quinta-feira, 30 de junho de 2016

Festival de umbu de Uauá. Coluna do Paladar, edição de 30 de junho de 2016

Jussara, da Coopercuc, e seus pimpolhos que adoram umbu 
Já falei um pouco da viagem deste ano para Uauá - aqui. Mas hoje saiu o texto sobre o Festival do Umbu para os leitores do Estadão, na minha coluna do caderno Paladar.  Veja lá no blog do Caderno ou no jornal impresso.

E aqui deixo o texto integral:

Umbu de fim de safra
Festival do umbu no Sertão do São Francisco

O propósito da viagem era o festival,  mas não nos limitemos. Para um turista à procura de aventuras gastronômicas envolvendo a fruta símbolo da Caatinga, o  Festival de Umbu que costuma acontecer no começo do ano em Uauá, interior da Bahia, pode não corresponder à expectativa da exploração fácil. Você não vai encontrar ali fartura de umbu e seus produtos, cozinheiros em barracas com pratos à base de umbu nem muito assunto sobre a fruta.  Pelo menos  do jeito que a gente costuma ver em festivais que homenageiam um produto.  Não se engane. É que para quem vive ali tudo parece tão óbvio, nem precisa mostrar.  Mas o umbu que dá nome ao grande encontro  está nas entrelinhas ou impregnado nas pessoas, nos animais e nas coisas. A pequena cidade, em todos os tempos, na safra ou na entressafra  do umbu, é o próprio festival.

Neste ano foi no final de abril a oitava edição e desde a primeira quem está à frente da organização é a Coopercuc – Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá, que começou com um grupo de mulheres arretadas em busca de independência financeira no final da década de 1990. Hoje,  vende geleia de umbu e maracujá-da-caatinga até para a Europa,  e no repertório de produtos locais tem até cerveja artesanal feita com a fruta por cervejeiro jovem da comunidade que foi estudar fora bancado pela cooperativa.
Para a cidade, o evento representa a oportunidade de se discutir políticas públicas, questões agrárias, merenda escolar,  território e tantas outras demandas que vão se acumulando.  Sem deixar de lado os concursos de poesia, de pintura, as apresentações de teatro  e de cantoria. 

Normalmente acontece em plena safra de umbu, mas neste ano, além de a produção ter sido fraca por causa da seca,  atendeu-se a um pedido de religiosos para que a festa fosse depois da quaresma , afinal os estandes de produtos da agricultura familiar da região, as barracas para venda de comida à noite na praça e o grande palco para shows de forró são muito animados, ficam bem juntos da igreja e não cai bem tanta alegria nesta época de recolhimento.  Então o umbu foi mesmo a raspa do aribé neste ano, só para citar o grande tacho de barro onde na temporada se cozinhavam os umbus para o doce ou o vinagre quando não havia alumínio. 

Agora, por que ir a um festival em plena terra do bode, a mais de quatrocentos quilômetros de Salvador,  a mais de cem do Vale do São Francisco, em pleno sertão de céu azul que nos distrai de tudo?  Exatamente por tudo isto. 

A distância da capital contribui para a preservação dos hábitos, das lendas, da cultura. Por ali passou o cangaceiro Lampião e seu bando, aconteceu ali a primeira batalha da Guerra de Canudos e foi na região que Glauber Rocha gravou Deus e Diabo na Terra do Sol chapando o céu de branco que era pra quem visse não se perder nele esquecendo do resto. Agora, andar pela Caatinga com gente do lugar tendo o sol quente sobre a cabeça e espinhos de toda natureza sob os pés é um presente que ninguém há de esquecer ainda que esta situação não pareça confortável.   E esta gente, pode apostar, está toda na cidade quando rola o festival.  É ali que você vai encontrar seus melhores guias, homens, mulheres ou crianças que vivem na roça,  e sabem tudo da flora, da fauna, das comidas, dos remédios e das lendas da Caatinga.  É como ter a companhia de vários Riobaldos saídos do Grande Sertão de Guimarães Rosa.  É gente que vem de vilarejos e cidades próximas. Um é de Bendengó, outro de Caititu, ou de Cocorobó, Caratacá, Creitu, Marruá, Macururê, Curundundum,  Patamuté, Quinjingue, Quembrenguenhem, ou ali de pertinho, do Sítio do Tomás, da Serra da Besta.

