quarta-feira, 30 de maio de 2012

O que é, o que é?

Sei, sei, hoje não é sexta-feira, mas como amanhã viajo e só volto na segunda, você tem quase cinco dias para descobrir. Só pra você saber, a coisa é de comer e está descascada. Na segunda, eu conto o que é, mas arrisque seu palpite. 


Jardim Botânico de São Paulo, o livro

Há dois tipos de visitas que devemos fazer quando conhecemos um lugar, segundo meu particular ponto de vista, a fim de reunir em pouco tempo um número grande de  informações a respeito da flora  e da fauna que ali habita, incluindo as gentes.  A partir daí, deduz-se muita coisa.  O Jardim Botânico e o Mercado.  Ou o horto, a praça mais verde da cidade e o supermercado, que sejam... 


Ir pra Paris e não conhecer o Jardin des Plantes é como vir a São Paulo e não conhecer o Mercado Municipal.  Mas fico triste quando sei que tantos paulistas conhecem o Kew Gardens ou o Jardin des Plantes, mas nunca pisaram no nosso Jardim Botânico ou no Horto Florestal. Mesmo o leitor do Come-se que está agora se perguntando: e o que isto tem que ver com comida?, vai encontrar num jardim botânico assuntos de seu interesse. Foi, por exemplo, no Jardim Botânico de Turim que conheci um pé de zimbro frutificando. No do Rio de Janeiro, conheci a árvore que nos dá o cravo especiaria - no chão abaixo da árvore colhi dentes de cravo ainda frescos e vermelhos com que fiz um chá de linda cor. Foi lá também que conheci a palmeira de sagu. No horto de Curitiba vi as frutas maduras de umê e pude provar as que não viraram umeboshi. E no Jardim Botânico de São Paulo vi uma coleção de mirtáceas, todas juntas, num só bosque. Araçás, goiabas, uvaias, grumixamas. Sem contar que é um lugar de paz, gostoso para fazer piqueniques ou simplesmente observar patinhos na lagoa e caminhar pelas alamedas.  


Para minha felicidade, acabei de ganhar o livro sobre o Jardim Botânico, com fotos de Juan Esteves e texto de Maria Guimarães, da Editora Terceiro Nome.  Em suas páginas você vai descobrir o que tem a ver os Jardins Botânicos com as espécies comestíveis exóticas e nativas presentes em nossa mesa, vai acompanhar através de fotos históricas toda a construção do parque, desde a terraplanagem para as estufas até o Jardim de Lineo feito à moda do Jardim de Uppsala, na Suécia, contra a vontade do mentor do parque, o descendente de alemão Frederico Carlos Hoehne, que queria ver ali a reprodução de um ambiente que tivesse mais a nossa cara tropical.  E as fotos atuais mostram uma paisagem deslumbrante que não faz feio aos jardins botânicos estrangeiros. O lugar é lindo e conserva um grande pedaço de mata atlântica - a nascente de um dos córregos que ajuda a formar o riacho do Ipiranga, está abrigada dali. Além disso, funciona no local um importante centro de pesquisa botânica - e eu confesso, morro de inveja dos pesquisadores que trabalham ali apreciando ninfeias. 


Então, recomendo as duas coisas: uma visita ao Jardim e a compra do livro, que é imperdível  - daqueles que são lançados apenas uma vez porque os interessados pioneiros parecem ser em número exato para esgotar a primeira tiragem, e depois os descobridores vão surgindo aos poucos e esparçadamente, em número insuficiente para justificar uma segunda edição.  Por isto, aproveite enquanto é tempo.  Algumas imagens: 




 



Para comprar o livro, entre no site da Editora: http://www.terceironome.com.br/jardimbotanico.html#
E, para visitar o Jardim Botânico, se oriente aqui:  http://www.ibot.sp.gov.br/jardim/index.php


