terça-feira, 26 de julho de 2011

Laranja de rua em Rio Branco


Laranja de chupar é coisa rara hoje. A maioria da produção vai para a indústria de suco, mais fácil de vender para quem não quer ter trabalho. E quem só bebe suco de caixinha chega a acreditar que aquele sabor de laranja cozida que sabe a uma certa podridão misturada ao sumo amargo da casca prensada é o que a laranja pode oferecer de melhor. Há marcas que acrescentam até umas garrafinhas (as células da laranja) para dar mais credibilidade à bebida. E dão o nome de suco caseiro.

Muita gente sequer sabe dar movimento à faca que vai serpenteando o fruto para tirar a casca em caracol. Além do gesto perdido, ninguém mais se lembra do tempo em que laranja era sobremesa, que cortava-se uma tampinha porque é no meio que as sementes se alojam, que havia brincadeiras com o desafio de conseguir tirar a casca sem quebrá-la ou chegar até o fim sem ferir a parte branca. E depois rodar a casca para que ver em que volta ela se partia - era a idade com que a criança iria se casar ou quantos filhos iria ter. Ou continuar à mesa depois do jantar quando faltava luz e espremer o sumo da casca contra a chama da vela só para ver o óleo aromático e combustível virar faíscas. E ainda se retirar da mesa sem ninguém notar e reaparecer no escuro com uma dentadura feita com o lado branco da casca, só para dar susto nos irmãos.  

E tem mais, quem comia laranja, com albedo, bagaço, suco, ela inteirinha, não tinha problemas intestinais, não. Era um tempo bom pré-Activia, afinal bastam duas laranjas depois do jantar, bem mastigadinhas, com calma, para um ritmo intestinal perfeito.  

Por tudo isto fiquei feliz de ver que tanto em Dakar, no Senegal,  quanto no Acre, laranja ainda é vendida na rua como água de coco. Com o calorão que fazia em Rio Branco, não resistimos, Lúcia e eu. Os vendedores usam uma maquina de manivela para tirar cascas fininhas - se as laranjas fossem orgânicas e decentemente lavadas,  as tiras de casca poderiam ser glaçadas ou aproveitadas para doces, mas não era o caso.  De qualquer forma, a polpa estava intacta, gelada, suculenta e doce. E o hábito é saudável.

Observe o gesto do menino: ele chupa, parece que a laranja está pouco
suculenta, então ele dá soquinhos para soltar o suco e aí sim, nhac! 

21 comentários:

Anônimo disse...

Muito obrigada por mais uma vez ter me deixado com lágrimas nos olhos. Lendo esse post me senti de novo com seis ou sete anos, quando já conseguia descascar uma laranja sozinha, na melhor época da minha vida, pois morava no interior com um quital repleto de frutíferas: laranja, manga, ciriguela, goiaba. Fiz muitas vezes esse "exercicio" de fazer com o suco se soltasse, de brincar com as cascas da mesma maneira que você narrou e ainda tinha mais uma utilidade: chá de casca seca quando tinhamos algum problema digestivo. Muito obrigada!!!
Hildeny Medeiros

Dricka disse...

Pois é, não consigo entender como conseguem beber suco de laranja industrializado e sinceramente não consigo encontrar a utilidade de tal produto em nosso pais que dá laranja o ano inteiro, é tão mais saudavel e gostoso chupa-la ao natural ou mesmo o sumo fresco. Vai entender!!
Bjs

Lina disse...

Olá, Neide!Parece que voltei no tempo também. Eu ainda descasco as laranjas dando as voltinhas, embora cá em Portugal ninguém faça isso. Também há muitas laranjas boas por aqui e eu prefero chupar uma laranja do que beber o sumo, mesmo que da própria laranja, o bagaço faz mesmo muito bem à barriguita. Gostei muito do post e de ver o menino beber daquela laranjinha, que gracinha! Obrigada por partilhares estes momentos!
Beijinhos

Mariana Rosa disse...

Oi Neide! Que bom que você voltou cheia de coisas boas pra falar, sobre um mundo que não precisa de tantos conservantes, e que segurança alimentar é algo mais simples!

Suco de laranja industrializado é muito triste... mas o preço da laranja no mercado é abusivo! Com o que se paga em um quilo de laranjas, se enche o carrinho de mexirica.

Triste pensar que é exatamente a quantidade de suco industrializado que entra no mercado que faz com que a gente não possa mais fazer uma geléia de laranja.

Faltou só falar da brincadeira de jogar a casca na escada ou no telhado depois de se fazer um pedido. Se ficar no lugar, é porque o pedido será atendido.

Abraços, vizinha!

Rodrigo Santiago disse...

Sofro com erosão ácida, então tenho que cortar a laranja em 4 e comer tudo quase sem mastigar. Mas ainda assim, muitíssimo melhor que aquele gosto esquisito dos sucos em caixa...

Angela Escritora disse...

Ueba!! ela voltou!! Menina, tenho tantos pés de laranja.. a moça que trabalha aqui descasca pra mim.. afinal,eu já casei não preciso mais dar voltinha na casca, coisa que fiz demais da conta, e deixo na geladeira aquele sacão. E é laranja lima chupada, que aqui chamam de serra dágua e laranja sei lá o quê no suco na centrífuga, com casca branca junto. O suco fica bárbaro, espumante, fino!