Dificilmente os dias amanhecem pesarosos e cinzas em Uauá.  Pelo contrário, o céu é de um azul extravagante e as núvens são tão brancas, fofas e próximas que parecem bolas de algodão grudadas nos galhos secos das catingueiras.  Geralmente são assim os dias na época do festival. E um chuvisquinho de nada de um dia para outro faz da paisagem esbranquiçada um tapete dourado com as folhas clarinhas e flores amarelas  da catingueira, também conhecida como pau-de-rato. 

Aliás,  não vai ser no café da manhã do hotel em Uauá que você vai tomar um delicioso chá de flores de catingueira, mas quem sabe na casa de alguém no Caratacá ou em Bendengó, cidade vizinha onde caiu há 110 mil anos o maior meteorito de que se tem notícias no Brasil e onde se pode tomar num bar sem alarde a bebida  servida direto da garrafa térmica em copo de plástico, sem nenhuma pompa.  Tampouco o chá de amburana, tão perfumado, usado mais como remédio pra dor de barriga, ou o chá de flores branquinhas de umbuzeiro cheirando a mel e servido por prazer aos mais íntimos às vezes para substituir o café e acompanhar o o autêntico manuê. Assim é chamado o bolo de milho duro demolhado e triturado que leva, além do grão, apenas  água e açúcar e é assado no forno de lenha. Dona Joana Maria de Souza vendia o bolo até o ano passado em Caratacá, um povoado de Uauá, mas já deixou de fazer e ninguém a substituiu.   

A gente jovem da cidade está mais ligada a assuntos urbanos e, com algumas exceções, há pouco interesse em explorar o conhecimento dos pais que, por força das circunstâncias, aprenderam a tirar o melhor proveito dos recursos naturais da caatinga – que por muito tempo foi tida como um bioma a ser combatido.  Hoje mesmo os jovens da cidade já sabem da importância de sua preservação e dali pode se tirar o que comer, o remédio para se tratar e fibras para o gobó de carregar umbu.

Se você conseguir companhia para um dia de caminhada pelas roças, vai descobrir o verdadeiro festival do umbu. Pessoas como Dona Joana, Dona Juvita e Seu Isaias, por exemplo,  te levam para o léxico fantástico do sertão onde reina o umbuzeiro, hoje tão reverenciado e bem tratado,  em parte pelo trabalho de conscientização da cooperativa.

É o umbuzeiro que mantém suas folhas verdes quando todas as árvores já se despiram. Isto, graças à grande quantidade de água que reserva em suas batatas subterrâneas que são comparadas às cacimbas para armazenar água da chuva a ser usada na estiagem.  Mas quando a seca é muito intensa, de um dia para outro o umbuzeiro despeja toda a carga de folhas no chão para evitar perder mais água. 

Os bodes se viram bem na caatinga e com suas pontas conseguem até abrir o cacto cabeça-de-frade para comer seu miolo. Porém,  a natureza se defende como pode. Os amontoados de macambira, uma bromélia espinhenta, e de cansanção, a urtiga do sertão, ajudam a proteger dos bichos as plantas pequenas que vão germinando até que ganhem força para resistir ao assédio.  Ninguém queira levar uma surra de cansanção,  diz Dona Joana.  Nem precisa ser uma surra. Um simples encosto no cansanção ou na faveleira leva à descoberta do que seria estar nu sobre o  inferno de um formigueiro raivoso.  Pior que isto só mesmo se apoiar num pé de amburana-de-cheiro e encontrar em suas forquilhas uma casa de caboclo, marimbondos destemidos que picam doído sem piedade.  Ou cair sobre os espinhos da palmatória, do xique-xique, do mandacaru, da palma de ema.  Ou ainda ficar ariado e se perder na caatinga enganado pela Caipora.  Tudo é possível, mas os bodes com seus cascos fortes, estes andam bem por aqueles terrenos pedregosos e espinhentos e você pode ir atrás deles, seguindo a veredinha que vão deixando. E,  claro, sempre de sapatos.

