quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Associem-se ao Slow Food

O Convivium do Slow Food de São Paulo está sob nova liderança: quem assume é Cenia Salles, idealizadora do Espaço Siriúba. Participam da equipe como vice-líderes a Denise Bergamin, a Ludmilla Fonseca e euzinha. Por favor, dêem uma força para aumentarmos este Convívio, que por enquanto só conta com 47 associados. Estamos abertas a novos projetos, sugestões e qualquer dica que nos leve a organizar eventos gostosos, prazerosos, úteis e alegres. É claro que já temos algumas idéias, mas a filosofia do Slow Food é agregar e é isto que estamos buscando. Por favor, associem-se e participem. Há opção de assinatura de 10 dólares ao ano (uma pexincha, vá). A única forma de se associar diretamente é entrando no site do Slow Food internacional. Entre aqui. Basta clicar "join us today" e depois, a cidade de São Paulo (se for este o caso). Mas, se quiser fazer isto através de nós, escreva para o email: saopaulo@slowfood.com.
Aproveito para copiar aqui o texto sobre o movimento que escrevi para a Revista Bons Fluidos (ilustração e texto da Revista).


Tatiana Paiva
Educação para o gosto

Curtir o preparo de uma receita, com apuro na escolha dos ingredientes e em seu próprio tempo, ganhou caráter de movimento na Europa. É o Slow Food, que entre nós já reúne muitos adeptos. Caso da nutricionista Neide Rigo, que participou do encontro Terra Madre, realizado em Brasília. Aqui, ela conta como atitudes ecológicas se relacionam com o prazer à mesa
Por Neide Rigo, especial para a Bons Fluidos
Revista Bons Fluidos - 12/2007
Você já deve ter visto por aí o caracolzinho, símbolo do Slow Food. O movimento, nascido na Itália em 1986, está presente em 122 países, com 83 mil membros. Até há pouco tempo, eu achava que tudo não passava de um pequeno grupo de sonhadores com idéias opostas ao modelo do fast food. Jantares longos e agregadores, celebrações do prazer de comer, degustações de raridades harmonizadas com vinhos caros e piqueniques bucólicos povoavam minha imaginação. Só até eu me associar e descobrir que a filosofia do movimento é muito mais nobre que a simplória contraposição ao fast food. É principalmente a luta por uma alimentação boa, limpa e justa e tudo o que isso envolve. Embora cause grande impacto na Europa, ao Brasil o caracol vem chegando no ritmo que lhe é próprio. Mas acabo de voltar do Terra Madre, em Brasília, com a certeza de que, ainda que devagar, encontrará um terreno muito fértil.
AFINADO COM O MEIO AMBIENTE
Essa foi a primeira vez que o encontro aconteceu no Brasil e estava integrado à IV Feira Nacional de Agricultura Familiar e Reforma Agrária, organizada pelo Ministério de Desenvolvimento da Reforma Agrária. As duas versões anteriores do Terra Madre, em 2004 e 2006, foram na Itália. Trata-se de um dos projetos do Slow Food para integrar gente do setor agroalimentar de norte a sul. Todos afinados com o ideal de preservação ambiental, produção sustentável e respeito ao homem e suas tradições culturais. Resumindo: valorização dos produtos, dos produtores e da terra que os mantêm.
INTERCÂMBIO DE SABERES
A experiência foi ainda mais enriquecedora porque, nos quatro dias em que estivemos reunidos, o debate envolveu detentores do saber tradicional, como índios, assentados de reforma agrária, pescadores artesanais e representantes de comunidades do alimento com antropólogos, cientistas, cozinheiros e associados do Slow Food. Hoje, mesmo entre os mais reticentes, já está ficando difícil dissociar o ato de comer da responsabilidade que se estabelece com a produção do alimento: de onde vem, quem produziu e qual o impacto ambiental e social gerado na sua produção. E isso de forma alguma exclui o prazer de comer. Pelo contrário, reforça nossa auto-estima como produtores, recupera nossas referências gastronômicas, destruídas em nome da globalização, e nos devolve uma relação saudável com a comida. Quem sabe, voltaremos a ter aquele saber natural acerca do ciclo da vida e da sazonalidade das coisas. Nesse caso, é importante o papel de chefs e donos de restaurantes, que deveriam valorizar produtos regionais e da estação em seus cardápios.
PARA SABER MAIS
Um dos pontos altos do Terra Madre foi o Intercâmbio de Saberes e Sabores, em que os participantes tiveram contato com pequenos produtores de alimentos, entre os quais os catalogados pela Arca do Gosto*, caso da marmelada de Santa Luzia, e os protegidos pelo projeto Fortaleza**, como o feijão canapu, do Piauí. Grandes lições!
* ARCA DO GOSTO
O projeto identifica, cataloga e divulga alimentos vegetais e animais em risco de desaparecer, mas que ainda conservam algum potencial comercial. No mundo todo, são mais de 750 itens relacionados.
** FORTALEZA
Diferente da Arca do Gosto, esse projeto auxilia de forma prática grupos de produtores artesanais. Isso envolve a ajuda financeira para a implementação de melhorias e o desenvolvimento da qualidade dos produtos, assegurando a sustentabilidade e a viabilidade comercial.
SLOW FOOD
No site http://www.slowfoodbrasil.com/, é possível saber se há algum núcleo de associados perto de sua cidade. Se não, você pode reunir pessoas simpáticas ao movimento e criar o próprio convívio.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Salada de papaia verde



Outra coisa que a gente encontra no mato, além de taiobas: mamõezinhos verdes. Aos maduros, chegam primeiro os pássaros. Nos terrenos de mata na praia de Itamambuca encontramos vários pés carregados, sem dono. Minha avó os fazia como chuchu, em cubinhos, refogado no alho e azeite, cozido e temperado com muito cheiro-verde. Pode ir na sopa, fazer suflês e qualquer prato de legumes. Eu gosto de fazer salada à moda tailandesa, como já dei a receita aqui. Mas, lá, fiz com o que tinha à mão: rabanete, gergelim preto, salsinha, gengibre, alho frito, pimenta vermelha em flocos e limão.


Aqui vai a receita:



Salada de papaia verde com rabanete

1 mamão bem verde, com cerca de meio quilo
3 rabanetes médios
1 colher (sopa) de açúcar
1 colher (chá) de sal
4 colheres (sopa) de suco de limão Tahiti *
3 colheres (sopa) de cheiro-verde (salsa e cebolinha) picado
1 colher (chá) de gergelim preto tostado
4 dentes de alho picado e frito em pouco óleo até ficar crocante e escorrido
1 colher (chá) de pimenta-vermelha em flocos

Com uma faca afiada, faça vários riscos no mamão e deixe exudar a seiva por meia hora. Lave bem, descasque com descascador de legumes e rale no ralo grosso. Rale o rabanete com casca e junte ao mamão, assim como o açúcar e o sal diluídos no suco de limão, o cheiro-verde e o gergelim. Misture com cuidado e sirva a salada polvilhada com o alho frito e a pimenta.

