Como disse nos posts anteriores, nos vilarejos do Senegal não é comum haver um cômodo da casa chamado cozinha ou algo similar. Pode, sim, haver um local fechado para se guardar os utensílios e mantimentos, como se vê numa das fotos do álbum abaixo. As casas resumem-se a várias cabanas com cerca de 25 metros quadrados que servem de quarto, mas também de sala íntima e até de sala de jantar, se necessário - quando lá fora está muito quente ou chove, a comida é servida nesta parte da casa. De resto, a ala social e de cozinha é o páteo aberto.
Demora-se muito no preparo do alimento. Não só porque é feito sempre em grande quantidade para a família numerosa, mas também porque não existe muitas facilidades. O feijão de corda tem que ser debulhado no pilão, peneirado, escolhido. O arroz consumido em grande quantidade geralmente é importado e já vem limpo, mas muita gente nos vilarejo consome o arroz local que também vai ser limpo no pilão. Para o pilão vai ainda o milhete, cereal farto por lá, mas de limpeza super trabalhosa, pois o grão é minúsculo e revestido com película resistente que tem que ser removida para o preparo da farinha, do mingau e do cuscuz. Por isto, muita gente tem trocado o milhete pelo arroz. Nas cidades maiores é comum vermos bujões de gás com uma boca de fogo, fácil de transportar para o quintal e recolher se for preciso. Nas minhas oficinas usamos estes fogareiros. Mas nas aldeias o fogo de lenha é improvisado no chão, sobre o qual se apoiam grandes panelas com pezinhos.
A comida é feita geralmente em panelas grandes, mexida com enormes escumadeiras. Muita gente da família pode ajudar no preparo coletivo da comida, mas numa casa onde há duas ou mais esposas, elas se revesam a cada dois dias ou uma por semana, a depender da combinação, já que nem sempre elas se combinam e a disputa para ver quem faz a melhor comida para o marido pode ser acirrada.
Na hora de comer, a comida é servida sempre bem quente, o arroz ou cuscuz por baixo e a mistura por cima, que pode ser peixe, frango ou carne de cabrito ou vaca, sempre com algum legume ou ao menos muita cebola. Ou pode ser só carne com pão. Como não há geladeira, a comida é sempre muito fresca e saborosa. Minha única implicância é em relação à quantidade de óleo excessiva e o tal caldo maggi que aparece em tudo. Nas aldeias, menos. Antes, o óleo de amendoim extraído artesanalmente era o preferido, mas hoje nem todos tem acesso a este óleo mais puro - em muitas aldeias ainda há prensas para isto -, e optam pelo óleo refinado do mercado. E quanto ao caldo maggi, sinceramente acho que é dispensável já que os temperos como pimentas malaguetas, pimenta-do-reino, cebola, massa de tomate, tamarindo, vinagre e ervas são ingredientes que sempre acompanham os tais cubos - eles poderiam sair de cena que ninguém sentiria falta. Mas falo dos tempero depois.
Para comer, as mãos. Direita, sempre. Colher, só se estiver acontecendo uma oficina como a nossa por perto. Mas não é comum nas casas, mesmo para medir ingredientes - nas oficinas fiquei sabendo que minhas medidas em colheres não seriam tão fáceis de serem seguidas. Para servir mingaus - com bolinhas de milhete, por exemplo, são usadas colheres feitas de cabaça, mas quem come tem que entornar a caneca ou cuia. Pratos de louça, individuais, também não há. Precisei de um numa das oficinas e não encontraram de jeito nenhum, nem nas casas, pra emprestar. Só travessas grandes de aço inoxidável ou bacias. Os utensílios costumam ser lavados com duas ou três bacias de água apoiadas no chão. Para secar, qualquer superfície mais alta e ensolarada serve de escorredor, como se vêem nas fotos. Pano de prato não há.
Uma coisa interessante é que as mulheres não se agacham como os ortopedistas preconizam, dobrando os joelhos. Elas se abaixam com as pernas retas, fazendo um vê com o corpo. E o mais incrível é que, seja por isto ou por treinar o equilíbrio da coluna com bacias de água na cabeça ou filhos nas costas, elas são as mulheres mais eretas que já vi. Não se vêem mulheres arcadas, com ombros caídos e corpos pendendo para um lado, como é comum vermos por aqui.
Aqui, mais fotos:
12 comentários:
O ano está chegando ao seu final e estou visitando os blogs que sigo ou me seguem. Confesso que mesmo seguindo-a meu tempo foi muito curto para comentar. Hoje, lendo a postagem fiquei fascinada e prometo ler senão todas, a maioria delas. Desejo-lhe um bom Natal e que 2012 seja repleto de saúde, novas conquistas, amor, sucesso e paz.
