quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Capim Santo, matéria de hoje no Paladar


Hoje tem matéria capa sobre capim santo no Paladar, feita por mim.
Lá está toda bonita, bem editada, com fotos perfeitas do Márcio Fernandes, mas ainda assim deixo aqui a versão original, com fotos minhas.
Algumas receitas vou deixar para os próximos dias para você não ficar com preguiça de ver tudo de uma só vez.

Bem, se quiser ver tudo, vá ao blog, que a matéria completa está lá:
http://blogs.estadao.com.br/paladar/os-milagres-e-o-nome-do-capim-santo-edicao-15012015/


Para começar, nenhuma planta recebe o sobrenome ‘santo’ senão como recompensa por suas  virtudes, especialmente as farmacológicas e neste quesito a erva é prodigiosa. A Cymbopogon citratus é uma espécie nativa da Índia e sul da Ásia e cresce em climas tropicais úmidos e ensolarados até a 1200 metros do nível do mar. Hoje está está espalhada por toda a Ásia, América Central e América do Sul e seus nomes quando não fazem alusão ao uso medicinal remetem à características de aroma: capim limão, capim cidró, capim cheiroso, erva cidreira ou erva-príncipe, entre outros nomes na língua portuguesa. Em inglês, é lemongrass e, em francês, é chiendent citronelle e em espanhol, té de limón.
Entre nós, o nome capim santo tem sido o mais usado e a melhor escolha pois evita confusões com outras espécies como a erva-cidreira (Lippia alba), a erva-luíza (Aloysia triphylla) ou a melissa (Melissa officinalis), todas elas também conhecidas como erva-cidreita, outro nome popular do capim santo. Em comum, as ervas citadas têm um ou outro componente químico no óleo essencial que confere o perfume cítrico, com destaque o para o citral, o geranial, o geraniol, mirceno, citronelal, limoneno e linalool, por exemplo.
De fato, o capim da família das Poáceas (Gramíneas) é quase milagroso como fitoterápico, afinal tem propriedades digestivas, analgésicas, antinflamatórias, sedativas e antimicrobianas comprovadas através de ensaios com animais e humanos. Nos locais de origem e também no Brasil seus usos etnomedicinais extrapolam as atividades já comprovadas, o que mostra que há ainda muito a ser explorado e pesquisado. Agora, o que pouca gente faz além do chá recreativo ou medicinal, dos refrescos e sorvetes, pelo menos no nosso país, é usar a erva como condimento nos pratos salgados. E deveríamos aproveitar, pois além dos méritos curativos e também preventivos da erva,  afinal em sua composição estão flavonoides antioxidantes, não há contraindicações ou efeitos adversos relacionados ao seu consumo. 
Basta observar a cozinha do Sudeste Asiático, onde a erva tem uso consagrado nos pratos tailandeses, filipinos, malaios e indonésios, por exemplo, quase sempre combinada a leite de coco, folhas de coentro e suco de limão, tudo o que temos aqui.  Ela é ingrediente de pasta para caris, tempero para cozidos de vegetais, frangos, carnes e peixes, além de conferir perfume e cor para sobremesas e bebidas.  Um uso ancestral nas Filipinas era como clareador dental, bastando mastigar as raízes ou esfregá-las sobre os dentes. Se hoje dispomos de outras opções mais eficazes para esta tarefa, sobra ao menos o prazer de mastigar o miolo da planta nem que seja só para sentir como é suculento, perfumado e adocicado. E quem sabe daí nascer inspirações para outros usos.  
Aliás, é o miolo da base ou o bulbo, como um pequeno palmito, despido das camadas de folhas mais fibrosas, a parte usada como tempero nos caris asiáticos. A vantagem é que é tenro, claro e tem presença cítrica e sabor adocicado pronunciados. Socado ou fatiado finamente, pode permanecer no prato, seja cru ou cozido. Já as folhas compridas e disfarçadamente serrilhadas são fibrosas e devem ser cortadas com tesoura antes de ser usadas na forma de infusão. Ou, num uso menos comum, as folhas podem ser batidas com água e depois coadas em pano. Neste caso, o resultado também é cheio de sabor e perfume e a técnica deve ser usada quando a cor verde é desejável – em sucos, drinques, molhos e para tingir massas ou doces.
Pena que seja tão raro encontrar a erva fresca e seus talos nos mercados convencionais, o que se contrapõe com a facilidade de cultivo da espécie nos vasos e quintais de quem se dispõe a plantá-la.  Se você ainda acha que ter um bulbo de capim-santo é um luxo para poucos, tente plantar algumas mudas no primeiro buraco com terra que encontrar, seja no seu quintal ou no de amigos, na calçada ou numa praça do seu bairro.  Em último caso, num vaso. A planta não exige cuidados e sua reprodução pode ser feita a partir dos bulbos que tenham ao menos um pedaço da raiz.  Não sendo assim, basta comprar uma muda num viveiro de ervas e replantar.
