quinta-feira, 13 de junho de 2019

Farinha de raspa. Coluna do Paladar de 13 de junho de 2019

Hoje tem coluna Nhac no Estadão. Está no jornal impresso,  lá no site do caderno Paladar e também aqui: (já falei da farinha de raspa e dei receitas também aqui no blog - veja aqui e ali.) 


FARINHA DE RASPA

Acabo de voltar do Piauí e a cada viagem que faço por estes rincões do Brasil descubro, maravilhada, diferentes subprodutos da mandioca ou nomes regionais variados para um mesmo produto. Aprendo também com os seguidores virtuais de todos os cantos.
Há dois anos mostrei no meu blog como fazer farinha de raspa e acabei aprendendo mais com os comentários do que o que eu já sabia.  Por exemplo, a leitora Vanilda Fernandes Firmo contou que em Lagoa Formosa, Minas Gerais, faziam a farinha com as mandiocas pequenas que eram difíceis de ralar ou com os toquinhos que sobravam da ralação. Estas aparas eram secas ao sol e depois socadas no pilão.  O que restava na peneira voltava para o pilão e socavam novamente até não sobrar quase nada que não fosse uma farinha finíssima e polvilhada que podia substituir o trigo em bolos e biscoitos.  Quando o processo era feito no monjolo era mais fácil, mas no pilão dava calo nas mãos.  Outra pessoa, também de Minas Gerais, diz que a mãe fazia esta mesma farinha a que chamava de “para” ou farinha de apara e com ela fazia pães e bolos deliciosos. 

Já não me lembro de quando foi meu primeiro contato com ela, mas certamente foi feita por mim, pois nunca achei pra comprar. Mas acho que o interesse por ela nasceu de uma visita a uma aldeia Guarani anos atrás, quando comi chipás, umas panquecas grossas e fritas feitas de farinha de trigo. Fiquei intrigada com o trigo e a gordura e logo descobri que o preparo tradicional era à base de milho ou farinha de mandioca e em vez de óleo era usado gordura de yxo, larva, de palmeiras.  A partir daí não foi difícil chegar ao tipo de farinha de mandioca usada pelos Guarani que sempre tiveram o milho como alimento principal. 
No livro Etnografia de los Guarani del Alto Parana, de Muller, P. Franz. Buenos Aires: Caea Editorial, 1989, entre os modos de preparo da mandioca a farinha de raspa está lá: "La raíz de la mandioca, pelada, se hierve en agua o se asa con cáscara en ceniza caliente, o la mandioca es cortada em trozos y expuesta al sol para su secado; luego es convertida en harina en el mortero; con esa harina se preparan panqueques - popi - que son freídos en grasa. La harina se llama cu-í.".  Pela descrição, popi e a chipa que conheci são a mesma preparação, feita com esta farinha à base de pedaços de mandioca secos ao sol e transformados em pó no pilão.

Pelo fato de ser farinha crua e integral, já que só a umidade é extraída das raízes, o amido tem comportamento diferente da farinha de mandioca de mesa, que sempre é torrada ou cozida nos tachos, com amido já gelatinizado.  A farinha de raspa dá mais liga à massa, porém sem ser grudenta como o amido puro, pois tem o equilíbrio das fibras.

Por isto, no passado foi usada para substituir o trigo, pelo menos em parte, na panificação e daí vem seu outro nome “farinha de mandioca panificável”.   E olhe que esta farinha já esteve em destaque. Em maio de 2017, a seção “Há um século” deste mesmo jornal O Estado de São Paulo trazia o seguinte trecho extraído do mesmo dia e mesmo mês cem anos antes: Mandioca – A questão alimentar em boa hora posta nos devidos termos pelo diretor paulista da Liga da Defesa Nacional, tem encontrado estudiosos que procuraram resolvel-a pelo aproveitamento de material puramente brasileiro. Cabe-nos o prazer de noticiar um processo inteiramente novo para o fabrico de farinha de mandioca, panificável e de conserva garantida.”

Se em todas as ocasiões em que a farinha guarani esteve em alta foi por uma questão ligada ao trigo, mas de cunho mercadológico, desta vez a farinha volta a entrar em cena também graças ao trigo, mas agora pela repulsa ao glúten.

Num mesmo momento cronológico em que a farinha de raspa é usada principalmente como ração, vendida a preços irrisórios atualmente, outro nicho específico, em outro ambiente, se abre para ela.  A farinha de raspa para alimentação animal coexiste com a cassava flour encontrada nos mercados nacionais e internacionais de gluten free.

Ou seja, a mandioca desidratada e finamente triturada, muito usada no passado, pode ser novamente alçada a item de destaque e voltar a ser fonte importante de renda para muitos produtores da agricultura familiar que ainda não se deram conta do valioso recurso que têm em mãos.

