quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Pão de batata-doce com figo

Não publico todos os pães que faço aqui pra não ficar repetitivo, já que faço pão toda a semana e cada um sai de  um jeito, de acordo com o que tenho na dispensa ou na geladeira. Às vezes misturo farinhas, acrescento tubérculos, raízes, o que tiver, enfim.

A fórmula é sempre mais ou menos a mesma, só vou mexendo na água de acordo com o que acrescento.

Este é de batata-doce com figo, não porque segui uma receita, mas porque me deu na telha vendo umas batatas-doces já cozidas esquecidas no freezer. Descongelei, juntei água, o levain (fermento natural, já reformado), farinha, sal. Pra não ficar muito sem-graça piquei uns figos e juntei também. Ficou muito bom, com casca dourada mas macia.

Veja o jeito de fazer em outros posts, como este. Mas vou explicar aqui rapidamente.


Um dia antes, reformei meu levain que estava na geladeira. No outro dia, ele estava super aerado e foi uma parte dele que usei (o restante, deixei sobrar só uns 100 g, guardei na geladeira).

Coloquei no liquidificador 400 g de batata-doce cozida, 250 ml de água e 175 g de levain. Bati bem até ficar cremoso. Passei para a tigela da batedeira de bolo com a pá para pão (ou pode fazer isto na mão), juntei 500 g de farinha de trigo orgânica branca, misturei e esperei 10 minutos. Bati por uns 10 minutos - se a massa ficar muito mole, junte farinha aos poucos (não é pra ficar uma massa dura, hem?). Se estiver muito dura, vá juntando água. No final, juntei uns 6 figos secos picados - mas nem precisa, ou podem ser substituídos por passas. Passei para uma tigela, cobri com filme plástico e esperei meia hora.

Você pode continuar assim: faça dobras na massa, formando uma bola - assim, vai esticando o glúten e aprisionando umas bolhas de ar que vão se expandir ao assar o pão. Passa mais meia hora e você dobra de novo. Quando começar a crescer a massa, modele e passe para uma cesta bem enfarinhada, com as dobras pra cima. Deixe crescer. Assim que a massa estiver levedada, coloque no forno uma panela de ferro ou barro com a respectiva tampa (usei duas assadeiras compridas de ferro, uma se fazendo de tampa), deixe no forno ligado a 250 ºC por cerca de 10 minutos. Emborque o pão na forma bem quente e enfarinhada (ou com folha de sete-copas, esta é a técnica que eu uso), faça cortes e deixe assar por 45 minutos a 1  hora (este era menor dos que costumo fazer e por isto deixei menos tempo), sem mexer na temperatura nem na tampa. Desenforme com cuidado e só corte depois de frio. Aí está:

Dendê só no aguardo...

Uns milhos coloridos

Antes do verão, comprei milhos diferentes na feira dos bolivianos, na praça Kantuta, e também ganhei milhos de amigos. E ainda tinha milho que plantei e colhi em Piracaia. Sempre milho crioulo. Na horta comunitária plantei uma fileira junto ao muro, numa terra dura e pedregosa - não dava pra substituir. O que viesse seria lucro. Plantei também feijão de corda. O milho deu meio mirradinho, mas as espigas mal despontaram já foram colhidas - isto acontece mesmo em hortas comunitárias. Às vezes colhe-se para comer, outras, por curiosidade. Mas é o preço de ter uma horta aberta. Temos que treinar o desapego. 

O fato é que se eu não colhesse estas duas espiguinhas ficaria sem saber como saíram - sabia que os grãos sairiam coloridos e mesclados - já que milhos de diferentes variedades foram plantados juntos. Como a polinização é feita pelo vento, os pólens se misturam a menos que sejam plantados com certa distância de tempo e de espaço. 

Pois aqui estão. Maior dó de comer.







sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Talharim de taioba com almôndegas

Vou tentar ser breve. É que tenho dez minutos para escrever e postar esta receita, pois prometi para uma leitora do instagram, mas tenho compromisso em dez minutos. Ops, já se passou um.