Rende de 4 a 6 porções

* Rôti de main au citron




Todo mundo sabe que mão com limão não combina com sol. Provoca queimaduras graves e eu sempre tive o maior cuidado com isto, principalmente na praia. Mas, para fazer esta salada meti o mãozão para misturar melhor; em seguida, claro, não fui à praia nem me postei sob o sol. Como me queimei, então? Não sei. Só se foi a radiação do sol, pois almoçamos na varanda da casa. Mas cheguei em São Paulo com a mão já vermelha e inchada e eu nem percebi quando isto começou acontecer. Como se tivesse mergulhado a mão em água fervente. Logo surgiram bolhas no dorso e a dor passou a ser a de queimadura em óleo. Comecei a passar babosa de minuto em minuto. A Aloe vera é uma daquelas plantas amigas que não pode faltar no jardim de nenhum cozinheiro. Além de analgésico seu gel é cicatrizante e faz grudar no corpo a pele fina, solta pela bolha. Se eu puder não raspar esta pele morta em nenhuma quina de mesa – e isto vai exigir um esforço supremo, acho que vou conseguir faze-la secar no lugar, não contaminar nem inflamar. Pelo menos por uns dias me livro de lavar louça.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Taiobas mansas, taiobas bravas


Neste feriado aniversário de São Paulo rumamos para Ubatuba, casa do Guilherme, namorado da Ananda. Mais que a praia, a parte gostosa foi cozinhar para gente que gosta de comer. Jovens, surfistas, famintos, não-avessos à novidades. Pra variar, fui sem cardápio nem idéia do que comeríamos, além das alheiras e da berinjela agridoce que levei pronta. Mas carrego comigo uns ingredientes curingas – pimentões coloridos, cebolas de duas cores, muito alho, pimenta e limão. E uma latinha com especiarias variadas - cuminho, grãos de coentro e de mostarda, cúrcuma, cardamomo. Com isto dá pra fazer o diabo na cozinha. De resto, é ver o que tem de bom no mercado de peixes, na feira e no mato ao redor. Descobri naquele pedaço de mata atlântica mamão verde aos montes, que usei para uma salada estilo tailandesa, e taiobas por todo canto. Bastaram duas folhas enormes, junto com seus talos, para fazer um prato leve e nutritivo que acompanhou o xarel com manteiga de manjericão, especialidade do Guilherme (o peixe aberto, que estava muito fresco no mercado, cortado em postas, seco e besuntado com manteiga temperada com sal e muito manjericão – assa na brasa e come sem a pele. Dos Deuses!).
A foto está feia, mas o prato é bonito e saboroso, garanto.
Para fazer a taioba: as folhas foram separadas do talo e picadas em tiras grossas. Descasquei os talos quase como aspargos, puxando a película com uma faca (um descascador de legumes também funciona) e cortados em pedaços. Como se faz com espinafre, passando-o por água fervente para eliminar parte do ácido oxálico, fazemos o mesmo, e pelo mesmo motivo, com os talos e folhas de taioba para deixá-los mais suaves, sem aquela picância característica. Na água já salgada (1 colher de sobremesa de sal para 2 litros de água) e fervente, joguei os talos e cozinhei por 1 minuto. Acrescentei as folhas e desliguei o fogo. Esperei 30 segundos e escorri. Numa frigideira, dourei em azeite uns 4 dentes de alho finamente picado, mas não amassado, juntei 1 pimenta dedo-de-moça picada, sem sementes e, em seguida, a taioba aferventada. Bastou misturar com delicadeza e levar à mesa. Não sobrou nada.

Aqui, os dois tipos: a brava, com talos escuros e a parte de cima do coração terminando antes de começar o talo; e a comestível, verde mais claro, tanto o talo quanto a folha, nervuras claras, em Y e lobos que se juntam exatamente onde começa o talo (embora isto também aconteça com outras variedades bravas, mas com talos bem roxos, que é um bom parâmetro para diferenciá-las).

Originária da América do Sul, a taioba (Xanthosoma sagittifolium) é muito similar na aparência ao inhame (Colocasia esculenta),natural do Sudeste da Ásia. Desde que a conheci, quando ainda era criança, nunca me confundi ao colher delas no mato - hoje tenho no meu quintal, no sítio, na casa dos amigos que me permitem plantá-la. Mas há quem tenha dificuldade em diferencia-la da taioba brava (Colocasia sculenta, var. antiquorum), venenosa por causa do grande teor de oxalato de cálcio, que podem causar reações fortíssimas (edemas, vômitos, asfixia). As folhas de taiobas são verdes uniformemente, incluindo os talos (pecíolos) e nervuras. E são muito macias. Quando cozidas, tornam-se quase cremosas. Cordiformes, tem os dois lobos do coração se encontrando exatamente na junção do pecíolo. Já o encontro destes dois lobos, na taioba-brava, se dá antes da inserção do talo, que tem coloração arroxeada. Mas, na dúvida, não coma. Pergunte a quem conhece.
Ou compre: em algumas lojas do bairro da Liberdade, aqui em São Paulo você pode encontrar as folhas e os talos separados. Já vi também na feira de Orgânicos, no Parque da Água Branca.
Agora está em plena safra, pois gosta de chuvas, solos úmidos. Riquíssima em pró-vitamina A e antioxidantes, a taioba é uma ótima opção ao espinafre em várias preparações. A batata também se come, como inhame, mas é assunto para outra vez.
Veja também, no Come-se: Inhames e carás

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Mais Ver-o-Peso


Uma das cozinhas menos afetadas do nosso país, a paraense mantém a herança portuguesa convivendo lado a lado com a indígena. Às vezes as duas juntinhas no mesmo prato, como é o caso do pato no tucupi. No mercado Ver-o-Peso, em Belém, várias barracas vendem assim os ingredientes para o cozido ou para a sopa. Embora sejam sofríveis a qualidade e a oferta das hortaliças naquela terra quente, quando comparados a Rio e São Paulo, os vendedores pelo menos tentam deixá-las atraentes em seus arranjos. E sem desperdício.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Cheiro-verde paraense

No mercado Ver-o-Peso, em Belém do Pará, o cheiro-verde é assim: pimentas-de-cheiro de todo tipo, da doce e da ardida, cebolinha, coentro e chicória - os dois cheiram quase igual, também chamado de chicória-do-pará, coentro-da-Índia, coentro-de pasto.
Aqui em São Paulo e em estados do Sul e Sudeste, cheiro-verde é o nosso bouquet-garni, guardadas as diferenças de composição e formas de uso, e entra numa série de pratos, com este nome, sem outra especificação. E todos sabemos que se trata de salsinha+cebolinha, mais salsinha que cebolinha. Junto com ele, na feira, às vezes incluem uma pimenta dedo-de-moça e umas folhinhas de louro. Mas o conceito muda quando vamos para o Norte e Nordeste. E agora fiquei curiosa. Há mais variações Brasil afora? Como é o seu cheiro-verde?

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Batatinhas de tiririca ou chufas


Carmem no comando da enxada; eu e Claudia no controle de qualidade.


Do tamano de avelãs

Outro dia escrevi aqui sobre minha surpresa em descobrir a chufa que faz a horchata espanhola era uma vulga tiririca, considerada uma das piores pragas da agricultura. Depois disto não houve terra à vista que eu não cavucasse. Em Fartura meu pai indicou na horta algumas tiririquinhas mixurucas – ele arranca todas, não deixa vingar. E, na tarde do Natal, debaixo de chuva, fui lá e cavei um buraco tão fundo que quase mina água. E nada das bolinhas (porque ele me disse que às vezes as batatinhas estão nas profundezas). Mas não desisti.
Em Gonçalves-MG havia praticamente um roçado delas junto ao jardim, para minha alegria. Quer tirar, tire e aproveite para levar longe as batatinhas porque são umas pestes para proliferar, disse Carmem, a dona da casa. Foi moleza, as batatinhas estavam todas ali, quase rentes à superfície da terra fofa. Carmem e eu nos alternamos na enxada. Claudia ia separando as bolinhas da folhagem e numa brincadeira conseguimos reunir uns 200 gramas. Mas chegando aqui fui correndo ao google imagens conferir as formas das chufas espanholas e vi que, embora o gênero da planta seja o seja o mesmo, a espécie é outra (Cyperus esculentos), de pendões dourados. As minhas eram daquela tiririca de flores arroxeadas (Cyperus rotundus).
Fiquei chateada, comi uma batatinha crua (depois de descascadas ficaram com a forma e o tamanho de avelãs peladas), senti gosto resinoso de cúrcuma fresca, achei pequenas demais. Joguei tudo fora, com medo de fazer mal. Adeus minha orchata e sorry Carmem e Claudia, que vão ficar sabendo agora do trabalho à toa.
Mas eis que nesta semana chega um comentário do Neco Torquato, do blog Mungo Verde, que me anima novamente, dizendo que temos sim tiririca amarela ou tiriricão. E que as bolinhas que joguei fora poderiam sim ser usadas. Por exemplo, na chapa como aperitivos (se tem sabor de cúrcuma - eu achei, basta um salzinho e pimenta para já sair bem temperada). Com cerveja, ele sugere. Gostei desta parte.
O comentário dele, com a receitinha:
A variedade correta para fazer a orchata é a conhecida com tiriricão, junquinho ou tiririca amarela. É bem fácil de distinguir a "correta" da outra: o tiriricão tem as sementes douradas, bem douradas mesmo (como essas
), tem as folhas mais largas, o caule mais grosso e costuma dar um pé de uns 2 a 3 palmos (ou mais). Aqui na minha região tem bastante. Agora esta na época dessa variedade (como se existisse época para a tiririca:) ). Tem um terreno aqui do lado de casa que está cheio. Semana que vem, quando estarei mais folgado, vou apanhar algumas e ver o que vai dar.De todo caso, nada é perdido pois eu adoro as batatinhas de tiririca (qualquer variedade) cortadas bem fininhas para fazer uma pasta de passar no pão ou ainda torrá-las na chapa, bem temperadinhas, e saboreá-las acompanhadas de uma cervejinha bem gelada :) Neco Torquato, Santa Rita do Sapucaí - MG

