quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Pancnacity para a turma do LabMani de 10 de novembro de 2017

Pão de abóbora e jenipapo verde, pasta de jiló sapecado, homus com taioba
e manteiga de flores panc 
Ninguém aguenta mais minhas desculpas de que estou atrasada pra registrar o que deveria no blog. De qualquer forma, ficam aqui algumas poucas fotos do último PancNaCity do Lab Mani, só pra registrar.

As primeiras ervas comestíveis na calçada 

Um pé de tomate carregado, atitude panc 

Almôndega de jaca verde, salada de verdes panc, salada de mamão verde,
caroços de jaca verde no azeite com ervas, arroz com folhas de curry
e ora-pro-nobis, fermentado de mamão verde 


De sobremesa: panqueca de cúrcuma com recheio de creme e doce de cupuaçu


sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Jenipapo maduro. Coluna do caderno Paladar. Edição de 16 de novembro de 2017



Ontem foi dia de coluna Nhac no Paladar. E falei do jenipapo maduro. Está lá no site do caderno e aqui também.  


JENIPAPO CAI DE MADURO
Em minha coluna de julho mostrei o jenipapo verde que tinge tudo de azul e prometi que voltaria a falar do fruto maduro quando fosse a safra dele. Pois nem precisei procurar. De repente minha casa foi invadida por uma mala de jenipapo trazendo seu perfume na rabeira.  Veio de Manaus, diretamente do sítio do biólogo Valdely Kinupp, autor,  junto com o botânico Harri Lorenzi,  do livro Plantas Alimentícias Não Convencionais (Panc) no Brasil e que esteve em São Paulo para uma palestra no Sesc Pompeia sobre Panc – sim, jenipapo é considerado uma Panc.

Na mesa de espécies que dificilmente encontramos nos supermercados apresentada por kinupp durante a palestra, havia entre as hortaliças raras frutas com perfumes pronunciados. Cupuaçu, maçã-de-elefante, melão-cruá e jenipapo brigavam pra ver quem ganhava no cheiro. Difícil dizer, mas isoladamente o jenipapo é mais ardiloso, pois atrai a atenção e o apetite com um forte perfume frutado de maçãs, ameixas ou marmelos, para em seguida mostrar seu lado B, notas que remetem à querosene, motor de liquidificador prestes a queimar, massa plástica, funilaria. Mas, calma lá, são só vagas lembranças que aos poucos você associará ao ótimo sabor e para sempre sua memória afetiva será componente importante deste paladar único. Guardadas as devidas diferenças e proporções, podemos comparar ao aroma petroláceo do vinho Riesling alemão. Se é defeito ou não,  ainda se discute, mas a maioria dos enófilos aprecia.

No caso do jenipapo, à primeira prova, muita gente estranha a combinação do Diesel com o ácido, perfumado e falta de doçura na fruta in natura, mas diante de uma travessa de jenipapada – fatias da fruta descascada, sem pele e sem sementes, apenas polvilhadas com açúcar, ninguém se contenta com pouco. É viciante, já adianto. O aroma indesejado é imediatamente trancafiado em outro compartimento, sendo superado por substâncias voláteis florais e frutadas das mais agradáveis.

Jenipapo pra tingir pele de preto ou comida de azul tem que ser imaturo, ainda duro, mas a fruta para comer, fazer doce, bolinha, passa ou licor, tem que cair de maduro. Geralmente é colhida embaixo das árvores e, mesmo com a queda, amassa mas não quebra. Por esta característica, não é um fruto que atrai pela aparência na banca de frutas. Você passa, sente um perfume frutado delicioso e quando vai ver de onde vem se depara com um saco, bacia ou balde cheios de frutos amarronzados e amassados. É difícil acreditar que não estejam passados, apodrecidos.  Na porta do Mercado da Lapa sempre via, mas nunca me senti motivada a comprar.

Só com a intimidade é que vamos desmontando os mitos. A polpa tem uma membrana fina aderida, facilmente removível com um descascador de legumes, e realmente cede à pressão quando a apertamos, mas o que amassa é o miolo com as sementes, pois a polpa com cerca de 1 centímetro de espessura tem consistência macia, mas resistente como uma borracha.  E é incrível como um fruto assim pode ser resistente. Fora da geladeira, sem se desintegrar, pode durar dias. Na geladeira, até um ano resiste sem perder a dignidade. 