O piquenique de maio e o bolo que levamos


http://piqueniquepertodecasa.blogspot.com.br/2012/05/piquenique-de-maio-de-2012-e-o-bolo.html

terça-feira, 29 de maio de 2012

Cára-moela roxo bem apimentado

Todo ano, lá para o meio do mês de maio, a situação  fica insustentável e damos um basta. Os galhos atravessam o quintal pelo ar, escalando telhados, janelas e varais. Carurus do reino, chuchus, videiras, orelhas de padre, carás-moelas. É finalmente hora do desprendimento. Precisamos abrir uma clareira para que o sol fraco desses meses frios nos dê alguma cor ou morremos estiolados sob a sombra fria. E foi assim que colhemos uma bacia de carás-moelas, alguns muito pequenos ainda, com grande potencial de crescimento. Carás de todo tipo, do branco, do roxo, do combinado, de quinas retas ou onduladas, com jeito de moelas ou de fígados de pedra. Cozinhei alguns, dos pequenos, na cesta de vapor, enquanto preparava arroz integral na panela elétrica. Tirei a pele fina, puxando com uma faca, para manter a forma. Ela vai se desgrudando facilmente, como se tivesse sido presa com alfinetes de cabeça que se soltam deixando impressa a marca dos furinhos. Não sabia a cor da polpa, que se revelou roxa apenas quando os parti. O sabor não muda, sempre agradável, com leve amargor, com textura de castanhas assadas. Refoguei com pimenta, cominho e ervas que colhi no quintal, mas você pode inventar seus temperos. 






Cará-moela roxo apimentado 


4 carás roxos pequenos inteiros
1 colher (sopa) de azeite 
1/4 de colher (chá) de grãos de cominho
1 pimenta dedo-de-moça picada, sem sementes, picada em quadradinhos
Meia colher (chá) de cúrcuma em pó (açafrão-da-terra) 
1/4 de colher (chá) de sal 
4 florzinhas de jambu 
2 folhas de manjericão anis fatiadas
1 folha de alfavacão fatiada


Cozinhe os carás inteiros, no vapor, por cerca de meia hora ou até que fiquem macios (se preferir, cozinhe em água com um pouco de sal). Espere amornar e tire a pele, puxando com uma faquinha. Numa frigideira, aqueça o azeite com o cominho. Quando ele começar a pipocar, junte os outros ingredientes e mexa. Acrescente os carás inteiros e chacoalhe a frigideira para que os temperos fiquem aderidos aos carás. Corte os carás ao meio e sirva com arroz, feijão, omelete, abóbora... E nhac! 


Já falei dos carás moelas aqui: 


http://come-se.blogspot.com.br/2010/05/resposta-charada-cara-moela.html http://come-se.blogspot.com.br/2011/09/cara-moela-frito-dois-em-um.html http://come-se.blogspot.com.br/2011/05/cara-moela-e-tomatinhos-do-quintal.html http://come-se.blogspot.com.br/2011/09/bolinho-de-cara-moela-ou-cara-do-ar.html

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Biscoito com amêndoas de cupuaçu


Ontem os amigos Marly e Marcelo estiveram aqui para um chá, trazendo um saco de cinco quilos de amêndoas de cupuaçu que vieram do Acre na bagagem do Pablo, que retirou a encomenda em Acrelândia com a Susana, que me fez a gentileza de ir buscar em Nova Califórnia - RO, na sede do Projeto Reca. Lendo o primeiro post a respeito, você vai saber um pouco mais a respeito do projeto e das castanhas que, sem o pericarpo, são chamadas internacionalmente de nibs, como os nibs de cacau. O trabalho de tirar a casquinha dura é ingrato - coisa de meia hora pra livrar 150 g de pedaços crocantes.  Mas vale a pena. A Dendê adora e não ouvir o barulho das sementes que vem correndo e fica embaixo esperando por migalhas. Quando cai uma inteira no chão, ela pega e sai correndo pra comer no tapete. A danada já desenvolveu técnica própria para tirar a casca, mas a gente demora um pouco pra pegar o jeito. No começo as unhas ficaram pretas, até que descobri que a casca quebradiça pode ser partida com o descascador de pinhão. Aí é só usar uma faquinha para separar a polpa. São como folhas finas e crocantes de chocolate amargo sobrepostas, cheias de aroma. Resolvi testar em biscoitos. Peguei uma receita clássica de cookies e fiz algumas alterações, como substituir o ovo por polpa de cupuaçu e a baunilha por canela em pó, que combina muito com a acidez da fruta e tem uma certa liga (quando tirada na tesoura, direto da fruta) e gotas de chocolate, por nibs de cupuaçu. Quem sabe um dia você se depara com estas amêndoas?  Comece a pedir para o Projeto Reca  ou para um fornecedor da Bahia, Eduardo que já entrega sem as casquinhas.  E veja também nas lojas de produtos orgânicos. Precisa ter demanda pra começarem a vender e,  por mim, terá muita, pois estou com outros usos em mente.  Mas já aviso, é só pra quem gosta de chocolate amargo, cem por cento. É amarga, não tem doçura alguma, mas tem crocância, cor, sabor e aroma muito tentadores, como o café, o chocolate.  