A receita é fácil: cozinhei em água fervente 3 folhas de taioba, sem os veios, até ficar molinha. Escorri, espremi bem, mas bem mesmo. Esperei esfriar e coloquei no liquidificador (deu mais ou menos meia xícara dela bem espremida, um pouco mais talvez). Junte 3 ovos e bati com uma colher de chá de sal. Passei para o processador e fui juntando farinha - a princípio 3 xícaras. Com o processador ligado. Juntei um pouco mais. Formaram-se uns grumos que logo se juntaram. Fiz uma bola, coloquei dentro de um saco plástico e guardei por meia hora. Dividi em pedaços, abri na maquininha, tudo enfarinhado, cortei em talharim e deixei secando na cadeira - é só virar a cadeira sobre a mesa e usá-la como varal de massas - claro, tudo muito limpo e enfarinhado.


Cozinhei em bastante água fervente e servi com almôndegas com molho (6 minutos me restam ainda, ufa, de modo que dá pra dar a receita das almôndegas). Piquei 3 pedaços de pão - cerca de meia xícaras. Ele estava bem duro e era de nozes. Juntei a ele 1 ovo, 1 cebola ralada, sal, pimenta-do-reino, cheiro verde finamente picado, páprica defumada, uma  pitada, uma pitada de canela e 1 dente de alho socado. Juntei umas 3 colheres (sopas) de leite e esperei o pão amolecer neste tempero. Juntei tudo com a carne, misturei, fiz bolinhas, fritei na frigideira, todas ao mesmo tempo, chacoalhando a frigideira de vez em quando pra fritarem por igual - cerca de 20 minutos.  Azeite, cerca de meia xícara. Tirei as almôndegas, escorri o excesso de azeite. Fritei ali uma cebola picada e 2 dentes de alho, juntei 2 latas de tomate pelado, uma pitada de orégano, sal, páprica defumada e deixei cozinhar por 15 minutos.  O molho já estava pronto quando joguei o macarrão na água pra cozinhar por cerca de 2 minutos. E aí está! Pronto, deu o tempo. Nhac!


quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Foraging tour: passeio para reconhecimento de plantas alimentícias não convencionais na City Lapa

Pois aqui está. Tanto que pediram (e eu preciso ganhar uns trocos), que resolvi me organizar para fazer um passeio por mês para iniciantes,  para reconhecer, identificar, fotografar, colher e cozinhar plantas alimentícias não convencionais, panc´s, encontradas no espaço urbano.

Um encontro por mês vai possibilitar acompanhar diferentes espécies ao longo do ano, observando assim a sazonalidade não só das ervas espontâneas mas também de outras plantas comuns ou não, encontradas em espaços não convencionais ou colhidas em estágios pouco usuais.  Você pode se inscrever em um passeio ou em todos, pois sempre haverá novidades. (obs: agora já são duas turmas - primeira segunda e primeiro sábado, preferencialmente).

Ao final, um almoço com pancs colhidas ou de outra natureza.  Teremos ainda bebidas fermentadas e pão de levedação natural. Quem vier, sairá ainda com mudinhas de levain, de kombucha e kefir. 

Quando:  toda primeira segunda-feira e todo primeiro sábado do mês, preferencialmente. 

Horário: das 9 às 16 horas - ou mais tarde, se o assunto estiver animado.


Vagas limitadas: serão apenas 10 vagas por turma porque na volta nos reuniremos na minha cozinha. Se perder o primeiro encontro, já reserve a vaga para o segundo. Claro, se houver muita procura, abrirei outros dias da semana - se tiver demanda, no sábado. Ou para turmas fechadas. Nenhum passeio será igual ao outro, de modo que poderá fazer todos, se quiser e se puder. 


Para mais informações: escreva para neide.rigo@gmail e coloque no assunto: pancnacity  - para que a mensagem não se perca entre as várias que recebo.  

Valor: verifique no momento da inscrição.  

Hibisco de flor vermelha refogado com camarão seco


  • O hibisco que a gente costuma usar no chá e que maranhenses conhecem por vinagreira é o Hibiscus sabdariffa, cujas folhas são usadas como verdura e as sépalas das flores viram chás, geleias etc. Hibiscos ornamentais também são comestíveis, folhas e flores - mas não tão gostosos quando a vinagreira e este que mostro aqui, o Hibiscus acetosella, de folhas avermelhadas, cuja primeira planta ganhei de minha amiga Verônika. Todas as mudas que tenho hoje originaram daquela.


    Na horta comunitária temos dois pés e estavam enormes, por isto precisei podar. Usei as folhas azedinhas, cortei os galhos em pedaços de uns trinta centímetros e plantei. A planta brota facilmente por estacas.