A propósito, segundo o dicionário Aurélio, temos na língua portuguesa o termo orchata derivada do horchata, em espanhol. E a descrição é uma receita a ser testada: refresco preparado com pevides de melancia pisadas, água e açúcar.

Fotos de Claudia Monteiro Magalhães e Osvaldo Campos Magalhães (a minha máquininha digital pifou)

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Mangaba


Mangabas no paneiro de arumã, forrado com as folhas da mesma planta

Estava meio triste quando entrei sozinha no barco de volta pra Belém, deixando para trás a Ilha, os amigos e os peixes do Marajó. Sem falar num tanto de farinha de mandioca amarela que vazou do saco furado dentro da mala e foi escapando pelo caminho, denunciado meus passos. Mas logo me animei ao ver os vendedores ambulantes passando de lá pra cá, com cupuaçu, tapioquinha e um deles com paneiros de mangaba. Arrematei os três. Já tinha sido apresentada à fruta por meu anfitrião Paulo, em Belém, e a primeira coisa que a menininha Vitória me disse ao concordar com os elogios do avô à fruta é que ela também tinha um mmm .... e fazia o gesto com a boquinha colando e soltando os lábios, querendo me avisar da seiva viscosa da casca. Ainda assim era o suco preferido da pequena. Acho que o meu também, desde aquele dia. Se disser que não conhecia a fruta, estarei mentindo, pois comi direto da mangabeira no Cerrado da Chapada dos Guimarães. Mas não dei muita sorte. Não vi muita graça. Talvez não estivesse madura - não me lembro, no entanto, de estar amarrenta, travosa, característica dela quando verde. Ou talvez eu esteja sendo traída pela memória de mais de uma década. Comi ainda a compota, em Goiás ou Minas, e achei que o açúcar matou a fruta. Também não dei importância.
Agora já sei que para estar boa tem que cair do pé de madura, com a pele corada como pêssego. Ou ser colhida quando está firme, mas bojuda, e deixada a amadurecer até ficar molinha, com consistência cremosa, ácida o necessário, muito doce e aromática. E estas do Pará são tudo isto e muito mais. Come-se inteira, com casca e tudo (resta apenas um pouco do visgo e do amargor da seiva, complementos indispensáveis até). Só se tiram as sementes, não grandes, não muitas. Lembra um pouco o sabor da pera, mas a massa é de uma atemóia lisinha. Até chegar a São Paulo (passei ainda mais um dia em Belém), as frutinhas já estavam maduras o bastante para serem devoradas, assanhando papilas. Como eu estava sem tempo para dar a elas destino melhor, e elas, no ponto exato de maturação, sem tempo de me esperar, viraram suco mesmo, o que não a desmerecem. Pelo contrário - o suco entrou no rol dos melhores para mim, junto com o de cupuaçu e de graviola. E creme, numa fórmula já clássica que os paraenses usam para transformar várias frutas em sobremesa rápida e infalível: 1 parte de creme de leite, 1 de leite condensado e 1 de polpa da fruta. Bate tudo e bota no congelador por 1 hora. Serve para bacuri, cupuaçu, maracujá, graviola etc. Se colocar na sorveteira, vira sorvete cremoso.
Como prefiro admirar o sabor e a acidez natural da fruta e gosto de subverter receitas clássicas, usei minhas próprias proporções: 2 medidas de polpa (a fruta batida no liquidificador e peneirada), ½ de creme de leite e ½ de leite condensado. Bati no liquidificador e deixei 1 hora no freezer só para firmar e ulalá. Ainda sobrou outro tanto de polpa, que congelei.
Bem, acho desnecessário dizer que a brasileira Hancornia speciosa é nutritiva, faz bem e coisa e tal. O resto eu já disse.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Estas sim são panelas empilháveis



São da cozinha da Nina Horta no Rio de janeiro. Cozinhei nas brancas tipo Le Creuset, que estavam mais a mão. E eram poderosas. Só no dia de ir embora pus reparo nas pretinhas finlandesas da Eva Trio do premiadíssimo designer Ole Palsby, penduradas num canto à parte. Verdadeiras obras de arte. Sempre sonhei com tampas assim. Além de práticas na hora de guardar a bateria completa, enquanto a panela está no fogo elas servem de chapa quente para aquecer uma fatia de pão, derreter um tutaninho, manter os legumes no calor e outras invenções. Isto sim é design inteligente (sem falar do material utilizado: alumínio com revestimento especial, as tampas em aço inoxidável e pelo menos uma delas em vidro transparente -alta tecnologia por trás). Aqui no Brasil finalmente lançaram panelas empilháveis (a Panex, se não me engano), mas são mais modestas, reconheçamos.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Rolhas de buriti. Por que não?


Da esquerda pra direita: rolhas de buriti trabalhadas artesanalmente, de plástico e de cortiça (tem até uma da Embrapa)

Quem fala de vinho na blogosfera é o Luiz Horta, mas como ele falou de tampas de rosca nesta semana, lembrei das minhas rolhas de buriti que trouxe da feira de São Joaquim, Salvador-BA. Devo ter pago pelo pacotinho 1 real e me quebram um galhão quando quero guardar qualquer líquido, pois são leves, ajustáveis e algo impermeáveis. Já no Brasil d´antanho elas já eram usadas para tampar garrafadas e bocas de chifre guarda-rapé. Agora, o que dizer de uma planta que tem vinífera no nome e ainda nos fornece a rolha? Palmeira de Deus. "...buriti-verde que afina e esveste, belimbeleza" (Grande Sertão: Veredas. G.Rosa).
Buritizeiro (Mauritia vinifera Mart ou Mauritia flexuosa L) é como uma dádiva, tem utilidades sem fim. A seiva é açucarada e, fermentada, dá um bom vinho. Daí o nome científico mais recente, retificando o anterior, de Lineu, que indicava a flexibilidade da palmeira - "ah, a papeagem no buritizal, que lequelequeia" (G.Rosa). É claro que não tem nada do vinho vinho. Mas de doçura! Quando concentrada, esta seiva vira açúcar com 92% de sacarose. E eu já estou sonhando com açuquinha de buriti no meu açucareiro. Espero só que não seja preciso derrubar o buritizeiro para isto. E tem mais: do tronco ainda se extrai uma fécula amilácea, como o saguzeiro asiático - como devem saber, o sagu original é feito com a fécula de uma palmeira. Os buritis são frutos lindos. Têm uma cobertura em escama dura e envernizada que protege uma polpa saborosa e riquíssima, mas riquíssima mesmo, em betacaroteno (pró-vitamina A), com a vantagem de ter bom teor de gordura, melhoranho o aproveitamento da vitamina, lipossolúvel. Aqui em São Paulo costumo comprar o doce, como uma marmelada, que vem embrulhado em caixa feita com ripinhas do pecíolo das folhas. É com este material que se fazem, além de canoas e objetos, também as rolhas.
E fico pensando: será que ainda não descobriram uma tecnologia capaz de transformá-las em substitutos perfeitos às rolhas de cortiça? Algumas vantagens? é um produto nacional, biodegradável, de cultura sustentável, vem moldado em cilindro naturalmente pela natureza (os pecíolos sao espessos como talos), tem coloração clara e uniforme, textura comprimível e firmesa para aguenar o saca-rolha. Imagino que, como as sementes germinam facilmente e produzem bem mesmo em lugares alagados (sobre buritizais seguindo veredas, nada como ler Guimarães Rosa), a produção destas rolhas daria ainda emprego a muita gente ribeirinha. Posso estar sendo bem ingênua, mas abro aqui espaço para que me informem se estou viajando ou não. Bem que a Embrapa uva e vinho poderia pesquisar. Se é que já não pensou nisto e eu estou aqui falando besteira. Mas pesquisei artigos científicos e não achei nada. Ao menos seria uma alternativa mais agradável aos olhos que as rolhas de plástico. Não sou contra nenhuma inovação desde que o vinho continue bom e o meio ambiente, preservado; mas aprecio a estética. E elas sao lindas. Quem tiver mais informações, traga-as.