Algumas saem inteiras. Outras, nem tanto
A bolinha de pelos à direita, sob a mesa, é Dendê à espera de migalhas



Biscoito com amêndoas ou nibs de cupuaçu


200 g de manteiga em temperatura ambiente
100 g de açúcar mascavo
100 g de açúcar cristal 
1 pitada de sal (se a manteiga for sem sal)
60 g de polpa de cupuaçu (integral, sem adição de água)
2 colheres (chá) de canela em pó
300 g de farinha de trigo  
150 g de amêndoas de cupuaçu sem pele picadas grosseiramente 


Na batedeira, em velocidade máxima, bata a manteiga até ficar cremosa e esbranquiçada. Junte os dois açúcares aos poucos, sempre batendo. Coloque o sal, se for usar. Continue batendo e acrescente a polpa de cupuaçu aos poucos, batendo bem para que ela se espalhe bem pela massa (para facilitar, pique bem antes de acrescentar). Diminua a velocidade da batedeira e acrescente a canela e a farinha peneirada, aos poucos. Não bata muito - só o suficiente para misturar. Se não tiver experiência (e acha que vai acabar mais que o necessário, deixando a massa dura), o melhor é desligar a batedeira e misturar a farinha com uma espátula. Por fim, junte as amêndoas e misture. Pré-aqueça o forno à temperatura média. Unte formas com manteiga e coloque bolas disformes feitas com uma colher de sobremesa. Achate com garfo e leve ao forno para assar por cerca de 20 minutos ou até começar a dourar por baixo. Tire do forno (os biscoitos ainda estarão moles e frágeis), espere esfriar para ficar bem crocante e nhac!  Rende uns 50 biscoitos (depende do tamanho que fizer). 

Dendê está viciada. Sabe tirar a pele, nhac e vem pedir mais



sexta-feira, 25 de maio de 2012

Mescla de banana-da-terra apimentada com beiju de abóbora e banana

O molcajete é emprestado da Mara Salles, mas a miscelânea sem nome foi inspirada na oficina de moles da Lourdes Hernandez na saudosa Casa dos Cariris. Além da inspiração, veio de presente da Lourdes também a prensa usada para os beijus - preferi usar o nome dos nossos pães chatos


Chapa da Lourdes: pimentas defumadas, folhas de abacate-anis,
tomatillos, tortilla amanhecida etc
Os moles feitos pela Lourdes eram divinos, mas na falta de muitos dos ingredientes usados, fiquei imaginando uma pasta com ingredientes nossos, bem apimentada, para comer com nossos beijus. Fiz já algumas vezes, mas no processador. Agora, com o molcajete, este pilão de pedra vulcânica bem áspera, a textura fica muito melhor. Usei bastante banana, que foi quem deu o corpo, a sustância.  As castanhas amazônicas dão crocância. E, agora que tenho as amêndoas do cupuaçu, de sabor meio amargo e bastante aromático, incluí também. Se quer menos picante, é só diminuir as pimentas ardidas e aumentar a pimenta doce como a americana. Ou ainda tirar todas as sementes da pimenta ardida. Ou, também fica bom e eu já fiz para crianças, pode usar pimenta biquinho em conserva escorrida. 


Faça algum beiju como este de banana com abóbora, que já dei aqui ou sirva com as tortillas mexicanas. Com nata no meio, sugestão da Ana Soares, Nhac! 


Usei banana-da-terra, cebola, alho, tomate, pimenta e especiarias




Mescla de banana-da-terra apimentada 

2 bananas-da-terra médias
6 pimentas dedo-de-moça maduras, inteiras
1 pimenta americana vermelha
1 cebola cortada ao meio
1 tomate maduro cortado ao meio
2 dentes de alho
1 colher (chá) de grãos de cominho
1 colher (chá) de grãos de coentro
1 colher (chá) de grãos de erva-doce
2 colheres (sopa) de castanhas amazônicas
2 colheres (sopa) de amêndoas de cupuaçu torradas, sem pele
1 colher (sopa) de colorau (urucum)
2 colheres (sopa) de folhas de coentro picadas
2 colheres (sopa) de óleo de castanhas ou de abacate
1 colher (chá) de sal
1 colher (sopa) de suco de limão