Todas as partes do jenipapeiro são muito usados na medicina popular contra males diversos - tosse, anemia, contusões, luxações entre outros -, por isto a planta Genipa americana é uma espécie amplamente estudada e os componentes dos frutos já tiveram atividade antibiótica comprovada em testes in vitro contra várias espécies de bactérias. Talvez isto explique a longa vida de prateleira que o jenipapo exibe. Ele mumifica mas não estraga – a não ser que esteja com ferimentos na casca e isto pode ser um caminho para a deterioração.

Assim como o café, o jenipapo pertence à família das Rubiáceas e não é exclusividade brasileira, já que está amplamente distribuída por todas as áreas tropicais e subtropicais da América Latina. Entre nós, podemos encontrá-lo da Amazônia a São Paulo. No Nordeste é comum e alguns preparos são populares especialmente na Bahia. No Recôncavo, por exemplo, são famosas as bolinhas de jenipapo – a polpa sem pele e sem sementes passada em máquina de moer e cozida com açúcar até o ponto de enrolar, quando deve estar bem escura. Passadas em açúcar, estas bolinhas são tentações disputadas nos mercados. E o São João na Bahia não é festa se não tem licor de jenipapo. Sem contar os refrescos que podem ser feitos deixando o miolo da fruta na água para soltar a mucilagem que envolve as sementes – estas costumam ser descartadas apesar do intrigante sabor apimentado quando mordidas.

Recentemente a fruta foi incorporada à  Arca do Gosto, projeto do movimento Slow Food que visa identificar, catalogar e proteger alimentos em vias de desaparecer, pois jenipapeiros do Sul da Bahia estão dando lugar à cultura do café, colocando em risco toda a história de uso do ingrediente nesta região.  Aliás, uma publicação com todos os produtos brasileiros da Arca, incluindo o jenipapo,  foi lançado recentemente. Para adquirir, escreva para contato@slowfoodbrasil.com

Jenipapada - a fruta crua, fatiada e polvilhada com açúcar 

Ainda estou em processo de adquirir intimidade com a fruta, mas já posso dizer que meu preparo favorito é a jenipapada feita por Tieta do Agreste, na obra de Jorge Amado e que conheci recentemente.  No livro de Paloma Jorge Amado, As frutas de Jorge Amado, a receita é simples. Diz para preparar 2 jenipapos (lavar, descascar, tirar sementes e a película entre as sementes e a polpa), cortar em tirinhas e misturar com 3 colheres (sopa) de açúcar. Fica na geladeira por dois dias para macerar e está pronto para servir. 
Gosto também muito das bolinhas de jenipapo que me fazem lembrar das bolinhas de tamarindo mexicanas , doces, salgadas, ácidas e apimentadas, cuja receita dei na minha coluna sobre tamarindos.  Então misturei as duas receitas e fiz bolinhas de jenipapo – doces, salgadas, ácidas  mas nem tanto,  e apimentadas. Ficam deliciosas e intrigantes – seguindo o estilo desta nossa fruta.



Bolinhas de jenipapo com pimenta

300 g de polpa de jenipapo (sem sementes e sem pele)
150 g de açúcar
¼ de xícara de água
1 colher (café) de sal
2 colheres (sopa) de pimenta vermelha seca em flocos

Para passar as bolinhas
2 colheres (sopa) de açúcar
1 colher (sopa) de pimenta vermelha seca em flocos (pode usar pimenta para kimchi encontrada em lojas de produtos asiáticos ou substitua por 1 pitada de jiquitaia ou pimenta em pó do Xingu) 
1 colher (café) de sal


Passe a polpa de jenipapo pela máquina de carne ou processador para que fique bem triturada. Em uma panela pequena coloque todos os ingredientes, misture bem e leve ao fogo baixo. Quando ferver, cozinhe por 10 a 15 minutos, até que o líquido se evapore e reste na panela uma pasta espessa que se desprende do fundo da panela. Retire do fogo e espere esfriar completamente.


Para passar as bolinhas: em um prato coloque o açúcar, a pimenta e o sal e misture. Tire porções da massa do tamanho de bolinhas de gude e enrole nas mãos. Passe por esta mistura. Estão prontas pra comer ou, se quiser guardá-las, coloque num vidro e feche bem. Conserva-se bem fora da geladeira por até uma semana ou mais.

Rende
 cerca de 50 bolinhas