O doce em sua caixinha ecológica.

Se quiser saber mais sobre a palmeira, leia a dissertação de Paulo Santelli:
Fisiologia Pós-colheita de frutos das palmeiras Syagrus oleracea (Mart.) Becc. e Mauritia vinifera.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Broto de feno grego


Se estiverem em local claro, ficam mais verdinhos (com clorofila). Prefiro assim. Quando germinados em local escuro, ficam estiolados e pálidos.

falei do feno-grego aqui. Como recentemente fiquei encantada com sabor das folhas, resolvi experimentar agora os brotos. Deixei de molho em água fria as sementes de um dia para outro, escorri e mantive-os numa peneirinha de plástico coberta com pano claro. Duas, três vezes por dia, ou sempre que passava pela cozinha, dava uma enxaguadinha com água corrente, para mante-los úmidos (secos, morrem; enxarcados, apodrecem). Depois de três dias já me dei por satisfeita com a germinação e decidi que era hora de comer. Poderia esperar mais, até os brotos ganharem folhinhas, e talvez mais sabor até, mas a ansiedade foi maior que a razão. E eles estavam ótimos, mais sutis, como é de se esperar, que as sementes compactas, que são ligeiramente amargas. Mas o aroma é o mesmo. Comi com arroz basmati. Vão bem também nas saladas (crus ou rapidamente branqueados).

E aqui um jeito de prepará-lo à moda indiana dos caris (fui fazendo de olhada, mas a receita ficou mais ou menos assim:





Caril de cebolas com brotos de feno-grego

Coloquei ½ colher (sopa) de sementes de mostarda marrom e 1 colher (chá) de sementes de cuminho numa panela com 1 colher (sopa) de ghee e levei ao fogo. Quando as sementinhas começaram a pipocar, juntei 2 dentes de alho e 1 colher (sopa) de gengibre, ambos finamente picados. Assim que o alho ameaçou dourar, juntei 1 pimenta dedo-de-moça sem sementes picada em tiras e 1 colher (chá) de cúrcuma em pó. Refoguei por 1 minuto e adicionei 3 cebolas cortadas em gomos e alguns naquinhos de pimentão vermelho que sobrava na geladeira. Polvilhei 1 colher (chá) de sal e pinguei umas gotas de água. Mexi e mantive no fogo até ficarem macios. Por fim, juntei uma xícara de brotos de feno-grego, mexi com cuidado e deixei cozinhar por 3 minutos. Rendeu 2 boas porções.


Veja também no Come-se como fazer brotos de feijão

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Cipo-alho, cipó d´alho, amazonian garlic bush


Estas folhas, trouxe na mala, guardei na geladeira e usei por vários dias para temperar arroz, feijão, carne e peixe.
Quando cheguei ao Marajó, dona Jerônima, minha amiga e dona da pousada Fazenda São Jerônimo, me contou que uma semana antes o cipó tinha sido a estrela da horta. Cobriu-se de florezinhas rosas até não mais poder. Ela falou com tanta naturalidade como se cipó-alho fosse universal como coca-cola. Nem reparou na minha cara de surpresa, olho estalado de emoção em saber que estava ali frente a frente com um dos temperos amazônicos que eu mais idealizava e, por tudo que já tinha lido, imagina-o escondido nas margens mornas de igarapés inatingíveis da misteriosa selva amazônica. Ela apanhou algumas folhas e colocou no caldo de turu. Diferente do alho, cuja presença encorpada de derivados de enxofre lhe dão um aroma que tem lado A e lado B (aquele cheiro de enxofre do mal que tem sua expressão máxima nos temperos prontos que empesteia, no supermercado, tudo o que está ao seu redor), o cipó-alho só guarda semelhança com o lado A, aquele aroma bom que atiça o apetite, faz da comida salgada algo melhor de se comer. E se a gente maneira no uso do bulbo por causa do enxofre nauseabundo, nas folhas do cipó o perfume é só alegria, pois tudo nele é suave, embora inconfundível - o dialill sufídrico está presente nas duas plantas, só que mais equilibrado aqui. As folhas podem ser usadas como as de louro, para ser tiradas depois. Ou deixadas, afinal não agridem, apenas não são macias com manjericões.

A planta, batizada de Mansoa alliacea (ou Bignonia alliacea, Adenocalymna alliaceu e outros ) é uma trepadeira grande, vistosa e nativa das regiões tropicais do Brasil. È encontrada mais facilmente, contudo, na região Amazônica, onde é usada também como medicamento: antipirética, anti-reumática, antigripal. E, como alho, para espantar maus espíritos.

Trouxe um galho grande com raiz e duas folhas, que plantei num vaso e até agora continuam do jeito que vieram. Acho que vinga. E uma mudinha pequena, em estufa de garrafa pet, mas parece que esta padece.

Carlo Petrini, presidente do Slow Food, no Rio


Durante o almoço, no restaurante O Navegador (foto tirada daqui)

O texto abaixo é uma transcrição feita pela Margarida Nogueira da fala do presidente do Slow Food, Carlo Petrini, que esteve de férias no Rio de Janeiro. O original está no site do Slow Food Brasil.

Veja também outro texto da Margarida Nogueira - Um presente inesperado: Carlo Petrini no Rio de Janeiro


