quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Banana verde. Coluna do Paladar, edição de 01 de setembro de 2016

Hoje tem Paladar. Veja no blog do caderno, na versão impressa e também aqui. 


BANANA VERDE
Ver despontar o coração no meio de uma bananeira e depois acompanhar penca a penca o desabrochar das flores que vão sendo expostas em fileiras às abelhas, borboletas e morcegos, vai pela ordem natural das coisas que começam com o manto vermelho se enrolando pra cima para mostrar a cena até chegar ao fruto maduro que,  se a gente não corre pra colher, sobra ao sanhaço comer.   

Então, para consumir com calma, sem medo da concorrência e ainda manter os frutos em casa por vários dias sem se preocupar com o amadurecimento simultâneo de uma penca ou, se tiver sorte, um cacho inteiro de frutas,  uma das opções é consumir o fruto verde. Pode ser banana sapo ou marmelo, prata, nanica e até banana da terra.   Isto, claro, numa situação idílica de plantar e colher. Mas a gente sabe que na cadeia produtiva da banana, do pós-colheita até chegar ao consumidor final, o desperdício da fruta é muito maior.  Infelizmente o consumo do fruto verde ainda é tão pouco difundido que raramente se vê nas feiras e mercados.

Está certo que você vai encontrar informações sem fim sobre os efeitos milagrosos da banana verde por causa da boa quantidade de amido resistente e isto é bem verdade. Este tipo de amido resiste aos processos digestivos e se comporta como fibra que melhora o trânsito e a flora intestinal, diminui a resposta glicêmica e será fermentada no cólon por bifido-bactérias benéficas na prevenção de câncer local. Por este motivo se popularizou o uso da polpa da banana verde cozida e transformada em purê sob o nome de biomassa, que pode ter vários usos como espessante em bolos, pães, massas etc.

O que a gente pouco vê é o uso da banana verde como ingrediente além da biomassa.  Mas andando por aí e ouvindo histórias de outros cantos do mundo descobre-se uma infinidade de usos para a banana verde como se fosse uma batata ou um amiláceo neutro que aceita temperos doces e salgados.

No litoral norte de São Paulo, ela entra no prato caiçara Azul Marinho – um ensopado de peixe com banana verde que, por causa do tanino, confere ao prato um tom azulado. Em várias partes do Brasil ela é usada para substituir a batata em pratos com carne. Ou para fazer chips fritos. Mas os exemplos não são tantos quanto poderiam ser.

Na Ilha do Marajó, tomei  um típico mingau de banana verde com leite de coco feito pela Dona Jerônima Brito que poderia ser eleito o emblema da comida de alma.  Ela usa 3 bananas verdes raladas, 3 litros de leite de coco, 3 colheres (sopa) de açúcar, 1 pitada de sal. Coloca a banana com  um pouco do leite de coco, o açúcar e o sal no fogo e vai cozinhando sem parar de mexer. À medida que vai engrossando, vai juntando mais leite de coco. Cerca de 20 minutos depois, quando todo o leite de coco tiver sido incorporado e a mistura estiver cremosa, está pronta uma tigelada de mingau que lembra o de aveia com a vantagem de yes, nos temos, bananas verdes!

Banana verde com frango faz o godó, um delicioso ensopado típico da Chapada Diamantina, na Bahia! 

Em Cuba, na região costeira de Baracoa, há um tipo de pamonha ou tamale chamado Bacán que é feito mais ou menos assim: ralam-se em ralador grosso 10 bananas verdes, tempera-se com suco de limão, alho, urucum, sal, e pimenta a gosto. Junta-se 1 xícara de leite de coco cozido (deixando reduzir de 2 xícaras para 1) e mistura-se bem. Coloca-se uma colherada de massa sobre folha de bananeira amaciada na chama do fogão e, no meio, o recheio de carne de porco ou de caranguejo bem tem temperado. Depois de embaladas e amarradas, as pamonhas são cozidas em água fervente por 50 minutos. Ficam deliciosas.

