sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Nas nossas escolas, não! Vamos assinar este abaixo-assinado ?


Texto copiado do www.change.org. Clique e assine o abaixo assinado. Tenho certeza que os leitores do Come-se hão de concordar.  Veja todas as instituições que assim.

Carta aberta* ao chef Jamie Oliver


Brasil, agosto de 2016.


Nós, cidadãos e organizações da sociedade civil comprometidos com a saúde e o direito humano à alimentação adequada, vimos através desta manifestar nosso repúdio à parceria estabelecida entre o senhor e a Sadia para o projeto “Saber Alimenta”. Este programa prevê a realização de supostas "atividades educativas" em escolas, ao passo que sabemos que crianças devem ser protegidas contra práticas abusivas de comunicação mercadológica, como ações de merchandising dentro do ambiente escolar. A alimentação adequada e saudável é um direito humano, reconhecido em inúmeros documentos internacionais, nacionais e incluído na constituição brasileira. Não queremos que nossas crianças sejam transformadas em promotoras de produtos de qualquer marca. Esperamos que, diante de nossas considerações expostas ao longo desta carta, o senhor tome as medidas necessárias para impedir a exposição de crianças aos produtos e aos programas da Sadia e reconsidere sua decisão de vincular sua imagem a esta parceria.


Direito à Alimentação Adequada e Saudável


O Direito Humano à Alimentação Adequada e Saudável (DHAAS) é composto por duas dimensões indissociáveis: estar livre da fome e ter acesso a uma alimentação adequada. Entretanto, a alimentação foi transformada em mercadoria e, por isso, esse direito está permanentemente ameaçado, mesmo para aqueles que não têm restrições financeiras para comprar alimentos. A AAS não é garantida apenas por características específicas dos produtos alimentícios (equilíbrio nutricional, menor presença de agrotóxicos etc.). A AAS pressupõe o acesso permanente e regular, de forma socialmente justa, a uma prática alimentar adequada aos aspectos biológicos e sociais dos indivíduos, de acordo com o ciclo de vida e as necessidades alimentares especiais. Deve estar pautada no referencial tradicional local e atender aos princípios da variedade, equilíbrio, moderação, prazer (sabor), às dimensões de gênero e etnia, e a formas de produção ambientalmente sustentáveis.


É sabido que o mercado mundial de alimentos é dominado por poucas transnacionais que controlam praticamente todas as etapas do sistema alimentar. Isso gera, em nível global, exclusão, pobreza, fome, obesidade e danos ambientais e sociais no limite da catástrofe. Para o desenvolvimento de ações efetivas de promoção da AAS, é imprescindível ter clareza de seus determinantes e consciência desse cenário.


Os Estados têm a obrigação de proteger, promover e garantir o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA). A legislação brasileira proíbe a publicidade que se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança (art. 37 § 2° do Código de Defesa do Consumidor). Segundo o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), é abusiva “a prática do direcionamento de publicidade e comunicação mercadológica à criança com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço” (Resolução 163 de 2014). De acordo com essa Resolução, “comunicação mercadológica” é toda e qualquer atividade de comunicação comercial, incluindo o merchandising e ações por meio de shows e apresentações, mesmo e inclusive aquelas revestidas de ações chamadas de “educativas”. A sociedade civil brasileira vem atuando, por meio de diversas organizações e coletivos, para que os direitos das crianças sejam protegidos e promovidos. Um dos espaços fundamentais para isso é o ambiente escolar.


Alimentação no ambiente escolar


A escola é um espaço privilegiado para desenvolvimento de valores e hábitos e para a promoção da cidadania e da saúde. O Brasil possui um dos maiores, mais longevos e mais arrojados programas públicos de alimentação escolar do mundo, cujos princípios e diretrizes convergem com a garantia do DHAA. Certamente, ainda há muito o que melhorar, mas são incontestáveis os avanços ocorridos nos últimos anos no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Exemplo disso é a lei que está em vigor desde 2009, que estabelece que pelo menos 30% dos recursos federais repassados aos municípios devem ser destinados à aquisição de alimentos diretamente da agricultura familiar. Esta medida gerou um circulo virtuoso para a economia local, para a melhoria da qualidade nutricional das refeições servidas e para o resgate do patrimônio alimentar local.


