Não morri, não, minha gente. É sempre culpa dele, o tempo. Era pra ter postado ontem a coluna do Paladar. Não deu, mas antes tarde que nunca. Pra quem não vê no jornal, aqui está: Tem também no blog do caderno.
Outro dia um
grupo de amigas que gostam de cozinhar e trabalham falando e escrevendo sobre comida
esteve em casa para algumas horas felizes fazendo nada muito diferente disso
tudo, a não ser pela etapa do comer e por estarmos de folga do trabalho. Nossa
convidada especial era a amiga comum Ana Rita Dantas Suassuna, autora do livro
Gastronomia Sertaneja, que chega sempre cheia de ânimo com histórias do Sertão.
Desta vez a comida emblemática estava na panela já cozida com temperos, só faltando
o leite de coco que veio no vidrinho, comprado pronto, pra colocar na hora de
esquentar e servir.
Entre
cachimbos e malassadas, a maxixada brilhou. Lembrando que cachimbo é de beber e
malassada não vai ao forno. O primeiro é uma bebida feita de cachaça, mel e
frutas que, segundo Ana, a moça grávida já começa a receber quando anuncia o
pãozinho no forno, para servir às visitas quando vem o rebento. E malassada é a
tortilha do sertão feita na frigideira com ovos batidos em neve, farinha de
mandioca e temperos. Mas, voltemos à maxixada.
No almoço do
outro dia todas nós queríamos repetir a maxixada do jantar de tanto que
gostamos. Quem já comeu a maxixada do restaurante Mocotó ou já fez a receita
que Ana traz em seu livro ou simplesmente faz deste prato uma mistura do dia a
dia sabe do que estou falando. Maxixe é um ingrediente incrível: rústico,
nutritivo e, a quem possa interessar, não tem quase nada de calorias embora
possa ter o tamanho de uma batata média – o que ajuda a nos iludir quando é
colocado no prato.
Em Salvador
comi na casa de amigos a maxixada da Geo, Geralda Oliveira Silva, que comanda a
cozinha há anos e incorporou a técnica da família ao seu jeito de
temperar. O leite de coco é pouco, mas
leva extrato de tomate, camarão seco e ovos no final. A técnica da família consiste em aferventar
as rodelas do maxixe antes e espremer um pouco para tirar o excesso de
sementes. Já Eliana Santiago, também
baiana, mas do Sertão, e que trabalhou
um tempo comigo, cozinhava sua maxixada na panela de pressão com
temperos comuns que incluía tomate, pimentão e coentro, mas refogava tudo com
um pouco de toucinho e colorau. E também ficava divino.
Ana Rita fica
radiante ao contar que o maxixe é o primeiro verde que surge na seca tão logo vem
a época das trovoadas. A chegada das águas no Sertão é cercada de reverências.
Um amigo de Uauá, no interior da Bahia, me conta que o pai não deixava ninguém
continuar deitado se por acaso a chuva chegasse no meio da noite. É falta de
respeito. Todos se sentavam e rezavam em agradecimento ao milagre da vida. Pela manhã os filhos saiam a plantar os
grãos, o milho, o feijão, mas o maxixe brotava sozinho, por bondade, de
sementes de outras safras. Em pouco tempo já podiam colher os primeiros frutos.
Os primeiros verdes da temporada a irem pra panela que andava meio pobre.
A planta Cucumis anguria é originária da África e
foi uma das preciosas contribuições dos escravos à nossa dieta, nos impondo
além de pedidos de desculpas também o eterno agradecimento. Logo se transformou
numa espécie quase espontânea por todas as áreas tropicais, não só no Brasil. Do Sudeste brasileiro até o Sul dos Estados
Unidos o maxixe nasce à toa, sem muitas exigências a não ser o calor. Na
Flórida, numa extensão limitada há cultivo para a fabricação de picles. Por aqui, ele é mais apreciado fresco, na
maxixada, na feijoada, nos escaldados e cozidos. E até em saladas, sucos,
drinques – Ana Luíza Trajano, do restaurante Brasil a Gosto, inventou o seu
“dry maxixe”, que fez sucesso. O perfume
do legume lembra o de pepino e deixa um aroma bom na bebida.