    O Hibiscus acetosella é conhecido também como hibisco cranberry, falsa roselle (roselle ou ´groselha´ é o outro nome da vinagreira) ou hibisco de flor vermelha e pode ser uma planta perene de acordo com o clima. Por aqui, nunca morre, mas em climas frios se comporta como planta anual. É originário da África e provavelmente foi trazido pelos escravos. Em alguns lugares da África é hoje consumido como verdura.

As folhas jovens têm um sabor ácido delicioso, ótimas para compor saladas. Mas as mais velhas também são comestíveis como verdura cozida. Como são muito ácidas, é bom sempre misturá-las com outros ingredientes como carnes, peixes ou  outras folhas. 

São ótimas também para fazer sucos e coqueteis, não só por causa da acidez como também pela cor. Experimente adicionar as folhas na limonada gelada.  Diferente da vinagreira, as sépalas das flores deste hibisco não são carnudas, mas as pétalas podem ser adicionadas em saladas - vale lembrar que as flores ficam abertas só  um dia e que são parentes dos quiabos, portanto, a planta toda tem algo de mucilaginoso. Como planta medicinal, é considerada como anti-inflamatória por causa dos polifenois presentes. 

Por estas e por outras, não poderia desperdiçar as folhas que recolhi na poda. Antes de saber o que faria, cozinhei em água salgada da mesma forma que faço com o espinafre, já que as folhas já não eram tão jovens. Por fim, resolvi fazer um refogado à moda de cuxá, que se faz tradicionalmente com as folhas do outro hibisco - também azedinhas, e camarão fresco, pra comer com arroz - arroz de cuxá.  Com algumas licenças e com uma foto horrível - foi o que consegui com um péssima luz noturna, aqui está minha versão. 

Hibisco de flores roxas com camarão seco - Cuxá 

  • Cozinhei uma tigela de folhas de hibisco em água fervente e salgada, por cerca de 10 minutos ou até que ficassem macias. Escorri, piquei bem e reservei. Descasquei cerca de 70 g de camarão seco e deixei de molho em água enquanto já começava a preparar o refogado. Numa frigideira, dourei em azeite 3 dentes de alho picado, juntei 1 cebola picada e 1 tomate picado. Deixei refogar por 3 minutos ou até que o tomate amolecesse. Juntei 1 moeda de gengibre ralado, 1 pimenta-de-cheiro picada, 2 colheres (sopa) de coentro picado e a mesma quantidade de cebolinha picada. Mexi e juntei a folha picada, o camarão seco picado e 1 xícara de camarão fresco temperado previamente com sal e pimenta. Deixei o camarão cozinhar e polvilhei por cima farinha de mandioca, só pra engrossar um pouco o caldo. Acrescentei também 4 colheres (sopa) de gergelim torrado. Provei o sal, corrigi, deixei cozinhar mais uns minutos e servi com arroz branco.  Se precisar, junte um pouco de água quando acrescentar o camarão e junte folhas de coentro pra decorar. 
Rende umas 6 porções. 

  •  

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Docinho de batata-doce roxa com flor de sabugueiro e recheio de coco

Esta não é exatamente uma receita, afinal só tinha uma batata doce roxa colhida acidentalmente na horta comunitária (sim, ela está linda com esta chuvarada) quando estávamos trabalhando em mutirão no domingo.  Uma linda batata que cozinhei sem saber bem o que faria com ela. Por fim, tinha um doce que coco que havia comprado na feira, na banca do Manuel e então resolvi juntar as duas coisas.

Ia fazer pasteizinhos também com a banana, mas ela estava madura demais
A cocada que usei como recheio 

Apenas cozinhei a batata e passei pela peneira. A massa tinha a mesma consistência daquele pastelzinho de banana-da-terra que já postei aqui. O jeito de abrir a massa também é igual ao de banana. Uma porção de massa (sem açúcar nem nada) entre duas folhas de plástico, prensagem com algo reto e pesado (o fundo de uma cafeteira serve),  tira uma das folhas de plástico, coloca no meio o recheio e fecha com ajuda do plástico de baixo. Corta com cortador ainda com o plástico, fazendo uma meia lua e já está!  Se quiser, decore com florezinhas comestíveis pressionando-as entre a massa e o plástico. Neste caso, as brancas e cheirosas flores de jasmim também ficariam lindas, mas acabei usando as flores que florescem neste momento na horta comunitária - as de sabugueiro.

