Hoje é dia de coluna no Paladar. E o assunto é: dilênia, fruta-cofre, fruta-da-pataca, maçã-de-elefante... Está lá no caderno impresso e também no site do Paladar: http://paladar.estadao.com.br/noticias/comida,procure-dilenias-ou-fruta-cofre-pelos-bairros,70001830406
Dilênia
Não me lembro a capital, se foi em Salvador ou Vitória. Só sei que
deixamos o carro na calçada de uma grande praça para visitar algum mercado com
a alegria de ter encontrado facilmente duas ou três vagas a escolher. Na volta, uma lataria ligeiramente afundada e
o fruto ao lado do carro se denunciando.
Era grande, algo entre uma laranja e um melão, de cor caramelo e perfume
forte. Descobrimos logo que o espaço
vago não era sorte mas prudência dos que já conheciam os fatos. Ninguém quer umas bolas daquelas caindo sobre
sua cabeça e olhe que, maduras, elas caem.
Perguntamos pra um, perguntamos pra outro, ninguém sabia nada além de
ser perigosa para carros e cocurutos incautos.
Isto tem uns trinta anos e a maior lembrança que tenho é do perfume inicial
da fruta. Ela teria que nos acompanhar durante uns 20 dias que era o tempo que
ainda tínhamos para nossa viagem de carro pelo litoral. No primeiro dia
elogiamos o seu perfume que no segundo o chamamos de cheiro. E a partir daí foi
começando a feder a óleo diesel velho em posto de gasolina. A intenção era
trazê-la para casa e tentar saber mais sobre ela em livros, lembrando que não
tínhamos a facilidade do Google e de grupos de face book como o Hortelões
Urbanos para ajudar na identificação.
Não conseguimos, pois a convivência tornou-se insuportável. Era ela ou
nós dentro do carro.
Espero que este preâmbulo não tenha desanimado o leitor e a leitora de
conhecer a Delícia indica em
profundidade, pois o fruto maduro de fato tem cheiro forte e é pesado, mas logo
descobri que são os verdes que devemos comer.
Estes, sim, têm perfume ácido e refrescante, quase como maçãs. Aliás,
são frutas apreciadas pelos elefantes selvagens na Índia e há lugares onde nem
podem ser colhidas das florestas para preservar o alimento natural desses
animais. Por isto, pelo formato e cor verde claro, são conhecidas
internacionalmente como elefante Apple.
Agora, por que falar de uma fruta
exótica, da qual dificilmente vamos ver cultivo comercial e que não vamos
encontrar nas feiras e supermercados?
Porque todo ano, nesta época, recebo fotos via email ou instagram
perguntando “que fruta é esta?”. E fico com um dó danado de ver por aí as
árvores carregadas de frutos que quase ninguém sabe usar. E a planta toda tem um potencial incrível.
Originária do Sudeste Asiático,
pode ser encontrada na Índia, Bangladesh, Sirilanka, China, Vietnam,
Tailândia, Malásia, Indonésia. Se por
aqui seu uso é negligenciado, podemos
nos inspirar nos diversos usos que o fruto tem nestas culturas e sobre isto a
literatura é vasta, mas antes é curioso saber a razão de dois de seus nomes
populares em português: fruta-cofre e fruta-da-pataca.
As primeiras plantas foram trazidas ao Brasil em 1808 junto de outras
espécies exóticas, para compor o Jardim
Botânico do Rio de Janeiro, criado por Dom João VI para aclimatação de
especiarias da Índia. A atração maior
eram as flores que, além da beleza e
perfume atraente para insetos e abelhas,
têm uma particularidade que as tornam únicas. Elas se abrem, se expõem à
polinização e se cobrem novamente com as sépalas firmes e carnudas – o que
comemos. Acontece que quando se fecham podem aprisionar o que estiver ali no
momento. Pode ser um pedaço de folha que grudou ao acaso, um inseto que perdeu
o voo ou até uma moeda colocada propositalmente. E era uma moeda de pataca que
fanfarrões costumavam ajeitar sobre as flores para fazer graça na época e
divertir visitantes. Um caso que se
conta é que Dom Pedro I fixou patacas nos centros de várias flores e, quando os
frutos estavam formados, meteu-os numa caixa e enviou para Portugal se gabando
de estar num país onde dinheiro nascia em árvores - hoje ainda há quem pense e
se comporte assim, mas a dilênia foi
esquecida e a patacoada é bem maior.
