quarta-feira, 19 de março de 2014

Festival do Umbu em Uauá


Acontece em Uauá, na Bahia, mais um Festival do Umbu. E é pra lá que eu vou, que não sou boba nem nada. Se tudo for verdade, volto a escrever aqui no primeiro de abril. Quem quer ir?

terça-feira, 18 de março de 2014

Tudo do coco. Ou creme de coco para cozinha tailandesa

O creme nas cumbucas
Meu cunhado é marceneiro e outro dia fez várias cumbucas para uma cliente que daria uma festa tailandesa na praia. Conclusão, sobrou o coco. Então, aqui, o aproveitamento deu-se pelo contrário. Normalmente sobra a casca.

O bom é que ganhei muito coco, o suficiente até para separar o creme ou a nata. Este creme pode ser usado como um leite de coco concentrado que pode ser diluído, lembrando que é mais gordo,  como creme mesmo em sobremesas e curries tailandeses, ou simplesmente colocando uma colherada sobre um cozido, frango ou peixe assado,  como se fosse uma colherada de manteiga.


Uma colherada no curry
Para conseguir separar este creme, é só extrair o leite e deixar na geladeira de repouso por alguma horas. A gordura é mais leve e vai subir e se solidificar. Tire, então, com uma colher e guarde em vidros para usar depois. Dura até cinco dias na geladeira, mas o melhor é congelar. O líquido que sobra pode ser usado como um leite de coco mais ralo. Bom para cozinhar legumes e frangos. E o creme, para ficar mais cremoso, pode ser homogeneizado no processador. Fica mais fácil para colocar nos vidros e para usar nas receitas. Se quiser ainda fazer óleo, é só levar esta nata ao fogo e deixar a umidade evaporar, afinal no creme há gordura e líquido emulsionados.  Quando o líquido evapora, sobra na panela uma massa (a parte sólida do leite) com gordura separada. Coe para tirar o óleo e use a massa para fazer farofa.  


Imagino que todo mundo saiba extrair leite de coco, afinal é só bater o coco em pedaços (não precisa tirar a pele marrom) com um água morna em quantidade suficiente para conseguir fazer funcionar o aparelho. Bata até formar uma massa e coe em pano, espremendo bem.

A fibra virou farinha
A fibra pode ser seca no forno bem baixo até ficar totalmente seca. Depois, bata no liquidificador para ficar fina. Esta farinha nutritiva e rica em fibras é cheirosa e pode ser usada em farofa (neste caso, nem precisaria afinar no liquidificador), pão, biscoito, bolo, granola etc.

sexta-feira, 14 de março de 2014

Xarope de jabuticaba. E geleia, e doce e ... Aproveitamento total.

 

Uma coisa é pegar duas jabuticabas e fazer cozinha contemporânea, de vanguarda, seja lá o nome que se dê, desenhando um risco rubi no prato. Outra é aproveitar uma baciada que a gente não dá conta de comer mesmo dividindo com os amigos. O fato é que não sei outro jeito para não desperdiçar se não congelar antes que fermente para lidar com ela depois ou fazer geleias e compotas. Já dei receita com jabuticaba de tudo quanto foi jeito: vinagre, tapioca, sagu, gelatina, chá, casca desidratada, no papel de banana, com sal, com açúcar, passa, compota, caipirinha e calda. Nunca pensei, no entanto, em fazer da calda um xarope para usar em refresco. Ando com mania de fazer xaropes. É uma saída rápida e gostosa para o verão quando não se tem tempo para fazer um suco de fruta fresca.  E uma variação para a simples água. Ao refrigerante, nem se fala. Depois que fiz o xarope de sabugueiro, já fiz de hibisco, de ervas aromáticas e agora o de jabuticaba. 