Da próxima vez, vou acrescentar umas gotinhas de essência de baunilha na batata-doce. Mas ainda assim, sem nada, ficou um doce delicioso. A batata roxa não é muito doce e equilibrou a cocada bem doce do recheio.  Tentei passar na frigideira com manteiga e com azeite, mas não aconselho. Fica feio, as flores amarelam e não tem acréscimo de sabor. Então, como massa e recheio já são cozidos, é só comer os pasteizinhos ainda que com talher. Um molho inglês iria bem.

E nhac!

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Quinta sem trigo: panquecas coloridas com flores

A massa é aquela mesma das panquecas coloridas feitas com polvilho de mandioca, que ensinei neste post: panquecas coloridas.

Já o recheio, você escolhe o que quiser, mas eu fiz uma mistura de ricota com berinjela assada e picada finamente, uvas passas, orégano e aqueci tudo isto numa frigideira onde previamente fritei cubinhos de cebola em manteiga.

Para inserir as flores e folhas na massa, coloquei por cima da massa molhada - e não por baixo, como faço com as tapiocas. Depois que vira, deixe cozinhar só alguns segundos para fixar o vegetal. E aí está.  Use ervas como folhas de manjericão, tomilho, orégano, guasca ou flores comestíveis. Aliás, em sites americanos você vai encontrar centenas delas. Procure como "edible flowers".

Coloquei o recheio ainda morno, dobrei as panquecas e reguei com manteiga clarificada quente perfumada com sálvia.





sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Leite fermentado ou "yakult caseiro" com kefir

Yakult, todo mundo sabe, é aquele leite fermentado ralo, docinho, gostoso, ácido e com lactobacilos vivos, especificamente Lactobacillus casei Shirota.  Tem um sabor muito peculiar, especialmente porque contém um aroma secreto não descrito nos ingredientes. O que aparece é leite desnatado e/ou leite desnatado reconstituído, açúcar, glicose, fermento lácteo e aroma. Resumidamente, é um leite bem diluído, adoçado e aromatizado, com adição de lactobacilos vivos - que podem colonizar beneficamente nosso trato digestivo. 

Nunca pensei em fazer em casa até que minha vizinha Ana me chamou no muro e me deu um copinho com um yakult perfeito, só que era uma réplica feita com soro de kefir. Claro, pedi a receita e ela me passou: "500 ml de soro de kefir, 300 ml de leite, 1 colher (sopa) de essência de baunilha, 4 gotas de essência de laranja, açúcar a gosto".  Aliás, se você conhece o autor desta fórmula ou a fonte onde foi publicado pela primeira vez, pode reclamar a autoria que eu desconheço, já que chegou aqui por vias indiretas.

Assim que pude, drenei kefir de leite até conseguir meio litro e fiz a receita do meu jeito, afinal não queria usar essências artificiais, por isto usei baunilha verdadeira (o açúcar da baunilha-do-cerrado) e o óleo espremido da própria casca da laranja. Também achei melhor dar um pouco de cor ao líquido muito esbranquiçado e juntei caramelo de açúcar. O leite que uso para o kefir vem da roça e é puro e cru. O que usei para acrescentar à bebida é o mesmo, só que fervido e desnatado. Ficou tão bom, tão bom, que não consigo parar de beber. A baunilha com a laranja e o ácido do kefir de repente ficam com gosto de yakult. Com a diferença que o kefir pode chegar a ter 70 microorganismos benéficos e vivos. Tenho posts a respeito. É só ir no campo de buscas.  Se não conseguir fazer a minha receita, use a fórmula básica acima e adapte ao que você consegue ter de ingrediente. Só com kefir, leite e açúcar já fica muito bom. 


Leite fermentado com kefir 

3 colheres (sopa) de açúcar e 3 colheres (sopa) de água
500 ml de soro de kefir *
300 ml de leite desnatado
2 colheres (chá) de açúcar de baunilha-do-cerrado (ou de qualquer outra  fava da baunilha guardada em açúcar)
Uma tira de casca de laranja bem lavada

Leve ao fogo o açúcar e a água misturados e espere formar um xarope de caramelo. Espere esfriar.
Junte o soro do kefir com o leite, acrescente o açúcar de baunilha, o xarope de caramelo e esprema perto da superfície do líquido a casca de laranja. Quando você aperta a casca, as células se rompem, deixando escapar vapores do óleo perfumado. Misture bem e sirva bem gelado.