Veja abaixo as muitas formas de uso da erva
Como comprar ou colher: de preferência, tenha a erva inteira, com um pedaço da raiz. Assim, poderá usar o miolo do bulbo, as folhas frescas para chás ou sucos e ainda replantar.
Para fazer infusão com folhas frescas: lave bem as folhas, passando a mão de baixo para cima e nunca de cima para baixo, pois as bordas são serrilhadas e funcionam como uma lâmina. As folhas possuem uma camada cerosa, por isto precisam ser bem lavadas. Do contrário, o chá poderá ficar turvo em vez de cristalino.  Depois de lavadas, corte as folhas com tesoura. Use cerca de 10 folhas frescas ou de 15 a 25 gramas por litro de água. Deixe a água ferver,  coloque a erva, desligue o fogo, tampe e deixe em infusão por 10 minutos.  Use esta infusão para tomar quente ou gelado, com ou sem limão. Aliás, o limão clareia o chá de capim-santo que passa de amarelo a incolor.
Sumo de folhas frescas: as folhas frescas podem ser batidas no liquidificador. Para fazer limonada, use cerca de 12 folhas por litro de água e de 2 a 3 limões. Lave e  pique as folhas, coloque com água no copo do liquidificador e bata bem. Coe em pano (para evitar os fiapos que podem ser irritativos para a mucosa), junte o limão, adoce, gele e sirva. Experimente também bater com pedaços de manga verde no lugar do limão. Pode bater ainda com iogurte, leite ou água que serão usados em receitas, como no beiju de goma, por exemplo.  O suco verde pode ser usado nos molhos de caris quando não se tem o miolo para temperar, como na receita do frango com berinjela.
Erva seca, sozinha ou acompanhada:  se você se deparar com uma touceira de capim-santo, separe umas folhas, lave bem, corte em pedacinhos e espalhe sobre uma bandeja perfurada forrada com pano. Cubra com tule e deixe na sombra até que a erva esteja totalmente seca. Guarde em vidros e terá um ingrediente melhor que os chás de sachês. Se quiser deixar o chá com cor vibrante (ou dar sabor aos chás coloridos e insípidos), coloque para secar junto folhas de perpétua-do-mato (Althernantera brasiliana) ou flores de perpétua-pink (Gomphrena globosa).
O miolo do capim-santo: a planta tem em média 80 centímetros de altura. Para chegar ao miolo, corte o bulbo um pouco abaixo do ponto em que as folhas começam a se abrir. Corte também cerca de 2 centímetros acima da raiz (se quiser replantar, reserve um pouco mais). Faça um corte no sentido do comprimento suficiente para chegar ao meio do diâmetro. Vá descamando as folhas até chegar a um miolo macio que possa ser quebrado ao dobrá-lo.  Fatie bem fininho e use em seguida ou coloque para secar caso queira guardar.  A parte mais tenra deste miolo pode ser usada fatiada em saladas, como a de vagem, ou para temperar arroz, carne, peixe ou frango – refogue junto com a cebola.
Amarrados para o arroz: para fazer arroz de coco com cúrcuma, use um laço do bulbo (ou das folhas que folhas descamadas), para que possa depois ser retirado facilmente. Para conseguir que a porção fique flexível o suficiente para ser amarrada, bata com o fundo de uma caneca sobre toda a extensão do bulbo até romper a rigidez das fibras.  Aí basta dar um nó.
Para plantar: se tiver em mãos bulbos da planta com pedaço da raiz, ainda que pequeno, corte um tolete com cerca de 10 centímetros acima dela (use todo o resto) e mergulhe a base na água. Em poucos dias ela estará enraizada, bastando então passar para a terra.
Receitas
A foto está feia, pois fiz depois do fotógrafo, com o prato já frio.
Mas este molho verde fica delicioso
Caril de frango com berinjela
10 folhas de capim santo
1 xícara de água
1 cebola pequena
1 dente de alho
1 rodela de gengibre
1 colher (chá) de grãos de cominho e 1 colher (chá) de grãos de coentro ligeiramente tostados e triturados
2 galhos de coentro – folhas, talos e raízes
1 colher (chá) de cúrcuma em pó (açafrão-da-terra)
1 colher (sopa) de açúcar
2 colheres (chá) de sal
2 colheres (sopa) de suco de limão
2 colheres (sopa) de óleo
500 g de frango cortado em cubos
1 pimenta dedo-de-moça sem sementes picada
2 berinjelas japonesas picadas como o frango
1 xícara de leite de coco
Folhas de manjericão e de coentro a gosto para finalizar