Dona Joana diz que bode come cansanção quando não há outra coisa, mas,  embora possa até engordar,  é bicho que não dura muito quando entra nesta dieta.  Já folha de umbu deixa o bode esperto, com o pelo bonito, lisinho, logo ganha peso, logo a fêmea  está  parindo.  Estas folhas são gostosas pra gente também, ácidas como vinagreira, podem ser comidas até cruas na salada, embora não seja muito do hábito na cidade nestes dias atuais. Tampouco é comum encontrar quem ainda coma a batata do caroá, um tipo de gravatá, ou mocó de macambira, que é o broto docinho, macio e crocante da bromélia espinhuda.  Ou o miolo do cacto xique-xique assado, ou a cabeça-de-frade assada recheada com carne de caça. Mesmo porque há muitas destas plantas já em extinção e a caça, ninguém se atreve a comer, pelo menos publicamente.

Considerada a capital do bode naquele Sertão do São Francisco, Uauá tem a melhor carne porque ela já vêm temperada, dizem os criadores.  A dieta seleta composta de frutos e folhas de umbu, macambira, quebra-facão, carqueja, favela,  é complementada ainda com velame, uma erva aromática abundante na região. Os entendidos na carne sabem quando o bicho se alimentou com esta erva que serve também para intercalar as mantas embaladas para transporte.  Vai mandar bode para o filho em São Paulo?  Coloca galhos de velame no meio, que é pra não estragar.

Além do velame, há outras ervas aromáticas na Caatinga, como o alecrim-do-campo que em Uauá tem um perfume e em Canudos já é outro. Ana Luiza Trajano, do restaurante Brasil a Gosto também esteve no festival e ficou fascinada com o perfume do alecrim de Canudos que tem folhas muito miúdas, ramagem seca e sabe à lavanda.  Quando tem oportunidade, o bode se tempera também com ela.

Acontece que quase toda a carne consumida em Uauá é de bode de sol. Ou de galinha de capoeira.   De vaca, quase não há. O bode  é abatido, limpo e aberto com o primor de um cirurgião a dissecar para que fique como um tapete pintado em branco e vermelho.  O sal é pouco, que é só pra suar. Com o tempo seco, em cerca de 24 horas a carne já está desidratada, pronta para ser vendida no galpão coberto que é a grande atração na segunda-feira,  dia de feira de rua, outro acontecimento na cidade.  Que raça é, pergunto ao vendedor de bode. Pé duro, responde. Tudo ali é pé duro. Porco pé-duro, bode pé-duro, gado pé-duro e galinha de capoeira, o que quer dizer que é tudo animal sem raça definida, rústico, mestiço.  

E aí está o segredo daquele bode criado sem ração, só com a comida e o tempero que a Caatinga lhe dá.  Pra não dizer que o bode se vira sozinho, às vezes corta-se raquete de palma ou sapeca-se mandacaru pra tirar o espinho e alimentam-se assim os bichos. Há quem cultive mandacaru só pra servir de ração aos bodes. É o caso do Seu Afonso Almeida da Silva, que tem em sua casa um banco de sementes comunitário invejável e produz, além de maracujá-da-caatinga, uma roça de mandacarus sem espinhos desenvolvidos pela Embrapa.  
Pelo menos bode a gente encontra em todos os restaurantes e é sempre muito bom.  Pode ser carne em molho ou assada, mas saiba que assada quer dizer frita em óleo até ficar sequinha.  Dá pra ir comendo em lascas, deliciosa, com farinha.  Só falta mesmo para acompanhar o vinagre de umbu, que quase ninguém mais faz. Lembrando que  vinagre de  umbu não é límpido como aquele ácido acético que gente conhece com tal, mas um fermentado de umbu, reduzido no fogo de lenha até ficar preto, ácido e doce sem ter levado açúcar. Pode ser comido puro com carne ou feijão, usado fazer refresco e até umbuzada,  o nosso iogurte do Sertão feito também com o fruto fresco maduro e cru ou inchado e cozido.
Carne de bode também pode ser a refeição dos padeiros quando acabam de assar a fornada de pãozinho depois de uma jornada exaustiva. Com o forno quente, aproveitam para assar, e aí sim é assar, pedaços de carne que comem como aperitivo ainda pela manhã. As padarias artesanais têm lindos fornos de lenha e valem uma visita. Os padeiros geralmente desconhecem fermentação natural mas usam uma quantidade mínima de fermento comprado, deixam a massa trabalhada manualmente fermentando a noite toda e assam em grandes fornos de barro de madrugada.  Padarias fazem apenas pão, um ou dois tipos, além da xeba, um pão chato feito com a mesma massa do pão salgado, só que coberto com açúcar, quase como um focaccia doce. E favor não confundir padaria com confeitaria, esta sim com vários tipos de pães, bolos, doces e outros confeitos. 

