sexta-feira, 13 de junho de 2014

Frutos do Pará



Tanto em Belém, especialmente no Mercado Ver o Peso e redondezas,  quanto na Ilha do Marajó, as frutas estão por todo canto, nas bancas, nos bancos, encostadas aos postes, carregadas nos carrinhos e nos quintais, ainda por colher ou caídas sob as árvores. Toma-se muito suco, de taperebá, de caju, de abacaxi, de cupuaçu, de gabiroba, cajá e tantas outras. E estão ainda na refeição principal quando uma bacia de açaí acompanha o peite frito ou assado. 

De um modo geral a população de homens e mulheres está mais gorda que da primeira vez que estive lá na primeira edição do Festival Ver-o-Peso da Comida Paraense, no ano 2000. Não fosse tanta comida industrializada e em proporções descomunais, ou talvez o excesso de cerveja, de refrigerantes e tonelada de açúcar nos sucos, poderia se dizer que o paraense tem tudo para comer bem: boas farinhas, açaí puro, peixes excelentes, tucupi, castanhas, cocos de todo tipo dos quais se aproveitam a polpa crua ou cozida, as amêndoas e o óleo.  E os frutos, que estão aqui pra não me deixar mentir. Já falei outras vezes deles e do mercado Ver-o-Peso. Por isto, seguem apenas fotos que fiz em Belém e Ilha do Marajó para você ficar com vontade de ir ver e provar de perto. 


Biribá

Cacau e açaí

Cacau e cupuaçu

Coco dourado

Biribá, jambo, cupuaçu, abacaxi, ingá chinela, abiu

Biribá, cacau, sapoti

Cacau

Ingá chinela

Dona Carmelita em sua banca de frutas no Ver-o-Peso

Limão

Pupunha

Biribá

Castanha amazônica

Inajá

Jenipapo

Pupunha

Banana da terra e pupunha 

Bacuri 

Cajá 

Mamão amarelo

Pitombinha

Goiaba 

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Brasil verde-e-amarelo


Não é circunstancial, é intrínseco e amanhã é feriado de Come-se também. 


Maloca do Orlando. Belém do Pará 2

Tem gente que vai pra Orlando e não conhece a Maloca do Orlando, tão mais perto de nós. Está certo, não é logo ali, mas em poucas horas se vai a Belém. E de lá pra Maloca é um pulo. O almoço ali fazia parte das atividades para chefs e jornalistas organizadas pela equipe do Festival Ver-o-Peso da comida Paraense. De Belém até lá se vai de barco, cerca de 40 minutos se não me engano,  ou qualquer outro veículo que se desloque por água, incluindo os barulhentos jet skis. Nosso barco era motorizado mas silencioso e durante o caminho havia apresentação de carimbó e outros ritmos regionais enquanto a paisagem ribeirinha ia passando diante de nossos olhos como um filme. Chegando à Maloca, debruçada sobre o rio Arapari, uma mesa colorida de frutas locais adornada com flores de alpínia púrpura nos esperava. Aliás, acabei de ver que apareço numa foto postada na página do restaurante no facebook falando do evento (veja lá).

Em Belém comi em ótimos restaurantes como o Santa Chicória, Lá em Casa, Remanso do Bosque, Remanso do Peixe, Família Sicília e acho que ainda esqueço algum. Mas comer na Maloca é mais que uma experiência gastronômica porque a paisagem é mágica, a família do Seu Orlando é acolhedora, os ingredientes são fresquíssimos vindos do Ver-o-Peso, e o preparo dos pratos envolve o mínimo de intromissão no que a natureza deu de melhor. Não havia nenhum prato muito elaborado. Camarão no bafo, caranguejo toc toc, peixes como pescada amarela e filhote grelhados, salada, farinha, arroz, feijão, casquinho de caranguejo com farofa crocante por cima e de sobremesa uma tigela de açaí puro colhido na floresta atrás da cozinha e extraído na hora num extrator profissional areado até brilhar  - quando chegamos o açaí estava de molho numa panela. O creme vem acompanhado de gelo e açúcar à parte pra quem quer. Mas não precisa de nada. O açaí fresco lembra azeite bom, abacate maduro. Quando não tão fresco sabe mais à caroço de abacate terroso.

O legal daquela cozinha é que não tem nada mocozado. O ingrediente fresco chega, é preparado e servido. Tudo à mostra, com cozinha aberta, arejada, de limpeza impecável e com mulheres sorridentes trabalhando sem estresse.