Bata as folhas de capim santo com a água no liquidificador. Coe em pano, despreze as fibras e reserve. Coloque no copo do liquidificador a cebola, o alho, o gengibre, grãos de cominho e de coentro, o coentro fresco, a cúrcuma, o açúcar, o sal e metade do suco de limão. Bata, juntando, se precisar, um pouco do suco de capim-santo, só para que se transforme numa pasta.  Numa panela, aqueça o óleo e despeje o tempero. Deixe fritar um pouco, até começar a exalar um bom aroma de tempero refogado. Junte os cubos de frango , a pimenta e a berinjela e mexa. Junte o restante do suco de capim-santo. Tampe a panela e deixe cozinhar por 15 minutos em fogo médio ou até o frango e a berinjela estarem macios. Não deixe secar totalmente o caldo. Se precisar, junte mais água quente. No final, adicione o leite de coco e espere ferver. Prove o sal e corrija, se necessário. Junte o restante do suco de limão, misture e espalhe por cima as ervas e um reforço de pimenta, se gostar.
Rende: 6 porções
Nota: se preferir, substitua a mistura do liquidificador por 2 colheres (sopa) ou mais do tempero pronto, depois completado com água.
Tempero verde com capim-santo ou pasta para caril
4 cebolas médias
8 pimentas verdes frescas (pode ser murupi e dedo-de-moça)
4 dentes de alho
2 miolos de capim-santo
3 colheres (sopa) de óleo
1 colher (sopa) de casca de limão ralada fino
2 colheres (sopa) de suco de limão
2 colheres (sopa) de folhas de coentro fresca
3 raízes de coentro
1 colher (sopa) de grãos de coentro e 2 colheres (chá) de grãos de cominho ligeiramente tostados e triturados na hora
1 colher (chá) de cúrcuma (açafrão-da-terra) em pó
2 colheres (sopa) de açúcar mascavo

Pique as cebolas, pimentas, alho e o capim-limão.  Refogue em 1 colher (sopa) do óleo, mexendo sempre, até a mistura ficar bem macia. Deixe esfriar um pouco. Coloque no liquidificador junto com os ingredientes restantes e triture tudo até homogeneizar. Aqueça o óleo restante numa frigideira e acrescente a mistura. Cozinhe por cerca de cinco minutos ou até conseguir uma pasta densa. 

Rende:  uma xícara e pode ser guardada na geladeira por até uma semana em vidro fechado. Pode temperar frango, peixe ou legumes como vagens, berinjelas, cenouras ou abóboras. Na hora de usar é só fritar a mistura num pouco de óleo e juntar o ingrediente principal além de caldo, água ou leite de coco.

Sorbet de capim-santo com cachaça e beiju de goma, amanhã e depois...

8 comentários:

Gilda disse...

Ri muito de mim mesmo, que sempre usei o capim santo de modo errado. Mas também nunca vi ninguém explicar no detalhe toda a anatomia dele e como lidar com ela. Tenho uma touceirinha em um vaso e o mais que faço é cortar as folhas velhas e de vez em quando, mudar a terra e replantar. Também não sabia que para a foto ficar boa o fotógrafo ainda tinha que estar quente rsrsrs. Desculpe a brincadeira, por favor. Ficou engraçado. Obrigada pelas dicas.

Cris Moraes disse...

Adorei a matéria. Sempre acompanho o blog e acho que você deveria publicar um livro. Parabéns! abs

Vera disse...

Neide,
Como diz minha filha, virei fã do seu blog rs rs e ainda tem muita coisa para eu explorar nos posts antigos.

Durante muito tempo mantive um pezinho de capim limão na varanda do apartamento, mas como é face sul e no 7o. andar, o coitado sempre foi mirradinho, diferente das moitas que existiam na casa da minha avó e da minha mãe. Mas mesmo assim, tomei muito chá de folhas fresquinhas.

Senti falta neste post de uma foto de uma moita e a dica de como diferenciar da citronela, que até onde sei não é recomendável para chá e sim para espantar mosquito.

Eu só sei diferenciar pegando uma folhinha e sentindo o cheiro. Mas já que a internet não tem cheiro (ainda...) existe alguma dica para quem não conhece o cheiro nem do capim santo, nem da citronela, saber qual é cada uma?

Abraços! Vera

Neide Rigo disse...

Gilda, ainda bem que me avisou da legenda (risos). Foi ato falho. Já arrumei.

Vera,
farei, então, outro post mostrando as duas plantas. Tem, sim, pequenas diferenças. Por exemplo, a citronela
é maior e geralmente dá flor. As moitas também são mais densas.
Se bem que às vezes eu mesma me confundo e só consigo distinguir as duas cheirando.

Obrigada, um abraço, n

Valentina disse...

Neide, tem coisas que so vc faz com mestria. Excelente artigo.

marci disse...

A receita nao é criaçao minha, mas, rendo minha homenagem!!
melao amarelo
+ agua de coco+ capim santo= delicia

Anônimo disse...

Lendo em 2021... Ótima matéria! Quanta informação, oh! Somos gratos.
Justo hoje que descobri também as múltiplas receitas com jabuticabas (nem sabia que se usavam as cascas em receitas que não fossem de licor e sempre lamentei jogá-las fora...) -- aliás, as jabuticabas que me jogaram aqui, que sorte, S2.

luiz ferreira da cunha disse...

gostei muito meus parabéns pelas suas belas receitas