quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Animais úteis do Senegal


No começo estranhei não ver animais de estimação. Um ou outro gato pingado, que corria de mim como o diabo da cruz - quem é este ser estiolado refletindo luz em meus olhos?  Vi também uma cachorra com costelas à mostra, olhos tristes e tetas cheias revirando o lixo. Aliás, lixo orgânico não se vê. Animais são bons recicladores, afinal.  Vi também algumas galinhas ciscando em terreno baldio. E um porco, coisa raríssima entre a maioria muçulmana, fuçando o chão. No caminho de um lugar para outro vi rebanhos bovinos conduzidos por nômades, que montam suas cabanas nos campos e enquanto estão ali vendem o leite para os laticínios locais. Acabou a pastagem, desmontam o acampamento e seguem viagem. Mas nos vilarejos vacas não são comuns e leite, só em pó, às vezes com gordura vegetal adicionada no lugar do creme. O que se vê aos montes são os rebanhos de cabritos que ora cruzam o asfalto sozinhos, ora obedecem ao pastor. Às vezes, nas casas, os animais esperam sua hora amarrados às patas, alimentados com restos de arroz. Depois vão pra panela com cabeça, pés e todas as partes. Como alimentar cães e gatos por mimo se a cabra ao menos a gente come depois? Às vezes passa pela estrada um carro carregando cabras no bagageiro, acomodadas e presas como malas.  Mas, animal bom para carregar coisas não é carro, é  burrico. Carro não se vê nos povoados, só os que vem de fora e aí são do tipo quatro por quatro, portentosos. Voltando aos burricos, como nossos jegues, fazem trabalho duro, mas,  diferente dos animais nordestinos,  não foram ainda substituídos por motos, não foram ignorados à própria sorte. Felizes enquanto servem ao homem. Às vezes, puxando carroças conduzidas por crianças trabalhadeiras. Carregam de tudo, de cercado de fibras, baldes de água e bujões de gás a sacos de milhete, milho e sorgo.  Já os cavalos resistem ao trabalho ainda mais pesado. Levam gente e carga pesada nas charretes. Às vezes vêm de longe, das feiras, tarde da noite,  trazendo adultos, crianças e mantimentos. Estão também nas marchas, desfiles, passeatas. E os pássaros dos quais não descobri o nome nem consegui tirar fotos? A imagem das asas de azul reluzente em vôos rasantes sobre a vegetação seca da savana, entre acácias de folhas miúdas e gigantescas árvores de baobás, é coisa de cinema, que fica na lembrança, e a importância dos pássaros ninguém ignora.  Fora isto, há muitos calangos e rãs com cor de terra seca que se espalham pelos muros a cada passo seu. Utilidade? ué, comem mosquitos. 


Mais fotos no álbum:


5 comentários:

silvia lopes disse...

É amiga, a paisagem árida lembra muito a regiaão da caatinga daqui da Bahia, mas eu gosto, me lembra a infância passada na fazenda dos meus avós paternos. Me parece que só faltam os cactos.

Flora Maria disse...

É, Neide, seus relatos são importantíssimos para abrir consciências e mostrar um outro lado da vida que muitos desconhecem.

Valorizar o que temos, cuidar melhor da terra, da água, dos animais, deixar o consumismo de lado e usufruir as maravilhas da natureza.
Essa é a grande lição que está nos repassando.

Eu, que já sou ambientalista e vegetariana, tenho aprendido muito com suas vivências por essas terras distantes.

Obrigada.
Beijo

marta disse...

Oi Neide,
fotos lindas como tb.o texto sobre os animais em Senegal..O Blog que mencionei é:www.egmtravels.blospot.com (uganda love it) e o nome dela é Erin..ela é uma amiga perto daqui de Philadelphia e está fazendo trabalho voluntario para o Peace Corps.

Neide Rigo disse...

Silvinha, Senegal tem muito de Bahia, especialmente nos costumes. Se bem que é o contrário, né? Realmente não há cactos como os da caatinga, pelo menos por onde passei com vegetação mais de savana.

Flora, que bom saber que está gostando. Imagino que esta parte "fauna" seja menos interessante pra você que o próximo tema, "flora".

Marta, há algum erro no link. Pode conferir? Vou gostar de ver.

Um abraço, N

Claudio Oliver disse...

Excelente NEide. A observação da ausência de animais PET e o contraponto da quantidade absurda de sua presença entre nós, na substituição egoísta de relações, fazendo-os tão enfermos e poluentes quanto nós, em uma relação crescentemente terceirizada (alguém passeia por mim, cuida por mim, trata por mim, alimenta por mim...)o custo de 11 Bilhões de reais por ano para satisfazer o ego, e depois o abandono, o descaso. Em contraponto o resgate dos animais como parte da vida, da atividade humana, como reguladores do ambiente, como fonte de alimento e como sinal de prosperidade e abundiancia em meio à lógica de escassez do mercado, que nos faz a todos pobres... seu post foi uma beleza de se ler.