Outro elemento fundamental do PNAE são as ações de educação alimentar e nutricional (EAN), que devem ser desenvolvidas diretamente pelos profissionais de educação em parceria com a equipe técnica local do programa - que podem contar com a parceria com profissionais da saúde e de outras áreas (meio ambiente, assistência social etc.). Ainda que sejam muitos os desafios para a qualificação dessa prática e para a sua articulação com o currículo escolar, muito se tem avançado em relação a estas ações no ambiente escolar.


Questões éticas e sociais


Uma questão chave dessa agenda é a garantia de que as ações de EAN sejam absolutamente protegidas de conflito de interesses (CoI). O CoI está presente, por exemplo, quando são estabelecidas parcerias com empresas que possuem produtos, princípios e práticas divergentes (e, em geral, antagônicos) aos princípios e diretrizes que norteiam as políticas públicas de promoção e garantia da AAS. Estas parcerias são claramente uma situação de CoI, porque há um confronto entre o interesse público (promover a AAS na perspectiva que apresentamos no início deste documento) e o interesse privado (ampliar o conhecimento da marca, construir/consolidar uma imagem positiva da empresa, apresentar novos produtos de seu portfólio e fidelizar o mais precocemente possível a clientela, com o objetivo, ao fim e ao cabo, de ampliar suas vendas e seu lucro).


Reconhecemos como conflituosas e abusivas as iniciativas de EAN desenvolvidas em escolas por (ou em parceria com) indústrias de alimentos e outras empresas cujas práticas atinjam os interesses da saúde coletiva


Ficamos surpresos pelo fato de o senhor, um profissional que se apresenta como ativista social, se dispor a atuar em espaços sociais (como são as escolas) em um determinado país que não o de sua origem sem estabelecer qualquer diálogo com os ativistas e os movimentos sociais nele existentes e sem saber se, de fato, a proposta que traz faz sentido para esta realidade. No caso do Brasil, são inúmeros os movimentos, entidades e coletivos que atuam há muitos anos na agenda de promoção da alimentação adequada e saudável que foram surpreendidos com essa parceria com a Sadia e que a identificam como nefasta para o trabalho que vem sendo construído há muitas décadas. O que pode ser uma boa solução para o seu país pode ser uma prática inadequada e até nociva em outras realidades. Diferentemente do seu país, em que mais de 60% das calorias consumidas pela população vêm de produtos ultraprocessados, no caso do Brasil, em que esse número é de 30%, as principais ações de promoção da AAS são a preservação e o resgate da cultura alimentar e não a promoção de produtos ultraprocessados pretensamente mais saudáveis, como faz a campanha que o senhor e a Sadia estão propondo.


Ademais, vale ressaltar que o sistema integrado de produção de frango adotado pela Sadia é alvo de críticas que vão muito além do bem estar animal, uma vez que deixam os produtores associados em situação de extrema vulnerabilidade social – o que configura um dos importantes desafios a serem enfrentados na promoção de um sistema alimentar saudável e sustentável.


Marketing social e merchandising


Consideramos profundamente incoerente que um profissional como o senhor, que vem construindo sua trajetória valorizando as práticas alimentares locais, o meio ambiente e o comércio ético, associe seu nome e sua prática a uma empresa como a Sadia, que: comercializa produtos de "conveniência" como pratos prontos e embutidos, como apresuntado e salsichas; que, pela natureza de seu negócio, objetiva ampliar as vendas e o consumo desses produtos alimentícios ultraprocessados; e que, ainda, possui uma linha de produtos denominada em seu website de "alimentação escolar", que inclui carnes processadas e embutidas, como salsichas de peru, salsichas hot dog e empanados de frango e aves. O Guia Alimentar para a População Brasileira**, publicado pelo Ministério da Saúde em 2014 e considerado por especialistas de diversos países como o mais arrojado do mundo, orienta que seja evitado o consumo de tais produtos alimentícios. Como se não bastasse, nas matérias de divulgação da campanha - que é um dos eixos da parceria - consta a informação de que seu material “está customizado conforme as diretrizes do Guia Alimentar para População Brasileira”, o que está longe de ser verdade. Divulgar esse tipo de mensagem na mídia é um desserviço para a difusão adequada das mensagens do Guia Alimentar e indica práticas e intenções duvidosas.


