quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Frutos utensílios

Fruto do guatambu

Fruto da espatódea

Fruto do tingui 
De uns tempos para cá estou sendo obrigada a me enveredar por assuntos até então totalmente obscuros. Toda planta me interessava desde que produzisse algo utilizável na cozinha, nem que fossem belas flores para enfeitar. Pois agora, com o sítio de Piracaia tomado de braquiária e tendo por vizinhos plantações de eucaliptos, estou me esforçando para aprender mais sobre as árvores nativas, pioneiras, primárias, secundárias. Tenho dado salvas a cada estífia-branca que floresce ou lobeiras e jurubebas que conseguem romper a escuridão do capim sufocante. Tenho tratado pelo nome cada arbusto de folhas feias e ásperas, sem frutos ou belas flores. As poucas árvores adultas que não dão frutos de comer já não são apenas pés de pau, são preciosidades que serão tratadas com zelo. Já consigo diferenciar alguns tipos de embaúba, reconhecer um guatambuzinho etc. Não é tão fácil mudar o assunto de uma vida ou introduzir um novo aos cinquenta anos, mas aos poucos meu livro de árvores brasileiras está ficando grosso, recheado com as inúmeras folhas, flores e sementes que vou trazendo para identificar. Aos poucos também vou coletando sementes e mudas nas ruas e selecionando as nativas para plantar. Fora as que ganho de amigos. Com isto vou aprendendo a relacionar frutos, flores e folhas à árvore, mesmo não sendo de interesse alimentar. Às vezes sementes aladas são encontradas bem distantes da árvore mãe e este mecanismo de dispersão é incrível, importantíssimo para a garantia da biodiversidade. E tenho prestado a atenção na beleza destas sementes e seus frutos que podem ser vagens, cumbucas, colheres.

Outro dia minha vizinha de muro Ana me deu dois frutos secos com sementes de árvores do cerrado - a irmã comprou em Brasília: guatambu e tingui (não me lembro qual delas é chamada também de papoula), que consegui identificar no livro já que ela não sabia os nomes. Fiquei impressionada com o tamanho, o formato e o design inteligente das sementes, agrupadas como folhas de pergaminhos em capa dura. Plantei as sementes, mas não soube desprezar os frutos. Preferi guardar para ver no que iriam se transformar. Durante dias, nas horas vagas,  brinquei com os formatos, aferventei, lixei, raspei o interior, furei com ferro quente, colei, amarrei, desamarrei, amoleci na água, moldei sob o sol, até que cheguei a objetos que me pareceram interessantes para se usar como suportes para ingredientes, pimentas, farinhas.

Mesmo a espatódea, exótica, que não vou plantar em Piracaia, tem frutos lindos nos quais nunca havia reparado. Abertos, se parecem com barquinhas que remetem aos cartões postais do mercado sobre água na Tailândia e inspiram temperos.






Tingui
Guatambu
Guatambu

Guatambu


8 comentários:

Anônimo disse...

Neide faz tanto tempo que não vou pra Goiás que nem sei mais como é o pé de lobeira, mais ando encafifada com umas plantas que nasce nas gretas das calçadas aqui em Santo Andre,eu acho que é lobeira tem espinhos,voçê poderia vir um fim de semana aqui para ir no clube de cmpo tem um pouco de mata nativa da serra do mar, que tal eu terei muito prazer em te levar.,(Diulza),

Neide Rigo disse...

Diulza, pode ser que seja sim. De vez em quando também vejo por aqui, mas elas nunca vingam porque são consideradas mato. Ultimamente ando muito ocupada nos finais de semana, mas quem sabe quando eu estiver mais tranquila. Gostaria muito de conhecer este pedaço da serra do mar.
Um abraço, N

Juliana Valentini disse...

Neide, benvinda ao incrível mundo das curiosidades vegetais (como se você já não o frequentasse...). É uma curtição sem fim, você vai ver!
Lindas as fotos.
Beijo!
Juliana

Henrique Komoda disse...

Oi Neide

Acompanho sei blog há anos, vi o fim de Fartura e agora vejo a promessa de "fartura", em Piracaia.
Como bom biólogo e também amante de pomares e coleções de ervas e plantas variadas fiquei curioso com suas informção.
Ficaria indeciso em que tipo de vegetação plantar. Dividir a terra em setores? Reflorestar tudo com nativas? Manter um bosque exótico sem se preocupar se é europeu ou asiático??
Por qual tipo você se decidiu?

Parabéns pelo blog, sempre!
Abraços

Leo disse...

Oi Neide. Ja vi em Bichinho, distrito de Prados-MG uma vez, um mobile com sementes de guatambu, eram umas 30, penduradas e tingidas acho que com anilina. Parabens pelo espirito aventureiro e bons frutos em Piracaia.

Maria das Graças disse...

Neide, voce me fez lembrar da época em que compramos um terreno no interior coberto de braquiária e muitos, mas muitos formigueiros. Mas no meio daquele mato alto e viçoso surgiam pequenas plantas. Por uma delas, de folhas de um verde vivo, brilhante cai de amores. Protegi-a de tudo e de todos. Estava em um lugar estratégico, onde seria a calçada. Ela cresceu e um belo dia sugiram umas florzinhas brancas, perfumadas que pareciam catavento. Foi uma dificuldade descobrir que árvore era aquela. Soube por um nativo que era uma leiteira.

Neide Rigo disse...

Juliana, estou cada vez mais fascinada. E aprendendo um monte no seu blog.

Henrique, não fiz nenhum planejamento, não. É claro que vou ter bastante exóticas, a começar pelas frutas - manga, banana, lixia, cítricos... O espaço é pequeno, 1,3 hectare, então vou ter que me conter. Mas já comecei plantando pau brasil que ganhei de uma amiga, vou deixar crescer o que já tem no terreno e plantar outras nativas que estou semeando. Veremos...

Leo, o guatambu e o tingui são muito utilizados para artesanato e artes. Veja que lindo o que é feito neste atelier: http://www.monicacarvalho.com.br/produtos/cacho-tingui/

Maria das Graças, o leiteiro é perfumado e os frutos já foram até confundidos com urucum: http://come-se.blogspot.com.br/2008/04/isto-no-urucum-ou-um-errinho-histrico.html

Um abraço,
N

Angela Escritora disse...

Artista em todos os sentidos!