sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Cante Alentejano, patrimônio da humanidade



Ontem a Unesco proclamou em Paris o cante alentejano como Patrimônio Imaterial da Humanidade. Tive o privilégio de gravar este vídeo, que já publiquei outras vezes (aqui com a letra do que é cantado).  Depois do vídeo de como fazer tapioca, com 170 mil visualizações, este é o mais popular, com 125 mil. Estar junto a estes cantores é emocionante, o canto coletivo é tocante. E ainda há o ensinamento - aqui, de açorda de coentros e alhos, uma delícia.   Como hoje é dia de recordar, aqui fica para cantar junto no fim de semana e homenagear os cantores.

Blackfriday ou blackfood day

Se você acha que viu isto aqui no Come-se, tem toda razão. Hoje estou muito ocupada e não vou conseguir postar nada. Se você é leitor antigo, volte na segunda. Se está chegando agora, é só pra se divertir um pouco nesta sexta de loucura total, o horror. Veja aí o que tem de preto na despensa, chame os amigos no final da tarde, faça um happy hour temático acompanhado de cerveja preta e pronto, terá um funny e não dispendioso day. O texto abaixo é de 2012, quando a sexta de ofertas foi vizinha do dia da consciência negra, mas a loucura aumenta a cada ano.  


Içás
 


No dia da Consciência Negra a Igreja do Rosário, aqui em São Paulo, ficou fechada. Mas depois de todo mundo comer o peru na quinta de ação de graças, afinal todo brasileiro comemora dia de ação de graças, certo?, nossas lojas resolveram abrir os estoques e festejar com os grandes descontos. Então, como nos faltam palavras, nos falta cultura própria, vamos lá à black friday, off,  sale, of course e outras papagaiadas eleitas pelo comércio. De minha parte, a contribuição é abrir a despensa e mostrar tudo o que temos de negro para comer e a economia que podemos fazer. Comida negra é geralmente magra, então economizamos calorias. E são ricas em antioxidantes antocianinas, caso das uvas, jabuticabas, amoras, feijão preto, arroz negro etc, que nos fazem economizar remédios.  Ou são fermentados. Ou são secos. Todos tão saudáveis. Se de longe estas comidas são negras, de perto são de todas as cores. A chia tem grãos acinzentados;  a pimenta é verde;  a berinjela, roxa; o arroz, vinho;  a ameixa, púrpura; mirtilos e maria-pretinhas, azuis; a papoula é cinza; o shiitake é marrom etc.  O que mais? Lembra de mais alguma coisa? 


Ameixa seca
Amora
Ameixa preta
Alga hiziki

Amburana

Arroz negro

Arroz selvagem

Azeitona

Bananada

Baru

Baunilha

Berinjela 

Café seco não torrado

Chia

Chá 

Cogumelo trombeta da morte (catalão, comestível)

Cravo

Sementes de cupuaçu

Fava negra

Feijão preto

Geleia de amora

Gergelim

Goji

Grumixama

Casca de jabuticaba passa

Jabuticaba

Milho preto

Molho de ostra

Molho de soja

Orelha de pau

Papoula 

Pimenta longa

Pimenta de árvore

O grão preto é sal negro do Himalaia

Shiitake

Uva passa



quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Chá de flores azuis de feijão-borboleta

Já não me lembro de quem ganhei as sementes, só sei que trouxe daquele Terra Madre de 2010 que aconteceu em Brasília. Lembro de ter perguntado para o produtor se os feijõezinhos que estava distribuindo eram de comer. Disse que não, que era uma forrageira boa para o solo, fixadora de nitrogênio. Em todo caso, trouxe um pouco e guardei. Ficou anos aqui perto de mim, num envelope. Um belo dia, quando já nem me lembrava mais dele, achei o envelope com nome: feijão-borboleta. Só então fui procurar saber mais a respeito e descobri um mundo em azul comestível e divertido em torno da Clitoria ternatea L. (observe a anatomia da flor e vai entender porque Lineu lhe deu este nome). Então plantei, primeiro na jardineira da minha janela - foi quando tirei mais sementes e sequei algumas flores -, e agora na horta comunitária da minha rua, onde a planta já começa a florescer.

Na horta comunitária
No Brasil é conhecida também como cunhã (termo que definitivamente não adotarei e que deve ter a ver com o nome científico) e sua folhagem é usada para alimentar animais. Mas dizem que toda ela é comestível, incluindo as vagens verdes - eu nunca as comi pois deixo para conseguir mais sementes. Mas também não me pareceram muito palatáveis. As folhas, dia desses vou provar, parecem gostosas.

A planta é nativa da Ásia tropical e hoje está espalhada por todas as zonas tropicais do globo. Porém, é no Sudeste Asiático que o pigmento azul das flores parece ser mais explorado. Tanto para colorir o arroz glutinoso quanto para vários outros doces de goma ou farinha. Além do chás azuis feitos com as flores frescas ou secas. Embalagens com flores secas podem ser encontrados em vários países e tem a reputação de ser medicinal.  Aliás, a planta é amplamente estudada na fitoterapia por sua atividade anti-estresse e ansiolítica. Parece que também pode melhorar a memória.

 

 

Nas infusões é comum adicionar gotas de limão, não só para adicionar algum sabor que as flores não têm, mas para ver o líquido mudar de cor - como tem antocianina, que é a substância que confere a coloração azulada, basta adicionar um ácido para que o pigmento ganhe tonalidades rosadas. É uma reação normal que acontece com qualquer alimento que tenha este pigmento.