Sobre uma chapa quente coloque as bananas inteiras, as pimentas inteiras, a cebola com casca, cortada ao meio, o tomate cortado ao meio e os dentes de alho inteiros. Deixe dourar de todos os lados e reserve. Toste brevemente e triture as especiarias. Tire o cabinho das pimentas e as peles que estiverem queimadas ou soltas. Tire as sementes da pimenta americana e das dedo-de-moça se quiser uma pasta menos picante. e descasque a banana.   Coloque no pilão as pimentas com as especiarias e o alho. Triture bem. Junte a cebola e soque. Junte as castanhas, as amêndoas de cupuaçu e triture. Acrescente as bananas em pedaços e o urucum, sempre socando. Pingue o óleo aos poucos e tempere com o sal, o suco de limão e o coentro. Misture bem, prove o tempero e corrija, se necessário. Se preferir, triture tudo no processador.    Rende: para umas dez pessoas comendo beijus

Repeti os beijus de banana-da-terra com abobora, que incharam assim. Receita aqui.


quinta-feira, 24 de maio de 2012

PALADAR - COZINHA DO BRASIL - 6ª edição do

Ana Soares, eu e Mara Salles. Foto: Inês Correa 

Estamos lá novamente, no Paladar, Cozinha do Brasil, junto com um time de tirar o fôlego. Até o amigo João Rural vem. E um monte de gente nova no evento.  Veja toda a programação no caderno Paladar de hoje ou aqui: http://blogs.estadao.com.br/paladarcozinhadobrasil/

Fritada indiana: arroz, feijão e mistura


Este é continuação daquele post sobre Idlis ou bolinhos indianos no vapor. Eu disse que a massa era versátil, não? Pois é, quinta é um dia em que almoço sozinha e sempre que posso, quando não tenho comida de ontem para esquentar, improviso um prato único. Foi o que fiz. 

Se você já deixa um tanto dessa massa pronta na geladeira, pode improvisar de mil maneiras. A massa mais durinha, pode fritar como acarajé. Se deixá-la mais macia, pode assar no forno com algum recheio ou dourar, assim, na frigideira, à moda de uma fritada, como fiz. Aliás, na falta de um nome melhor, fiquemos com fritada indiana. Se você se lembrou de fazer a massa com antecedência e deixou fermentar de um dia para outro, como mostrei naquele post, ótimo. Se não, deixe as farinhas molhadas descansar um pouco, cerca de três horas, e adicione uma pitada de fermento em pó para dar mais leveza à massa. Ou ainda, aere a massa batendo em batedeira. Eu prefiro deixar fermentar, pois o sabor levemente ácido também fica melhor. 


Fritada indiana ou idli de frigideira

Bem, o que fiz foi misturar 1 xícara de farinha de feijão fradinho com 1 xícara de farinha de arroz, juntar água até formar uma massa como a de bolo, cobrir com plástico e deixar fermentar até o outro dia. Na hora de preparar, temperei com sal e 1 colher (chá) de cominho e coentro moídos juntos  (os grãos tostados e triturados na hora de usar). Numa frigideira com um pouco de azeite chapeei um pouco de quiabo picado com um pouco de sal, só até aquecer. Juntei um pouco de cebola roxa e pedaços de pimenta dedo-de-moça sem sementes (ela ficam muito suave e você poderá comer sem lacrimejar) e refoguei rapidamente.  Juntei mais água à massa de idli para que ficasse um pouco mais fluida (entre uma massa de panqueca e uma de bolo), a ponto de poder ser despejada sobre à frigideira. Limpei a frigideira, juntei mais azeite e despejei um pouco da massa. Por cima espalhei o quiabo, a cebola, a pimenta e umas folhas de salsinha. Abaixei o fogo, tampei a frigideira e quando a massa começou a ficar firme por cima e dourada por baixo virei com uma espátula. Deixei dourar um pouco,  virei direto no prato e nhac. Um almoço vegetariano de primeira pra comer na quinta. A massa fica assim, macia,leve e granulosa como a do acarajé. 


quarta-feira, 23 de maio de 2012

Livro gratuito sobre abelhas nativas

Minha caixinha de jataí
O Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) acaba de lançar um manual técnico que é muito mais que isso. É um livro essencial para todos aqueles que criam abelhas sem ferrão. Tem tudo o que eu gostaria de saber para ter sucesso com minhas três caixinhas de jataís. Desde que trouxe os mimos de Porto Alegre, estava insegura para abrir as caixas, mas agora, com o livro super bem detalhado, com várias fotos ilustrativas, estou me sentindo uma profissional.   Fala sobre legislação, tipos de abelhas, instalações, extração, etc. O autor, Jerônimo Villas-Bôas, é ecólogo, especialista em abelhas sem ferrão e também membro do Slow Food -  faz parte da comissão nacional da Arca do Gosto, da qual também já participei.  O objetivo do livro é orientar produtores da agricultura familiar, mas mesmo que você não tenha sua própria criação de abelhas sem ferrão, sei que com o livro vai ter muita vontade de ter ao menos uma caixinha na varanda do apartamento por prazer.  