Estas chegaram recentemente com as goiabas, pelas mãos do caseiro, mas as que usei foram as congeladas que tinha da outra safra. Precisei de espaço no freezer e tive que fazer escolhas com o que havia dentro. Imediatamente, claro, pensei em fazer mais xarope colorido. Ainda tenho o de hibisco, mas nunca é demais ter outro sabor, ainda que da mesma cor. 

Para o xarope de jabuticaba, foi só colocar as frutas (congeladas já lavadas), uns 3 kg mais ou menos, numa panela de inox e cobrir com água. Deixei cozinhar por cerca de 1 hora até que a água ficou bem tingida e a fruta macia.  Coei no pano - a foto lá em cima-, sem espremer muito. Rendeu 2 litros de caldo. Juntei meio quilo de açúcar e voltei ao foto. Deixei ferver até o açúcar derreter e ficar com consistência de xarope. Apaguei o fogo, juntei o suco de um limão, esperei esfriar e engarrafei.  Na hora de beber, é só diluir 1/4 de xícara ou a gosto com água e gelo num copo. 

Poderia ter parado por aí, jogado fora o bagaço. Mas ainda havia tanta cor, tanta polpa, tanta antocianina, este pigmento antioxidante que a gente tanto busca nos vinhos. Então o que fiz foi tentar uma segunda extração. Coloquei o bagaço na panela, juntei mais água e cozinhei mais 10 minutos. Passei por pano novamente apertando um pouco mais e coletei o líquido, 2 xícaras. Coloquei na panela este suco com 1 xícara de açúcar e o suco de 1 limão tahiti e deixei cozinhar em fogo baixo até o ponto de geleia (tem receita parecida aqui e o ponto da geleia de hibisco, que é igual). 

Poderia ter jogado fora agora o bagaço, mas ainda tinha tanta cor, tanta polpa, tanta antocianina... Resolvi fazer mais uma extração. Bati tudo no liquidificador rapidamente com um pouco de água, passei por peneira para reter sementes e cascas, pressionando bem. E à polpa obtida juntei igual quantidade de açúcar. Levei ao fogo e deixei apurar até ficar como uma goiabada cremosa. Ficou uma delícia, com muito sabor ainda da jabuticaba. Pode ser usado como base para sobremesas ou servido como geleia, para passar no pão. 

Mas ainda tinha tanta cor....  Agora deixo o assunto da quarta extração para um próximo post, quem sabe. 





Aula grátis com Pupin amanhã na Wilma Kovesi

Amanhã haverá uma palestra do Pupin na Escola Wilma Kovesi. Neste horário estaremos, os vizinhos e eu, iniciando uma horta urbana na nossa rua. Por isto não vou. E eu posso ouvir sempre o Pupin ao vivo em Piracaia. E a Sonia, lider do Slow Food Piracaia que participará do encontro, também. Mas é uma ótima oportunidade de conhecer um pouco do que tem sido feito em Piracaia.

AULA ABERTA

AULA ABERTA | ORGÂNICOS
Roda de conversa com Dercílio Pupin
Questões históricas ● Cadeia envolvida no manejo orgânico ● Plantio de pomares, hortas e jardins● Orientações para consumo consciente... Sábado | 15 de março : 10 às 12 horas
25 vagas | reservas sujeitas a confirmação: info@wkcozinha.com.br
Escola Wilma Kovesi
Rua Cristiano Viana, 224
São Paulo - SP
11 3063 1592

quinta-feira, 13 de março de 2014

Visita boa

Foto da Juliana Valentini, roubada descaradamente do blog dela (a toalha
e o prato são meus afinal). Cambucis congelados vão direto para o
liquidificador
No carnaval tivemos boas companhias. Os amigos Juliana e Flores, que também nos visitaram no carnaval do ano passado, para manter a tradição e aplacar nossas saudades, estiveram novamente conosco no último feriado, silencioso e de muito plantio. 

