Hoje estou voltando de Uauá e já tem coluna Nhac no caderno Paladar. Veja lá no blog do caderno, no Estadão impresso e também aqui.
CORAÇÃO
DE BANANEIRA
Lá
em Itabirito, na venda do Roninho, sempre tem um punhado de mangará fresco apanhado
há pouco envolvido em seu manto roxo descansando num caixote. É que mineiros
daquela região ao redor de Belo Horizonte ainda tem apreço pela iguaria. É
consumido em outras partes do país, como comida ou remédio, mas em pontos
esparsos.
Para
quem sabe lidar com ele, é um prato cheio que sustenta a família e imita o
palmito além de dar um prazer danado aquele amarguinho de guariroba que ele
tem. É o que dizem as cozinheiras que têm
intimidade com os assuntos do coração. Aliás, dizem por aí que pobre o chama de
imbigo com orgulho e o rico, de coração com soberba. Já umbigo é pra quem se
mete a querer falar como gente chique. Mas, não importa a parte anatômica animal que
o nomeia popularmente nem o nível econômico de quem o aprecia, o que vale é que
a estrutura floral cordiforme que também responde por bogó é democrática,
acessível e deliciosa.
Todo
mundo já deve ter visto ao menos em foto este lustre de pétalas cor púrpura por
fora e o avesso vermelho brilhante, às vezes revelando as florezinhas amarelas como
pingentes enfileirados, e que continua umbilicalmente
ligado ao cacho-mãe a menos que seja extirpado. Portanto, não estou falando de
nenhum ingrediente desconhecido, mas apenas negligenciado pela maioria das
pessoas na república das bananas, sem nenhum tom pejorativo aqui – ao contrário,
sortudos nós que, yes, temos banana e coração.
Os
frutos, a gente nasce comendo, mas o coração só experimentei depois de adulta e
os preparos são sempre meio mineiros, bem temperados com alho, cebola, pimenta,
pimentão, cheiro verde, como recheio de pastel de angu ou de buraco-quente - colocado
no meio do pão francês, e ainda combinado com costelinha de porco, carne moída, frango,
peixe. De certa forma, quase os mesmos
usos que o palmito, especialmente o guariroba.
Depois conheci receitas de curries, com
temperos asiáticos como leite de coco, pimentas, coentros. No Sudeste Asiático há inúmeros pratos com o ingrediente e ainda separam o coração das flores masculinas
que são limpas e preparadas à parte. No
Brasil o coração é limpo e fatiado inteiro incluindo estas flores. As camadas externas e mais firmes protegem as
pequenas pencas de flores masculinas, que são como miniaturas de bananas. Livres dos pistilos e das sépalas ficam menos
amargas e textura delicada.
Foi,
porém, um olhar estrangeiro não viciado e sem a menor familiaridade com o
ingrediente que me fez levantar os olhos para além do meu próprio umbigo. A amiga italiana Alessandra Sposetti se
encantou com o formato do coração que conheceu em minha casa e levou para o Rio,
onde ensina cozinha italiana. Disse que iria preparar como alcachofras já que a
referência que ela tem é diferente da nossa, comedores de palmitos.
Foi
influenciada por alguma similaridade, o
roxo das brácteas duras, a ponta do cone fechada em pétalas e o nome
coração. Mal sabia ela que além dessas características coincidentes, havia ainda o amargor presente nas duas, mas
muito mais discreta na alcachofra.
Claro, foi só preparar no azeite com vinho e alho para descobrir que o
sabor estava mais para cardo, vegetal do mesmo gênero Cynara que a alcachofra, do qual se comem os talos bem mais amargos,
mas deliciosos também.
E aí foi minha a
vez de experimentar. Ela me passou a receita de gobbi alla parmigiana tal qual a mama italiana Ada Guzzini faz na
cidade de Maceratana, região de Marche, no centro da Itália, onde o cardo é
conhecido como gobbo. Foi de Alessandra a ideia de usar queijo da Canastra duro
em vez de parmesão. Se você tiver
oportunidade de preparar este prato, verá como a italiana foi certeira na
intuição. O leite e o queijo trazem equilíbrio ao sabor final fazendo do
amargor um item suave e desejável como o de alcachofra.
Antes
disso, porém, é bom observar a sabedoria mineira: embora todos os mangarás de
bananeiras sejam comestíveis, os menos amargos são os de banana-prata; o coração deve ser retirado do cacho enquanto
as bananas ainda estão verdes, pois à medida que os frutos amadurecem o coração
vai endurecendo - neste caso não há como
endurecer sem perder a ternura.
A
retirada do coração é a conduta recomendada aos produtores de banana para que o
cacho se desenvolva melhor. Quando todas
as flores femininas foram fecundadas e se viraram para cima, basta esperar de
15 a 20 dias para tirar e aproveitar o coração - é só torcer o pedúndulo perto
dele para quebrá-lo .
As
flores que restam entre as primeiras camadas roxas do coração são apenas as masculinas
que não se desenvolvem em frutos, mas são deliciosas para comer. As camadas externas mais duras são
descartadas até chegar a um miolo claro e tenro. Aí, sim, corta-se em fatias
diretamente sobre a bacia de água acidificada (4 colheres de sopa para cada
litro de água). Aferventa-se duas vezes em água limpa, escorre-se e está pronto
para ser usado como se fosse palmito ou alcachofras em conserva.