Então o festival do umbu é assim,  bem  grande, a perder de vista naquele tapete amarelo de catingueiras. Pra ficar perfeito, só falta ter produtos de umbu nas confeitarias, nos restaurantes,  nas lanchonetes e na merenda escolar.  E cerveja de umbu nos bares, que ninguém é casco duro como bode. 

E aqui, algumas fotos: 


Alecrim de Canudos e flores de catingueira - duas aromáticas do Sertão

Sabores do Sertão na cachaça

Carne de bode, lanche dos padeiros

Juan e dona Júlia fazendo umbuzada

Pietro e Joaninha do Sertão






terça-feira, 28 de junho de 2016

Feijoada do aikido em Piracaia

Eu aqui representada pelos meus pés na cadeira 


Como todos já sabem, não vendemos o sítio e estamos aproveitando cada vez mais - e, sim, continuamos trabalhando muito também, mas estamos curtindo ver as mudanças.  Cada vez que mostrávamos para os interessados, mais interessados ficávamos nós pelo espaço. Então este processo foi bom e necessário.

Neste último fim de semana tivemos novamente encontro com o pessoal de Aikido do Marcos - o Aikido da Vila fica na Vila Madalena (tem facebook) e a comida foi feijoada. Quando todos chegaram para o Dojo do Doc, como é chamado de brincadeira o espaço que temos lá para os tatames, já havia uma mesa montada para a diretoria - também de brincadeira, pois depois desarrumamos a mesa e todos se serviram igualmente. A comida já estava pronta, fiz quase tudo de véspera, mas ainda sobrou muito trabalho na cozinha e todos ajudaram na finalização.

Aqui, algumas fotos.  Outras mais estão aí do lado direito, no instagram neiderigo.

Muitas mãos pra ajudar
3 kg de feijões, 10 quilos de carnes 
Havia mais duas panelas de feijoada! 
E ainda teve fogueira e cantoria
Beto, o pequeno estudioso de pancs (adorou conhecer as plantas comestíveis)





segunda-feira, 27 de junho de 2016

Tortillas de banana verde

Claro, tortillas deliciosas são aquelas feitas com milho nixtamalizado, especialmente quando você mesmo planta o grão, colhe, nixtamaliza e tritura. Eu já fiz tudo isto e o resultado já mostrei aqui anos atrás. Essencial ler os dois: aqui e ali.  Perfeição seria mesmo comê-las no México.

Mas por enquanto ficamos por aqui  e com o que temos de mais farto - bananas. Bananas verdes não servem apenas para fazer polpa de banana a que chamam biomassa.  Há uma infinidade de pratos a serem feitos com bananas verdes amassadas ou picadas e cozidas.  As tortillas foram feitas com a polpa cozida e passada no espremedor de batatas de modo a não ficar tão homogênea. Por isto, não é bom bater no processador. Neste caso a polpa ficaria mais mole, difícil de amassar pra tortillas.

Tortillas de banana verde. O que você tem a fazer é colocar as bananas verdes com casca bem fechadas (sem cortes ou machucados), bem lavadas, numa panela de pressão, cobrir com água fria, fechar e levar ao fogo. Quando a válvula começar a apitar, desligue o foto e espere acabar a pressão. Deverá estar bem macia, com a casca partida. Se não, cozinhe mais.  Descasque, passe por espremedor de batatas enquanto ainda está quente, tempere com sal a gosto e espere esfriar.  Retire bolas da massa e prense entre duas folhas de plástico até a massa ficar fina para tortillas. Use duas tábuas para fazer isto ou uma prensa para tortillas. Retire a folha de cima, segure a parte sem plástico com a palma da mão, tire o outro plástico e passe a massa para uma frigideira antiaderente já quente. Deixe dourar de um lado, vire com uma espátula e doure do outro. Simples assim.

Sirva com abacate, guacamole, peixe, carne, o que quiser.  Fica com sabor bem neutro e é boa opção para crianças com intolerâncias, para celíacos, para quem não quer comer trigo, gordura, leite, ovo. É isto. Nhac!




sexta-feira, 24 de junho de 2016

Aquela sua waffle maker ...