A parceria com a Sadia prevê a realização de supostas "atividades educativas" em escolas brasileiras por meio do projeto “Saber Alimenta”, apresentado como um “projeto pedagógico que ensina as crianças a serem protagonistas na mudança dos hábitos alimentares dentro de casa e cria uma relação mais próxima delas com os alimentos saudáveis”. Na verdade, a campanha proposta é uma prática de comunicação mercadológica (merchandising da Marca Sadia direcionada ao público infantil dentro de escolas) maquiada de ação educativa, e por isso abusiva, conforme definido pelo CONANDA. De acordo com o site da Sadia, o projeto "Saber Alimenta" da Sadia chegará a centenas de escolas em São Paulo e Santa Catarina, visando alunos do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental I, ou seja, crianças com idade entre 6 e 10 anos!! Trata-se de um público extremamente vulnerável, cuja deficiência de julgamento e experiência, própria de sua faixa etária, não lhes permite reconhecer os objetivos finais de persuasão e fidelização dessa ação de marketing. Esse projeto pode, portanto, ser caracterizado como uma ação de branding, cujo objetivo final é desenvolver positivamente a reputação da marca e de seus produtos e, assim, fidelizar o público consumidor desde a infância.


A título de ilustração, citamos dois exemplos de abusividade e enganosidade que podem ser observados na campanha: (a) a letra inicial do projeto “Saber Alimenta” é grafada da mesma forma que a letra inicial da logomarca da Sadia e (b) as receitas e outros materiais da campanha estimulam o consumo de produtos ultraprocessados da Sadia apresentando-os como “deliciosamente saudáveis”, o que, conforme já apontado, não atende às recomendações do Guia Alimentar para a População Brasileira.


Somos pais, mães, cidadãos, educadores, profissionais de saúde, pesquisadores, organizações de defesa do consumidor, da saúde, do direito humano à alimentação adequada, da comida de verdade, da construção de sistemas alimentares sustentáveis, justos e saudáveis, e estamos convencidos de que a celebração de parcerias com empresas que adotam práticas de marketing dirigidas ao público infantil em nada contribui para a promoção da AAS; ao contrário, pode comprometer ações de EAN e outras que de fato promovem mudanças estruturantes. Não queremos que nossas crianças sejam transformadas em promotoras de produtos de qualquer marca. Não é isso que entendemos como protagonismo e autonomia, dois princípios essenciais às estratégias de EAN desenvolvidas em nosso país.


Assim, mediante os motivos expostos, esperamos que o senhor Jamie Oliver utilize seu carisma e força midiática para a promoção da saúde e não para fortalecer o marketing de empresas cujos interesses comerciais se sobrepõem aos interesses públicos.

Para assinar: clique aqui.
Colocamo-nos à disposição para esclarecer e aprofundar os vários pontos apresentados nessa comunicação.


Assinam:


- AAO – Associação de Agricultura Orgânica


- ACAN – Associação Catarinense de Nutrição


- ACT - Aliança de Promoção da Saúde


- AGENDHA - Assessoria e Gestão em Estudos da Natureza, Desenvolvimento Humano e Agroecologia)


- Alianza ENT (Enfermidades non transmisibles) – Peru


- ASBRAN - Associação Brasileira de Nutrição


- Associação Alagoana de Nutrição – ALNUT


- Associação de Nutrição do DF – ANDF


- Associação de Nutrição do Estado do Espirito Santo - ANEES;


- Associação de Nutrição do Estado do Rio de Janeiro – ANERJ


- Associação Gaúcha de Nutrição - AGAN;


- Associação Paulista de Nutrição – APAN


- Associação Pernambucana de Nutrição – APN


- Associação Slow Food do Brasil


- Associação Sul-Mato-Grossense de Nutrição – ASMAN


- Canal do Campo a Mesa


- Centro Ecológico Rio Grande do Sul


- Conselho da Cultura Alimentar de Curitiba


- Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional de Caxias do Sul


- Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Santa Catarina – Consea/SC


- Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Sergipe – Consean/SE


- Conselho Regional de Nutricionistas - 10a Região - CRN 10


- Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Sergipe – DNUT/UFS


- FASE - Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional

- CERESAN - Centro de Referência em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional


- FENACELBRA - Federação Nacional das Associações de celíacos do Brasil


- FBSSAN – Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar


- FIC México - Fundação Interamericana do México


- Gestores do projeto interinstitucional “Alimentos bons, limpos e justos: ampliação e qualificação da participação da Agricultura Familiar brasileira no movimento Slow Food”


- IBFAN - Rede Internacional em Defesa do Direito de Amamentar


- IDEC - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor


- Instituto Alana – Projeto Criança e Consumo


- Instituto Kairós


- Instituto Pólis


- Instituto REAJA - Rede de Estudos e Ações em Justiça Alimentar


- ISPN - Instituto Sociedade, População e Natureza


- MILC - Movimento Infância Livre do Consumismo


- MSP Brasil – Movimento pela Saúde dos Povos Brasil


- Núcleo de Alimentação e Nutrição em Políticas Públicas da UERJ - Universidade do Estado do Rio de Janeiro


- Núcleo de Pesquisa de Nutrição em Produção de Refeições da Universidade Federal de Santa Catarina (NUPPRE-UFSC)


- NUPENS - Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo


- Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição. Universidade de Brasília


- Observatório de Segurança Alimentar e Nutricional do Estado de Sergipe (OSANES)


-ONCB - Organização Nacional de Cegos do Brasil


- PROSAN - Promoção da Segurança Alimentar e Nutricional no Contexto da Alimentação Escolar da Universidade Federal de Viçosa


- Rebrinc - Rede Brasileira Infância e Consumo


- Rede Brasileira de Professores de Universidades Públicas


- Rede de Mulheres Negras para Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional/REDESSAN


- REDENUTRItodos


- SINESP – Sindicato dos Nutricionistas do Estado de São Paulo


- SINUSC – Sindicato dos Nutricionistas no Estado de Santa Catarina


- Slow Food Educação


- UBM - União Brasileira de Mulheres


- WPHNA World Public Health Nutrition Association






* Esta carta foi motivada pela divulgação da parceria do Frigorífico BRF (detentor das marcas Sadia, Perdigão e Qualy) com Jamie Oliver, chef internacional, conhecido pelo seu movimento "Food Revolution", que tem como focos de ação: educação alimentar, nutrição, desperdício alimentar, sustentabilidade, culinária e comércio ético (o que inclui o bem estar dos animais criados para consumo humano). Esta parceria ganhou notoriedade e gerou controvérsias pelo volume do investimento financeiro envolvido, pela união de atores com práticas aparentemente não convergentes, pela ação publicitária massiva e articulada para o seu anúncio e pelo público de interesse (escolares, em uma das vertentes de ação)




**http://dab.saude.gov.br/portaldab/biblioteca.php?conteudo=publicacoes/guia_alimentar2014


Este abaixo-assinado será entregue para:

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Banana verde. Coluna do Paladar, edição de 01 de setembro de 2016

Hoje tem Paladar. Veja no blog do caderno, na versão impressa e também aqui. 


BANANA VERDE
Ver despontar o coração no meio de uma bananeira e depois acompanhar penca a penca o desabrochar das flores que vão sendo expostas em fileiras às abelhas, borboletas e morcegos, vai pela ordem natural das coisas que começam com o manto vermelho se enrolando pra cima para mostrar a cena até chegar ao fruto maduro que,  se a gente não corre pra colher, sobra ao sanhaço comer.   

Então, para consumir com calma, sem medo da concorrência e ainda manter os frutos em casa por vários dias sem se preocupar com o amadurecimento simultâneo de uma penca ou, se tiver sorte, um cacho inteiro de frutas,  uma das opções é consumir o fruto verde. Pode ser banana sapo ou marmelo, prata, nanica e até banana da terra.   Isto, claro, numa situação idílica de plantar e colher. Mas a gente sabe que na cadeia produtiva da banana, do pós-colheita até chegar ao consumidor final, o desperdício da fruta é muito maior.  Infelizmente o consumo do fruto verde ainda é tão pouco difundido que raramente se vê nas feiras e mercados.