Como quase não há pigmento azul natural com que podemos contar na cozinha, está aí um boa opção para começar a brincadeira. Procure as sementes em viveiros de especialidades como o Sambalina, por exemplo - nos links aí do lado.  Eu gosto de colocar no chá de folhas de manjericão-anis, de erva-doce ou anis-estrelado, já que estes chás carecem de cor e o anis, não sei porque,  está associado a esta coloração. Fica muito bom. Com umas gotas de limão, fica melhor ainda, se bem que não será mais azul.


Para o chá, foi só ferver água, desligar o fogo e juntar folhas de manjericão anis e flores de feijão-borboleta (ou cunhã), tampar e esperar dez minutos antes de servir quente ou gelada.

Outros nomes em inglês para você pesquisar sobre a planta: butterfly pea, blue pea, cordofan pea e asian pigeonwings. E ainda cunhã, feijão-borboleta, ervilha-borboleta, ismênia, palheteira.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Broto de bambu ou takenoko no missô




Depois daquela oficina de meliponicultura, que eu citei aqui ainda sobrou um tempinho antes da chuva para conhecer o sítio do Jerônimo Villas-Bôas, o professor, que é meu amigo e consultor para assuntos meliponíferos. Tudo era lindo e cheio de surpresas, como o verdadeiro mar de bambus com centenas de brotos. De safra curtíssima, agora é o momento de colher, quando lançam estes grandes brotos ou takenokos (que quer dizer exatamente isto, broto de bambu, ou bebê de bambu). Está certo que o ideal é fazer como os japoneses que saem preparados com cestas e enxadas e só coletam aqueles que ainda conservam grande parte do corpo abaixo do solo coberto de folhas. Estes são mais mansos (sem aquelas substâncias cianogênicas que os fazem amargos e algo venenosos) e sem amargor. Mas não tínhamos nada disso, pois foi surpresa nosso encontro. E diante de tantos grande e pequenos, escolhi todos que pudemos carregar. E tive que tirar os brotos dando uma leve bitoca com o pé bem firme. Não foi difícil tirar assim. A desvantagem é que machuca um pouco a base dos brotos que depois precisam ser descartadas. Mas meus chutes foram certeiros e só machuquei uns três ou quatro.

Cecília, a filhinha do Jerônimo, tem seis anos e ficou super interessada quando disse que aqueles brotos eram de comer. Numa distraída minha a peguei experimentando uma lasquinha. - Hum, come-se mesmo, é gostoso! Disse que levaria um para a bisavó preparar no jantar (já sei que foi feito pro almoço do outro dia). Nas descobertas, cortou o dedinho com a face serrilhada de uma folha - queria que ela já levasse um limpo para casa e por isto descascamos ali mesmo. Só contou porque começou a sangrar, mas como medo de impedirmos que continuasse na brincadeira, já foi logo avisando: - Olhe, eu cortei um pouquinho o dedo, mas é só um pouquinho, nem está doendo. A menina curiosa já entende tudo de abelhas sem ferrão, agora já começa a entender também de colheita de bambus e possíveis acidentes. Voltamos com o porta-malas cheio.

O porta-malas virou porta-takenokos
Quanto ao amargor, estes são da mesma variedade que a Marisa Ono me deu e sem amargor algum quando bem fresco. À medida que o tempo passa, começam a ficar mais amargos. Não foi o caso.  Mas é sempre bom aferventar antes de usar. Se não é amargo, basta lavar bem e cozinhar até que fiquem macios. Jogue a água fora e os pedaços estão prontos para serem usados.  Se estiverem amargos (pode provar uma lasquinha mínima na ponta da língua, como fez Cecília), é bom juntar à água um pouco de bicarbonato (1 colher (chá) a cada três litros de água, mais ou menos - é o que meu pai costuma fazer) e fazer troca de água umas três vezes até os brotos perderem todo o amargos. Os japoneses usam farelo de arroz e pimenta seca.

Não sei do que gosto mais, de comer ou olhar os desenhos
Amargor o meu não tinha, então não precisei usar artifícios, além do sal. Mas da dica da pimenta gostei. Além de deixar o vegetal apimentado, parece que confere certa doçura. Usei pimentas frescas partidas ao meio. Mas vai do gosto.

Uma pessoa no Instagram deu a dica para eu preparar um refogado com missô, mirim, saquê e cebolinha no final. Foi o que fiz e ficou delicioso. Depois vou postar as outras receitas que fiz. Por enquanto, fiquem com esta - o missô é especial, só não sei é o que ganhei da Marisa ou da Mari Hirata. Só sei que os dois são caseiros e divinos.

A receita é coisa inventada de acordo com a dica que pedia para refogar antes cebola em óleo. Mas imagino que japoneses e seus descendentes tenham receitas mais apuradas e que podem me passar (ainda tenho takenokos ..). De qualquer forma, este refogado ficou delicioso. Eu comeria só isto com arroz pra sempre.

Broto de bambu com missô

1 colher (sopa) de óleo
Metade de uma cebola picada
200 g de broto de bambu (takenoko) cozido e picado
1 colher (sopa) de saquê
1 colher (sopa) de mirim
1 colher (sopa) de missô
1 colher (chá) de açúcar
Cebolinha a gosto (eu só tinha um pouco)

Aqueça o óleo com a cebola e espere murchar. Junte o broto de bambu e os temperos todos misturados com um pouco de água (menos a cebolinha). Deixe ferver uns cinco minutos, juntando mais água se necessário. Prove o sal e junte mais missô se precisar. Apague o fogo, junte cebolinha e abafe para que murche um pouco. Sirva com arroz.  Acrescentei um ovo cozido e nhac!
Rende: 4 porções



Cecília já levou o dela limpinho