Seu Orlando levou alguns de nós para mostrar sua casa. Basta ver as cores da sala e os bibelôs de passarinhos pregados na varanda pra perceber que se trata de uma casa de gente feliz. E comer comida de gente feliz, vamos combinar, deixa a gente mais feliz ainda, não é não?

Então, quando for a Belém, procure na estação das Docas algum passeio de barco que inclua almoço na Maloca, ou vá por conta, contratando um barco que te leve até lá. Mas aí é melhor ligar que o Orlando te explica como chegar.  Ou visite a página do restaurante no facebook.

Maloca do Orlando
Telefone 091 9233-0350

Veja algumas fotos





terça-feira, 10 de junho de 2014

Chocolate da Ilha do Combu. Belém do Pará 1

Pois é, quem acompanha o blog já sabe que estive em Belém, no Pará,  a convite do Festival Ver o Peso e da Embrapa (participei de um fórum técnico sobre mandioca e dei palpite na comida de uma boieira).

Para muita gente que foi, chefes e jornalistas, o assunto já parece velho, porque as notícias e fotos foram circulando ao vivo pelas redes sociais, como um jet ski barulhando ondas. Mas, como meu único canal é este, tenha paciência que vou contando aos poucos, no ritmo da canoinha a remo direto dos igarapés.

Entre tantos passeios e comidas boas que tivemos em Belém, a visita à ilha do Combu era a mais esperada. Já conhecia o chocolate Filha do Combu quando uma vez ganhei do Thiago Castanho, no Paladar. Achei tão incrível, que não comi. Experimentei e guardei na geladeira da posteridade (sim, eu tenho uma geladeira só pra pérolas). Agora, já posso comer aquele e os mais novos pacotinhos que trouxe de lá.

Dona Nena é quem faz estas poquecas de cacau numa ilha do distrito de Outeiro, chamada de Combu, quase de fronte ao Mercado Ver o Peso, em Belém. Já tinha visto fazer chocolate artesanal em Ilhéus muitos anos atrás. Mas lá colocavam açúcar. Na Bahia inda se faz muito com ou sem açúcar. Já Dona Nena (Izete dos Santos Costa), faz do jeito que aprendeu com o pai. De fato, não foi um aprendizado continuado. Ela precisou recuperar a receita que já não sabia mais executar e não é mais comum no Pará. Errou um pouco até chegar ao perfeito grau de torração e ao moinho ideal para triturar (um moedor manual de cereais, igual àquele que uso para fazer tortillas mexicanas). O processo é trabalhoso, mas fácil de entender quando ali é possível acompanhar todos os passos, já que a produção é pequena, feita numa pequena cozinha. O cacau vem do quintal, uma linda floresta à beira do rio. O grão é despolpado, fermentado, seco, torrado, despelado à mão - acho que é parte mais trabalhosa, feito grão a grão,  e triturado. A pasta gordurosa e cremosa que saí do moinho logo endurece,  por isto é embalada na folha do cacaueiro enquanto ainda é macia suficientemente para ser moldada. Vem da folha do açaí o amarrilho. Um luxo.

O resultado é a barra perfumada, ligeiramente amarga, cem por cento cacau. Delícia sem igual. Dona Nena produz também brigadeiro feito do jeito clássico, com leite condensado, mas usando seu chocolate amargo triturado. E, em vez de chocolate granulado, nibs de cacau, feitos a partir do próprio grão quebrado miudinho.  Na recepção havia uma garrafa térmica com chocolate quente feito também com o próprio chocolate.

O brigadeiro é assim 
Sugestão minha e da Janaína 
Para seguir o mesmo estilo de embalagem, minha amiga, a jornalista Janaína Fidalgo, pensou na possibilidade de usar a própria folha do cacaueiro também para amparar o brigadeiro. Aproveitei para pedir umas folhas pra dona Nena e não via a hora de chegar ao hotel para testar a ideia. Como tinha na mala, não sei porque, algumas forminhas de pão de queijo pequenas, marquei as folhas de cacau com a tampa do creme nívea, cortei com minha super tesourinha, lavei bem, sequei e coloquei as folhas entre as formas, pressionando para dar o formato côncavo. Para desidratar, coloquei o conjunto na parte de trás da geladeira. Deu super certo. No outro dia, as folhas já eram forminhas, estavam secas e ainda verdes. Acho que dona Nena iria gostar. Pedi pra deixarem algumas com ela, mas não sei se chegou a receber.