Eles têm um viveiro em Holambra e chegam sempre com muitas mudas. Flores e Marcos plantam, Juliana e eu vamos pra cozinha preparar jarras de suco de cambuci. Aliás, a fruta em extinção é a cara da Juliana, que se empenha numa missão de fazer mudas e mais mudas a partir de sementes enviadas pelos leitores do seu blog De verde Casa.  Ela escreve super bem e fala de assuntos interessantes, divertidos, emocionantes. Confira lá.  

Voltando ao cambuci, ela ganhou um tanto de um leitor e levou congelado pra fazermos sucos. Então nosso carnaval foi uma bebedeira só. Jarras e jarras de suco de cambuci, perfumado, geladinho, delicioso. E Flores entende como ninguém de árvores nativas de flores e frutas. O viveiro deles, Oiti,  faz projetos de reflorestamento de verdade - não com eucalipto, mas com espécies nativas. Como as espécies com que lidam, são pessoas raras.  Sorte nossa ter amigos como eles. 

Juliana fez um post lindo sobre a estadia na chácara. Confira lá a visão dela: 
http://www.deverdecasa.com/2014/03/descansar.html#comment-form

quarta-feira, 12 de março de 2014

Hibisco saiu de moda. Ou água de jamaica e muffin de hibisco

O bom das modinhas de alimentos funcionais e para emagrecer é que assim como vêm elas se vão. Ou, assim como estes alimentos chegam ao mercado com valores exorbitantes, vão saindo aos poucos cabisbaixos custando menos da metade do preço.  Este é o perigo de endeusar alimentos. Assim que a promessa de milagres não se cumpre (alguém acredita neles?), o pobre diabo volta a ser o último da fila, afinal quando ninguém mais se lembrar do seu fracasso ele poderá ressurgir do pó com novas promessas. Enquanto isso, um novo alimento ou suplemento é lançado. Logo será a elderberry ou fruto do sabugueiro. Aguarde. 

Fico com dó quando chego ao Mercado da Lapa e vejo alguém com uma listinha sem a mínima ideia do que se trata. São alimentos que nada têm a ver com a cultura da pessoa, com a intimidade na cozinha, com o conforto do gosto. Mas ela vai ditando: me vê aí um tanto de chia, outro de gojiberry, suco de cranberry, flocos de quinoa, farinha de linhaça, farinha de açaí etc. A conta? cara, bem cara.  Outro dia um rapaz com uma cinturinha larga, pediu tudo isso, olhou pra mim - devia estar encarando meio incrédula - e disse: estou tentando comer mais saudável, sabe? Vou tentar aprender a cozinhar com tudo isto.  Dizem que é bom. O vendedor me conta que vai aprendendo sobre a propriedade dos alimentos com os clientes e estimula: olha, pode comer bastante quinoa que tem mais proteína que a carne. A chia você engole a seco. O grão se espessa com líquido e fica uma delícia em sucos doces, mas o rapaz ia engolir a seco pra inchar dentro dele, enganar a danada da fome. Sou palpiteira de nascença, mas adianta ali rebater?  Tudo bem, às vezes não aguento e falo alguma coisa só para situar a pessoa. 

Mas minha demora ali, a ponto de observar clientes, é mesmo para escolher ingredientes. Um dia comprei farinha de açaí e achei com gosto artificial. Mas da chia eu gosto. Assim como também gosto também de quinoa, linhaça etc. Mas não pela panaceia como são tratados e sim pelo que são de verdade. Todos com muito potencial na cozinha, todos nutritivos, saudáveis e que podem entrar uma vez ou outra no nosso cardápio sem histerias, sem depositar neles a esperança pela salvação do esqueleto. 