Fala de Carlo Petrini no almoço do Convivium do Rio de Janeiro


*Transcrição da fala de Carlo Petrini*, Rio de Janeiro, 03/01/2008

Me desculpem, mas não falo português! Eu entendo, não como "seu Bené" que dizia non capisco! Io capisco, mas... não sei falar!
Antes de tudo, um agradecimento a este extraordinário comitê de recepção: Margarida, Teresa, Manuel, Maria** e a este meu precioso tradutor, o primeiro estudante** do Brasil que cursou nossa Universidade de Ciências Gastronômicas... o primeiro!
Obrigado pela hospitalidade...
Eu estava de férias! Por uma semana, tranqüilo... E então o Manuel me fez chorar por 1 hora!!!
Porque este filme (Seu Bené vai pra Itália), é uma coisa tocante, importante! Porque mostra bem o conceito e o espírito do Terra Madre!!!
Tomarei poucos minutos para explicar o que é Terra Madre e Slow Food.
Me cabe sempre falar no final das refeições; às vezes me fazem mesmo falar antes e aí, tenho que falar pouco, pois as pessoas estão com fome...
Conto então uma história bem significativa sobre falar depois do almoço, uma história que se passa no Coliseu, onde, diante do Imperador, são mandados para a arena, os mártires cristãos para serem devorados pelas feras.
Ai chega um cristão, "pelo amor de Deus, estou aqui para me tornar mártir"
Entra o primeiro leão, chega perto, olha, sente o cheiro e vai embora... "Mas por que? Estou aqui para morrer pela graça de Deus!!! "Mandam um leão mais feroz, grande! Chega, olha, cheira e... vai embora!!! Aí vem o mais feroz dos leões! Olha, cheira e vai embora! E o cristão pergunta: "Mas porque? Porque não me come, porque não me devora???" E o leão responde: "Não te como porque senão depois de te comer vou ter que... fazer discurso!!!"
Eu sou melhor que o leão e estou fazendo um discurso!!!
Slow Food é hoje um movimento presente em 150 países no mundo com mais de 100.000 associados.
Mas, se contarmos as redes que o Slow Food está desenvolvendo, as redes que tem milhões de camponeses, muitos deles representando cooperativas, comunidades ou aldeias, a nossa grande família, hoje, entre cozinheiros, pescadores, nômades, fazendeiros, é formada por mais de 10 milhões de pessoas!
Não é um movimento estruturado, é muito livre, criativo, mas é regido por uma idéia forte. A idéia forte é o fato que a gastronomia é uma ciência multidisciplinar e complexa.
Se você vê televisão em qualquer país do mundo,vai ter sempre alguém que cozinha e fala, fala... em cada revista, receitas, livro de receitas, fotos de pratos tiradas de cima, como se fossem defuntos... sempre receitas...
Isto é uma parte da gastronomia, uma pequena parte da gastronomia que, se continua a crescer, se torna pornografia alimentar... porque não tem a outra parte da gastronomia. E qual é essa outra parte? Esta pessoa aqui... (mostra a foto do seu Bené)
Nós não poderíamos estar apreciando hoje a mandioca se não fossem essas pessoas, os agricultores... Essa é a base da gastronomia. Isto significa que essa economia, essa história, essa cultura é gastronomia... Esta economia é gastronomia...
E foi por isto que fizemos a universidade, a primeira universidade de ciências gastronômicas. Muitos pais de estudantes pensam que eles vão lá para a Universidade de Ciências Gastronômicas para comer! Não é isso! Os estudantes lá, estudam biologia, antropologia, história, economia, química, física, genética. Porque não se pode falar de alimentação sem conhecer essas matérias!
Por isso, dizemos que a alimentação deve libertar-se dessa pornografia alimentar. Também porque, vejam vocês, o mundo está hoje numa situação histórica muito peculiar, pois nossa mãe terra, está cada vez mais envenenada!
Em 2005, as Nações Unidas fizeram uma matéria sobre as perdas dos ecossistemas no planeta. A pesquisa feita por 1400 cientistas durante 4 anos, diz que o maior responsável pela destruição dos ecossistemas é a produção de comida, a produção alimentar. O maior responsável...
O que isso significa? Significa a destruição com produções em massa, significa que destruímos e perdemos a água! Esta é a realidade!
São 150 anos que botamos química no solo!
Hoje, na Terra, produzimos alimentação para 12 bilhões de pessoas! Na Terra somos 6 bilhões e 300 milhões; 800 milhões estão morrendo de fome; 1 bilhão e 700 milhões sofrem de obesidade, diabetes ou doenças causadas por problemas de alimentação excessiva!!!
Estamos ficando todos loucos, estamos ficando todos loucos! E não compreendemos que é preciso mudar!
Consumir, consumir, consumir!!! O primeiro conceito do consumo é o desperdício! Jogar fora! Jogar fora...
Essas pessoas (mostra a foto de seu Bené) não jogam nada fora! É a economia de subsistência. Penso pois, que temos que refletir! Temos que refletir!
O Slow Food quis fazer o Terra Madre para dar dignidade a essa economia, contra a economia massiva.
Contra a economia forte, a economia do lucro, a economia do capital. Uma economia local pode ser criada e essa economia local, salvará o planeta. Será a economia local que salvará o planeta!!!
Mas tem outro elemento importante: é que nós hoje quando falamos, damos sempre muita importância à inteligência racional. Tudo é racional! Tudo é racional!!
Terra Madre é inteligência afetiva! É inteligência afetiva!
O mundo tem necessidade de inteligência afetiva!
Porque a inteligência racional só pensa em uma coisa: lucro, lucro!
Não pensa no amor, não pensa na amizade, não pensa na solidariedade, não pensa no meio ambiente, só dinheiro, dinheiro, dinheiro... Precisamos de inteligência afetiva! É ela que salvará o planeta!!!
Por isso agradeço a Manuel, por este extraordinário documento (referindo-se ao filme)
Vou mandá-lo ao Secretário da Nações Unidas...
Veja, estas são as Nações Unidas!!!
Por que este documentário exprime bem esta inteligência afetiva. Porque este homem que sai de sua casa e durante toda a viagem pensa sempre na sua mulher, vive uma situação inacreditável, inacreditável...
Nós hoje viajamos, hoje estamos aqui, amanhã ali, não damos importância a viagens. Mas eu me lembro que minha avó, viajou uma só vez na sua vida, da Itália foi à Lourdes, para a Virgem de Lourdes. Uma vez só!!
A importância da viagem para esses agricultores de cidades pequenas é extraordinária! E se nessa viagem encontram outros agricultores, eles pensam: porque estou aqui? Porque fui convidado? Nós convidamos você, porque seu trabalho tem valor, porque você protege a mandioca, porque defende as sementes, porque você está salvando uma raça animal...
Eu garanto, estou certo que essa pessoa quando volta para sua casa, será uma outra pessoa...
É a auto estima que move o mundo! Nós mesmos, só realizamos belas coisas das quais nos orgulhamos, quando nossa auto estima está alta! Sem ela, nada se realiza...
Terra Madre é isto! É hora do Slow Food Brasil ir adiante!!!
Por isso, vamos, em frente... crescer, para fora da vida gastronômica de elite... abrir-se para as crianças, para os camponeses, para toda gente, porque comer é o primeiro ato agrícola.
Se como de um modo, ajudo uma certa agricultura; se como de outro modo, ajudo outro tipo de agricultura.
Por isso, não gosto da palavra consumidor, uma palavra nascida na Revolução Industrial, por volta de 1850. Consumir vem de "consunzione"(tuberculose / depauperamento).
Não devemos ser consumidores, devemos nos tornar co-produtores: ser co-produtor é pagar bem pela mandioca, respeitar quem trabalha na terra, dar mais valor ao alimento que às roupas, pois quando eu como mandioca, um segundo depois ela se torna Carlo Petrini.
Já as cuecas do Armani... As cuecas Armani estão sempre... fora do Carlo Petrini....
É hora de darmos mais valor à mandioca que às cuecas Armani!! É hora de darmos mais valor ao alimento que aos automóveis. A alimentação é importante! Pensem, o ato de comer é importante...
Eu não creio em Deus, sou agnóstico. Mas, se acreditasse em Deus seria porque ele deu prazer às duas funções fisiológicas mais importantes da vida: comer e fazer amor. Se se pára de comer ou se pára de fazer amor, é o fim! Para comer e fazer amor, eu te dou prazer, Deus deve ter dito!!! E assim se continua... Há gente que sente prazer em trabalhar, mas isso é patológico.
Pensem, quando nascemos, saímos do ventre materno, os olhos não vêem, os ouvidos, nada, a primeira coisa que fazemos, com a boca, é procurar o peito da mãe. Aquele momento é o primeiro ato de amor e prazer. Ato de amor da mãe que dá o leite ao filho, e o filho que sugando o peito, dá prazer à mãe
O mistério da vida está todo aí... todo aí!
Quem não dá importância à alimentação, perde metade da sua vida, mais da metade de sua vida. Dar importância à alimentação, neste momento histórico, significa ser contra a economia destrutiva, contra a economia massiva, significa defender Benedito e os milhões de Beneditos que existem no mundo. Quando vi esse filme, pensei que essa mesma história, viveram os camponeses do Congo, da Coréia, da Lapônia. Todos partiram, chegaram...
Eu penso que o Slow Food é isto! Com a educação das crianças, com a convivialidade, o prazer de estar juntos, com a defesa desta economia, com o estudo desses produtos, nós podemos dar nossa contribuição, lentamente, slowly, não tenham pressa... É a mensagem que deixo para vocês!
Penso também, que da próxima vez que venha aqui, o Slow Food vai ter ao menos 1000 sócios no Rio de Janeiro!
E que mantenha o espírito com o qual vocês têm trabalhado até agora!
Agradeço de coração!
E agradeço por me ter feito chorar...