O soro do kefir de leite 
* Se não tiver kefir, pode comprar pelo Mercado Livre ou procurar listas de doadores perto de você (infelizmente não tenho mais como atender as pessoas que querem - mas já fiz minha parte doando a centenas de pessoas - espero que elas também tenham se tornado doadoras. O que faço agora é trocar por mudas frutíferas já produzindo ;)

Para saber mais sobre o kefir, veja estes dois links e outros mais, procurando pela palavra chave kefir aí no campo de buscas:
http://come-se.blogspot.com.br/2007/06/receitas-com-kefir.html
http://come-se.blogspot.com.br/2009/03/bolinhas-de-kefir-no-azeite.html





quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Um jeito pouco usual de se preparar sagu. Coluna do caderno Paladar. Edição de 05/01/2015

O assunto era pra ser um, mas hoje é quinta, então é outro. É que tem coluna Nhac no Paladar e aproveito para deixar aqui também. Se quiser ver no blog do Paladar, vá lá e aproveite para ler o caderno inteiro, que está muito bom. Ou compre o jornal Estadão, nas bancas. 

Já falei muito sobre sagu aqui no blog. Basta ir no campo de busca e ver as opções, mas hoje falo de uma técnica diferente de usar sagu -já tinha mostrado também aqui no Come-se, mas não para os leitores do jornal. 

Então, aqui está o texto, um resumo de tudo o que já disse um dia aqui. 



Sagu de mandioca

Algumas vezes o marido otorrino já teve que tirar a bolinha branca do ouvido ou nariz de uma criança e ensiná-la que sagu é gostoso pra se sugar pela boca quando bem cozido, cremoso, macio, elástico, escorregadio, quase sempre tingido de vinho tinto para alegria de adultos e pequenos.

O que não costuma nos ocorrer na hora do deleite é associar a bolinha às nossas raízes. Aliás, se por um lado a mandioca é ignorada como matéria prima, por outro,  pode-se achar  redundante dizer sagu de mandioca, afinal toda bolinha branca encontrada nos supermercados brasileiros é feita com o amido dela.  E, pela origem desta matéria prima, há quem acredite que sagu seja produto da terra.  Não é. Nem tão óbvio que o ingrediente seja sempre a mandioca, nem que a técnica seja expertise indígena, embora a farinha de tapioca do Norte tenha alguma semelhança.

Tradicionalmente,  as pérolas de sagu ou pearl sago, como se diz na língua inglesa, são feitas do amido extraído do interior do tronco de palmeiras encontradas na Ásia e Pacífico, todas do gênero Metroxylon, incluindo a M. sagu, mais comum, que dá origem ao nome popular em quase todo o mundo.  No século XIX as bolinhas brancas que aumentam de tamanho e se tornam translúcidas depois de cozidas começaram a fazer parte da dieta da tripulação dos navios que voltavam da Ásia trazendo chá para a Europa. Cruas, ocupavam pouco espaço. Cozidas, inchavam, enganavam a fome. Não demorou muito e o sagu foi incorporado como ingrediente na cozinha inglesa. E aos poucos foi se transformando em pudins, manjares e mingaus infantis.

O que isto tem a ver com nosso sagu de mandioca? Acontece que as bolinhas fizeram tanto sucesso, que a produção asiática à partir do amido da palmeira não conseguiu atender à demanda e, assim, elas passaram a ser feitas com outros tipos de amido com características parecidas, sendo o mais similar e mais farto o de mandioca. Mas podem ser feitas também com uma mistura de amidos de mandioca e de batata doce, como fazem os chineses. Ou ainda com araruta, usada em vários países da América do Sul.  Féculas de batata, de feijão e de milho são outras escolhas. O fato é que sagus são produzidos com tipos de féculas diferentes, geralmente as que são mais fartas no lugar. No nosso caso, de mandioca.  O importante é que resultem em pequenos grãos esféricos que fiquem translúcidos ou transparentes com textura elástica e gomosa depois de cozidos.