E para quem não está nem aí com a moda, alguns desses alimentos vieram para ficar ou já tinham chegado antes de surgirem como novidade. O óleo de coco, por exemplo, minha mãe já extraía em casa quando eu era criança. Chegou a custar uma pequena fortuna, agora o encontramos ainda caro, mas não absurdo. Prefiro fazer o meu em casa. Já o hibisco, compro fresco desde que me conheço por gente grande. Às vezes era vendido em feiras e sacolões com o nome de groselha. Talvez pelo xarope que ele faz, talvez pelo nome francês roselle. Com a moda, ficou super caro o seco, ótimo para infusões,  xaropes e uma porção de receitas feitas estes líquidos coloridos.  Pois, pelo preço, percebi que já caiu no esquecimento. Comprei 100 gramas por menos de 4 reais. E com esta quantidade dá pra fazer muito chá e refresco. 

O hibisco fresco é mais difícil de encontrar atualmente, mas em se plantando produz fartamente.  Pode também ser usado em geleias, saladas, caipirinhas, refresco, sagu etc. 

A mancha vermelha no prato não é sombra 
Gosto de fazer xarope como o de groselha para diluir na hora de tomar.  No México, este xarope é chamado de água de jamaica (o hibisco é flor de Jamaica).  Você pode aromatizar ou não com casca de laranja, cravo, canela.  O meu faço meio a olho. Coloco uma mãozada de hibisco - ou uns 100 g ou o conteúdo destes sacos que mostro na foto - numa panela de aço inoxidável, cubro com bastante água e deixo reduzir no fogo até o líquido ficar bem tingido e o hibisco, macio. Coo, imagino que tenha ali mais ou menos 1 litro de suco, junto umas duas xícaras de açúcar e volto ao fogo com um pedaço de casca de tangerina, 1 rodela de gengibre, 1 cravo, 1 pedacinho de canela. Ou, se estou com pressa, só açúcar mesmo (pois o hibisco já tem cor, sabor e é ácido, ótimas condições para refrescos).  Passo por peneira, engarrafo e coloco na geladeira. Dura vários dias. É só diluir umas 4 colheres de xarope ou a gosto num copo com água e gelo na hora de beber. Se quiser, rodelas de limão. 

Como calda sobre o bolinho de iogurte com iogurte. Nhac!
Bastidores: posicionar a câmara com uma mão e despejar a calda com a outra.
Acertar o copo é só um detalhe... 
Você pode usar este xarope como calda pra bolos, bolinhos, sorvetes, iogurtes. 

O hibisco cozido
O que sobra do hibisco cozido não precisa ir pro lixo. Pode virar geleia, ser batido com kefir ou iogurte ou fazer as vezes de passas em bolo. Foi o que fiz. Usei 1 xícara de hibiscos cozidos nos bolinhos de iogurte.  Destes, tenho a receita certinha porque já fiz outro igual, só que com pitangas, aqui. Ficam deliciosos e macios. Como tem bastante hibisco, pode comer à vontade que não vai engordar (mentira rude!).

Adicionar legenda
Muffins de iogurte com hibisco 

½ xícara de manteiga sem sal, derretida
1 xícara de açúcar
2 ovos
1 copinho de iogurte natural de 170 g
2 xícaras de farinha de trigo
1 colher (chá) rasa de bicarbonato de sódio
1 pitada de sal
Raspas da casca de dois limões (um tahiti e outro siciliano)
1 xícara de hibiscos cozidos e escorridos

Unte com manteiga e polvilhe com farinha 15 forminhas de muffins. Numa tigela, combine a manteiga derretida fria com o açúcar, os ovos e o iogurte. Misture bem. Peneire sobre esta mistura a farinha, o bicarbonato e o sal. Misture até virar uma massa homogênea. Junte a casquinha de limão e o hibisco. Mexa delicadamente para incorporar. Divida a massa entre as forminhas – deixando espaço para crescer (se quiser, use outras forminhas, como fiz desta vez, mas lembre-se de deixar espaço para a massa crescer). Leve para assar em forno médio preaquecido, por cerca de 30 minutos ou até dourar.
Rendimento: 15 muffins

segunda-feira, 10 de março de 2014

Tempo de colher goiabas, araçás, jabuticabas, oitis, caferanas, pitangas

A colheita urbana de hoje: goiabas brancas, araçás, jabuticaba, pitanga,
oiti e caferana
O combinado com a Letícia, há uns quinze dias, era colher mangas aqui  pelo bairro. Mas na semana passada passei pelo único pé em que a produção foi farta e mangas já não havia. Sorte que Marcos e eu colhemos várias assim que as avistamos. Fatiei todas, congelei e usei dia a dia no kefir de frutas.

