NHAC!
Toda araruta tem seu dia de mingau
Receita: Gratinado com araruta
E aqui também vai a versão integral:
Toda araruta tem seu dia de mingau
Por Neide Rigo. Coluna Nhac. Caderno Paladar
Entre os vegetais, a araruta é o equivalente à cabeça de bacalhau - todo mundo sabe que existe, mas ninguém vê. Pelo menos nos dias atuais. Do rizoma desta planta se extraí uma fécula finíssima usada abundantemente no passado para biscoitos, brevidades e mingaus, da qual sobrou hoje apenas uma fina poeira, afinal este é um ingrediente que sofre sério risco de desaparecer e já não é mais encontrado no mercado. Quando você encontra um pacote como o nome de araruta ou ararutinha no rótulo, custando duas vezes mais que polvilho de mandioca, e confere a lista de ingredientes, está lá: “fécula de mandioca”, ou seja, o mesmo polvilho de mandioca pelo qual poderia pagar a metade. Ou, pior, esta informação não aparece no rótulo, mas, se você liga para o serviço de atendimento ao consumidor da empresa e inventa que sofre de alergia mortal à mandioca, o impostor confessa rapidamente. “Bem, veja bem, é amido de mandioca, mas a araruta está em falta e o polvilho tem o mesmo comportamento” é o que costumam dizer. Então, se você não sabe reconhecer o pó de araruta, desconfie sempre.
Primeiro, que o comportamento não é o mesmo. A araruta faz
um mingau menos visguento, mais macio e deixa biscoitos mais crescidos e
crocantes. E se estão vendendo uma coisa pela outra, e nada contra o polvilho
de mandioca, deveriam ao menos cobrar o
mesmo preço, mas a falsificação é mais cara.
Está certo que uma verdadeira araruta hoje custa bem mais
que o dobro do polvilho de mandioca (cerca de quarenta reais o quilo), mas,
pela raridade e apreço, o uso já não é o
mesmo do passado. Minha mãe conta que
quando sua família ou seus avós se mudavam,
sacos enormes de polvilho de araruta faziam parte da provisão e ele
servia para alimentar a família no café da manhã com biscoitos e papas, numa
época em que o trigo era artigo raro. Hoje, no mundo todo, o uso da araruta é mais parcimonioso, mais
para fazer cobertura transparente para tortas de frutas ou espessar molhos como
os da culinária chinesa, por exemplo.
Agora, nem toda arrowroot pode ser traduzida como nossa
araruta. Estudiosos acreditam que esta que conhecemos e que é considerada como
a verdadeira, Maranta arundinacea, da
família das marantáceas, tenha seu centro de origem no continente sul-americano, sendo encontrada
em estado silvestre nas florestas venezuelanas.
Entre os índios aruaques, era conhecida como aru-aru, ou alimento dos
alimentos e esta é só uma das explicações para o nome. E servia não só para comer mas também para curar
feridas por flechas envenenadas, mordidas de cobras e picadas de insetos. Já o nome em inglês, arrowroot, denomina
mundo afora não só a raiz dos aruaques
mas também a fécula de outras plantas amiláceas tropicais, como Curcuma angustifolia, a Cana indica, a Zamia pumila, a Zamia
integrifolia e a Pueraria lobata.
As féculas destas, sim, têm performances
parecidas com a da nossa araruta.
Apesar da perda de espaço para outros amidos mais fartos,
como o de milho e o de mandioca, a araruta ainda tem defensores ardorosos entre
consumidores, chefes e produtores. Já
vi pequenas produções na Bahia, no Espírito Santo e em Minas Gerais, mais pelo
prazer de não deixar a cultura morrer, que propriamente pelo lucro que ela
representa.
A planta é ornamental e produz, em touceiras na superfície
do solo, os rizomas que são colhidos anualmente. Eles são cônicos, segmentados, têm pele lisa
e brilhante de cor de marfim quando despidos de uma película marrom que os
recobre . A polpa é fibrosa, mas quando jovens os rizomas podem ser usados como
batata. Há também uma variedade esférica
chamada ovo-de-pata.
No processo de extração da fécula, a araruta é ralada ou
triturada com água até soltar o líquido leitoso que é peneirado para separar a fibra
e deixado em repouso para sedimentar a fécula, amido, polvilho ou goma, nomes
dados para esta porção carboidrato da planta . Depois de algumas horas, o líquido excedente
pode ser desprezado, sobrando apenas o amido que é seco e transformado em
pó. Este mesmo processo, para pequenas
quantidades, pode ser feito em casa usando liquidificador e o amido, seco ao
sol. Quando a produção se dá em escala
maior, a secagem é feita na sombra e em ambiente protegido.
Se você quiser comprar o polvilho, procure casas de produtos
naturais, feiras de produtores e até via facebook.
Wagner Finotti, por exemplo, é um pequeno produtor de Uberlândia-MG que cultiva
a planta e vende o polvilho de araruta em sua página “chacaraparadisouberlandia”. Já visitei plantações em Conceição de
Almeida, no Recôncavo Baiano, num dia de
campo da araruta, e um dos produtores, Pedro Coni, também atende por email (saboresdeararutas@gmail.com)
e entrega por correio. Ambos produtores vendem ainda mudas para quem quiser
cultivar.
