amarronzados dos porcini quase mimetizados com as
folhas secas dos pinheiros. Cresce no
mesmo ambiente que os porcini. Onde se encontra um, provavelmente encontraremos
um aglomerado de porcini. Mas, cuidado, são venenosos. Descendentes europeus
locais costumam coletar para fazer mata-moscas.
Lambuza-se um cordão com mel e amanita esmagado e pendura. As moscas atraídas pelo mel são envenenadas
pela toxina do cogumelo. Pendurar estes lindos cogumelos nas portas ainda é uma
técnica mosquicida em regiões da Romênia, Polônia e países vizinhos.
INFORME-SE SOBRE OS
COGUMELOS DE URUPEMA E REGIÃO SERRANA DE SANTA CATARINA
Em
Florianópolis, todos os anos, acontece um encontro chamado Rick Foray, promovido pelo Laboratório de Micologia da Universidade
Federal de Santa Catarina, e que traz pesquisadores do Brasil e do exterior
dedicados ao estudo dos fungos. Para saber a programação deste ano, entre em contato
com a Professora Maria Alice Neves – maliceneves@gmail.com
Prefeitura
de Urupema: imprensaurupemasc@gmail.com
. Tel. (49) 3236.3057
Marcelo
Zulzbacher – marcelo_sulzbacher@yahoo.com.br
Daniela
Carneiro Maximo de Oliveira - dani.cmaximo@gmail.com
Pousada
Rio dos Touros: contato@riodostouros.com.br
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quarta-feira, 2 de agosto de 2017
Jiló sapecado
Você nem pode imaginar a delícia que este antepasto fica. Sapeca o jiló na brasa ou na boca do fogo virando, virando até ficar todo queimado e mole. Espera esfriar, abre ao meio, retira a polpa com uma colher tomando o cuidado de não pegar a parte queimada, coloca numa tábua, pica com uma faca bem finamente, passa pra uma tigela e tempera com alho ralado, sal, azeite, umas gotas de limão e folhinhas secas e frescas de manjericão zathar - ou orégano. Aí é só servir com pão, peixe, legumes, coalhada, dentro do sanduíche, em cima do arroz ou purinho. E prepare-se pra ouvir elogios de quem diz não gostar de jiló. Nhac!
Eu sempre faço no Pancnacity, mas nunca vi receita. Faço assim, com temperos a gosto. Se quiser, coloque tahine como no babaganush. Eu nunca coloquei, mas deve ficar bom.
Eu sempre faço no Pancnacity, mas nunca vi receita. Faço assim, com temperos a gosto. Se quiser, coloque tahine como no babaganush. Eu nunca coloquei, mas deve ficar bom.
terça-feira, 1 de agosto de 2017
Sopa de abacate com capuchinha
Ontem olhei para a jardineira e tive vontade de comer todas as flores de capuchinha, cada um com uma tonalidade diferente. A época de comer comida pastosa e gelada foi na semana passada quando operei do dente. Mas, vá lá, deu vontade de comer as flores sobre um creme verde. Sorte que tinha na geladeira abacate maduro e cremoso. Lindamente homogêneo, quase amarelo. Mas eu queria verde. Então colhi também folhas de capuchinha pra chegar ao tom e bati junto no liquidificador com uma xícara de iogurte, uma colherada de vinagre de kombucha, um pouco de azeite, 1 dente de alho. Já no prato, reguei com mais azeite, espalhei por cima uns floquinhos de pimenta vermelha e decorei com as flores. Depois da foto, afundei todas no creme e nhac. Estava muito boa!
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