quinta-feira, 31 de julho de 2008

Jantar Slow Food - Sbav com produtos regionais harmonizados com vinhos orgânicos

Entrada: olhem a farinha ovinha aqui.
As malas, minha e da Roberta de Sá, coordenadora dos projetos do Slow Food no Brasil, foram cheias para o encontro da Comissão Internacional da Arca do Gosto, em Scandicci, na Toscana. Roupas supérfluas deram lugar a pinhões de Santa Catarina, mangaritos de São Paulo, farinha d´água do Seu Bené e farinhas tantas outras, incluindo a ovinha de Uarini. Sem falar nos saquinhos de licuri salgado que todo mundo queria beliscar. Trata-se de um coquinho com gosto de coco, é claro, só que mais suave. Salgado e tostado é um petisco crocante tentador.

O fato é que nem todo licuri que me foi enviado pôde embarcar, afinal levaríamos apenas pequenas amostras para o pessoal da Itália ver. Um tanto ficou aqui em casa. E um destino pra ele não tardou a ser descoberto. Usaríamos no jantar Sbav/ Slow Food que nosso Convivium estava organizando junto com a Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho. Não deu outra: o coquinho foi um sucesso. Deu crocância e casou bem com o sabor amendoado do arroz vermelho do Vale do Piancó.
Aliás, como conseguir o arroz vermelho com greve do correio? Junta um pouco daqui e outro dali e conseguimos reunir 2 kg. O meu, tinha conservado dentro da geladeira. A Cênia Salles, líder do nosso Convivium, tinha outro tanto. Deu tudo certo no final. E a parceria arroz vermelho+licuri deu o que falar. Arroz deste tipo, integral, com a película vermelha rica em antocianinas - como o vinho, pode ser encontrado em mercados municipais ou em lojas de produtos naturais, vindo de diferentes lugares, mas o objetivo era usar este arroz específico protegido pela Arca do Gosto do Slow Food. O objetivo do jantar era divulgar e valorizar os pequenos produtores e produtos de qualidade - bons, limpos e justos - relacionados com os projetos do Slow Food no Brasil.
Seu João Lino, por exemplo, produtor que resgatou a cultura do mangarito aqui em São Paulo, estava lá pra aplaudir o talento do chef Newton Figueiredo, que soube transformar as batatinhas miúdas, mesmo sem nunca tê-las visto antes, num purê perfeito: liso, dourado, delicioso, que acobertava nacos suculentos de carne seca no seu Escondidinho, que acompanhou nosso arroz crocante. Antes disso, o chef Newton já havia surpreendido com a entrada à base de legumes grelhados – berinjela e abobrinha – com farinha ovinha do Uarini, que trouxemos de Manaus. De novo, mesmo sem nenhum contato prévio com esta farinha iguaria que lembra grãos de cuscuz marroquino, o Newton se saiu bem na técnica: hidratou os grãos com caldo de legumes e serviu com os legumes ladeados por cubos de queijo coalho grelhados e cobertos com mel de abelhas nativas de florada de limoeiro (néctar ou natimel, do projeto Abelhas nativas da Amavida - Associação Maranhense para a Conservação da Natureza, à venda no site da ong Central do Cerrado).
De sobremesa, um perfumado creme de cupuaçu, delicado, com pouco açúcar, azedinho e muito sabor.
Os vinhos escolhidos pelo diretor cultural da Sbav, Edecio Armbruster, combinaram perfeitamente com os pratos salgados – degustamos duas versões de brancos com a entrada e duas de tintos com o prato principal para comparar qual seria a melhor escolha. Se entre eles houve ganhos e empates, no caso do vinho de sobremesa aconteceu a incompatibilidade total: a parceria Riesling e cupuaçu não funcionou. Os dois estavam deliciosos, fortes, dinâmicos, cheios de personalidade, mas não se bicaram. São como aqueles amigos que você adora separadamente, mas não ousa apresentá-los. O bom é que, um de cada vez, nenhum deles se podia desperdiçar. Ao final, taças e pratos vazios, óbvio.

Entre um gole e uma garfada, Edecio Armbruster deu uma verdadeira aula de harmonização de comida brasileira com estes vinhos orgânicos e/ou biodinâmicos. Dos brancos que acompanharam a entrada, o alemão Iphöfer Kronsberg Silvaner Kabinett trocken 2005 – da Francônia, Alemanha, era mais complexo, encorpado e tinha um toque de açúcar ideal para fazer companhia para os grãos delicados e ligeiramente ácidos da farinha ovinha de Uarini e mais ainda com o queijo coalho com o mel, que também traz certa acidez além da doçura.