Quem quiser saber mais sobre o feitio do chocolate artesanal veja este vídeo de Marion Valadier, uma jovem francesa, namorada do filho de uma amiga,  que veio ao Brasil fazer um estágio numa fazenda baiana em Rio de Contas.  Aqui está o pedaço do filme (eu tenho a versão completa em cd, com cerca de 1 hora):  O grão de cacau, de Marion Valadier. Para ter o filme, compre direto com ela - tem seu contato no Vimeo, aí no link.

Algumas fotos da visita à Ilha do Combu.




 

Perguntei sobre estas mudas que vi num balde no quintal e dona Nena
disse que são os visitantes que põem ali as sementes do cacau que provam





segunda-feira, 9 de junho de 2014

Pacová, o nosso cardamomo. Coluna do Paladar, edição de 05/06/2014

























Pois é, voltei. Toda picada de micuim de búfalo, mas voltei do Marajó. Não consegui postar durante a viagem, de modo que sobrou muita coisa interessante pra mostrar, mas antes preciso organizar as lembranças. Enquanto isto, a coluna do Paladar da última semana. Há tempos queria falar do nosso cardamomo, mas desejava antes ter a oportunidade de conhecer a planta, o que aconteceu há alguns dias. No jornal, o link é este: http://blogs.estadao.com.br/paladar/pacova-para-comer-e-para-perfumar/. Mas aqui reproduzo o texto original, mais fotos do passeio de coleta e uma receita de bolo e outra de açúcar, exclusivas para o blog.  E amanhã tem Pará. 



Pacová 

Até hoje não sei de onde vem a expressão “não me enche os pacovás”, mas ouvi tanto quando criança que resolvi ver no dicionário se pacová era sinônimo de paciência. Um tipo cardamomo brasileiro era a descrição do verbete. Cardamomo, a especiaria indiana muito aromática, só vim a conhecer mais tarde. E, ainda assim, antes de ver um fruto seco do nosso pacová, que descobri em bancas de ervas medicinais não tem muito tempo. Já a planta em flor e com frutos frescos, conheci só há alguns dias.

Em tupi-guarani, pacová quer dizer folha enrolada, daí a profusão de plantas com este mesmo nome popular, incluindo a banana-da-terra, um tipo de alpínia e outro filodendro comum nos viveiros. Mas o pacová de que falo é aquele mesmo dos dicionários, Renealmia exaltata parente do cardamomo, cujas sementes são repletas de óleos essenciais. Na China, há um tipo parecido que costumam defumar para usar em pratos salgados.

A planta está presente em quase toda a América tropical e às vezes cultivada como planta ornamental.  E, como resiste a algum tempo de seca e até a frio intenso, pode ser encontrada em todo o território nacional, preferencialmente no interior de bosques em terrenos úmidos e sombreados. 

O que fiz há alguns dias foi ir atrás dos frutos em seu ambiente natural. Quem me guiou foi Carlos Gomes, que nasceu em Piracaia, interior de São Paulo, e conhece todos os matos e plantas medicinais. Andamos mais de uma hora por trilha até chegarmos ao local onde havia uma reunião de pacovás com mais de metro de altura e folhas parecidas com a de alpínias, galangas ou lírios do brejo.  Numa mesma planta havia lindos cachos de flores rosa forte e frutos, alguns ainda vermelhos como grãos de café, outros mais velhos, já púrpuras como jabuticabas e uns poucos enegrecidos e secos, prontos para usar.  A maioria dos frutos, no entanto, Carlos já havia colhido na maturação coletiva da semana santa. Em sua varanda, há várias pencas de pacovás de cabeça pra baixo secando presas ao madeirame do telhado. 

Algumas pessoas da cidade ainda usam as sementes como medicamento para dor de estômago e má digestão, como em todo o Brasil, mas conhecer a planta quase ninguém conhece e Carlos se orgulha de saber o dia certo de ir colher. Segundo ele, a planta guarda um mistério, pois a maioria dos frutos amadurece exatamente na semana santa, não importa ela se caia em março ou abril. E nesta mesma época as flores estarão desabrochando para dar vida a novos pacovás que levarão um ano para amadurecer. 