Falando dos usos das dilênia, vamos ao que temos no mundo asiático
especialmente. Ela não é o tipo de fruta que se come crua. Não que seja
tóxica. Ao contrário, é fruta rica em
antioxidantes, tem sabor ácido, ligeiramente doce. Seu defeito não é acidez, que aliás a torna
refrescante e saborosa e é boa característica para sucos, doces e temperos – na
linha do limão, do tamarindo, do pó de manga verde, do biribiri ou da
garcínia. No entanto, é fruta a ser
domada. Porque não é doce o suficiente para se servir como sobremesa nem macia
o bastante para ser desgarrada de suas fibras.
Sim, fibras, muitas fibras, tão grossas e firmes quanto as fibras de
bucha vegetal. O segredo é separar a polpa, crocante quando crua mas macia
quando cozida, dessas fibras. E isto não é difícil. Basta cozinhar e passar por
peneira grossa, este é o segredo. A
massa resultante é o que se usa e assim poderíamos ter “polpa de dilênia” como
ótimo ingrediente a ser guardado, congelado, para usos diversos, assim como temos
a polpa de banana verde.
Também não é fruto para fracotes. O conjunto todo a que chamamos de
fruta é composto do fruto propriamente dito, que fica no cerne e não é tão
interessante do ponto de vista culinário,
e as sépalas carnudas e côncavas que o rodeiam bem juntas formando uma
grande esfera, firme e pesada. Escolha
de preferência frutos verdes e menores em vez dos grandes e maduros. Para separar as sépalas ricas em
amido, o mais fácil é partir a fruta em quatro com um corte certeiro usando o
cutelo sobre uma tábua, e descartar o fruto do miolo – se bem que no interior
de seus pequenos gomos, ácidos e
crocantes como folhas de begônia, podemos encontrar uma mucilagem bem viscosa
que pode ser usada como xampu natural para combater quedas de cabelo e
caspas. Com as sépalas separadas, basta
ir cortando a base mais dura e deixando mergulhadas em água, pois oxidam
rapidamente – depois de cozidas, os pontos oxidados desaparecem, ficando a
polpa com cor verde claro. As menos fibrosas podem ser cortadas
longitudinalmente, paralelo às fibras, e usadas em curry ou picles. As mais
duras podem ser deixadas em pedaços grandes e cozidas na panela de pressão por
cerca de 5 minutos ou até que fiquem macias. Tire da água e passe em peneira
grossa de fritura apertando para reter as fibras. A polpa estará pronta pra
usar em doces cremosos, musses, recheios, sorvetes ou tempero ácido para
curries e dhal (cozido indiano de leguminosas).
Pode ser embalada e congelada para uso na entressafra. A frutificação costuma durar de janeiro a
junho, mais ou menos. A água de
cozimento pode ser preparada como chá de maçã – basta acrescentar cravo e
canela e servir quente ou gelado. Esta
mesma bebida pode servir de base para refrigerantes fermentados.
No caso de usar os pedaços inteiros em pratos com o curry de peixe,
receita inspirada nos ensopados similares do norte da Índia e Bangladesh que
dou a seguir, é melhor tirar as peles
externas com um uma faca de legumes. E mesmo que tenha fibras, basta, na hora
de comer, segurar com as mãos os pedaços
pelo lado mais carnudo, levar à boca e puxar. A polpa ficará nos dentes e as
fibras, ligadas em rede entre elas, você puxará com as mãos, não muito
diferente do que fazemos com as pétalas de alcachofras. Mesmo porque o peixe usado também é
espinhento e já vai mesmo precisar das mãos.