Waffle de verdade gosto de fazer na lenha. Faz um tempão que não uso minhas formas de ferro que se encaixam na bola do fogão de lenha. Mas tenho também uma forma elétrica que paguei 10 pilas num brechó e ultimamente tenho feito bom  proveito dela. Tudo ali, menos waffle. Outro dia mostrei rodelas de berinjela. As de hoje, cortei de comprido e o tempero, a gosto.

Mostro aqui outros vegetais e até o beiju de massa de mandioca que ficou delicioso - com coco fresco, um pouco de açúcar e erva-doce, como comi no Marajó.

Os quiabos e as berinjelas são meus preferidos e as pimentas também ficam lindas. Quando tiver algo úmido, pegajoso, doce, é só isolar as chapas com folhas de bananeira ou de amendoeira. E nhac!



Meu livro chegou! Mesa Farta no Semiárido

Não sei se já sabe, mas agora tenho um livro pra chamar de meu. Não é exatamente um livro autoral porque foi encomendado e fiz de acordo com os objetivos de quem me contratou, a Coopercuc, cooperativa de Uauá-BA a quem devo muita gratidão pela oportunidade de mostrar um pouco do meu trabalho para merendeiras, nutricionistas e produtoras rurais. O projeto teve apoio do Programa Semear com financiamento de órgãos internacionais (FIDA/IICA/AECID). A maioria das receitas do livro são do blog, mas tem também aquelas que fiz especialmente para as oficinas com as merendeiras usando os produtos locais. A ideia é mostrar como os produtos cultivados atualmente no Semiárido podem ser preparados,  incentivando assim o uso deles na merenda escolar e na casa dos agricultores.  São receitas simples, saudáveis, com o mínimo de ingredientes processados que atendam não só adultos mas crianças pequenas e em idade escolar. 

Infelizmente não está à venda - foi feito para ser distribuído gratuitamente para o público alvo, escolas, instituições, mas a Coopercuc estuda a possibilidade de venda. Quem sabe se houver bastante demanda, a segunda edição para venda não aconteça mais rapidamente. Então, se tiver vontade de ter o livro, escreva para a Cooperativa manifestando seu interesse: 
Coopercuc: jussara@coopercuc.com.br

Independente disso, logo teremos link para baixar o livro em pdf no site da cooperativa: www.coopercuc.com.br/

As mulheres da oficina em Caraças, Itaoca, no Vale do Ribeira gostaram do
livro pois muitos produtos da agricultura familiar são os mesmos no Brasil
inteiro e o gosto pela cozinha, idem. 






quinta-feira, 23 de junho de 2016

Artigo da Ana Sachs

Castanha do Maranhão. Foto: Ana Sachs

Lindo artigo da Ana Sachs no site da São Paulo Saudável.  Clique aqui.

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Oficinas de culinária no Vale do Ribeira


Na semana passada estive dando oficina de culinária no Vale do Ribeira, uma atividade promovida pela Sof - Sempreviva Organização Feminista com mulheres agricultoras atendidas pelo programa de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER). O  programa foi criado pela organização em 2015 para apoiar a cadeia de produção e consumo de alimentos. E aí entra minha parte: o autoconsumo.

A Quitandoca, que vende aqui em São Paulo, no bairro de Pinheiros, produtos  agroecológicos da agricultura familiar do Vale do Ribeira, também estava presente com Gabriela e Janaína que ajudaram bastante na oficina desde o momento em que colhemos flores de mamão na estrada. Vivian, agrônoma que foi minha professora numa curso de horticultura orgânica e virou amiga, e trabalha para a Sof na parte de agricultura do programa, era quem estava à frente e conhecia os caminhos para chegar ao Quilombo Cangume e ao bairro rural do Caraças, ambos no município de Itaoca. 



A casa de pau-a-pique onde aconteceu a roda de conversa. 


Dona Antônia colocando o feijão no fogo pra janta. 