Está certo que você vai encontrar informações sem fim sobre os efeitos milagrosos da banana verde por causa da boa quantidade de amido resistente e isto é bem verdade. Este tipo de amido resiste aos processos digestivos e se comporta como fibra que melhora o trânsito e a flora intestinal, diminui a resposta glicêmica e será fermentada no cólon por bifido-bactérias benéficas na prevenção de câncer local. Por este motivo se popularizou o uso da polpa da banana verde cozida e transformada em purê sob o nome de biomassa, que pode ter vários usos como espessante em bolos, pães, massas etc.

O que a gente pouco vê é o uso da banana verde como ingrediente além da biomassa.  Mas andando por aí e ouvindo histórias de outros cantos do mundo descobre-se uma infinidade de usos para a banana verde como se fosse uma batata ou um amiláceo neutro que aceita temperos doces e salgados.

No litoral norte de São Paulo, ela entra no prato caiçara Azul Marinho – um ensopado de peixe com banana verde que, por causa do tanino, confere ao prato um tom azulado. Em várias partes do Brasil ela é usada para substituir a batata em pratos com carne. Ou para fazer chips fritos. Mas os exemplos não são tantos quanto poderiam ser.

Na Ilha do Marajó, tomei  um típico mingau de banana verde com leite de coco feito pela Dona Jerônima Brito que poderia ser eleito o emblema da comida de alma.  Ela usa 3 bananas verdes raladas, 3 litros de leite de coco, 3 colheres (sopa) de açúcar, 1 pitada de sal. Coloca a banana com  um pouco do leite de coco, o açúcar e o sal no fogo e vai cozinhando sem parar de mexer. À medida que vai engrossando, vai juntando mais leite de coco. Cerca de 20 minutos depois, quando todo o leite de coco tiver sido incorporado e a mistura estiver cremosa, está pronta uma tigelada de mingau que lembra o de aveia com a vantagem de yes, nos temos, bananas verdes!

Banana verde com frango faz o godó, um delicioso ensopado típico da Chapada Diamantina, na Bahia! 

Em Cuba, na região costeira de Baracoa, há um tipo de pamonha ou tamale chamado Bacán que é feito mais ou menos assim: ralam-se em ralador grosso 10 bananas verdes, tempera-se com suco de limão, alho, urucum, sal, e pimenta a gosto. Junta-se 1 xícara de leite de coco cozido (deixando reduzir de 2 xícaras para 1) e mistura-se bem. Coloca-se uma colherada de massa sobre folha de bananeira amaciada na chama do fogão e, no meio, o recheio de carne de porco ou de caranguejo bem tem temperado. Depois de embaladas e amarradas, as pamonhas são cozidas em água fervente por 50 minutos. Ficam deliciosas.

Para fazer a polpa cozida que pode ser guardada ou usada imediatamente, coloque as bananas verdes de qualquer tipo na panela de pressão, cubra com água e leve ao fogo. Quando a válvula começar a chiar, conte 8 minutos, desligue o fogo e espere acabar a pressão. Abra, tire as cascas – que certamente estarão já meio abertas – e passe por espremedor de batata ou triture com o mixer.  Neste ponto, já poderá guardar para uso posterior na geladeira ou no freezer.

Gosto de colocar esta polpa cozida na massa de pão feito com levain. Algo como 500 g desta massa para 1 quilo de farinha.  Quando passo ainda quente por espremedor da batatas, espero esfriar um pouco, tempero com sal e faço tortilhas. Achato a massa entre duas folhas de plástico até ficar fininha, podendo usar uma prensa própria ou duas tábuas.  Basta, então, tirar o plástico, colocar a massa sobre uma frigideira antiaderente bem quente para dourar dos dois lados e rechear como uma tortilla de milho.

Nas sopas-cremes esta polpa pode aumentar o volume, melhorar o valor nutritivo sem alterar em nada o sabor. Já fiz com ela molho branco para gratinar – uma vantagem para quem não pode com o glúten -, caldo verde,  nhoque, purê com leite de coco e cúrcuma e outras invencionices que a versatilidade do ingrediente sugere. Tente fazer homus e molhos apimentados para comer com pão ou tortillas. 