Abraço,
Beth.
Ai Neide que delicias de fotos e relatos! Obrigada por compartilhar com a gente!
Bjs
trouxe pilão pra sua coleção?
Oi,Beth! Logo logo tiro uns dias entre natal e ano novo, portanto vai ter muito tempo para ler os atrasados... Ou veja pelo menos os álbuns. Obrigada!
Dricka, eu é que fico feliz por isto.
Angela, advinha se não trouxe? Só não veio a mão do pilão. Ficou no raio x - e o medo de eu acertar o piloto com aquilo? Mas veja a foto dele, lá atrás, na parede, todo desenhado, lindo: http://come-se.blogspot.com/2011/12/de-volta-do-senegal.html
Um abraço, N
As diferenças são incríveis não. Pelo menos aqui em São Paulo todas cozinheiras fazem uso de um paninho enquanto cozinham, pratos e colheres nem se fala.
Queria ver a cara de numa nutri de produção do controle de qualidade, no Senegal presenciando essas oposições.
Beijos
Bruna Buesso as cozinheiras no Senegal podem nao ter um paninho como voces em São Paulo mas estao sempre a lavar as maos com água e sabão. Higiene não é o que falta por esses lados.
E quanto às cozinhas: não é so nas grandes cidades que existem cozinhas normais, nas pequenas cidades e em alguns povos também têm. Apenas faz parte da cultura cozinhar ao ar livre para poder fazer comida a lenha, tal como faziamos à 50 anos atrás. Porque lembro-me da cozinha da minha avó sem fogão, apenas com uma lareira para cozinhas. e que boa saia a comida.
Outra coisa, chover sim que chove. Depende da época do ano e da zona. é verdade que no norte nao chove tanto, Mas se vais para o sul chove imenso entre agosto e outubro. chove tanto que podes até tomar banho à chuva. e que bom é saltar debaixo da chuva
e esqueci-me de outra coisa: nem todas as pessoas comem com a mão. Nas aldeias de casas de barro sim, mas não em todo o pais.
Caty,
obrigada pelas informações. É isto mesmo, as mulheres lavam as mãos a todo momento e cozinham fora para poderem usar a lenha, mais saudável se usada em local aberto. E eu aqui só falo dos lugares por onde passei. Adoraria mesmo poder tomar banho na chuva. E, claro, comer com as mãos acontece mais nas aldeias, mas também vi muita gente da cidade comer assim. Sempre há uma bacia com água e sabão para se lavar as mãos.
Um abraço, N
Peço desculpa pelo comentário, mas vi coisas escritas por algumas pessoas que me fazem pensar que talvez fiquem com ideia errada do que existe no Senegal.
As pessoas ai sao bastante mais rspeituosas que pelo mundo que dizemos ocidental. Existe muito mais higiene que por aqui. Outra diferença que eu acho incrivel é o nao uso de papel higiénico porque se lavam imediatamente com água. Para mim isso é do mais limpo que posso ter visto. A mim custou-me ir a uma discoteca e ver uma mangueira coo a dos bares para te lavares. Incrivel ;)
Caty,
não tem do que se desculpar. Informações como estas apenas complementam o post. Pelo menos a maioria dos leitores do Come-se é bem respeitosa sim. É este o espírito do blog. O que a Bruna quis dizer, penso, é que muitas nutricionistas talvez ficassem desnorteados com as diferenças culturais no que se refere às condutas de higiene ensinadas nas escolas daqui.
Um abraço, N
NEIDE ADOREI SEU BLOG E AS CURIOSIDADES SOBRE A CULINÁRIA E OUTRAS COISAS DO SENEGAL, AS FOTOS TAMBÉM SÃO MUITO BOAS, ALIÁS AS NEGRAS DE LÁ SÃO LINDISSIMAS, INCRIVEL O BRANCO DA ROUPA DELAS. AMEI TUDO!
BJS JOSINHA!
NEIDE ADOREI SEU BLOG E AS CURIOSIDADES SOBRE A CULINÁRIA E OUTRAS COISAS DO SENEGAL, AS FOTOS TAMBÉM SÃO MUITO BOAS, ALIÁS AS NEGRAS DE LÁ SÃO LINDISSIMAS, INCRIVEL O BRANCO DA ROUPA DELAS. AMEI TUDO!
BJS JOSINHA!
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