Aliás, o
maxixe é do mesmo gênero do pepino e mesma família do melão, da melancia, da
abóbora e do chuchu. Como todas estas plantas, o maxixeiro é planta rasteira ou
trepadeira e tem gavinhas para o caso de encontrar suportes. As primeiras folhinhas lembram as de
melancia, mas tão logo os frutos ganham tamanho de uma noz já podem ser
colhidos. Nas feiras e mercados de cidades do Nordeste onde podem ser encontrados,
costuma-se encontrá-los amarrados pelo “rabo”, um fio fibroso que faz parte do
fruto e que é retirado quando vai ser
preparado. Em São Paulo os frutos normalmente já vêm sem o apêndice.
Há variedades
lisas, mas a maioria tem casca fina com muitas pontas na forma de espinhos
macios. São comestíveis, mas podem ser
raspados antes do preparo. Não precisa tirar toda a casca, que fica bem macia
depois do cozimento e as sementes achatadas tampouco incomodam. Pelo contrário,
conferem crocância ao prato.
Não é em todo
supermercado que você vai encontrar o legume, mas em mercados municipais e
principalmente ao redor deles, em barraquinhas, é certeza se separar com maxixe
o ano todo - em locais quentes ele tem produção ininterrupta com irrigação
quando não há chuva. Em frente ao
Mercado da Lapa, por exemplo, há uma
feira informal onde sempre vai encontrar maxixe e de tudo o que mais
precisar para sua maxixada: coentro,
tomate, pimentão, cebola, cebolinha.
Além de macaxeira, abóbora madura, feijão de corda, coco e quiabo para
completar a mesa.
Quando for
comprar, escolha os menores, mais firmes. Conforme vão amadurecendo vão ficando
amarelados, as sementes vão endurecendo e o sabor ganha um tico de amargor.
Quando estiverem totalmente maduros, melhor usá-los para espalhar as sementes pelos
quintais.
A maxixada
que fiz é parecida com a da Ana Rita, mas gosto de cozinhar os legumes em
metades e juntar um pouco dos temperos frescos também no final para me
aproveitar das cores. De resto, é igual. No livro dela há muitas outras
preciosidades do Sertão que não podem ficar esquecidas por aí.
Maxixada
1 cebola roxa
1/4 de cada
pimentão: do verde, do amarelo e do vermelho
4 ramos de
coentro
1 ramo de
cebolinha
20 maxixes
lavados, raspados e cortados ao meio, de comprido
3 dentes de
alho amassados
Sal e
pimenta-do-reino a gosto
1 xícara de
leite de coco
Pique a
cebola, o pimentão, o coentro e a cebolinha e guarde um pouco para usar no
final. Numa panela coloque o restante dos temperos, os maxixes, o alho e água
suficiente para cobrir. Tempere com o alho, sal e pimenta-do-reino. Tampe e
deixe cozinhar por cerca de 20 minutos ou até o legume amaciar e a água secar.
Se for preciso, junte mais água quente. Cubra com leite de coco, junte a cebola
e o pimentão reservado (pique mais fino), abaixe o fogo e espere aquecer. Prove
o sal e corrija, se necessário. Espalhe
por cima o coentro reservado e a cebolinha e sirva. Pode ser prato único ou
acompanhado de arroz, farinha, peixe, carne.
Rende: 8 porções
Tem um prato no meu Bazzar que é sucesso há muitos Verões: é um beijupirá com farinha do Acre, pirão e maxixe. Uma delícia!
ResponderExcluirNeide, gosto do maxixe assim: refogo 1 cebola picada com azeite, 2 tomates maduros picados, cerca de dez maxixes raspados e cortados em rodelas. Acrescento 2 colheres de sopa de extrato de tomate e meia xícara de água. Depois de abrir fervura acrescento meio vidro de leite de coco. Tempero com sal. Fica delicioso!
ResponderExcluirNeide, gosto do maxixe assim: refogo 1 cebola picada com azeite, 2 tomates maduros picados, cerca de dez maxixes raspados e cortados em rodelas. Acrescento 2 colheres de sopa de extrato de tomate e meia xícara de água. Depois de abrir fervura acrescento meio vidro de leite de coco. Tempero com sal. Fica delicioso!
ResponderExcluirCristiana, este prato deve ser demais de bom!
ResponderExcluirStella, gostei da simplicidade do prato. Vou fazer!
Um abraço,n