Na Índia o sagu é feito de mandioca como o nosso, mas podem ser brancos ou coloridos e ainda hoje uma grande parte é produzida  artesanalmente. O processo doméstico envolve a extração da fécula – ralar a mandioca, lavar, separar a fibra, deixar o caldo leitoso em descanso para que o amido se sedimente e desprezar o líquido sobrenadante – do mesmo jeito que extraímos a goma para a tapioca. A massa úmida pode ser agitada sobre tecido para se formem grânulos ou pode ser  pressionada contra peneira perfurada. Depois as bolinhas passam por secagem em tachos para pré-gelatinizar o amido e extrair a umidade. Elas ficam soltas e opacas. Na indústria, a diferença é que todas estas fases são mecanizadas, só isso.  As raízes passam por extratores do amido que segue, por sua vez, seu trajeto entre granuladores, cilindros giratórios, placas aquecidas, fornos, desidratadores e empacotadores. Com isso, as pérolas de sagus encontrados no comércio são pequenas esferas perfeitas.

Perfeitas, mas insípidas como também são as artesanais independente do tipo de amido usado. O que confere sabor é o tempero que vai no preparo.  Por aqui,  o mais comum é cozinhar com vinhos, frutas vermelhas, cravo e canela. Porém, mundo afora o sagu tem tantas variações que a gente não faz ideia. Se da farinha de tapioca que é nossa não conhecemos da missa a metade, do sagu então, menos ainda - pelo menos não vemos por aí muitos usos além dos clássicos sagus doces do tempo dos mingaus ingleses ou imitações de caviar quando tingidos de preto – aliás, eles absorvem bem pigmentos e sabores.

Na Índia, eles entram em saladas, sopas, bolinhos com batatas, em discos brancos ou coloridos fritos e crocantes como chips e, claro, sobremesas. Nos mercados chineses, as bolinhas de sagu podem ser encontradas em tamanho maior e coloração enegrecida  graças à passagem por caramelo ou pigmentos alimentares - no bairro da Liberdade, em São Paulo, não é raro encontrá-lo.  Os chineses usam o sagu escuro no Bubble tea, feito com chá verde gelado. Os japoneses chamam uma bebida parecida de Pobá ou bobá que pode ser feita com leite ou suco de frutas. Nos dois casos, o sagu representa a parte mastigável e divertida do suco. Nas Filipinas, uma cobertura de sagu com calda de açúcar faz parte da guloseima vendida na rua, o taho, espécie de coalhada de leite de soja . Na Tailândia, há inúmeras sobremesas, de pudins a sopas, feitas com as bolinhas.

Como tem a mesma composição da tapioca, não demora muito e será a próxima estrela das academias.  

Não importa o que pretenda fazer com o sagu, uma boa forma de preparo é deixá-lo coberto com bastante água por algumas horas ou durante a noite, depois deixar escorrendo numa peneira por 4 horas até perder o excesso de umidade e aí sim prosseguir o preparo. Em vez da água, pode usar água colorida naturalmente com pigmentos vegetais – com flor de hibisco, malvavisco ou feijão-borboleta, por exemplo. Se for cozida, cerca de 25 minutos em bastante água fervente são suficientes. Mas se esqueceu de deixar de molho e quer usar imediatamente, cozinhe em bastante água fervente – cerca de 1 xícara de sagu para 3 litros de água por cerca de uma hora, escorra, enxague em água fria para extrair o excesso de goma diluída e siga o preparo – com vinho ou leite, por exemplo. As bolinhas hidratadas podem ser apenas salteadas como verá na receita a seguir.

Só para ilustrar, escolhi um prato indiano com ingredientes que temos em comum e que pode ser servido quente ou frio. Além de delicioso, é colorido, refrescante, fácil de guardar, servir e transportar, sendo uma ótima escolha para fazer com antecedência em dias de festas ou para levar em refeições comunitárias ou piqueniques.




Sagu de festa

3/4 de xícara de sagu  
1 xícara de água
3 colheres (sopa) de óleo  
2 colheres (chá) de grãos de cominho e 2 de grãos de mostarda preta
2 batatas cozidas, com ou sem pele, cortadas em cubos (ou batata-doce)
1 pitada de açafrão-da-terra em pó (cúrcuma)
8 tomates cereja cortados em metades ou 1 tomate picado em cubos
1/2 colher (chá) de pimenta vermelha em pó
1 pimenta dedo-de-moça verde, finamente picada
1/4 de xícara de castanhas de caju tostadas – ou use amendoins com pele torrados  
1/4 de xícara de uvas passas e/ou damascos picados hidratados por uma hora e escorridos
Sal a gosto
2 colheres (sopa) de suco de limão fresco ou a gosto
Coentro picado a gosto

Hidrate o sagu: cubra as bolinhas com 2 litros de água e deixe de molho durante uma noite ou por pelo menos 5 horas. Escorra pela manhã e deixe na peneira por cerca de 4 horas ou até o momento de preparar. Estas bolinhas já hidratadas podem ser guardadas na geladeira por até três dias, para usar depois. 