Goiabas do sítio do Carlos

Mangas colhidas por Marcos e eu numa praça 
Se a safra da manga já está no fim, a de goiaba está a pleno vapor. No sítio, encontrei cestas de goiabas maduras nas últimas duas vezes em que estive lá. Trazidas pelo caseiro, do sítio dele. Rapidamente,  dada a iminência de se estragarem, tive que transformá-las em orelhas em calda para usar também no kefir ou vitaminas.

Mas, voltando à Letícia, combinamos então de colher goiaba. Quer programa melhor para uma segundona quente? Colher frutas na rua em dupla é muito mais divertido. E sempre para alguém, fica olhando, pergunta o que é. Se reconhece a fruta, dá uma risadinha como querendo participar. Se não conhece, quer saber se é de comer, qual é o nome. Enfim, é sim um programa divertido.

A Letícia na maior alegria.  Eu também!
Fomos, munidas de uma varinha com um gancho na ponta, em direção à goiabeira que conhecia e sabia que estava carregada. Para nossa decepção, várias eram só a casca a fazer chamariz. Pois estavam ocas por dentro, bicadas de passarinho. Mesmo assim, conseguimos colher algumas.

Pé de oiti

Pé de araçá vermelho


Compota fácil de fazer. Veja aqui.
Para não voltarmos com a sacola vazia, convidei letícia a ir ao pé de araçá. Uma árvore bem maior, carregada de frutinhos amarelos, vermelhos, arroxeados. Mas lá no alto. Colhemos algumas e não resistimos a provar ali mesmo. Deliciosas, com perfume incrível. Rumamos para outra goiabeira, mas me confundi, não lembrava mais sua exata localização. Mudamos de caminho de volta e encontramos o pé de oiti carregado. Havia anos que não o via com frutos, que ainda estão amarrentos, mas são lindos e vão ficar gostosos com o tempo.  No caminho também encontramos pitanga grandona, jabuticaba, caferana e araçá amarelo.

Em casa, dividimos nossa coleta e vamos ver o que sai. Pelo menos um suco ou kefir de frutas bem gostoso vamos ter.

Como tenho mais goiabas que trouxe do sítio, pelo menos estas vão virar compota, como a que já ensinei aqui. http://come-se.blogspot.com.br/2013/04/um-litro-de-leite-e-umas-goiabas-do-pe.html. Neste post mostro outra colheita de goiabas de praça muito mais farta: http://piqueniquepertodecasa.blogspot.com.br/2013/04/piquenique-de-pascoa-abril-2013.html

Mas, e você, já olhou as árvores do seu bairro pra ver em que fase se encontram?  Já sabe quando vão florir e produzir frutos, vagens, sementes?

sexta-feira, 7 de março de 2014

Elderflowers, elderberries, sabugueiro, flores e frutos. Coluna do Paladar, edição de 06/03/2014


Minha coluna publicada ontem no Paladar está também no site do caderno: http://blogs.estadao.com.br/paladar/o-doce-poder-do-sabugueiro/

Mas colo aqui meu texto com mais fotos:

Assim como muita gente, eu conhecia o sabugueiro apenas por suas competências fitoterápicas e como aromatizador de bebidas alcoólicas, conferindo certo amargor e perfume de mel.  Mas recentemente um novo mundo se abriu com a descoberta de uma árvore perto de minha casa e com o primeiro gole de um cardeal feito por mim com suas flores.  