Aqui
vale uma consideração. Enquanto brasileiros às vezes cortam o vegetal e o
deixam imerso numa solução de bicarbonato e limão para evitar que escureça,
asiáticos usam apenas limão. O bicarbonato
é usado para palmitos e brotos de bambu para eliminar o amargor e o limão ajuda
a evitar o escurecimento da oxidação, mas um é alcalino e o outro, ácido. Sendo
assim, penso que um anula o efeito do outro e, por isto, prefiro usar só o
limão, para não escurecer, e aferventar duas vezes para eliminar o amargor.
Funciona.
E,
se aproveitando da técnica asiática,
podemos separar as flores em vez de picar tudo junto como se costuma fazer por
aqui. E, mais ainda, podemos limpar uma a uma as flores, tirando pistilos e
sépatas para que fique só a pétala, menos amarga. Refoga-se na manteiga ou
azeite com gotas de limão e tem-se algo como cogumelos.
Então, se você frequenta feira de produtores, peça o
coração ao vendedor. Certamente não custará quase nada. E mesmo espalhados pela
cidade há vários cachos de banana esperando uma alma boa que lhes arranque fora
o umbigo que será devorado.
Coração de banana
gratinado com queijo
Meia
xícara de suco de limão
2
corações de banana
2
xícaras de leite integral – ou mais, se precisar
Sal
e pimenta-do-reino a gosto
4
colheres (sopa) de queijo duro ralado (pode ser Canastra, Serro, Salitre etc)
Prepare
uma bacia com 2 litros de água e o suco de limão. Lave bem o coração, tire as
camadas externas (descarte-as ou use como pratos), até chegar a um miolo claro.
Separe as flores que for encontrando entre as camadas e jogue-as na água com
limão. Se quiser usá-las separadamente, tire sépalas e pistilos (ficarão menos
amargas) e reserve.
Corte
o coração em fatias diretamente sobre a água. Deixe repousar por 2 horas ou
mais e descarte a água. Escorra em peneira de plástico. Coloque o coração e as
flores numa panela, de preferência de
barro ou aço inoxidável, cubra com água limpa e leve ao fogo para ferver. Ao
lado deixe mais água aquecendo. Deixe ferver dois minutos, escorra e coloque mais
água quente. Repita a fervura e escorra. Se achar que ainda está muito amargo,
ferva mais uma vez. Escorra bem e passe tudo para uma frigideira que possa
depois ir ao forno. Cubra com o leite,
tempere com sal e pimenta-do-reino a gosto e deixe cozinhar em fogo
baixo até o leite começar a secar e o coração ficar macio. Se for preciso,
junte mais leite quente. Cubra com o
queijo ralado e leve ao forno bem quente para gratinar. Sirva quente com pão ou como acompanhamento.
Rende: 4 porções
Aprendi a preparar com minha sogra e costumo fazer quando quero mimar a família. Parabéns pela postagem, adorei!
ResponderExcluirOI NEIDE LEIO SEMPRE SEU BLOG MAS QUASE NUNCA COMENTO HOJE TENHO UMA DICA E UM PEDIDO. PRO UMBIGO JA EXPERIMENTOU ACOMPANHAR COM ANGU DE MILHO VERDE E SO BATER MILHO VERDE COAR E DEPOIS FAZER O ANGU E UMA DELICIA E DA PRA CONGELAR ADEPOIS DE BARIDO E TEM MILHO VERDE PRO ANGU OU MINGUAL O ANO TODO . O PEDIDO E QUE LI NUMA POSTAGEM ANTIGA SOBRE O COGUMELO ORELHA DE PAU QUERIA SABERR COMO IDENTIFICAR O VENENOSO DO QUE SE PODE COMER . MEU E MAIL novomar@ymail.com. se puder me responder tenho outras duvidas mas fica pras proximas .valeu diego
ResponderExcluirObrigada, Rosângela!
ResponderExcluirDiego, boa diga para o angu. Vou experimentar dia desses.
Quanto ao cogumelo, só consumo o orelha-de-judeu, que sei que é comestível. Os outros podem não ser venenosos mas não são palatáveis, têm textura muito dura. O comestível tem textura de cartilagem.
Um abraço,n
Nossa Neide, como amo entrar aqui, aprendo tanto e tenho tanta admiração pelo seus conhecimentos., trabalho e como voce compartilha com tanto amor e segurança. Parabens.
ResponderExcluirum dia quero fazer essa receita, realmente a sacada da associação com a alcachofra deve ser maravilhosa.
beijos e tudo de bom.
Sempre interessante!
ResponderExcluirMuito feliz esse compartilhar de conhecimentos sobre o mangará! somos gratos
ResponderExcluirNeide, as folhas externas, pensei em usar para enrolar e assar bolinhos, como uma pamonha ou abará, será que tem algum problema em testar?
ResponderExcluirObrigada!
hamburguer ou bolinho de coração de bananeira urgente,ten como fazer e para amanha,me ajude por favor
ResponderExcluirIl Coração de bananeira, conosciuto anche come mangará, è un ingrediente sorprendentemente versatile che sta conquistando sempre più spazio nelle cucine di tutto il mondo. Nella colonna del caderno Paladar, si esplora l'uso di questo fiore tropicale, che può essere utilizzato in piatti deliziosi e innovativi.
ResponderExcluirÈ affascinante vedere come la gastronomia stia evolvendo, e allo stesso modo, anche il mondo dell'intrattenimento online sta cambiando rapidamente. Se sei appassionato di novità non solo culinarie, ti consiglio di visitare https://rocketplay77.com/live/all, dove troverai una vasta selezione di giochi di slot per divertirti e vincere in grande.