Ao Quilombo chegamos já de tardinha. O lugar é lindo e fica no alto de uma região bem montanhosa.  Nos alojamos numa casinha de pau-a-pique onde Dona Antônia cozinhava o feijão no fogão de lenha. Aos poucos foram chegando as mulheres e se abancando onde havia espaço. O pilão centenário virado de ponta cabeça era um dos bancos. A roda de conversa girou em torno do tema comida, é claro. Mas o que eu queria provocar era uma discussão sobre o que comíamos no passado e não comemos mais. Porque na época da necessidade havia cará, inhame, mamão verde, batata doce e agora, segundo eles próprios, a criançada e os mais jovens não querem mais comer estas coisas?  E elas mesmas foram refletindo sobre isso. Uma das mulheres resumiu: "Antigamente a gente tinha de tudo nas roças e achava que não tinha nada. Mas indo pra cidade e olhando pra trás a gente vê que havia fartura. A gente só não tinha aquilo que o povo da cidade tinha".  Pois é, alimentos industrializados estão por toda parte modificando hábitos. 

Vista do Quilombo Cangume ao longe 

O campinho do Quilombo
Uma particularidade neste lugar é que os porcos são criados soltos como galinhas e as roças precisam estar longe - algumas estão a uma hora de caminhada. Perguntei se não era mais fácil manter os  porcos presos e a resposta foi gourmet: se ficam confinados a carne não fica boa, não. 

Cada um arrumou um cantinho pra sentar. E dona Antônia contou histórias

Como do Pilão que o pai fez pra mãe na época do casamento 

Apesar do frio que castiga plantas, havia uma hortinha cercada com alguns temperos e remédios. Cordão de frade pra febre, cataflam (boldinho) pra gripe etc. Do mato chegam casca d´anta pra ficar forte e temperar sopa de mandioca.   Ao pilão de temperos, casca d´anta, pimenta, sal, alho e ... sazon. Mamão verde que comiam antes, dizem que parece batata, mas os mais jovens já não comem d iguaria.  Enfim, este papo iria longe se a noite e o frio não chegassem tão cedo. No outro dia, oficina no bairro rural de Caraças. 

Gabriela e Janaína ajudando na colheita de flores de mamão

Urucum 

Logo na estrada chegando a Caraças já fomos vendo muitas culturas comestíveis. Urucum, mamão verde. Aliás, paramos o carro e lá fomos colher flores de mamão macho que ficam gostosas (e amargas!) em refogados. 

A estradinha por onde andamos para colher nossos ingredientes

Caminhada de aprendizado 
Duda escolhendo feijão
Na entrada do bairro, uma igreja, o salão, as casas todas perto umas das outras assim como são as relações de parentesco e amizade por ali. As mulheres foram chegando. Irmã de uma, comadre da  outra, prima do marido, madrinha da filha, afilhada da mãe e assim são aquelas mulheres que, antes de correr pra oficina, dão comida aos filhos que vão a escola, deixam o feijão escolhido, adiantam a farinhada de amanhã e deixam a marmita pronta pro marido.  Ainda sobra tempo para andar pela estradinha de terra pra nos mostrar o que nasce ali espontaneamente de comida e remédio e também o que cultivam. 

As bananas da casa da Regina

Nossa colheita 

Procurando pimenta cumari

Colhendo mandioca 
Fomos colhendo corações de banana, mamão verde,  pimentinhas, mandioca, folhas de batata doce, beldroegas, temperos. E ainda fomos ver o rio de águas frias e limpas. Voltamos para a casa da Regina onde um tucano que come banana amarrada ao mamoeiro carregado nem se intimidou com nossa presença e em cuja cozinha o fogão de lenha já crepitava a espera das panelas. 

Nossa colheita do dia para a oficina 


Pimentas 

Flores do coração da bananeira 
Depois de uma conversa, não precisei dar atividade pra ninguém. Elas mesmas já escoladas na arte de se ajudar (no bairro há muitas atividades coletivas) foram adiantando o que já sabiam - descascando cebolas, ralando mamão verde, separando as flores do coração de banana. Logo estava tudo pronto à mesa. Elas estavam falantes, alegres, confiantes.  Eu nem sabia o que faria e o que encontraria para a oficina mas acabou como um momento de trocas e aprendizado dos dois lados - espero. 
Bastava dizer bijajica pra todo mundo cair na gargalhada 

Elas gostaram do meu livro - que fiz pra Coopercuc

Tanto no Cangume como no Caraças deixei também um pouco de levain (a isca do fermento natural) e já fiquei sabendo que pelo menos no Caraças já sairam duas fornadas de pão ao levain. 

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Mesa posta 
Flores de mamão - eu adorei, mas é um prato amargo