Ultimamente tenho gostado de repetir esta nova criação, cuja receita apresento. O mais trabalhoso é cortar a banana em tirinhas como se fossem macarrões, mas chega a ser relaxante quando se pensa no resultado. Para o molho, me inspirei no “espaguete com anchovas e pão” que Patrícia Ferraz publicou aqui meses atrás e deu muito certo, garanto. 

Banana verde com pão e ervas

500 g de banana verde crua descascada (use faca ou descascador de legumes até chegar na polpa branca)
1 limão siciliano
4 colheres (sopa) de azeite
1 dente de alho pequeno picado finamente
2 colheres (sopa) de ervas espontâneas picadas (mentruz rasteiro, guasca, capuchinha etc.)
1 pitada de pimenta calabresa
1 fatia de pão caseiro esmigalhado, finamente picado ou passado por processador
Sal a gosto

Corte as bananas em fatias de comprido e depois, cada fatia em tirinhas.  Vá deixando em uma tigela com água enquanto termina de cortar. Leve ao fogo uma panela com 2 litros de água, meia colher (sopa) de sal e suco de meio limão. Cozinhe as tirinhas de banana aos poucos  (1/3 de cada vez) por 1 minuto na água fervente. Retire com escumadeira e reserve. Em 1 colher (sopa) de azeite, doure o pão esmigalhado e reserve. Coloque o azeite restante e o alho numa frigideira grande, leve ao fogo e deixe começar a dourar o alho. Junte as ervas picadas e a pimenta e desligue o fogo.  Acrescente o suco do limão restante e, em seguida,  a banana escorrida. Misture delicadamente, espalhe por cima a farofa de pão e sirva.  Rende: 4 porções



quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Folhas de mostarda já não tão macias, mas orgânicas, enormes. Omelete!


Inverno é tempo de mostarda. No sítio, em Piracaia, elas já estão em processo de "desdomesticação" e, quando é tempo, nascem até na porta da casa. Agora, quando estão na horta e recebem água todos os dias, aí sim crescem como loucas.

Arranquei umas folhas enormes que já não estavam tão macias, mas ainda assim picantes e deliciosas. Um tanto sempre deixo para que elas dêem sementes. As vagens vão estourar e espalhar as sementes para a próxima estação.

De vez em quanto também compro na loja de temperos e espalho por lá sem me preocupar onde vão cair.

Na porta de casa 
E olhe que minha mão é grande 
Na horta 



Quem nunca comeu folhas de mostarda não sabe o que está perdendo. Tem a mesma picância dos molhos de mostarda, só que com mais sabor. Pode ser preparada como couve. E quando está mais firme, basta juntar um pouco de água quente ao alho frito antes de colocar a verdura. Logo estará cozida e macia. 

Como trouxe muitas folhas tive que inventar moda de usar bastante de uma só vez. Fiz assim, refogada, bem picadinha, e joguei um ovo por cima que foi comida com o pão de abóbora cabochá - tem receita do pão aqui
Usei também para fazer omelete. Piquei uma folha grande no processador, juntei dois ovos batidos, temperei com sal e pimenta e levei pra cozinhar numa omeleteira untada com azeite nas duas partes. Coloquei por cima umas fatias de queijo de coalho e sementinhas de mostarda. Virei para cozinhar do outro lado e Nhac!  (e outro tanto passei em água fervente pra murchar, escorri, piquei no processador e congelei em porções  - para sopas, omeletes etc - não dá pra desperdiçar umas folhonas lindas e orgânicas assim só porque estão mais duras). 

Omelete

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Espumante de kombucha com ervas, especiarias e flores

Há algum tempo publiquei aqui como fazer kombucha. Está tudo explicadinho. Ultimamente tenho aumentado a produção e feito com chá mate, chá verde, mate de chimarrão, chá preto e também hibisco (este chamo de kombisco porque em vez de usar os chás ricos em cafeínas, uso a mãe do kombucha em infusão de hibisco).

Tenho também, cade vez mais, aromatizado as bebidas com infusões de ervas, flores, especiarias, xaropes e sucos. Depois de uma semana de fermentação, tiro a bebida e dou-lhe algum sabor antes de deixar fazendo a segunda fermentação na garrafa. Não precisa, a bebida está pronta pra beber depois da primeira fermentação, mas eu gosto de temperar e deixar fermentando mais para criar espumas.