Já os dois apresentados para ver qual o melhor casaria com o arroz crocante com escondidinho brigaram pela liderança. Ficaram no empate principalmente quando se provou separadamente o arroz ou o mangarito com carne. Enquanto o espanhol Rioja, Ijalba Múrice Crianza 2003, biodinâmico, mais amadeirado, andava bem com o sabor de coco do licuri, o francês Crozes-Hermitage Les Meysonniers 2006 – Rhône, estendia as mãos firmes para o purê com carne. Os dois, absolutamente equilibrados.

E da deliciosa sobremesa com o estupendo Riesling alemão Wachenheimer Rechbächel, já falei. Eles não querem conversa.

Arroz vermelho do Vale do Piancó com escondidinho de mangarito e carne seca.

Creme de Cupuaçu com Riesling: não se bicaram

O Menu
Entrada
: Legumes grelhados com cuscuz de farinha ovinha de Uarini, cubos de queijo coalho grelhados ao néctar de abelhas nativas
Prato principal: Escondidinho de mangarito com carne seca e arroz vermelho com crocante de licuri
Sobremesa: Creme de cupuaçu

Vinhos degustados
Avondale Sauvignon Blanc 2006 - África do Sul
Iphöfer Kronsberg Silvaner Kabinett trocken 2005 - Francônia, Alemanha
Crozes-Hermitage Les Meysonniers 2006 – Rhône, França
Ijalba Múrice Crianza 2003 – Rioja, Espanha
Wachenheimer Rechbächel Riesling Auslese – Palatinado, Alemanha

Contato com os produtores
Arroz Vermelho do Vale do Piancó, Paraíba
Coordenador da Comunidade José Soares Filho
Telefone 83-3485-1080

Mangarito
Sr. João Lino. Telefone 11-5561-0120 ou celular: 11 7152-6585
www.mangarito.blogspot.com/


Licuri
Produtores do Piemonte da Diamantina (polígono das secas)
Coordenadora da Comunidade: Josenaide Souza Alves
Telefone 74-3651-0225 ou celular 74-199 8569
josenaide@coopes.org

Mel de abelhas nativas
Central do Cerrado – produtos ecossociais
http://www.centraldocerrado.org.br/


Informação sobre os vinhos
Sbav – Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho
http://www.sbav-sp.com.br/


Cenia Salles, lider do Convivium Slow Food de São Paulo (eu, vice-lider, estava sentada comendo, bebendo, fotografando..)

Odila Moraes, presidente da Sbav e membro do Slow Food

Edecio Armbruster, diretor sócio-cultural da SBAV-SP e membro do Slow Food

Os vinhos - faltou um


6 comentários:

Unknown disse...

Neide,

Gostei tanto das suas fotografias do mercado em Florença, que gostava de ter algumas na minha cozinha, de tão coloridas que são.

Vinha pedir autorização p descarregar 2 fotos, onde tem as flores de aboborinha e uma onde tem a bancada cheia de legumes.

Se tiver por acaso um tempinho p enviar os ficheiros (com o seu nome, claro), ficava super agradecida!

Cumprimentos

Claudia

PS: blogue lindo, que me dá imensa vontade de provar tudo!!

Neide Rigo disse...

Claudia,
obrigada. Me mande seu email que eu lhe envio as fotos. Um abraço,
Neide

Unknown disse...

Obrigada Neide!

O meu mail é claud.campos@gmail.com.

Um abraço

Claudia

Anônimo disse...

Uau, que belo jantar! Era privado pro pessoal da Sbav ?

Neide Rigo disse...

Oi, Eduardo,
o jantar era aberto ao público. Pena que você não foi. Eu mandei convite para o Grupo.
Um abraço,
N

Anônimo disse...

Olá Neide!
Então não é que vim dar aqui com uma comentadora,claudia de seu nome,que partilha dos meus sentimentos pelas suas fotos?!Bem,já somos duas a pedir...mas quantas mais existirão que gostariam de fazer o mesmo?Adorei!
Quanto aos vinhos,saúde!!!,mas para mim,tintinho por favor.
Brindo a si Neide,à sua prosa escorreita,aos seus dotes culinários,ao seu sentido de humor,às suas belas fotos e ao seu fantástico blogue.
Obrigada por tudo isso.
Adriana ou Dri