Você vai encontrar o link para baixar o livro em pdf aqui: 

Para ver outras publicações do ISPN, como a de manejo de frutas  nativas, clique aqui:




terça-feira, 22 de maio de 2012

Festival do queijo canastra no Tordesilhas: queijo, soro, nata, Canastra!

Foto:  Iara Venanzi 
Corra pra reservar seu lugar no Tordesilhas pois o festival mal foi anunciado e já está concorridíssimo. A chef Mara Salles foi duas vezes neste ano à Serra da Canastra, sendo que numa das viagens eu estava junto de intrometida, lembra? (falei da nossa viagem aqui,  aqui, ali e acolá).  Então posso recomendar o evento não só porque ela é minha amiga, mas porque vi seu empenho desde o começo do ano para digerir tudo o que presenciou por lá,  para transformar inspirações nascidas à beira dos fogões de lenha dos produtores em pratos magníficos que poderemos provar. Criativa que é, não ficou só no queijo. Começou lá mesmo a fazer testes com o soro e com a nata, ensinou e aprendeu, descobriu segredos que uma visita rápida não é capaz de revelar.  Para isto, dormimos e acordamos com as famílias de dois produtores, a do Zé Pão e Romilda e Zé Mário e Waldete. Acordamos de madrugada, fomos juntas para o curral, tomamos café doce, leite espumoso e morno direto da teta da vaca, bebemos da mesma pinga no fim do dia e conversamos à beira do fogão. E vocês vão ver, toda esta vivência vai estar ali nos pratos que teremos chance de provar. E ainda assistir a partes do filme O Mineiro e o Queijo que estará passando enquanto jantamos, e até conversar com Zé Mário e Dete, que estarão presentes - se tudo der certo, em todos os dias do evento.   Outro mineiro ilustre que vem prestigiar é o Joãozinho, presidente da Associação de produtores de queijo minas artesanal (João Carlos Leite), de quem também já falei aqui

o perca tempo, reserve seu lugar já, lembrando que o verdadeiro Canastra, assim como outros mineiros feitos de leite cru, não pode ser vendido fora de Minas e daí este evento ser,  além de um verdadeiro festim, também um protesto. Veja só as delícias que vamos provar: 


Sobre Queijeira Tradicional (foto acima), exposição de queijos para serem degustados com cachaças. Neste espaço também estará sendo exibido em “looping” o filme O Mineiro e o Queijo, de Helvécio Ratton

Lobozó – prato clássico da Serra da Canastra: vegetais frescos, ovos, queijo, cebolinha e farinha de milho

Ovo Caipira Pochê em Soro da Fazenda Matinha de Ouro e lâminas de Pancetta tostadas com toque de Pimenta jiquitaia  

Salada de Folhas Miúdas, Queijo Frito à moda dos produtores e Molho de Jabuticaba

Talharim de Abobrinha aos 3 queijos (fresco, meia cura e curado) e Tomates Confitados com Aliche

Mexidinho de Miniarroz com Queijo bem curado e Pimenta-de-cheiro fresca, acompanhado de Galinha Caipira de Panela

Macedônia de Frutas Frescas e Compotas com Nata da Canastra e Renda de Queijo


Foto:  Iara Venanzi  




Foto:  Iara Venanzi  
Foto:  Iara Venanzi  


QUEIJO, SORO, NATA, CANASTRA
29/05 a 02/06/2012 – Terça a sábado. Jantar
Preço: R$ 95 por pessoa 
Restaurante Tordesilhas
Rua Bela Cintra, 465 - Consolação - São Paulo
Reservas: 11 3107-7444 