Por isto sempre que encontro uma cooperativa que produz farinha, tento convencê-los de que deveriam também produzir a farinha de raspa e mandá-la para o mercado numa nova roupagem para consumidores de todos os tipos e preferências. E não apenas para atender este mercado crescente de quem não come trigo como o diabo foge da cruz. É porque realmente temos muitos portadores de doença celíaca, que não podem mesmo comer trigo, e porque assim podemos dar uma folga para o trigo, cereal que o Brasil não produz suficientemente para atender a demanda. E também assim podemos valorizar os pequenos produtores de mandioca espalhados por todo o país, já que o produto é gostoso, saudável, nutritivo e versátil e neste momento teria boa saída. Além disso, não requer grandes tecnologias - uma peneira ao sol ou um desidratador solar bastam, e um liquidificador faz um ótimo trabalho de triturar em pó bem fino no lugar do pilão.

A vantagem é que ela de fato pode substituir o trigo em vários pratos e inclusive tem o mesmo aspecto – fininha e branca. Diferente da farinha de mandioca de mesa, ela conserva todo o amido original e, melhor que o polvilho que é o amido isolado, ela conserva todas as fibras sem ser granulada.  Para fazer pão, já não é tão fácil, mas um pão de forma ou pães chatos como tortillas além de massas de biscoito e tortas podem ser feitos usando a mesma receita de sempre, substituindo o trigo integralmente.

Talvez você encontre esta farinha nos mercados de produtos sem glúten, nacionais e internacionais, sob o nome de “cassava flour” ou “farinha sem gluten” ou “farinha de mandioca crua”. Procure saber como é feita. Se a mandioca foi seca ou desidratada e triturada finamente, é a farinha de raspa. No Estados Unidos, uma marca de “cassava flour” faz sucesso e nada mais é que a farinha de raspa do Brasil.

Se não a encontrar e desde que tenha acesso ao sol, faça em casa. A minha faço assim: ralo a mandioca mansa (macaxeira, aipim) grosseiramente no processador, espalho sobre um pano limpo e deixo uns dois dias sob o sol. Vou virando e revolvendo até secar bem e ficar quebradiça. Depois trituro no liquidificador aos poucos, peneiro e guardo o pó branco e fino. Para fazer massas de torta, bolos ou biscoito, basta substituir a farinha de trigo por quantidade igual de farinha de raspa.

Massa de tortilla

1 xícara de farinha de raspa
½ colher (chá) de sal
1 xícara de água fervente aproximadamente

Coloque a farinha de raspa numa tigela, tempere com o sal e vá juntando água aos poucos e mexendo com colher até conseguir grânulos úmidos. Espere amornar um pouco e amasse com as mãos até formar uma massa macia e modelável.  Faça um rolo, divida em 10 pedaços e faça bolinhas. Coloque uma chapa de ferro para aquecer.  Entre duas folhas de plástico, abra as bolinhas com rolo ou numa prensa de tortilla até ficar um disco bem fino. Tire o disco do plástico de um lado e, com ajuda da mão espalmada, tire a outra folha e coloque a massa numa chapa quente. Doure dos dois lados e sirva como tacos com a cobertura que gostar – queijo fresco esmigalhado, abacate, tomate, carne moída, feijão bem temperado etc.

Rende: 10 tortillas

12 comentários:

Susanne Gerber-Barata disse...

Boa tarde Neide Rigo,
daqui da Amazônia, mais precisamente de Alter do Chão, gostaria de contribuir com sua postagem.
Se eu não me engane a sua farinha de raspa aqui se chama "Crueira" e aqui em Santarém acha-se em duas versões, branca e amarelada. Faz-se da seguinte maneira: Rala-se a mandioca ou macaxeira, da mandioca se espreme o tucupi, e a massa que sobra é peneirada. Os pedaços grandes que sobram na paneira são secos aos sol para depois ser pilados, dando uma fina farinha. Dessa farinha finíssima se faz rosquinhas ou mingau.

No meu livro de informações e receitas "Sabor Amazônico", encontra-se no internet no yumpu, tenho essa receita:

Rosquinhas de cruera salgadas ou doces

1 xícara de cruera
Água, leite de vaca ou de coco
Açúcar ou rapadura a gosto, a rapadura deve ser previamente dissolvida na água
1 pitada de sal
Óleo para fritar – as rosquinhas podem ser assadas no forno também. As rosquinhas mais claras foram assadas no forno, as mais escuras fritas no óleo.
Coloque a cruera em uma vasilha, tempere com sal e escalde-a colocando o liquido escolhido, água pura ou temperada, água com rapadura ou leite, fervente sobre a massa. Amasse com as mãos e corrige a consistência acrescentando mais líquido ou mais cruera até a massa desgruda da mão e se deixar formar. Enrole as rosquinhas e asse no forno até dourar ou frite em porções no óleo. Seque sobre papel cozinha.