Pode não ser um bom prato para restaurantes, mas para comer na mesa da
cozinha, na intimidade da família, é dos mais reconfortantes.
Se quiser ver muitas receitas com este ingrediente, como fruta ou legume, pesquise como outenga, que é o nome pelo qual é conhecido em Assam, no norte da
Índia. Há centenas de receitas com ele. E se quiser avançar nas pesquisas,
procure sobre o uso terapêutico da fruta, muito usada na medicina ayurvédica
como remédio para tosse e febre, por exemplo. Na fitoterapia vem sendo estudada
para combater artrose e diabetes tipo 2. Mas, por aqui, fiquemos com o
ingrediente na panela e aproveite enquanto é época. Fique de olho! Em vez de
caçarmos pokemons ou andar digitando por aí, tentemos descobrir onde há uma boa
árvore de dilênia perto de nós. A beleza delas é inconfundível.
Curry de peixe com dilênia
Para a dilênia
1 fruto verde de dilênia
1 colher (chá) de sal
1 colher (chá) de cúrcuma em pó (açafrão-da-terra)
2 xícaras de água
Para o peixe
4 carapau limpos, com cabeça, cortados ao meio
½ colher (chá) de sal
1 pitada de cúrcuma
4 colheres (sopa) de óleo
Para o curry
2 colheres (sopa) de óleo
1 colher (chá) de grãos de cominho
1 colher (chá) de grãos de mostarda
1 ramo de folhas de curry (ou 10 folhas de pitanga)
2 pimentas secas inteiras
1 cebola roxa média picada
1 colher (chá) de gengibre ralado
A dilênia cozida em pedaços com a água de cozimento
Os 4 carapaus fritos
1 colher (sopa) de açúcar
Modo de preparo
Lave bem a dilênia, corte em 4 com um cutelo. Descarte o miolo e separe as sépalas. Corte e
descarte as extremidades muito finas, tire as peles e fatie o restante no
sentido das fibras. Coloque na panela de pressão, tempere com o sal e a cúrcuma,
junte água e leve ao fogo. Tampe e espere a válvula chiar. Cozinhe por 5
minutos ou até a dilênia amaciar. Se quiser, use panela comum e controle o
tempo de acordo com a consistência.
Reserve com a água.
Tempere o peixe com sal e cúrcuma e deixe tomar
gosto por cerca de meia hora. Aqueça o óleo numa frigideira funda ou wok. Frite
os pedaços aos poucos dos dois lados e escorra. Despreze o óleo restante e
reserve o peixe.
Na mesma frigideira que usou pra fritar o peixe, junte as 2 colheres
(sopa) de óleo, leve ao fogo e junte os grãos de cominho e de mostarda. Quando
começarem a pipocar, junte as folhas de curry ou de pitanga e as pimentas. Mexa
por um minuto e junte a cebola e o gengibre. Mexa bem. Acrescente a dilênia com
parte da água de cozimento e deixe ferver. Junte o peixe frito e, se precisar,
mais água de cozimento. Acrescente o açúcar e misture com cuidado. Prove o sal
e corrija se necessário. Deixe cozinhar mais 5 minutos e sirva com arroz.
Obs: se quiser, faça um refogado à parte com folhas de curry e cebola e
despeje por cima do curry na hora de servir.
Rende: 4 porções
Que presente! Aqui, as dilênias já estão amadurando bastante, mas ainda têm várias que podem ser usadas... vamos lá!
ResponderExcluirAbraço.
Tem vários pés dessa árvore no Parque da Previdência, Zona Oeste, São Paulo.
ResponderExcluirObrigada Por esse Post Neide !!! Marmelada de Maca de elefante !!! Voce é o máximo !