  
A produtora Waldete e Mara Salles, observando o jiló para o lobozó 

Acrelândia 2012. Caril de banana-da-terra com leite de castanha

Talvez não devesse chamar de caril a este prato que nas oficinas que dei em Acrelândia chamei de refogado. Mas refogado diz pouco de um cozido vegetal que leva alguns temperos típicos da culinária indiana e que, suculento, aromático e saboroso, não nos deixa sentir falta de preparos com carne.  Caril, curry, kari, são nomes para o mesmo prato temperado com uma mistura de especiarias, também chamada de massala, que se pode combinar na hora do preparo ou comprar já pronta - é o pó de curry, invenção dos ingleses. Leva também folhas de caril, folhas de curry, kari pata, das quais já falei e mostrei aqui. Mas não quis complicar, porque não seria ingrediente fácil de encontrar em Acrelândia, então não usei. Se você tiver, use, vai ficar gostoso.   Bem, mantendo o espírito do prato, achei que poderia fazer um caril local mais simples, bastante adaptado aos ingredientes fartos de Acrelândia, que fica a cem quilômetros de Rio Branco, AC. Talvez um acril em vez de caril.  



Castanhas frescas, um luxo para nós, são tão comuns em Acrelândia quando é época, que não são encontradas no mercado. Acaba que todo mundo tem porque ganha do vizinho ou vai à coleta, ninguém compra. E embora estivéssemos já no fim da safra, pudemos encontrar algumas, não ganhadas mas compradas na pequena quitanda do Seu João. As castanhas, ainda inteiras, ficavam em um saco, longe dos olhos dos clientes. Só descobri porque desconfiei que ali poderia ter.  Um real um saquinho, bem leitosas e crocantes.  Maria e Fernanda tiveram a paciência de quebrar todas e tirar as castanhas, que usamos no pão e para o leite usado nesta receita (bate-se no liquidificador com um pouco de água morna e coa-se numa trouxinha de pano).


Quanto às bananas compridas (já falei destas enormes bananas amazônicas aqui), são fartas e baratas e eu só quis mostrar que podem ser usadas de outras formas, além de fritas. Cozidas, elas se mantém firmes com doçura realçada, o que faz muito bem para este prato. Já a leve e desejável acidez, consegui usando em vez de pó de manga verde ou pasta de tamarindo, que combinariam com a banana, um pouco de suco de cupuaçu,  numa quantidade suficiente apenas para temperar, sem impor seu perfume. E, em vez de folhas de coentro, as de chicória (não aquela parente do almeirão, por favor), que é como são chamados por lá os coentros de folha larga, ou coentro-da-índia, do qual já falei aqui, que fazem o mesmo papel e que crescem lá feito inço. 


Pois aqui está pra quem quiser se aventurar com a fórmula que pode ser adaptada ao que se tem por perto. Mas é bom manter o cominho, o gengibre e a cúrcuma, encontrados  em todo o Brasil,  algum leite vegetal (de coco, babaçu, licuri etc) e um dos dois tipos de coentro. Coma com arroz e depois me diga se não fica bom.  



Foto: Fernanda Cobayashi

Caril de banana-da-terra com leite de castanha 

2  bananas-da-terra (compridas)  maduras, mas firmes
1 colher (sopa) de óleo 
½ colher (sopa) de grãos de cominho
1 cebola grande picada
1 colher (chá) de gengibre ralado
2 dentes de alho socados
1 colher (sopa) de cúrcuma (açafrão-da-terra) fresca ralada ou 1 colher (chá) do pó
1 tomate picado
1 pimenta-de-cheiro ou 1 pimenta dedo-de-moça picada
1 colher (chá) de sal ou a gosto
1 xícara de água quente
1 xícara de leite de castanha
1 colher (sopa) de suco de cupuaçu (bata o cupuaçu com um pouco de água e use este suco – ou use suco de limão se não tiver cupuaçu)
2 colheres (sopa) de folhas de chicória (coentro-da-índia, coentrão, coentro-de-pasto) picada

Cozinhe as bananas com casca, em pedaços, com água que cubra, e um fio de óleo. Escorra e deixe esfriar. Descasque, corte em fatias de um centímetro e reserve.
Numa panela, aqueça o óleo junto com o cominho e deixe até os grãos começarem a pipocar. Junte a cebola, o gengibre, o alho e deixe começar a dourar. Junte a cúrcuma. Mexa bem e junte o tomate, a pimenta, as bananas, o sal e a água quente. Tampe a panela e deixe cozinhar em fogo baixo até o caldo ficar encorpado. Acrescente o leite de castanha e a polpa de cupuaçu, mexa devagar e deixe ferver. Confira o tempero e corrija se necessário. Junte e as folhas de coentro e sirva com arroz. 