*Carlo Petrini é Presidente Internacional e fundador do Slow Food
**Margarida Nogueira - lider do Comvivium Rio de Janeiro, Teresa Corção - chef/proprietária do restaurante Navegador, Manuel Carvalho - produtor do filme Seu Bené vai pra Itália, Maria Infante - sócia do Convivium Rio, Paulo Lima - o 1ºestudante brasileiro da UNISG

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Melão caipira



Sabem aquele sabor perdido das coisas que morrem junto com a infância? O do melão caipira é um desses e estava arquivado junto com seu perfume. Havia tempos que o buscava, nunca mais tinha visto. Lá pelos anos 70 do século passado (é tempo, hem?) ele era comum lá em casa, no pós-viagem de férias ao Paraná. Na volta, meu pai parava o carro e comprava deles na estrada. O cheiro vinha atiçando as vontades e prevendo as saudades, porque depois deste chorinho, passaríamos mais longos 12 meses sem ele. Com minhas primas e irmãs, vasculhávamos as roças de café e milho à cata de melancias, melões e pepinos – todos frutos da mesma família das cucurbitáceas – ou do que desse para comer cru, no pé, assim mesmo, sem lavar. Uma faquinha e um tantinho de sal no embornal eram providenciais (no filme Conversas com meu Jardineiro, faca e barbante aparecem como salva-pátria). Fazíamos estragos, abríamos vários melões caipiras para escolher o mais doce, o mais perfumado. Os restos imaturos, insípidos, ficavam às moscas. O mesmo fazíamos com melancias e pepinos que, crocantes, comíamos partidos com sal.

Em São Paulo hoje temos todo quanto é tipo de melão – cantaloupe, charentais, pele de sapo, gália, honey dew, etc, mas cadê os caipiras? Ficaram, parece, mais restritos a algumas zonas da região sul, nas mãos de pequenos produtores. Ou sabe-se lá onde. Os amarelos, mais comuns, até que eram doces há uns 20 anos, mas agora em tempos de exagero para menos na gordura, no açúcar e no prazer, melões foram reduzidos a pepinos adoçados com lights ciclamatos. Injustiça com os pepinos, já que os da roça eram saborosos, crocantes, refrescantes. Se ao menos melões ficassem melhores com sal, mas nem isto. Foram ficando tão sem-graça, tão desanimados, que chegou-se ao cúmulo de uma marca vender seu produto pelo dobro do preço, sob o apelo de “eu sou doce”. Verdade. Eu vi.
Por isto, não pude deixar de parar na estrada para Fartura-SP, onde um produtor em seu caminhãozinho vendia estes melões de até 3 quilos vindos do Paraná. O nome da estrada: João Mellão
.
Perfume de melão, sabor de melão.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Comida Requentada



Uma hora a gente acorda e a vida está diferente. Até outro dia havia em casa criança correndo pra lá e pra cá, pedindo lanche da tarde, comida a toda hora. E foram anos eu almoçando em casa com o marido, que trabalhava a 300 metros daqui. Agora Ananda faz internato, passa o dia inteiro no hospital e Marcos montou consultório em outro canto. Quem vem pro almoço? Ninguém. Isto dá uma certa melancolia, principalmente porque quero continuar trabalhando a maior parte do tempo em casa. Nasci pra cozinhar para família grande, mas cadê? Ir ao mercado, fazer feira, encher a geladeira de ingredientes... Que graça tem comer sozinha? Mas, assim como milhares de paulistanos solitários, a gente se acostuma. Vou descobrir a graça e aprender na prática a sentir prazer com minha agradável companhia à mesa.
Começamos a nova rotina nesta semana e por pouco não sucumbi, sem interesse, ao prato de miojo na frente da TV (se tivesse em casa, acho que o faria), ao sanduíche pobre e gorduroso, ao mingau confortante ou às guloseimas e frutas fáceis no lugar do almoço merecido. E Marcos tampouco tem conseguido manter um cardápio saudável, gostoso e tranqüilo nas redondezas da Av. Paulista. Bem, pelo menos ainda nos resta o jantar. E ontem ele apareceu aqui com estas charmosas marmitinhas indianas, de aço inoxidável, com compartimentos. Foi um sopro de alegria, pois me motivaram a pensar em jantares que caibam nelas e que possam ser aquecidas em banho-maria ou no vapor. A copa é bem montada e o consultório, agradável, e ele poderá passar tudo para o prato, levar fruta, salada e pão e ainda acompanhar com uma taça de vinho. E vamos ver se não é só empolgação. Já sei que batatas amanhecidas ganham sabor detestável e terei que evitá-las - sim, eu já comi muito de marmita na vida, mas certas comidas até ganham com o descanso. Comida fresca não tem igual, mas façamos sempre o melhor dentro do que é possível. E, marmita pra mim também.

São pequenas e têm compartimentos para diferentes alimentos
Onde comprar
Lojinha do restaurante Gopala Prasada
Rua Antonio Carlos, 413 / 429 - São Paulo
Telefones 3283-3867 e 3289-1911

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Um dia de carioca



Mesmo quando estou viajando, gosto de cozinhar, especialmente para experimentar in loco os produtos do mercado que a gente nem sempre encontra nos restaurantes. Por isto é sempre providencial levar nas viagens pelo menos um fogão elétrico de uma boca e uma panela pequena. Eu já cozinhei em varanda de hotel. Mas, no Rio, tinha à minha disposição uma cozinha super bem equipada com quatro bocas elétricas e panelas a escolher. Como estávamos sem disposição para pesquisar o melhor lugar para se devorar um bom camarão e porque estávamos cansados de andar durante o dia; e porque havíamos almoçado como reis no restaurante O Navegador; e porque queríamos ficar juntinhos, só nós dois; e porque queríamos estrear aquela cozinha intocada de moça recém-casada; e porque aquelas panelas brancas eram lindas; e porque gosto do desafio de fazer prato completo com o mínimo de ingredientes, que escolho e decido na hora; e porque queria me sentir uma carioca indo a pé às compras no Supermercado Zona Sul; e porque já sabia que o camarão de lá estava fresco como convinha... E por tantas outras coisas, ficamos a cozinhar no agradável apartamento da Nina Horta, em Copacabana, onde estávamos hospedados. E, vá lá... comemos bem. E, barato!


No Zona Sul estas lindas sacolas duráveis são vendidas a 13 reais. Muita gente já está se despedindo daquelas danosas descartáveis.

Começamos a pensar no cardápio a partir dos dois únicos ingredientes que havia na cozinha da Nina – sal e açúcar. Compramos canjiquinha finíssima quase como uma polenta italiana - que me inspirou na hora. Camarão grande inteiro, um maço de brócolis e outro de cheiro-verde (salsa e cebolinha). Além de bananas, para a sobremesa. E, claro, o pão (francês, comum) e o vinho (australiano, De Bortoli, IVA 4 Petit Verdot, 2003).


Com a ajuda do Marcos, fizemos tudo em meia hora.
Os camarões: 8 camarões grandes - limpei, puxando a tripinha – numa inserção ao meio do dorso. Separei cabeças e cascas, deixando os rabinhos. Deixei ainda dois inteiros, só pra fazer presença no prato. Temperei com sal. Numa panela coloquei as cascas e cabeças, juntei uns ramos de salsa e cebolinha verde picada, cobri com 1 xícara de água e deixei ferver até reduzir o caldo pela metade. À parte, aqueci um pouco de azeite e refoguei a parte branca da cebolinha, picada (umas duas colheres de sopa). Juntei os camarões e temperei com sal. Fritei rapidamente só até ficarem opacos e juntei o caldo das cascas coado. Cozinhei mais dois minutos, conferi o sal e espalhei salsinha picada por cima. Reguei com um fiozinho de azeite e estava pronto.