Ultimamente as embalagens diminuíram de tamanho já que o
produto passou a ter mais indicação como espessante. É usado quase como uma
especiaria, sendo um ótimo substituto do amido de milho pois espessa em
temperatura mais baixa, fica mais
transparente e é insípido. Aliás, o
polvilho de araruta substitui com vantagens qualquer amido usado para engrossar
molhos. Até a farinha de trigo do bechamel
para gratinar pode ser trocada pela
araruta. E se tiver em mãos a própria raiz fresca poderá extrair o amido na hora, junto com o
leite ou líquido que vai ser usado, como na receita que dou a seguir. Fiz um gratinado comum com as batatas de
couve-rábano, mas usei um pedaço de araruta em vez da farinha na hora de fazer
o molho.
Às vezes, especialmente no inverno, encontro ararutas no bairro da Liberdade, mas
nunca ouvi dos vendedores o nome certo. Dizem apenas que é batata chinesa, um
nome genérico para várias raízes e tubérculos nos mercados asiáticos. Se tiver o formato e o jeito de araruta, pode
comprar que é ela. Dura alguns meses na cesta até começar a brotar. Se isto
acontecer, é só deitá-la num vaso e cobrir com 10 centímetros de terra para ter
novas ararutas quando as folhas murcharem.
E assim não deixamos a araruta morrer.
Algumas dicas
- 1 colher (sopa) do pó de araruta equivale a aproximadamente
50 g do rizoma (bata no liquidificador com parte do líquido frio da receita e
passe por peneira antes de levar ao fogo).
- 1 colher (sopa) de
pó de araruta pode substituir a mesma quantidade de maisena ou de
polvilho. Para substituir a farinha de
trigo, troque 1 colher (sopa) desta por 2 colheres (chá) de araruta.
- Se estiver usando o pó, não se esqueça que, do mesmo modo
que a maisena, a araruta deve ser diluída em líquido frio antes de ir ao fogo.
Couve-rábano
gratinada com araruta
6 batatas pequenas de couve-rábano
Meio litro de leite
1 colher (chá) de sal
1 pitada de noz moscada
50 g de rizoma de araruta descascado e picado
2 colheres (sopa) de manteiga
6 colheres (sopa) de queijo da Canastra meia-cura ralado
Descasque e corte em rodelas as batatas de
couve-rábano. Coloque numa panela, cubra
com leite, tempere com sal e noz moscada e leve ao fogo baixo. Deixe cozinhar
por cerca de 25 minutos ou até as rodelas estarem macias. Escorra o leite
e meça uma xícara (se faltar, complete
com água). Espere amornar e coloque no liquidificador com a araruta. Bata bem
até ela ficar triturada. Passe por peneira fina e leve este leite ao fogo junto
com metade da manteiga. Cozinhe, mexendo sempre, só até engrossar. Prove o sal e corrija, se necessário. Unte
uma forma refratária com a manteiga restante e coloque as rodelas de
couve-rábano. Despeje o molho por cima e polvilhe o queijo ralado. Leve ao
forno quente e deixe até o queijo ficar dourado.
Rende: 6 porções
Adoro seus post!
ResponderExcluirParabens Neide por texto tão explicativo e interessante, grato por citar nosso nome.
ResponderExcluirWagner
Bom dia venho pesquisando a batata aranã com nome cientifico Saranthe marcgravii Pickel parente da batata araruta e vejo que não só o único, mais as histórias de vivencia com este rizoma são diferente e fico feliz por ter este tipo de rizoma em outro lugar do Brasil. Se possível para trocar experiência meu contato fica aqui na pagina com vocês. Gastrônomo e pesquisador Marcos Lôbo tel- 81-997886975. Obrigado
ResponderExcluirAqui onde moro as pessoas plantam no quintal, eu também plantei umas mudas, tanto de araruta como de açafrão.
ExcluirÓtima explicação.
ResponderExcluirMeu nome é Vânia Braga. Gostei muito da sua reportagen sobre a Araruta
ResponderExcluirO que posso fazer com a araruta, sem ser a farinha.
ResponderExcluirTenho um vaso, mas e muito pouco para fazer em po.
Mingau de araruta além de ser gostoso, é um alimento bastante nutritivo.
ResponderExcluirMelhor matéria que li sobre ararutas... Quando era criança fazia muito mas o costume foi se perdendo. Mas na casa da minha mãe ainda tem e resolvi continuar fazendo o amido...
ResponderExcluirMeu nome é Maria Raquel.Sou mineira. Nasci na região Oeste de Minas Gerais na década de 50. Ando atrás de uma planta que havia no sítio do meu pai, quando era criança. Meus pais a chamavam de ARARUTA. Mas provavelmente não seja araruta. Ela é um bambu. Tem um tronco fino e único de mais ou menos 1 metro. Em cima abre os galhinhos, parecendo uma sombrinha, com folhinhas com a textura da folha do bambu mesmo, só que mais ou menos no formato de uma "sainha"(roupa feminina). O tronco tb é um bambuzinho. Essa planta dá um rizoma que faziam polvilho. Segundo minha mãe era a melhor araruta que tinha. Tenho procurado há anos. Não acho nada parecido. Vou deixar aqui meu Email, caso alguém saiba, gostaria de ter notícias dessa maravilhosa planta. Agradeço! maquelsouza@gmail.com
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