Em uma frigideira grande, aqueça o óleo em fogo médio. Junte o cominho e a mostarda e espere começar a pipocar.  Acrescente as batatas em cubos e refogue-os por 5 minutos ou até começarem a ficar crocantes. Neste momento, junte a cúrcuma em pó e misture.  Em seguida adicione o tomate picado, pimenta em pó e a pimenta picada e refogue rapidamente, só para o tomate murchar (3 a 4 minutos).  Coloque as castanhas e as frutas secas e tempere com sal a gosto. Refogue só para aquecer bem (1 a 2 minutos). Junte o sagu e já desligue o fogo. Vá mexendo devagar, de baixo pra cima, até as bolinhas ficarem translúcidas e soltas. Só o calor dos ingredientes e da frigideira dever[a ser suficiente para cozinhar as bolinhas. Se as bolinhas não ficarem translúcidas,  ligue o fogo mas não pare de mexer a mistura delicadamente para evitar que as bolinhas se grudem. Espalhe por cima o suco de  limão, mexa, junte o coentro picado e sirva quente, morno ou frio.

Rende: 4 porções 


Muitas variações são possíveis

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Mais um ano. Estamos de volta.

Minha irmã e meu cunhado durante o primeiro café da manhã deste ano,
no sítio
O ano velho foi tão corrido que nem tive tempo de me despedir, desejar bom ano novo para os leitores, agradecer todos que acompanham, comentam, me desculpar pela falta e deselegância de não responder a todas as perguntas, fazer um resumo do que aconteceu etc. Mas pelo menos desejar bom ano, agradecer e me desculpar posso fazer agora.

Espero que o ano novo seja de muita saúde, alegria, compreensão, respeito, contato com a natureza, tempo para os amigos e família, diversão, amor e disposição para a melhora.

Este ano me senti meio relapsa com o blog. Não que as coisas não estivessem acontecendo, que me faltasse assunto. É que o tempo foi pouco mesmo. Aceitei muitos trabalhos, muita viagem - todos muito interessantes para mim - e as atividades foram se somando com a rotina de casa, da horta, do sítio. Às vezes vejo email no celular, em trânsito, e não tenho como responder. Ou esqueço de rever no computador.  Pelo menos com o Instagram posso ir publicando o que vejo, o que como, o que me chama a atenção. E não preciso estar no computador para isto. Claro, deu mais dinamismo, mas também mais superficialidade naquilo que às vezes eu poderia me aprofundar se estivesse numa mesa. Mas não se pode ter tudo o que quer. Por isto, agradeço a compreensão e peço desculpas pelo que possa parecer pouco caso.

Para quem acompanha o blog nem sei se atualizei a informação de que não vendemos o sítio em Piracaia, nem vamos vender mais. Sempre que mostrávamos o lugar para os interessados, terminávamos pensando: poxa, que chácara legal! Vamos ficar pra nós!  E assim foi. A pessoa mais próxima de comprar foi uma leitora que acabou virando amiga,  agora mora na minha rua, ajuda na horta e acho de desistiu da ideia fixa de morar no mato.  E acabamos ficando ainda mais apegados ao sitio, agora com água boa, de uma nascente. Sempre que vou pra lá, publico fotos no Instagram e você pode acompanhar no próprio blog, clicando nas fotinhas que aparecem na barra da direita.

E falar em horta, está aí algo que deu o que falar neste ano e também ocupou tempo. Depois de tanta reclamação de alguns vizinhos em relação à horta comunitária que criamos na minha rua, de ela ter sido criticada no jornal do bairro, de ter saído no Uol, Caderno Aliás do Estadão e no G1 (estes todos em apoio à horta), está mais firme e verde do que nunca. Ganhou calçadas novas da subprefeitura, ficamos com mais espaço.  E agora acabamos de ganhar paralelepípedos para fazermos o contorno dos canteiros. Deu um trabalhão carregar pedras no feriado, mas valeu a pena.  Também tenho publicado muitas fotos no Instagram - para quem tem, o meu é neiderigo.

E amanhã continuo com uma receita de yakult com soro de kefir. Prometo que vou tentar mais regularidade e aprofundamentos como antigamente. Que nosso ano novo seja suave, com bastante comida gostosa (nosso e de todo o mundo)!