As últimas que fiz e que ficaram bem boas levaram ervas, especiarias e flores num; e cenoura, cardamomo, cúrcuma e mel noutro.

Para fazer o de ervas, coloque num vidro com tampa de presilha o kombucha pronto, pimenta rosa, folhas de pimenta rosa (aroeira), folhas de gerânio, folhas de poejo, folhas de manjericão-cravo, 1 semente de amburana, uma flor tagete, umas 3 pimentas da jamaíca, 3 grãos de zimbro. Ou use outros sabores que tiver por perto.  Tampe e deixe 24 horas. Peneire, junte 1 colher (sopa) de açúcar rasa por litro de kombuchá, coloque numa garrafa pet sem encher. Esprema para murchar a garrafa e feche. Deixe em temperatura ambiente até a garrafa estufar - cerca de 3 dias ou mais. Passe para a geladeira e sirva gelado. Pode durar até 1 semana ou mais na geladeira. Se estiver muito estufada, desrosqueie um pouco a tampa para sair o excesso de pressão. Gosto de usar garrafas de vidro tipo growler, aquelas de cerveja com presilha - neste caso, todos os dias, abra devagar a tampa pra ver se pegou pressão. Assim que estiver pronta, passe para a geladeira. Se esquecer em temperatura ambiente, pode explodir.

Para fazer o de cenoura: para cada litro de kombucha, adicione 1 xícara de suco feito assim: bata no liquidificador 1 cenoura, 1 rizoma de cúrcuma, sementes de um vagem de cardamomo e água pra completar 1 xícara de suco. Peneire em pano, junte ao kombucha e tempere com 2 colheres (sopa) rasas de mel de mandaçaia ou jataí. Coloque na garrafa pet e proceda da mesma forma que o anterior. Sirva gelado. Ficam com sabor de cerveja. Foram nossas bebidas de fim de semana em Piracaia.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Um lanche na aldeia



Continuando a viagem a Aracruz, no Espírito Santo, só queria mostrar um fato inédito: o encontro de jovens de 4 aldeias tupinikim que não se conheciam. O encontro foi promovido pela Kamboas Socioambiental, que me convidou. Os jovens, bonitos e musicais, levaram seus colchões, seus instrumentos e entraram num ônibus que os levou até a beira do rio que margeia a aldeia Comboios. Atravessaram o rio de barco, se instalaram nas salas da escola municipal e participaram de atividades integrativas. Nina Kam, da Kamboas, e eu, só chegamos no dia seguinte, domingo, quando os jovens já estavam integrados. Na cozinha da Kamboas, onde fiquei hospedada, preparamos o lanche que encerraria o encontro no domingo. Tentamos usar o máximo de ingredientes locais.

Acostumados a muito açúcar, não acharam muita graça no chá mate gelado com folhas de canela e limão que fizemos bem docinho - ainda assim devem ter achado fraco de açúcar. Disseram que a canela estava forte, mas desconfiamos do açúcar, já que a canela em folhas é mais delicada. Gostaram também da torta de manga verde, do creme de mandioca que cobrimos com doce de leite, e do pão de abóbora com fermentação natural (sorte que levei meu levain na bolsa, como sempre faço).  Agora o que adoraram mesmo foi o bolo de abóbora com mandioca. Está certo que o cobrimos com chocolate porque eles gostam de doce e rejeitam o ácido, mas disseram que parecia bolo de cenoura. Não sobrou nada.

Bem, melhor ver as fotos:

Era uma vez um bolo de abóbora 


A torta e as outras comidas no porta-malas 
  


A Aldeia Comboios é linda









Não dourou mas ficou bom!