Cordial é um xarope ou simplesmente um concentrado de flores ou frutos para diluir como refresco. Foi o que fiz, meu próprio cordial. Tudo começou com a tentativa de imitar o conteúdo da garrafinha que ganhei da artista Daniela Brasil, de volta a este seu país natal representando a universidade de Graz, na Áustria, onde trabalha,  para participar da última bienal de arquitetura em São Paulo. Numa troca de gentilezas e sementes,  acabei ganhando um artesanal holler minz, como marcava o rótulo da garrafa escrito à mão. Holler minz é o xarope da flor com menta. Os austríacos são fascinados por esta bebida. Cheguei em casa, diluí umas duas colheres num copo de água gelada e fiquei tão maravilhada com o refresco que resolvi pesquisar mais a respeito frequentar o sabugueiro do bairro toda semana. Fiz muitos concentrados de flores até que chegassem as pequenas bagas, como um grande cacho de uvas pretas minúsculas. Como pude passar tantas vezes por estas preciosidades sem dar atenção?

Um cacho pode chegar a quase um quilo

Se ainda não ouviu falar, logo elas estarão por aqui. As elderberries e elderflowers foram desde a antiguidade produtos estimados da espécie Sambucus nigra na Europa central e meridional, assim como a S. peruviana nos Andes e a S. australis, nativa do sul do Brasil  – todas são muito parecidas, recebem os mesmos nomes populares e apresentam as mesmas propriedades e usos. As diferenças são morfológicas e discretas. Porém,  as frutinhas tem virado nova febre na Europa como alimento funcional – espere acabar a onda da gojiberry, da blueberry, da cranberry,  e logo aparecerão oportunistas oferecendo elderberries como a panaceia da vez. Pós, pílulas, pastilhas. Não acredite em tudo.

É claro, é ótimo saber que além de gostoso um alimento é tão benéfico. Se você for a um buscador mais sério como Pubmed ou Scielo e procurar pelo nome científico, vai encontrar muitas referências sobre seus componentes e benefícios preventivos e curativos. E  já adianto que para gripe e doenças do aparelho respiratório não há remédio igual. Mas, exageros à parte, o bom é saber que temos sabugueiro por aí, tanto da espécie europeia quanto da nativa, e podemos ter para a colheita outros projetos que não a expectativa única como alimento messiânico. O xarope amarelado e límpido das flores e o rubro denso da bebida feita com os frutos são uma alternativa prazerosa aos sucos concentrados e groselhas artificiais.


 
As flores miúdas são brancas cerosas agrupadas num arranjo de buquê de noiva. Elas têm um perfume forte de mel combinado com algo de abacaxi que se mantém no xarope.  E os frutos ao natural, para falar a verdade, são um pouco insípidos, não muito diferentes de uma maria-pretinha, inclusive no aspecto. Mas o sabor, ligeiramente resinoso e amendoado,  se ressalta com a combinação de calor e açúcar.  A polpa,  suculenta e tinta a ponto de manchar de vermelho os dedos, coberta com película fina, parece preta de tão escura, mas a cor é vinho forte como amoras, cheias de antocianinas, um potente antioxidante, é bom lembrar.

Estamos em plena safra dos frutos, mas você não deve encontrá-los à venda. Fique atento às árvores das ruas e parques e não se arrisque se não tiver certeza. Há uma espécie parecida Sambucus ebulus, que tem flores e frutos tóxicos. Para diferenciar, saiba que esta espécie tem forma arbustiva enquanto o sabugueiro é uma árvore com cerca de 4 metros ou mais, dependendo da origem.  E as brancas flores do sabugueiro têm filetes e anteras amarelos enquanto na espécie tóxica as flores são brancas mas com estes detalhes em vermelho.