Antes do camarão, comecei a fazer a canjiquinha (65 centavos, meio quilo!!). Juntei numa panela 1 xícara dela, 4 de água e 1 colher (chá) de sal. Cozinhei como polenta, mexendo, por 20 minutos (já vi gente servir canjiquinha ao dente e acho estranhíssimo, pois molinha é muito mais saborosa). No final, juntei um fio de azeite e mexi bem.

Os brócolis, cozinhei no vapor por 3 minutos e juntei sal e azeite. Comemos em dois o jantar que daria tranquilamente para quatro.



O sal era da casa. Esta canjiquinha (grãos de milho triturados) era finíssima e fiz como polenta. Se os grânulos fossem mais grossos teria feito como arroz (mesma medidas, mesmo jeito de fazer).


O vinho,
Deen De Bortoli IVA 4 Petit Verdot, Sudeste da Austrália,
escolhido pelo Marcos talvez casasse melhor com uma carne, mas, como diz meu amigo Luiz Horta, boa comida é aquela que não atrapalha o vinho. Neste caso, defendo o camarão que não fez mal algum ao vinho. Sei que isto não quer dizer uma boa harmonização, mas saímos da mesa felizes com a independência do crustáceo em relação à presença dos taninos fortes do vinho que sabia a especiarias frutadas.

Para as bananas
, nada de mais: um caramelinho com pouco açúcar, as bananas pratas fatiadas com um mínimo de água e fogo suficiente só para cozinhar de leve as frutas, que distribuí entre duas taças. Glaceei a frigideira com o pouco do vinho da nossa mesa e joguei sobre a taça. Comemos assim, morna, sem sorvete - e pra quê?

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Novo blog de comida no pedaço


Lili e eu estamos aqui!

Eu chego aos lugares, às vezes fico pouco, mas sempre levo um naco deles no meu farnel, vida afora. Na minha última empreitada, achei que consegueria levar adiante o curso de pós graduação de docência em gastronomia. Não consegui. Em compensação ganhei uma amiga, que já é íntima e pra sempre. Pensamos parecido em muita coisa, com a diferença que a Lili traz uma verve danada de boa na bagagem de socióloga.


Ela vai querer me matar, mas reproduzo assim mesmo sua mensagem que acabo de receber. Visitem, palpitem, dêem aquela força ao Farnel (e que nome apropriado!).



Neide,
Aos trancos, barrancos e sem certeza de nada, eis: o blog:
farnel.blogspot.com. Parece loucura, mas estou morrendo de medo... de que? nem eu sei! Afinal, ninguém acredita, mas eu tenho uma timidez disfarçada....
Sabe, resolvi meter as caras...
Não sabia direito o que escrever.
Enfim, dá uma olhadinha, quando puder. Aceito sugestões.
Afinal, se estiver legal: obrigada, vc me incentivou muito! E se estiver ruinzinho: a culpa é sua, vc me incetivou muito.
É tão confortante ter alguém para levar a culpa....
Obrigada, Neide!
Beijos,
Lili

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Pão de queijo de liquidificador - continuando o papo de ontem


Inspirada nos pãezinhos da Teresa e com a certeza de que nunca chegarei àquela perfeição toda, comecei minhas primeiras tentativas (estes da foto eram os que estavam a assar enquanto postava sobre isto, ontem). Bem, eles ficaram perfeitamente ocos e ainda macios por dentro, embora com a superfície bem crocante e flexível. Já fiquei imaginando uns recheios que combinassem. Comemos com o jantar e experimentamos rechear o buraco com o que tínhamos à mão – eu, salada; Marcos, um cubo de frango indiano. Mas imagino que ficaria melhor com carne seca desfiada, creme de camarão, queijo com geléia de pimenta... Pronto, cozinha é isto. Já não é mais pão de queijo, já não é mais pão de queijo de liquidificador e, quem dirá, o pãozinho da Teresa!

Vou continuar tentando melhorar, mas, por enquanto, lá vai a receita que saiu:

Pãozinho de polvilho com queijo

½ xícara de leite (120 ml)
¼ de xícara de azeite (60 ml)
1 ovo caipira pequeno
1 xícara de polvilho doce (tapioca starch, fécula de mandioca, goma seca)
2 colheres (sopa) de queijo parmesão ralado
1 pitada de sal ou a gosto
Flor de sal e alecrim para espalhar sobre a massa

Coloque no copo do liquidificador o leite, o azeite, o ovo, o polvilho, o queijo e o sal. Bata bem e distribua em forminhas de empada não untadas. Espalhe um pouco de flor de sal e folhinhas de alecrim por cima e leve ao forno bem quente. Deixe assar por cerca de 20 minutos. Rende: 24 pãezinhos.

Betumi
Aproveito para recomendar o site e
o blog da Fran Ósseo-Asare, que conheci no dia do almoço. Antropóloga americana, ela está passando um tempo no Brasil e é especialista em comida africana. No blog ela fala sobre ingredientes, das influências africanas e ainda relata a experiência no restaurante O Navegador.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

O Navegador, Rio



Achei que já tivesse comido bons pães de queijo. De fato, uns que comi em São Roque de Minas, na Serra da Canastra, eram deliciosos, feitos com o verdadeiro queijo canastra. Isto tomando por julgamento aquele tradicional pãozinho que temos em mente: macio, meio massudinho, gosto de queijo-minas. Agora, estes do Restaurante O Navegador, da Teresa Corção, que comi nesta última viagem ao Rio, são divinos. Não é porque ela é minha amiga, não. Poderia me calar, simplesmente. Mas eles poderiam até entrar numa outra categoria: pãezinhos de mandioca com queijo. Delicados, fofos, úmidos, macios, perfumados, com toque de alecrim. Fiquei com vontade de comer a cesta inteira e sei que poderia, pois a todo momento eles eram repostos, quentinhos. Só que havia ainda uma infinidade de coisas boas para provar, como as verduras e legumes orgânicos que ficam dispostos no que ela chamou de “ponto org” ou simplesmente”.org”. Ainda bem, é claro.
Mas, quanto aos pãezinhos, o que deu pra perceber é que ela não usa queijo fresco, mas sim grana padano ou outro parecido. E que a massa é do tipo mole que se assa em forminha. Ah, na superfície que brilha: sal e alecrim. Mesmo na textura, embra quase uma focaccia. Ela demorou meses de teste até chegar à fórmula pefeita. Então, vamos tentando nós também. Que tal pegarmos uma receitinha de massa de liquidificador (veja lá embaixo) e usarmos azeite, banha ou manteiga derretida no lugar do óleo; queijos dos mais variados tipos? Ou ainda usar polvilho azedo no lugar do doce? Meio a meio, quem sabe? Façam suas apostas, eu já estou pensando na minha. Se derem certo os pãezinhos que estão neste instante no forno, depois eu conto. Agora, se estiverem no Rio, não percam de vista esta cestinha de pães, que inclui grissini de mandioca (uma delícia também).
Legumes do .org. Sabores concentrados.
Serviço
Restaurante O Navegador
Av. Rio Branco, 180/6º andar Clube Naval
Rio de Janeiro - RJ - Cep 20040-003
Tel.: (55)(21) 2262-6037 / Fax: (55)(21) 2210-6107
Horário do restaurante: das11:30 às 15:30 (cozinha fecha às 15:00)
Pão de queijo de liquidificador, de um velho caderno de receita (é a receita que estou testando, com modificações - aqui, a receita original, nunca executada antes por mim): Bata no liquidificador 2 xícaras (de duralex - sic) de polvilho doce, 1 xícara de leite, 1/2 xícara de óleo, 1 ovo, 2 colheres (sopa) de queijo parmesão ralado, sal a gosto. Asse em formas de empadinha sem untar, forno bem quente.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Estufinha para viagem



Não há lugar aonde eu vá, que uma plantinha ou outra não me chame a atenção (e atice a cobiça de tê-la no meu quintal). Não deve ser invenção minha já que me parece uma coisa meio óbvia e muita gente pode ter tido a mesma idéia em lugares diferentes do planeta, mas vai a dica para quem nunca pensou nisto antes. Na minha viagem à Ilha do Marajó queria trazer junto a floresta amazônica, mas só trouxe o que coube nestas garrafinhas pet que conseguiram segurar a umidade das plantas até chegar aqui - e ainda continuam do mesmo vistosas – só vou abrir e transplantar daqui a alguns dias, quando elas tiverem enraizadas, já que só plantei a ponteira. É só ter o cuidado de trazer na bagagem de mão. Agora, não me responsabilizo se o ato for caracterizado como biopirataria na esteira de raio-x. Trouxe pau-d´álho (Mansoa alliacea - uma delícia, depois falo dele) e outras ervinhas de cheiro.

