Logo eu já estava com uma cesta para acolher os presentes. Pode pegar quanto quiser, eu não tenho tempo para tirar a polpa, teria dito. Aprendi que só se colhem os frutos caídos e que para saber se ainda estão bons, se estão frescos, basta arranhar a casca com a unha. Se por baixo da penugem marrom o risco do arranhão for verde, é porque está bom. Se marrom, esqueça.
À medida em que as atividades foram acontecendo, os cupuaçus foram sendo usados, graças à paciência nipônica da Fernanda Cobayashi, companheira de projeto, que se sentava à mesa da cozinha ou na varanda e tirava baciadas de polpa. Primeiro entraram em suco, depois no pavê de pão que levamos para o piquenique com as crianças, no curry de banana e no pão doce. Para este, usei muito cupuaçu, pois precisei pensar numa receita e ir aperfeiçoando até que ficasse com o sabor que ficou, uma massa azedinha e aromática, como um panetone.
Precisei pedir cupuaçus para Oliete mais duas vezes e sempre levei a ela um pão como agradecimento. É que nos mercados não há cupuaçu para vender. Em compensação, há pés de cupuaçu (assim como de jambo) espalhados por toda a cidade, assim como temos pitangas e amoras em São Paulo. É difícil haver um quintal sem cupu. Nesta época do ano, estão carregados, mas como não é o tipo de fruta que se come como veio ao mundo, caso das jabuticabas, pitangas, amoras ou jambos, o aproveitamento fica por conta da disposição de cada família para aproveitar a safra - tirar a polpa, congelar, fazer geleias, doces, sorvetes, bater com leite para dar às crianças e, por que não, colocar na massa do pão.
É trabalhoso, mas o sabor da fruta é tão maravilhoso e tão persistente a despeito do frio, do calor, da desidratação ou de qualquer outra técnica utilizada, e o fruto é tão nutritivo, que o esforço vale cada tesourada. Só ainda não se deram conta disso porque há fartura. Se tivessem, como nós, como única opção aquelas polpas aguadas, batidas e congeladas dos supermercados, certamente tratariam a fruta como ela merece.
Para quem acha sempre que está perdendo alguma coisa quando faz um trabalho artesanal, basta se sentar no sofá, com um pano e uma bacia no colo, ligar a tevê e ir tirando a polpa com tesoura. Não perde a novela nem desperdiça a fruta. Ou ainda: chegou uma visita daquelas que não vão embora nunca. Manda ela entrar, faz um café, puxa a cadeira da cozinha, uma tesoura pra cada uma, uma bacia no meio, papo vem, papo vai, e no final vai até achar a visita interessante.
Se você não sabe, o cupuaçu é parente do cacau (Theobroma grandiflorum), porém com polpa muito mais gostosa, com aroma e sabor muito marcantes (o perfume é tão forte a ponto de não se recomendar viajar de avião). As sementes, no entanto, tem composição parecida com as do cacau e delas também pode se fazer produto similar ao chocolate.
Mas, por enquanto, vamos ao pão:
Pão doce de cupuaçu com cúrcuma e castanha
500 g de polpa de cupuaçu ou (2 e ½ xícaras de polpa in natura, tirada com tesoura)
1 e ½ xícara de água
1 colher (sopa) de fermento seco para pão
1 ovo inteiro
½ xícara de açúcar
4 colheres (sopa) rasas de manteiga ou óleo
2 colheres (sopa) de casca de laranja e limão ralados
1 colher (sopa) de cúrcuma fresca ralada (ou use 2 de chá de pó)
1 pitada de sal
Mais ou menos 1 quilo de farinha de trigo
1 xícara de uvas passas
100 g de castanha-da-amazônia picada (castanha-do-pará)
Misture o fermento com a
água e espere dissolver (aproximadamente) 5 minutos. Bata no liquidificador a polpa de cupuaçu e a
mistura da água com o fermento. Junte o ovo, o açúcar e bata mais. Passe para uma tigela e junte as
cascas, a cúrcuma e o sal (se quiser, bata tudo no liquidificador, apenas diluindo antes o fermento). Acrescente a farinha aos poucos até o ponto de sovar. Junte a
uva passa e metade da castanha e misture tudo. Sove bem a massa, juntando mais farinha à medida que
amassa, até formar uma massa homogênea, lisa, modelável, que se solte das mãos.
Cubra com plástico ou um pano.
Espere crescer até dobrar de volume (caso não tenha experiência com pães, faça
uma bolinha com a massa e deixe num copo com água em temperatura ambiente –
quando ela subir à superfície, a massa certamente estará no ponto). Divida a
massa em três ou quatro e molde os pães compridos ou redondos. Espalhe as castanhas sobre uma superfície lisa, uma porção para cada pão. Molhe os pães com água e role-os sobre as castanhas picadas. Coloque-os numa
assadeira grande, untada e polvilhada, deixando espaço entre eles. Deixe
crescer novamente por cerca de meia hora ou até os pães dobrarem de volume.
Faça cortes com lâmina afiada (bisturi, estilete ou lâmina de barbear são melhores que faca), leve ao forno pré-aquecido bem quente e deixe
assar por 10 minutos. Abaixe o fogo e deixe assar por cerca de 50 minutos. Os
pães devem ficar bem dourados.
Rende de 3 a 4 pães
Menina, os pães ficaram lindos e devem ter ficado gostosos também. Nunca comi ou bebi nada com cupuaçu, mas fiquei com água na boca. Abç
ResponderExcluirIzabel
Neide, eu conheço o cupuaçu pelas polpas que compramos congeladas aqui no sudeste. E, mesmo assim, quando começo a fazer o suco já vou ficando inebriada pelo delicioso aroma e quando bebo o suco sinto uma sensação de que fui transportada e estou na floresta. Imagino o prazer que terei quando eu estiver diante dessa fruta no seu habitat. Estou programando uma viagem para Belém/Manaus no próximo mês de junho. Ulalá!
ResponderExcluirAmei esse blog, sou de RBC mas moro no RS, morro de saudade das delicias de lá!
ResponderExcluirHoje fiz este pão e ficou HORRÍVEL. Antes de fazer fiquei pensando o Cupuaçu é uma fruta ácida e entra raspa de limão e laranja que são super ácidas ainda por cima a cúrcuma. Dei para os parentes para me livrar e também detestaram. O pão ficou super amargo e ácido. Foi o pior pão que comi na vida. Grata pela receita
ResponderExcluirAnônimo,
ResponderExcluirsinto muito por ter perdido a receita. Diferente do que diz, a cúrcuma e as cascas de cítricos tem um certo amargor, mas não são ácidas. Só para saber o que pode ter acontecido (pois das vezes que fiz o pão, todo mundo que provou gostou, me diga, você usou a cúrcuma fresca ou em pó? Em que quantidade? as colheres eram rasadas? E o cupuaçu? era fresco ou polpa comprada congelada?
Mais uma vez, peço desculpas se não gostou da receita, mas aguardo sua resposta. Um abraço, N