Rende 4 porções

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Resposta à charada: Ingá de metro amazônico


Todo mundo há de concordar, esta charada foi suave. Suave, leve, branca. Quem conhece ingá, não se engana, por isto quase todos que responderam, acertaram. Obrigada e parabéns!

Eu já havia lançado uma charada com ingá aqui, mas aquele era  um ingazinho de brinquedo, que a gente rola na boca em busca da substância que a bolinha aveludada promete, e que logo se desfaz em ilusão doce de espuma que se esvai. 

Mas este ingazão, não. É um ingá açu, de metro, de vara, de macaco,  rabo de mico, feijão. Em inglês, ice cream bean; em francês, pois sucre; em espanhol, chalaite, guaba, guama, guamo, guamo bejuco, huaba, inga, pacay. 

São muitas espécies de ingá, mas poucos são assim tão carnudos. Lá em Acrelândia, a Patrycia apareceu com três de presentecomprados em Rio Branco. As sementes estavam todas germinando, com longas raízes que corriam ao longo da vagem e folhinhas  verdes já despontando na escuridão da capsula fechada.  Das três, comi duas, uma lá, outra aqui. Uma delas levei para a Oficina de frutas e uma das crianças levou embora no final. De qualquer forma, as duas vagens renderam sementes germinadas para plantar. Não tirei foto neste final de semana, mas as plantas estão indo bem em Piracaia. 

O Inga edulis é uma fabácea (ex-leguminosa) comum em toda a Amazônia, mas também pode ser encontrado em outras partes do país e na América Central. Minha  esperança  é que vingue em Piracaia, onde já temos alguns ingazeiros mirins produzindo.  A superioridade alimentar deste, no entanto,  já se vê no nome científico. Em latim, edulis quer dizer comestível. Não que os outros não sejam, mas este, se assim pode ser dito,  é muito mais. É que a polpa é mais densa e se desprende com facilidade das sementes escorregadias, como grandes pedaços mastigáveis  de casaco de pele de raposa branca, com a vantagem de que neste caso podemos comê-la sem dilemas morais.  Comi pela primeira vez na Ilha do Marajó e não me esqueço da sensação gostosa,  como a de comer um merengue feito de lã, algodão e seda.  

Como os outros ingás, é pobre em acidez e, como o caqui, não tem sabor e aroma pronunciados, mas a somatória de textura, umidade e doçura é que faz a graça do ingá de metro.  Infelizmente não consegui preparar nada com o arilo que a gente vai comendo sem se empanturrar. Tampouco encontrei receitas com ele. Talvez na Colômbia, Peru, México, haja algum preparo, mas aqui não achei nada a não ser reminiscências de infância.  Sorte que o amigo Pablo está trazendo mais do Acre e quero ver se invento algo, afinal este  ingá pode ser mais que nossas doces lembranças.  

Saiba mais sobre as espécies de ingás dos Incas, no livro:  Lost Crops of the Incas. E aprenda, no ótimo blog Árvores de São Paulo, a reconhecer um ingazeiro pelo nectário, uma glândula secretora de néctar localizado entre as folhas. As formigas são atraídas pela oferta e, em troca, defendem a planta de outras agressões - indiretamente, claro, pois só querem mesmo é defender sua fonte de alimento fácil.


sexta-feira, 18 de maio de 2012

O que é, o que é?

Sabe o que é? Então fale! Na segunda-feira eu digo se errou ou acertou, sem pitos nem aplausos. Bom fim de semana!

Óleo de patauá e outras gorduras nossas

Se você rejeita de todos os modos óleos, gorduras, manteigas e frituras porque fazem mal, porque engordam, fazem aumentar as taxas de colesterol e te matam do coração, é hora de saber que o que mata é o excesso. Até  água quando é demais mata. Basta ver o que acontece com alguns viciados em ecstasy. O que não pode é pensar que podemos comer impunemente gorduras, carboidratos e proteínas na mesma proporção. 


As gorduras são necessárias em inúmeras funções e estruturas de nosso organismo. E ainda fixam e realçam o sabor do que comemos, servem como meio de cocção por calor seco, concentrando sabores e alguns nutrientes e ainda veiculam as vitaminas lipossolúveis. 