Para fazer a polpa cozida que pode ser guardada ou usada imediatamente, coloque as bananas verdes de qualquer tipo na panela de pressão, cubra com água e leve ao fogo. Quando a válvula começar a chiar, conte 8 minutos, desligue o fogo e espere acabar a pressão. Abra, tire as cascas – que certamente estarão já meio abertas – e passe por espremedor de batata ou triture com o mixer.  Neste ponto, já poderá guardar para uso posterior na geladeira ou no freezer.

Gosto de colocar esta polpa cozida na massa de pão feito com levain. Algo como 500 g desta massa para 1 quilo de farinha.  Quando passo ainda quente por espremedor da batatas, espero esfriar um pouco, tempero com sal e faço tortilhas. Achato a massa entre duas folhas de plástico até ficar fininha, podendo usar uma prensa própria ou duas tábuas.  Basta, então, tirar o plástico, colocar a massa sobre uma frigideira antiaderente bem quente para dourar dos dois lados e rechear como uma tortilla de milho.

Nas sopas-cremes esta polpa pode aumentar o volume, melhorar o valor nutritivo sem alterar em nada o sabor. Já fiz com ela molho branco para gratinar – uma vantagem para quem não pode com o glúten -, caldo verde,  nhoque, purê com leite de coco e cúrcuma e outras invencionices que a versatilidade do ingrediente sugere. Tente fazer homus e molhos apimentados para comer com pão ou tortillas. 

Ultimamente tenho gostado de repetir esta nova criação, cuja receita apresento. O mais trabalhoso é cortar a banana em tirinhas como se fossem macarrões, mas chega a ser relaxante quando se pensa no resultado. Para o molho, me inspirei no “espaguete com anchovas e pão” que Patrícia Ferraz publicou aqui meses atrás e deu muito certo, garanto. 

Banana verde com pão e ervas

500 g de banana verde crua descascada (use faca ou descascador de legumes até chegar na polpa branca)
1 limão siciliano
4 colheres (sopa) de azeite
1 dente de alho pequeno picado finamente
2 colheres (sopa) de ervas espontâneas picadas (mentruz rasteiro, guasca, capuchinha etc.)
1 pitada de pimenta calabresa
1 fatia de pão caseiro esmigalhado, finamente picado ou passado por processador
Sal a gosto

Corte as bananas em fatias de comprido e depois, cada fatia em tirinhas.  Vá deixando em uma tigela com água enquanto termina de cortar. Leve ao fogo uma panela com 2 litros de água, meia colher (sopa) de sal e suco de meio limão. Cozinhe as tirinhas de banana aos poucos  (1/3 de cada vez) por 1 minuto na água fervente. Retire com escumadeira e reserve. Em 1 colher (sopa) de azeite, doure o pão esmigalhado e reserve. Coloque o azeite restante e o alho numa frigideira grande, leve ao fogo e deixe começar a dourar o alho. Junte as ervas picadas e a pimenta e desligue o fogo.  Acrescente o suco do limão restante e, em seguida,  a banana escorrida. Misture delicadamente, espalhe por cima a farofa de pão e sirva.  Rende: 4 porções



5 comentários:

Bruna Bronzato disse...

Que receita diferente e interessante. Não conhecia.

Gostei das informações contidas no post.

Beijos.

Blog Jovens Mães / Instagran / Facebook

Marli disse...

Querida Neide, passei pra deixar um grande abraço e meus parabéns, atrasado, pelo data de ontem (31/8)- Dia do Nutricionista - Felicidades! Sucesso sempre, você é uma nutricionista nota 1000! Obrigada por nos ensinar sempre! Saúde! Beijos!

Roberta Vasconcelos disse...

Neide,
Mais uma vez obrigada por tanta informação e inspiração! Uma dúvida: andei lendo que o amido resistente estaria apenas na banana verde crua, que o cozimento o transforma em amido normal. Já ouviu algo sobre isso?

Re invent Yourself disse...

Parabéns

Unknown disse...

Eita, e pra isso, pra mim pelo menos, não tem nada melhor que a banana pacovan. Baum demais! :-p