Dourou o que foi assado em panela com tampa 

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Entre panc e Tupinikim capixabas

Estive nos últimos dias no Espírito Santo, mais especificamente em Aracruz, onde se concentra grande parte do trabalho da Kamboas Socioambiental junto aos índios Tupinikim e Guarani. A ideia era conhecer um pouco da realidade alimentar das aldeias para nas próximas visitas poder ajudar a encontrar alternativas mais saudáveis. Mas, mesmo sem ter preparado nada de especial dada a minha completa ignorância, conseguimos fazer dois passeios para reconhecimento das espécies comestíveis. Por onde andei vi que comem mal como quase todo o resto do Brasil. Muita comida processada, pouca comida com ingredientes frescos e vegetais. Quem participou (mais mulheres, claro), gostou de me mostrar o que tinham de nativo e de plantado especialmente de medicamento. E eu ia apontando o que havia de espécies comestíveis espontâneas e que eles não conheciam ou pelo menos não como comida. No fim, montamos uma mesa com as espécies de comer e de curar.

Fora isto, fizemos um lanche com jovens de 4 aldeias em intercâmbio em uma delas. Usei produtos locais como manga verde, abóbora madura e aipim. Mas falo disso em outro post.

E durante minha estadia em Coqueiral de Aracruz não pude deixar de sair à caça de pancmons (plantas alimentícias não convencionais + mons, a febre do momento) pelas ruas, claro. Descobri que ali há muita árvore de monguba (Pachira aquatica), por exemplo, e pude me deliciar.  E ainda algas comestíveis (só lavei, fotografei, mas não comi, sem saber como andam aquelas águas), bromélia, abricó da praia e ervinhas que a gente encontra em todo lugar.

O dia-a-dia desta estadia capixaba já registrei no Instagram, que você, mesmo que não tenha conta, pode acessar clicando aí do lado direito nas fotos e vendo as legendas.

Aqui, algumas destas fotos:

Fruto da monguba 

Blutaparon portucaloides ou bredo-de-praia. Come-se! 

Gravatá ou caraguatá (Bromelia antiacantha) 

Manga verde. Os pés estão carregados

Ela levou as verduras pra fazer refogadinho pro jantar . Aldeia Areal 

Índias Tupiniquim, Nina e Bona, da Kamboas; e o banco cheio de espécies
úteis - alimentícias e/ou medicinais. Na aldeia Areal.

Urtiga

Caçando pancs na aldeia = pancmons ou pancnaldeia . Aldeia Areal 

Urtiga em flor (usam o chá para próstata)


Aloysia gratissima ou garupá ou alfazema brasileira - ninguém por lá usa
como tempero, mas fica ótima na carne de porco, no abacaxi etc 
Nina colhendo beldroegas para nosso jantar na roça de Dona Dora que
traz as abóboras para o pão do próximo dia.  Aldeia Pau Brasil

Fruta pão, esta maravilha da natureza exótica! Está ali por toda parte. 

A castanha da monguba 

Espécies medicinais

Resultado da nossa caçada pancmon na Aldeia do Irajá

Olhe o galhinho nas mãos da menininha. Ela adorou a caçada panc.

Dona Santina, da Aldeia Irajá, e suas bromélias 


Dona Santina diz que planta comida, planta remédio e planta flores e
folhagens ornamentais para alegrar a alma Aldeia Irajá. 

Nossa turminha da Aldeia Irajá 

Quem diria que encontraríamos tanta espécie comestível no meio deste
capim. 

Só por curiosidade, um cogumelo no cupinzeiro 


Aldeia Irajá 

Bona é o agrônomo agroecológico da Kamboas Socioambiental que faz um
 trabalho lindo de agrofloresta nas aldeias e conhece muito de panc (e adora
crianças!)

Beldroega (Portulaca oleracea)

Algas que colhi na praia 

As castanhas da monguba

Abricó da praia - Mimusops commersonii . Come-se! 

Crepis japonica - no quintal da Kamboas. Come-se! 

Xanana no quintal da Camboas. Come-se!

No quintal da Kamboas. Comem-se!

Resultado do trabalho do Jerônimo Vilas Boas, da Kamboas.  Abelhas
nativas sem ferrão para a produção de mel entre os índios Tupinikim e Guarani
e que em breve estará no mercado (de Pinheiros, por exemplo)


Beldroegas com farofinha de pão no nosso jantar 

Galo com monguba. O Galo e as ervas para sua marinada (alfavacão e garupá)
vieram de aldeia tupinikim, a técnica e a receita com vinho, da Nina Kam,
e a monguba foi intromissão minha. O aipim que também veio da aldeia
complementou. E ficou um prato delicioso. Pode acreditar. Nhac!