O problema é que no mercado encontramos sempre aqueles mesmos óleos insípidos, ultra refinados, obtidos de fontes não muito confiáveis (milhos transgênicos, colza modificada etc) e azeite de oliva importado. A indústria de óleo é controlada por grandes interesses e todo mundo sabe que as informações são manipuladas de modo a nos fazer acreditar que este ou aquele óleo é mais saudável que o outro. Óleos de palma da Malásia, de colza do Canadá (batizado de canola -  Canadian oil) ou  mesmo o azeite de oliva, travam disputa grande no mercado mundial, que passam por financiamentos a pesquisas científicas.  Enquanto isso, deixamos de observar o que temos por perto. O Brasil é rico em palmeiras e plantas oleaginosas e não precisaríamos depender exclusivamente de óleos que passaram por extração através de solventes, que extraem o que a prensa não consegue (o hexano,  usado no processo, pode restar como resíduo mesmo depois da destilação para separá-lo). 


Deixando de lado os óleos baratos e extraídos em larga escala e lembrando que podemos pagar um pouco mais caro por um produto que, por natureza e indicação, deveríamos usar em pequena quantidade, temos uma infinidade de opções mais coloridas, saborosas e nutritivas vindos de nossa flora e fauna. É claro que não vamos encontrá-los nos supermercados da esquina, nem vamos encontrá-los assim, como disposto aqui, todos juntos. Os meus, vou comprando cada  um em lugar diferente por onde passo. E às vezes ganhando. É o caso do óleo de patauá. 


Ganhei a iguaria do Mateus Cavalcanti, aluno do Senac Águas de São Pedro, onde fui dar uma aula no ano passado. Ele veio me perguntar se eu conhecia. Admiti minha ignorância e fomos trocando email até que ele conseguiu comprar em Belém e me deu um pouco. Fui em seguida para o Marajó, perguntei pra todo mundo em Soure e ninguém conhecia - então não se pode dizer que é conhecido em toda a ilha do Marajó. Vem do fruto de uma palmeira, Oenocarpus bataua Mart., com o qual também se faz o vinho (para o amazônida, vinho é qualquer espremido de frutos, geralmente de palmeiras, mas que não é fermentado como o vinho que conhecemos) e já foi muito mais utilizado no passado, inclusive sendo exportado para a Espanha durante a Segunda Guerra para substituir o azeite.  O sabor é de amêndoas e é delicioso quando usado frio em emulsões ou mesmo para chapear um filé de peixe. Lembra um pouco também o óleo de argan, acho que o mais recentemente exaltado internacionalmente depois do azeite (extraído dos frutos da Argan spinosa, do Marrocos).  


Mas além do patauá, há vários outros como o de licuri, que conserva o sabor do coquinho. Com sabor preservado há também os de castanha amazônica (do Pará), o de babaçu, de dendê (o puro, que trouxe do Senegal, é uma joia), de buriti, de amendoim, de pequi, de girassol (não o refinado), de coco (uma pena que estejam tomando de colheradas como panaceia - moda é moda e passa) etc. Poderíamos ter ainda o de castanha de caju, de açaí, de bacaba, de sapucaia, ou a manteiga de cupuaçu (por enquanto só produzida para cosmético) ou cacau, e de tantos outros frutos ricos em gordura. E, quem sabe, do murici, que tem gosto de manteiga?  Sobre o de bati, também uma preciosidade que guardo a sete chaves, já falei aqui


Para consegui-los, fique de olho nos mercados populares, nas feiras de produtores, de agricultura familiar, feiras orgânicas, etc. Azeite seu olhar e engordure um pouco sua cozinha extraindo suas próprias gorduras. Já mostrei como extrair algumas gorduras aqui: 

http://come-se.blogspot.com.br/2010/07/gordura-de-frango-com-sabor.html
http://come-se.blogspot.com.br/2010/04/oleo-de-bati.html
http://come-se.blogspot.com.br/2010/02/uma-boa-banha.html
http://come-se.blogspot.com.br/2008/09/gelia-de-mocot.html

Sobre o óleo de patauá, vale a pensa consultar: 
http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos,pataua-mais-uma-palmeira-amazonica,358538,0.htm
http://caxiuna.blogspot.com.br/2009/01/patau-o-fruto-que-d-vinho-e-leo.html
http://www.cifor.org/publications/pdf_files/Books/BShanley1001/203_208.pdf

Os óleos de argan foram presentes. Um da amiga Mônica Manir e outro do
amigo Pedro Henrique Garcia