Versão I
Elabore uma infusão infusão com cravo, canela ou erva doce e açúcar ou e incorpore fervente à cruera.

Versão II
Use leite de vaca ou leite de coco fervente para escaldar a massa. Adoça a gosto.

Versão III
Incorpore 1-2 ovos ou queijo a massa já esfriada.
Para as rosquinhas

Grande abraço e obrigada por todos os ensinamentos!

Susanne Gerber-Barata

Yanna Clementino disse...

Que informação excelente! Obrigada Neide!

Fabi Cesquim disse...

Ótimas informções, obrigada por compartilhar!

Tereza disse...

Que delícia! Quero experimentar!

Clipping Path Service disse...

Beautiful post. Reading this post I am very happy and joyful. Thanks for sharing this post.

Anneli Jäätteenmäki disse...

Ten, kto dnes číta toto svedectvo, by mal osláviť so mnou a mojou rodinou, pretože to všetko začalo ako vtip pre niektorých ľudí a iní hovorili, že to nie je možné. Volám sa Juraj Kamensky a som z Bratislavy, ale s manželkou sa sťahujem do Chicaga. Som šťastne ženatý s dvoma deťmi a krásnou ženou. Niečo hrozné sa stalo mojej rodine, stratil som prácu a moja žena opustila dom, pretože som sa nemohla starať o seba a o potreby rodiny. a jej deti v tomto konkrétnom okamihu. Podarilo sa mi deväť rokov, žiadna žena, ktorá by ma podporovala, aby som sa o deti starala. Snažím sa poslať testovaciu správu mojej žene, ale ona blokovať ma z rozprávania s ňou sa snažím hovoriť so svojím priateľom a jej rodinnými príslušníkmi, ale stále viem, že by mi mohol pomôcť a ja som bol podanie žiadosti neskôr toľko spoločnosti, ale stále to urobili Nevolajte ma, kým neprišiel verný deň, že nikdy nezabudnem v mojom živote. Keď som sa stretol so starým priateľom môjho, ktorému som vysvetlil všetky moje ťažkosti a povedal mi o skvelom mužovi, ktorý mu pomohol získať dobrú prácu v Coca cola spoločnosť a on mi povedal, že jeho kúzlo koliesko, ale ja som človek, ktorý nikdy neverí v kolieskach kúzla, ale ja som sa rozhodol dať mu vyskúšať a jeho meno je Drosagiede on ma poučil a ukázal mi, čo mám robiť v týchto troch dňoch obed spell.I sledovať všetky pokyny a robiť to, čo ma požiadal, aby som sa dobre. uistil sa, že všetko šlo dobre a moja žena ma opäť uvidí po skvelej práci Drosagiede. Moja žena mi zavolala s nevedomým číslom a ospravedlnila sa mi a povedala mi, že mi naozaj chýba a naše deti a moja žena sa vracajú domov.a po dvoch dňoch Spoločnosť, ktorej som poslala svoj uznávací list, teraz som manažérom spoločnosť Paragon tu v USA. Odporúčam vám, ak máte nejaké problémy, pošlite správu na tento e-mail: {doctorosagiede75@gmail.com} alebo čo mu dáte na +2349014523836 a dostanete najlepší výsledok. Vezmite veci za samozrejmosť a bude vám odobraté. Prajem Vám to najlepšie.

Unknown disse...

Aonde encontro a receita da Farinha de raspa?

Carolina Oliveira Aguiar Brito disse...

Mais uma grande informação. Obrigada Neide, seu compartilhamento de saber me enche de alegria.

descargar3 disse...

se eu não me engane a sua farinha de raspa aqui se chama "Crueira" e aqui em Santarém acha-se em duas versões, branca e amarelada. Faz-se da seguinte maneira: Rala-se a mandioca ou macaxeira, da mandioca se espreme o tucupi, e a massa que sobra é peneirada. Os pedaços grandes que sobram na paneira são secos aos sol para depois ser pilados, dando uma fina farinha. Dessa farinha finíssima se faz rosquinhas ou mingau.

No meu livro de informações e receitas "Sabor Amazônico", encontra-se no internet no yumpu, tenho essa receita

Unknown disse...

Ontem fiz biscoito de raspa de mandioca. Lembrança da minha infância. Mineira de Bom Sucesso

Anônimo disse...

Eu gostaria de fazer mas não tenho a receita isso é do tempo da minha infância.

Anônimo disse...

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