E usar como condimento na cidade também ninguém usa, ao menos que se saiba.  Eu conhecia o sabor e o perfume dos cardamomos comprados nas lojas de plantas medicinais e já havia usado em receitas no lugar do cardamomo. Mas agora, com vários frutos em mãos, colhidos no pé, parece que são ainda mais parecidos com o cardamomo – as plantas são parentes, ambas zigimberáceas como o gengibre. Certamente na composição de um de outro vários componentes do óleo essencial coincidem.

A casca arroxeada também é usada como medicamento e produz um chá avermelhado quando o fruto está maduro e foi recém-colhido. Em volta das sementes,  os arilos alaranjados são fiapentos e tornam-se um pouco mucilaginosos quando mastigados. Não são gostosos, mas são comestíveis, podem colorir e perfumar arroz e os jacus adoram.  Já as sementes também não são gostosas para comer, como não são o anis estrelado ou um dente de alho, mas na comida, em pequena quantidade, dão sabor e aroma. E mastigadas, elas produzem uma ótima sensação refrescante, deixando o hálito perfumado.

Se nunca provou, procure em casas de produtos fitoterápicos. Experimente uma semente e logo sentirá o sabor pronunciado não só lembrando o cardamomo, mas também algo cítrico e mentolado. E, assim como o cardamomo, o pacová pode ser usado para aromatizar o café, moendo um pouco das sementes junto com os grãos. Ou  para compor mistura de especiarias – triturado com pimenta-do-reino, cravo e canela, por exemplo, para usar em carnes, frangos e vegetais. Para pratos doces, basta socar no pilão um pouco das sementes com açúcar, peneirar e usar em chás aromáticos, bolos, biscoitos de especiarias e docinhos como este de fécula de mandioca, em que tem seu lado cítrico incrementado pelo capim santo.  



Doce de goma de mandioca com capim santo e cardamomo

Ingredientes
1 xícara de leite de coco
As sementes de 2 frutos de pacová socadas
10 folhas de capim santo picadas
1 xícara de açúcar
1 xícara de polvilho doce (fécula ou goma seca da mandioca)
½ xícara de coco ralado

Modo de fazer:  bata no liquidificador o leite de coco com o pacová e o capim santo até ficar bem triturado. Passe por um pano e esprema bem. Volte o líquido verde para o liquidificador com o açúcar e o polvilho. Bata até homogeneizar. Espere meia hora, bata de novo e distribua a mistura por forminhas de empadas de alumínio pequenas, ou de cupcakes de silicone – coloque a massa só até a metade da altura da forminha. Não precisa untar nenhuma delas.  Cozinhe no vapor por cerca de 20 minutos, com um pano entre a panela e a tampa, para absorver a umidade e não molhar o docinho. Estará pronto quando ficar translúcido e a superfície não grudar nos dedos. Desenforme ainda quente passando uma faca na lateral e puxando. Passe por coco fresco, espere esfriar e sirva.  Se preferir, espere esfriar, corte em pedaços e passe por açúcar – ficam como balas de goma.

Rende: cerca de 30 docinhos


Receita do Bolo de aveia com pacová  

1 xícara de manteiga 
2 xícaras de açúcar mascavo 
1 xícara de farinha branca 
1 xícara de farinha integral 
1 xícara de aveia 
2 xícaras de leite 
1 colher (chá) de bicarbonato
1 colher (sopa) de fermento em pó 
1 pitada de sal 
1 colher (chá) de noz moscada
2 bagas de pacová e 2 dentes de cravo socados com 1 colher (sopa) de açúcar e peneirados 
1 colher (sopa) de canela em pó 
2 xícaras de maçã descascada e picada 

Bata manteiga e açúcar até formar um creme e junte aos poucos os outros ingredientes. Asse em formas untadas. 


Açúcar de pacová 

Soque e peneire açúcar e sementes de pacová a gosto. Use o açúcar para adoçar chás, cafés, refrescos e drinques.  O arilo amarelo pode ser usado para tingir arroz. 

Outras fotos

Carlos e Silvana
Carlos entrando no bosque
O botão demora 1 ano pra virar fruto
O fruto imaturo
Fruto maduro
Quase dois metros
O ambiente

Ao redor tem líquem

E bastante água - Silvana bebe um pouco de água fresca na folha de caeté

E tem musgos e cogumelos
Marcos aproveita pra balançar num galho de limão zamboa