Mesmo no caso do sabugueiro, tanto o nativo quanto o europeu, nem frutos nem flores devem ser ingeridos crus – a não ser em pequenas quantidades.  E as sementes, mesmo cozidas, devem ser evitadas. É que, como as amêndoas amargas ou mandiocas bravas, a planta toda contém um glicosídeo cianogênico que pode ser tóxico a depender da quantidade. Felizmente o calor inativa este poder.

Para colher as flores, comece a olhar as árvores no final da primavera, mas ainda agora, no meio do verão,  algumas árvores podem ter cachos de flores e frutos. Com a colheita em mãos você poderá preparar os concentrados para usar em drinques e refrescos ou fazer infusões, sopas com os frutos e maçãs (sopa de sauco, como fazem argentinos), tortas com flores e frutos, geleias, doces em pasta ou compota, caldas, sorvetes ou as flores empanadas e fritas servidas com açúcar (fritelle di fiori di sambuco dos italianos).

Se quiser mergulhar neste mundo sabugueirístico, invista em saber o nome da planta na língua de outros países que sabem mais que nós sobre o uso da planta para fins recreativos na cozinha. Saúco, sabugo, canillero, süc, bonarbre, sauko, sarets, txotixika, sureau, grand sureau, sambuquier, sue, black elder, european elder, pipe tree, bour tree, vlier, holunder, flieder, schwarzer holunder, sambuco, zambuco, sambrugo, saugo, nebbli, savucu, sabugueiro-do-rio-grande, são apenas alguns.

Algumas dicas


Se não conseguir muitos frutos de uma só vez, vá acumulando os cachos no freezer e quando tiver uma boa quantidade, faça um xarope para conservar.
As frutinhas congeladas se soltam facilmente do cacho.

Com as flores vá fazendo pequenas quantidades de concentrado com os cachos que consegue colher. É só usar um vidro pequeno e encher de flores sem os talos. 


Um jeito fácil de separar as minúsculas flores ou os frutos do cacho é usar um pente de aço, daqueles de segurar cebola para cortar fatias.

Outro jeito de conservar os frutos é secá-los. Desidratados,  podem ser usados em chás combinado com outros aromas como casca de tangerina, gengibre,  hibiscos e canela.

Mas aqui o jeito de fazer os concentrados:



Já fiz com vidros de vários tamanhos, dependendo da quantidade de flores
que consigo

Aqui, o sol era tão forte que coloquei água fria e logo ela chegou a 47 graus
Xarope de flores de sabugueiro: separe as flores do cacho e coloque-as num vidro de tamanho proporcional à quantidade que tem, de modo a quase preenchê-lo. Introduza, encostados ao vidro, duas fatias de limão e 2 centímetros de fava de baunilha para cada cacho de flor. Despeje água filtrada a 40ºC, tampe o vidro e deixe no sol durante dois dias. Sob sol forte a temperatura se mantém em 40 graus ou mais durante o dia.  Coe, meça o líquido e junte a mesma quantidade de açúcar. Leve ao fogo e deixe ferver por cinco minutos ou até ficar com consistência de xarope fraco. Junte uma colher (chá) de suco de limão (quantidade por cacho), engarrafe e guarde na geladeira. Na hora de usar, basta diluir a gosto com água gaseificada ou não, gelo e fatias de limão.  Use também como calda, base para sorbet ou composição de drinques – com gim, gelo e limão, por exemplo.

Xarope de bagas de sabugueiro: junte 1 kg de frutos, enxague e coloque numa tigela de vidro. Coloque água que cubra, espere 15 minutos e leve ao fogo.  Ferva por cinco minutos, juntando mais água se for necessário para que os frutinhos fiquem sempre cobertos. Passe por peneira pressionando bem (pode usar espremedor de batatas),  junte 200 g de açúcar e leve ao fogo. Quando o açúcar derreter, basta engarrafar e guardar. Também pode ser diluído com água para fazer refresco ou usado como calda ou com bebida alcoólica.


E olhe que coisa boa: ele pega por estaquia facilmente