Como fazer: escolha garrafas pets com a tampa, empurre para baixo o rótulo (não tire, ele será útil) e corte a garrafa ao meio – de preferência transparente. Caso a planta seja grande, como muda já enraizada, use garrafa pet de 2 litros. Para ervinhas aromáticas, estas pequenas de água servem. Na metade de baixo, coloque um pouco de terra e plante a ponteira da erva (o terminal de um raminho novo, com poucas folhas), apertando bem com os dedos para que fique bem firme. Veja aqui, onde explico melhor. Junte as duas metades e vede com o rótulo empurrando-o pra cima. Está pronto. Agora é só ter paciência. Se deu tudo certo, as mudas chegam na sua casa sãs e salvas, nem murchas nem queimadas. Deixe-as na sombra por 30 a 40 dias e plante no lugar definitivo. É isto.
Para saber mais, veja aqui no Come-se:

Multiplicação das salvias

Plantar, colher, comer

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Ano de novo

Kátia e eu tomando coragem para passear no igarapé.

Demorei, mas voltei. Daqui pra frente, segue como dantes. Mas as viagens de fim de ano renderam. Primeiro porque fui ao Rio de Janeiro, treinei a cozinheira do meu cliente Filipe Miguez; comi no restaurante O Navegador, da minha amiga Teresa Corção - que, por sinal, recebe hoje Carlo Petrini do Slow Food; cozinhei camarões no apartamento da Nina Horta, onde fiquei hospedada; e joguei muita conversa fora tomando chope geladinho no bar da Adega do Cesare, com minha amiga carioca Kátia Brito. Depois fui à Ilha do Marajó, onde moram meus amigos Jerônima e Seu Brito, que têm lá uma pousada (Fazenda São Jerônimo). A Kátia é filha deles e também foi para o aniversário de 70 anos do pai. A festa teve direito a muito pato no tucupi e maniçoba, embalados por carimbó. Celso Fioravante, do Mapa das artes, é nosso amigo da PUC-SP e parece mais marajoara que qualquer nativo (basta dizer que vai pra lá 5 vezes por ano). Estar com ele, é diversão na certa. Bem, comi turu, mangaba, bacuri, frito do vaqueiro e despesquei curral para comer o peixe fresco. Depois, as delícias rurais em Fartura com a família. E, para terminar o ano, Gonçalves-MG, onde passei a virada com os amigos baianos Silvia Lopes, Claudia e Oswaldo Magalhães, além de Carmen Ávila, Mônica Manir e Carlos Colombo, amigos de sempre. Pelo jeito vou ter assunto para o próximo semestre inteiro (mas, perdoem-me se no trajeto tiver preguiça - e acontece).
E por falar em Natal e Ano Novo, estou quase assumindo que não gosto muito destas datas (olhe a dificuldade de sair de cima do muro e dizer de uma vez por todas: “eu odeio natal e ano novo”!). Talvez as próximas passe-as num retiro -não precisa ser espiritual, basta que um dia passe atrás do outro, sem horários para se abraçar. Como estas aranhas de Fartura que dia após dia armam suas teias ao por do sol e as recolhem ao amanhecer depois de cumprida a jornada (são nossos bichinhos de estimação que nos protegem de pernilongos e bichinhos irritantes, cujo excesso faz de qualquer paisagem bucólica um lugar inviável).

De tudo o que li nestes últimos dias, entre retrospectivas, previsões e desejos, o que mais me pareceu sensato foi o texto de ontem do Roberto DaMatta, no Estadão. Quem quiser ler o texto todo - eu recomendo, está aqui . Por ora, apenas dois trechos. E faço as dele minhas palavras. Se é que ele não se ofende.
“...Do mesmo modo que os tempos nos obrigam não somente a comprar, mas sobretudo a comer, e comer pantagruelicamente, o bacalhau e a rabanada, é difícil trocar a exagero da demagogia autocongratulatória, pela sobriedade do ceticismo que fala das ausências”.
E mais:
“...desejo do fundo do meu coração, caro leitor, que 2008 seja um ano em que você não deixe ninguém cuidar de você. Que seja um ano no qual você seja cada vez mais responsável por sua vida e que, para tanto, tenha uma robusta e indestrutível saúde física e mental. Que você seja também desconfiado e, para tanto, leia mais livros, revistas e jornais, desligando a televisão de quando em vez. E que você possa introduzir na sua existência pessoal um lema básico da vida democrática: seja reivindicativo, denuncie mais, reclame e clame por seus direitos...”
Roberto DaMatta

Festa de firma



Faz tempo que trabalho em casa, mas quando fui secretária em escritório já participei de muita festa de firma com amigo oculto e bilhetinhos secretos. Embora eu não sinta falta nenhuma de assinar ponto, cumprir horário e dizer bom dia pra chefe chato, os amigos secretos até que eram divertidos, momentos de conhecer melhor o colega do lado. Só não gostava quando em vez de dar dicas e sugestões de presentes os participantes pediam o cd xis de fulano, o tal perfume da moda da Boticário, o mocassim marrom número 40 da Birello ou a camiseta branca Pollo. Não tinha graça. Neste caso, eu preferia ficar fora da brincadeira e comprar meu próprio presente. O que eu gostava era da surpresa. Pra matar a saudade, entrei no amigo secreto de blogueiros de comida organizado pela Laila, que reuniu 41 pessoas desconhecidas (a maioria) e moradoras de lugares tão distantes quanto Canadá, Portugal, França ou Mirassol, cidade do interior de São Paulo onde mora a advogada Paula Amanda, para quem mandei uma sacola de pano e algumas especiarias que ela não tem lá. Os presentes, claro, foram itens de cozinha ou de comer. E, pelo que acompanhei, foram todos mimos de muito bom gosto e providenciais. Minha caixinha de surpresas veio de Salvador, enviada pela jornalista Camila Marinho, que durante a brincadeira assinou "Secretíssima", sem nenhuma pista. Logo de cara, abri o pacote maior. Colheres de servir feitas com madeira e casca de coco polida como jóia, um luxo só, lindas de causar inveja nos talheres óbvios de inox. E o pilão de madeira era o que faltava na minha coleção. Tenho um do mesmo modelo, só que menor e já rachado de tanto que eu uso. Então, chegou em ótima hora. Só com isto já estaria feliz da vida, mas vieram ainda porta-velas feito por ela, marcador de livro e uma baianinha fofa de cerâmica. Esta, infelizmente e apesar da embalagem cuidadosa, não resistiu aos sacolejos do transporte. Mas vou tentar colar. Isto sem falar no pacote de tempero baiano fresquíssimo (mistura à moda das massalas indianas que combina grãos de cominho e de coentro, pimenta-do-reino branca, pimenta seca, orégano seco e talvez cúrcuma triturados – foi o que identifiquei). Vou usar em ensopados de peixe e carne. A caixa veio preenchida com fitinhas do Senhor do Bonfim, que já me inspiraram algumas idéias na máquina de costura. Valeu, Camila!