ResponderExcluirEu conheci e uso ela para massagem. Aprendi a colocá-la em fusão com álcool ou cachaça e depois usar o líquido para massagear áreas doloridas.E alivia mesmo...
ResponderExcluirDona Neidoca, logo que descobri o blog havia uma postagem sobre a dilenia, em 2008, talvez. Em BH tem perto da Igreja da Boa Viagem e no Parque Municipal, na altura da Av Alvares Cabral, dando para Av Afonso Pena. Muitos, muitos anos antes eu já a admirava pela folhagem.
ResponderExcluiroi ,gostaria de saber quantos anos leva a dilenia pra frutificar sendo plantada por semente. Agradeço tania
ResponderExcluirOi Neide obrigado pela informação vou usar como remédio mas procurar as verdes pra fazer o prato quero experimentar.
ResponderExcluirOi gente eu moro em salador-ba e gostaria de saber onde encontro essa fruta.
ResponderExcluirExcelente texto! Parabéns!!
ResponderExcluirQuero mudas dessa árvore! Onde posso encontrar?
Pelo menos, uma mudinha!!!
Meu interesse é pela parte medicinal.
Quem puder me informar, agradeço, de coração.
Meu: watssap (11) 967633733
Carminda
Bom srs quem precisar dos frutos aqui no Parque Previdência em SP, km 10 da Rod Raposo Tavares há 4 pés carregados.
ResponderExcluirObrigado pelas dicas.
Bom mesmo primavera tem no lado da igreja católica sempre busco e ótimo para passar colocado no álcool deixe em repouso,por 7 dias, e ótimo por tira dor sempre que vou lá ,busco para meus amigos tbm.
ResponderExcluirGente eu gostaria muito de saber como faz a muda da planta se com a semente se deixa secar a fruta ou mesmo com ela verde e como faz por favor desde já eu agradeço de coração
ResponderExcluirNa minha cidade é conhecida como coco de Adão usamos para tratar dores e quando as pessoas se machucam é um ótimo remédio Basta apenas cortar e colocar dentro de um vidro com álcool deixa ela curtir por uns 20 dias esfregar no local tira toda dor
ResponderExcluirobrigado, parabéns pela matéria, li hoje 08/11/21 as 23:27 quase tudo, vou salvar, e vou tirar proveito dessa fruta...que é sim um desafio...mas acredito nos benefícios...no álcool eu já coloquei pra não fazer desfeita pro amigo que me trouxe elas....quem sabe agora com AS SUAS INFORMAÇÕES viro um especialista....vamos tentar....passei a infusão de alcool e minha esposa disse que talvez misturou com o meu cheiro....lascô...colocamos mais alcool e melhorou...só ficou o meu cheiro kkkkkk...(brincadeira)..vamos ver se funciona....ABRAÇOS...
ResponderExcluirAqui em Taubaté tem bastante pé dessa frutas
ResponderExcluirObrigada pela suas ricas informações , descobrir essa fruta esse ano e não paro de pesquisar sobre elas,cada vez gosto mais,encontrei no bosque Maia guarulhos.
ResponderExcluirDa pena de ver tantos frutas dessa ir pro lixo.
ResponderExcluirNa vila olímpica de São João de Meriti existe várias árvores desse fruto que são recolhidas e jogadas no lixões.
Não sabem o valor benéfico dessa iguaria.
Irad moraes
Megan Rapinoe suffered a painful end to her football career as the American star had to leave the pitch just three minutes into her farewell game. รับสร้างบ้านลำพูน
ResponderExcluirConheci a maçã de elefante a 6 anos atrás em Matinhos, não sabiam o nome e era tóxica ao consumo, até que vim ler um artigo e conheci como ótimo remédio para diabetes 2, hj leio este artigo maravilhoso, amei... quero plantar umas mudas em minha casa . Iracema Berwig
ResponderExcluirMeu esposo tem diabetes altíssima ,essa fruta é bom para diabetes?
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