Neide Rigo disse...

Hildeny, desculpe, não era a intenção. Que bom que gostou.

Dricka, pois é, o paladar vai sendo moldado. Sem falar que a ideia da praticidade convence.

Lina, fico feliz de saber. Não só em Portugal, mas no Brasil o hábito também está sumindo. Pena, né?

Mariana, você tem razão, a laranja anda bem cara. E a mexerica está barata porque está na safra. E para a indústria vai mais laranja que tangerinas. Você é minha vizinha?

Rodrigo, seria bom se houvesse uma "camisinha" para os dentes, não? Já pensei em encomendar pra minha dentista uma capinha como aquelas para fazer clareamento, só pra chupar manga de fiapo.

Angela, sortuda!

Um abraço, N

Dulceh Franzen disse...

Olá Neide
Eu cresci chupando laranja do pé, confesso que não suporto suco de caixinhas, tomo apenas suco natural.
Parabens pelo post, muito legal!
Bjos

luciane disse...

Na bOlívia também encontra-se laranjas na rua! E suco fresco.

Tá Bem Bom disse...

ola, lindo post
.....Muito boinha você,
Viu? Laranjinha doce
Dulcíssima... (djavan)

Marina Maria disse...

Ah, que delicia de post. Vontade de criar uma campanha, "Você já chupou uma laranja hoje?". Neide, vc sempre nos fazendo pensar sobre as coisas que realmente importam.

Doralice Araújo disse...

Reproduzo abaixo o que escrevi no Twitter, ao encaminhar o link ao seu texto, Neide:

Fiquei com uma vontade danada de chupar uma laranja, depois de ler o instigante texto da #NeideRigo. #recomendo o blog

Grande abraço; as fotos aproximam o leitor da fruta. Ótimo trabalho blogueiro você tem feito. Sou fã e leitora contumaz do seu blog.

Rydi disse...

Que lindo o menininho!!!
Neide seu blog é um achado mesmo, lembrei da minha infância no seu relato, parecia que eu estava vendo um filme :*), que pena que a indústria alimentar tem conseguido suprimir os costumes convencionais. Ainda resiste em algumas regiões porque o "desenvolvimento" ainda não chegou por lá.

Mariana Rosa disse...

Oi Neide...
A mexirica está na safra, isso explica o preço. Mas esse ano não teve safra de morango, por exemplo. O preço da caixinhanão desceu de 3,00.
Laranja tem safra? Não sei mesmo! Parece que sempre que vou para Rio preto tem um mundo de laranja na estrada.

Somos vizinhas de bairro, eu também moro no Alto da Lapa, comentei lá no post sobre pão de coco!!

Abraço!

carol guilen disse...

Neide, seus posts são de dar água na boca! Ao falar de laranja, então!! na familia da minha mãe todos adoram laranja. Chega a dvidir a família: os adeptos da laranja pera e os que preferem laranja lima (ou da ilha). Eu e o Sandro (do um litro de letras) somos do primeiro grupo. Se a gente dá laranja lima pro Sandro, ele faz cara feia e pede "laranja de verdade" (risos)

Neide Rigo disse...

Duh, não tem comparação!

Luciane, que bom saber. Taí um lugar que quero conhecer. E estava tão perto de onde eu estava. Mas não deu tempo.

Leo, laranjinha bem doce é a lima. Mas adoro também a lima da Pérsia, laranja seleta, bahia..

Marina, gostei da campanha.

Dora, poxa, obrigada! Fiquei feliz.

Rydi, desenvolvido é este povo que resiste. Obrigada!

Mariana, laranja tem safra, sim. Pena que aqui em São Paulo a gente já não saiba o tempo das coisas. Lembrei da vizinhança.

Carol,
Já eu gosto de todas, mas prefiro a seleta e a bahia. E você é o que do Sandro?

Um abraço, N

Neide Rigo disse...

Carol, desculpe pela pergunta distraída. Lembrei!
beijos, N

Anônimo disse...

Neide as lágrimas que você provoca em mim são sempre de recordação de coisas maravilhosas da minha infância, por isso eu que sempre agradeço.
Abraços
Hildeny Medeiros

Sarah Abreu disse...

Que delícia de post! Quando eu era criança achava o máximo ver minha avóe minha mãe descascarem laranja sem arrebentar. Morria de raiva porque eu não conseguia. A mão era pequena e não dava conta! Adoro fazer isto. Certametne meus futuros dois filhos (tomara! ;)) verão isto e ficarão fascinados também! E não tomarão suco de caixinha, éca!!!

Haroldo disse...

Isso faz lembrar meu Pai; vindo do interior, Batatais.... Descascava montes de laranja prá mim e meus irmãos e quem mais aparecece. utilizava seu canivete para dsecascar as laranjas e, com habilidade, fazia o que chamávamos de "piãozinho"......

Angela Escritora disse...

Neide, sabe me dizer qual a diferença entre se fazer chá com a casca da laranja seca ou fresca?

Outra coisa, vi um programa na tv que me lembrou vc, se chama Fominha. A moça estava no Amazonas e mostrou o peixe sendo assado na folha trançada, lindo! do açaí.